APRESENTAÇÃO
Esse livro resume em poucas páginas a trajetória de
um homem que merece o meu respeito, como ser humano e como profissional.
O Paulo teria tudo para ter enveredado por caminhos
tortuosos e até mesmo ter descarregado nos seus filhos os sofrimentos que teve
na infância.
Pelo contrário, passou sua história inteira
trabalhando, muitas vezes de dia e a noite, para sempre proporcionar uma vida
melhor a sua família.
E com seu sacrifício de estudar e trabalhar
conquistou seu espaço e reconhecimento por onde passou. Construiu uma família
enorme, com uma esposa, filhos, genros, noras e netos.
Ergueu a casa pedra sobre a pedra. Seus desafios
nunca foram fáceis, mas com competência soube superar todos e formou uma
espetacular família.
Parabéns, Paulo.
Jones Wilfing Rodrigues
SUMÁRIO
Prefácio
................................................................
Agradecimentos
..................................................
Frases
Especiais Para Meu Leitor ....................
Porque
Escrever Um Livro ...............................
Minha Mãe
..........................................................
Minha Avó
...........................................................
Meu Tempo
de Criança ......................................
Tempos
Difíceis ...................................................
Fênix
Ressurge das Cinzas ................................
Simplesmente
Dayse ..........................................
Meu Maior
Patrimônio – Minha Família ........
Tirando a
Roupa ...............................................
Trabalhando
Eu Chego Lá ...............................
Últimas
Linhas ..................................................
Referências
Biográficas ....................................
PREFÁCIO
Para a construção deste livro a participação de
muitas pessoas foi fundamental. Algumas delas não estão mais comigo. Outras já
não as vejo como as vi no passado. E outras fazem parte do meu dia a dia.
São familiares, amigos, colegas de infância,
colegas de trabalho, conhecidos ou mesmo desconhecidos. Pessoas de toda a ordem
que tive a oportunidade de ter um contato por menor que tenha sido que tenha marcado na minha trajetória.
Claro, que neste pequeno resumo não foi possível
registrar todos os acontecimentos por quais passei. E isto não minimiza a minha
amizade por alguém caso não tenha citado algum acontecimento.
Procurei ser o mais autêntico possível ao
transcrever todas as etapas da minha trajetória e ficarei feliz se de alguma
forma venha a ser fator motivacional a quem quer que seja.
E que Deus ilumine a todos nós!
AGRADECIMENTOS
Meu
Pai Amaro Nascimento Mendes
Minha
Mãe Filadelfa Ribeiro Mendes
Meus
Irmãos de Pernambuco
Meus
Irmãos de Alagoas
Minha
Avó Filomena Mendes
Minha
Tia Zuleide Mendes
Meu
Primo Arremar Mendes
Minha
Esposa Dayse Mendes
Meus
Filhos
Paulo
Roberto R. Mendes Júnior
Sérgio
Roberto Mendes
Ana Paula
de Fátima Mendes
Meus
Netos
Alline da
Conceição
Sérgio Roberto
Mendes Filho
Alice Mendes
Piuco
Bruna de Aquino
Mendes
Camila de Aquino
Mendes
Paulo Roberto R.
Mendes Neto
Meu
Primeiro Emprego: Prefeitura do Recife
Augusto
Cezar de Oliveira
Manoel Ribeiro
Escritório
de Arquitetura
Arquiteto
Tertuliano Dionísio
Arquiteta Jane
Teixeira
Tempos
Atuais: Construtora Arquimendes Ltda
Ceo Paulo Roberto
Ribeiro Mendes
Sócio Sérgio Roberto
Mendes
Arquiteto e Urbanista Paulo
Roberto R. Mendes Júnior
Tecnóloga da Informação Ana
Paula de Fátima Mendes
Siderúrgica
Açonorte SA PE
Engenheiro Mario Balduíno Linck
Siderúrgica
Comesa AL
Engenheiro Elmo Baum
Grupo
Votorantim
Advogado Henrique
Silveira
Engenheiro Clóvis Scripilit
FRASES ESPECIAIS PARA MEU LEITOR
A maior lei do sucesso é ter a consciência do amor
de Deus.
O apóstolo Paulo era um grande aliado de Deus.
Acredite no grande amor de Deus por você.
Tenha sempre sucesso com o grande amigo e seu maior
anjo de
Luz... Deus !
POR QUE ESCREVER UM LIVRO?
A ideia do livro surgiu espontaneamente num jantar
por sugestão de minha irmã Rejane para registrar algumas de minhas histórias
que volte e meia contava a todos. Até comentei na ocasião que outras pessoas já
haviam sugerido. Com o decorrer dos anos encontrei o Jones Rodrigues onde foi
possível concretizar esse projeto depois de um ano de longas trocas de
mensagens, com muitas risadas e uma enorme retrospectiva no passado,
involuntariamente relembrando alegrias, tristezas e centenas de momentos e
pessoas.
Primeiro desejo passar uma mensagem aos jovens que
porventura venham a ler minhas lembranças que vale a pena ter esperança. Devem
estudar. E acima de tudo se esforçar, se dedicar, se comprometer e empenhar.
Enfim, tenham a certeza de que todo o tempo que se dedicarem para alcançar seus
objetivos nunca será desperdiçado. O teu conhecimento deve ser compartilhado
com outras pessoas. Vivemos hoje num mundo globalizado.
Em segundo lugar quero através deste livro
transmitir a meus filhos que lutei e lutei muito para construir o nosso
patrimônio, para dar estudos a vocês. Sai de Maceió apenas com uma mala,
construí com a ajuda de minha esposa a nossa casa pedra sobre pedra. Nada foi
fácil, pelo contrário, tudo foi muito difícil. Muito empenho, muitas e muitas
horas trabalhando de madrugada, muito esforço, muito estudo. Cheguei a tomar
remédios para não dormir a noite e poder trabalhar para ganhar mais e poder
proporcionar uma segurança financeira no nosso futuro. Sempre pensando em quem?
Em mim? Não! Pensava em minha família!
Esse livro é um dos meus maiores projetos de vida.
Ele representa um legado que escrevi para meus amados filhos e netos. Vocês são
a razão da minha vida, o meu orgulho de existir, e que Deus Todo Poderoso e
Misericordioso proteja a todos vocês.
Eu vim lá de baixo, até saberia voltar a viver sem certos confortos. Mas tudo que fiz foi pensando em vocês, lutei e trabalhei para que chegassem aonde chegaram. Tenho o orgulho de cada um dos meus filhos e dos meus netos. Sei que por muitas e muitas vezes estive ausente, nas minhas viagens, nas minhas noites trabalhando para termos um futuro seguro.
Gostaria de ter vivenciado a história de meu pai.
Soube pouco de sua infância, e como gostaria que meu pai tivesse tido a
oportunidade de escrever a sua biografia, da mesma forma que contei a minha
história, descrevendo coisas que muitas vezes nem as lembrava mais pelas
décadas passadas. E alguns fatos com certeza não tive a oportunidade de relatar
a vocês meus filhos. . .
Quero dizer que amo muito vocês meus filhos e netos.
Vocês foram a maior obra que realizei em toda a minha vida. Espero que leiam esses
meus rabiscos e conheçam um pouco mais do velho pai de vocês.
Quem sabe daqui uns cinquenta anos, numa tarde de
chuva, um neto ou bisneto, que nem eu tenha conhecido, encontre esse livro
atirado num canto qualquer. Talvez o livro esteja em pedaços, e o jovem tenha
coragem de ler algumas páginas. Então, eu sou o Paulo, sou seu antecessor e
essa é parte da história da nossa família. Boa leitura meu jovem.
Não poderia terminar o prefácio sem agradecer a
Deus pelo dom da vida; aos meus pais que foram um exemplo de caráter,
tenacidade e força. A minha esposa e meus filhos. E a todos que passaram pela
minha vida, deixando suas marcas!
Que todos possam conhecer um pouco mais quem é o
Paulo Roberto Ribeiro Mendes!! Boa leitura.
ESTE LIVRO
FOI ESCRITO
EM RAZÃO DE
MINHA ESPOSA
MEUS TRÊS FILHOS
TODOS MEUS NETOS
MINHA MÃE
A minha mãe, Filadelfa, era dona de casa e mais
conhecida como Julita. Perdi minha mãe com cinco anos de idade para a doença do
coração.
Tenho poucas lembranças de minha querida mãe.
Lembro muito bem quando acordei estava na casa de minha tia Fia, em Recife no
bairro de Casa Amarela. Minha avó Belinha estava presente. Tinha uma pessoa
comigo no braço, não sei quem era. E o caixão estava posto no meio da sala.
Naquela época os velórios eram realizados nas residências dos familiares. Vi
aquilo tudo, mas não tinha muita noção do que estava acontecendo pela pouca
idade que tinha.
Recordo que na hora que o caixão ia sair a pessoa
que estava comigo no braço me disse "Paulinho sua mãe vai para a casa dos
Santos!" Seria como fosse para "Sua mãe vai para o céu". Essa
lembrança tenho nítida na minha mente. Lembro isso como se fosse hoje, no braço
dela e minha mãe dentro do caixão deitada dentro dele, com flores ao seu redor.
Outras recordações de minha querida mãe, eu estava seu
colo enquanto ela estava almoçando. Ela tinha o hábito de pegar o arroz, feijão
e a farinha e com a mão fazer um bolinho tipo quibe e temperava com pimenta
malagueta que ficava ao lado num pires. Lembro como se fosse hoje. Ela molhou o
bolinho no molho de pimenta. Umedeceu o bolinho na pimenta. E pedi para comer.
E disse: "Eu quero!" E ela
respondeu com uma voz maternal: "Paulinho vai arder, tem pimenta!" E repliquei:
"Eu Querooooo!!!" Na terceira vez ela colocou um pouquinho na minha
boca. E logicamente chorei, porque uma criança com menos de cinco anos passar
por uma situação dessas. Lembro de tudo isso perfeitamente, como se fosse
hoje.
Assim, não tive a oportunidade de fazer tantas
coisas com ela, como ser amado, comemorar minhas pequenas vitórias, mostrar
meus trabalhos escolares, pedir sua ajuda para aprender a escrever e a ler,
comemorar as festas de Natal, Páscoa, os meus aniversários, o dia das crianças,
das mães, as minhas formaturas. Apresentar a minha esposa. Estar presente
no meu casamento. Ter embalado no colo os meus filhos e seus netos. Quantos
conselhos ela teria me dado durante a minha jornada!
Sou católico, mas nosso universo contempla tantas
coisas que não sabemos explicar, e nem mesmo a ciência ainda tem respostas. E
nesse sentido, muitas vezes no transcorrer da minha vida me senti amparado pela
minha mãe. Como consegui chegar até aqui. Foi a mão de Deus, mas acredito que
tive o cuidado de minha mãe lá onde ela sempre esteve no céu, me guiava. Nunca
tive problema com nada. Nunca peguei no que era errado. Nunca fumei cigarro
diferente do normal. Nunca me envolvi com nenhum tipo de entorpecente. Nunca me
meti em confusão.
Então, alguma coisa me orientava, e foi Deus quem
sempre me guiou. Acredito também que minha queridíssima mãe sempre esteve por
perto acompanhando meus passos, mesmo a distância, seja lá onde ela estivesse,
me orientava. Tenho muito carinho e estima pela sua memória.
Minha mãe era linda. Linda demais. Eu com uma
fotografia das antigas mandei um pintor fazer uma pintura numa tela a óleo, de
60cm por 40cm aproximadamente. O quadro ficou espetacularmente lindo demais. E
claro a pintura ficou emoldurada numa das paredes de minha casa. Olhando esse
quadro e as fotos que tenho dela consigo perceber sua meiguice. Sei também que
ela me amava muito. Fui seu caçula, e era muito bajulado por ela, dizem que até
demais. Pela minha querida mãe tenho um enorme carinho e porque não dizer uma
veneração. Sinto uma falta dela, mas convivo com esse sentimento de uma maneira
muito lúdica e religiosa.
E assim, são essas poucas coisas que consegui
durante minha jornada saber de minha mãe. Conversando com minha avó, que também
sabia muito pouco, por ser mãe de meu pai e mais um pouco de meus irmãos. Mas o
pouco que sei, guardo com muito carinho dentro do meu coração. Sei que haverá
um dia que iremos nos encontrar, e nesse dia iremos nos abraçar e seremos
felizes. Por enquanto fica a saudade e a esperança do nosso reencontro.
MINHA AVÓ
Fui conhecer realmente minha avó no dia 01 de maio
de 1964, Dia do Trabalhador, quando ela me acolheu de braços abertos como
um filho em sua casa em Pernambuco. Rumei para sua casa, sem mesmo saber
exatamente qual era seu endereço, mal sabia onde era sua casa. Sabia que era
perto da rodoviária, mas consegui a encontrar. E foi aquela surpresa agradável.
Me recebeu muito bem. Me viu com uma malinha, como dizia no linguajar
nordestino, com "mala e cuia". Me abraçou e já senti de início que
estava verdadeiramente em casa.
Foi na casa de minha querida avó Filomena
Mendes de Oliveira que vim verdadeiramente me sentir ser amado. Pela
primeira vez senti na vida que alguém teria por mim o mesmo amor maternal que
minha mãe Julita teve quando era muito pequeno. Dentro de sua casa me sentia
seguro e protegido. E até as vezes me perguntava por que demorei tanto tempo
para ter ido embora da casa de meu pai.
Soube que nos primeiros meses após a partida de
minha mãe, minha avó foi morar com meu pai para cuidar dos netos. Porém quando
meu pai resolveu casar-se novamente, ela
resolveu voltar ao Recife e levar sua vidinha de sempre. Como minha vida teria
sido diferente se tivesse ido com minha avó no seu colo. Teria sido uma outra
criança. Foi dentro da casa de minha avó que descobri a felicidade. Podia ir
dormir e acordar sem medo ou nenhum receio. Sentir que era amado. Sentir que
aquela casa podia chamar de lar. Que felicidade!
Minha avó Filomena não era de muita conversa até em
razão de seu próprio estilo de vida, percebia que também havia passado por maus
momentos. Naqueles tempos não existia moleza não. Tudo era muito
difícil. Minha avó deveria ter nascido lá pelos anos de 1890
aproximadamente. Teve um casal de filhos.
Era uma mulher muito reservada, mas por outro lado
eu brincava muito com ela. Certa vez minha avó estava conversando com a vizinha
dona Henriqueta e eu vinha adentrando a ruela que morávamos e ela falou para a
vizinha: "Olhe que moço bonito vem ali." E dona Henriqueta lhe disse
"Dona Filó aquele é o Paulo, seu neto querido."
E ela sorriu feliz da vida. Eu estava bem-vestido e
ao chegar ao seu lado sem saber de nada lhe disse carinhosamente "Minha
velha avó me dê a papada." Era a maneira de lhe dizer "me dê um
cheiro". Então peguei na sua bochecha e lhe dei um cheiro. Ela ficou rindo
e feliz, sem saber o porquê. Essa era a minha avó Filó.
E todo o sábado nós comíamos a
galinha de cabidela, que era criada no quintal de casa, onde havia umas dez
galinhas. Eram compradas na feira e ficavam no quintal ciscando e comendo uma
alimentação saudável. Minha avó dizia que era para limpar seu organismo nesse
período que ficava em nosso quintal limpo. Havia um restaurante muito
famoso na cidade, onde o prato principal era a galinha de cabidela e o sabor do
prato de minha avó sem dúvida alguma era muito melhor que do restaurante.
Coisas que o tempo não apaga.
Tempos antes chegou a ter um pequeno café no centro
da cidade, algo muito simples e humilde onde era servido café. Era um pequeno
negócio. Meu pai antes de sair para estudar tomava café lá. Certa vez houve um
freguês chato que reclamou que o café estava frio. Minha avó colocou para
esquentar e serviu um novo café. Que reclamou novamente que estava frio.
Segundo histórias que me contaram, me pai ficou irritado e recolheu o café o
colocou tudo a esquentar, inclusive a xicara e a colher.
Ao servir o cidadão mexeu o café e provou com a
colherinha que grudou da língua do cabra de tão quente que estava. "Porra
Meu”, queria estar lá para ver a cara do cidadão, esse nunca mais voltou para
pedir sequer um copo de água. Nunca mais esse filho de uma égua vai reclamar se
o café vai estar frio ou quente. Deveria ser esse tipo de gente que reclama
demais, reclama de tudo. A vida está aí para ensinar.
Tenho uma enorme saudade de minha avó, uma pessoa
muito simples, humilde, integra, de nossas conversas. De seu carinho e porque
não dizer pelo seu amor para comigo. Sei que cumpri meu papel de neto e ela
cumpriu seu papel de mãe para comigo.
MEUS TEMPOS DE CRIANÇA
Meu nome é Paulo, nasci dia 17 de agosto de 1946,
em Maceió no Estado do Alagoas. Sou filho caçula de seis irmãos. Meu pai, Amaro
Nascimento Mendes foi professor e diretor da Escola Técnica Federal de Alagoas.
Em sua homenagem pelos trabalhos prestados batizaram uma rua na cidade e a
biblioteca da escola com seu nome. A minha mãe, Filadelfa, era dona de
casa e mais conhecida como Julita. Família unida, educação rígida, mas
harmoniosa.
Mesmo sendo filho de diretor da Escola Técnica e
com uma educação conservadora, como toda criança gostava de brincar e aprontar.
Maceió foi uma das primeiras capitais brasileiras a ter energia elétrica, isso
em 1887. O responsável foi o Argemiro Augusto da Silva, que tinha um talento
genial em construções de motores elétricos.
Entre idas e vindas a energia elétrica era
fornecida até às 22:00 horas. Quando então a luz era desligada, e cidade toda
ficava num breu. Tínhamos que ter velas e a lampiões de querosene. Na nossa
casa em Maceió e no engenho de meu avô a iluminação era de lamparinas Aladim.
Era colocado o querosene no bojo, acendia o pavio, dava umas bombadas e
encandecia de forma tal que clareava tudo e ainda mais alguma coisa.
Poucos lugares como hospitais e delegacias tinham
geradores próprios a óleo diesel. Era o princípio de tudo, o progresso aos
trancos e barrancos vinha chegando nas capitais. E como reclamar, se em outras
cidades brasileiras não existia energia elétrica. Inacreditavelmente sabemos
que ainda existem lugares no Brasil e no mundo que ainda não são servidos de
serviços básicos como luz, água, saúde, educação.
Nossa casa era na Avenida Comendador Leão e
semelhante das demais da vizinhança. O início da casa era junto a calçada.
Havia uma área de circulação, para entrar no primeiro cômodo que era a sala,
que tinha duas janelas para a calçada. Em seguida dois quartos. Depois uma
outra sala de jantar. A cozinha continuava a circulação e existia uma outra
pequena copa para refeições diárias, mais dois quartos, o banheiro principal
com aquelas banheiras antigas com bordas arredondas, com vaso sanitário, bidê,
chuveiro e balcão lavatório.
Havia um segundo banheiro ao lado dele, de forma a
aproveitar todos os encanamentos. Para então chegarmos à área de serviço, com a
lavanderia com tanque dos antigos. Nesses tempos nem se sonhava com máquina de
lavar roupa. Havia ainda um quarto e banheiro de empregada. Um terraço e por
fim um quintal que haviam plantadas duas enormes mangueiras espadas, que tinham
um espetacular sabor e doces que nem mel de abelhas. Papai tinha um outro
terreno bem maior onde havia várias outras árvores frutíferas nativas como
carambola, cajueiro, cajá, seriguela, abacate.
Era então que começavam as brincadeiras de verdade.
Éramos dez meninos do bairro que esticavam um cordão barbante na calçada para
que pessoas quando passassem pela calçada, tropeçassem. E então era uma
algazarra só.
Algumas vezes, nós não saíamos ilesos, visto que os
xingamentos eram com todos os tipos de palavrões possíveis e impublicáveis e as
reclamações não eram poucas. Apesar que nunca ninguém chegou a cair no chão,
eram apenas danças nos tropeços e a maioria já estava esperta com as nossas
brincadeiras.
Nossos pais nem sonhavam com nossas estrepolias,
era tudo muito bem escondido. Quando meu pai desconfiava de algo eu entrava na
sabatina do bolo. Ou seja, vinha à palmatória ou a régua, papai pegava o que
estivesse mais próxima de suas mãos. Naquela época a filosofia de educar as
crianças era o chicote na mão. Meu pai era graduado em filosofia, mas seu
método de educação era no castigo físico mesmo, na pancada.
Naqueles tempos as brincadeiras de crianças eram
todas sem maldade e sem nenhuma malícia. Tudo com a maior pureza. Podiam se
juntar meninos e meninas nas brincadeiras. Apesar que o mais comum era os
grupos separados de meninos e meninas. Uma das minhas paixões era jogar
"ximbra", tradicionalmente chamado de bolinhas de gude, aquelas
bolinhas pequenas de vidro coloridas transparentes.
Juntávamos em até seis meninos, e fazíamos no chão
de areia um triangulo com um pedaço de metal ou mesmo uma pedrinha. Dentro
deste triângulo cada menino colocava uma, duas ou três "bolitas"
como também são chamadas ximbras. Fazíamos um risco no chão a aproximadamente a
sete passos ou digamos a três metros do chão, de onde iniciava a brincadeira.
O objetivo era desta distância o menino atirar a
bolinha de vidro de forma a debulhar as bolinhas que estavam dentro do
triangulo. O primeiro arremesso tinha que ser em pé em razão da distância e era
atirada a bolinha com a mão.
A partir do segundo lance praticamente ficávamos
acocorados no chão de terra e com os dedos indicador polegar e pai de todos fazíamos
uma espécie de catapulta para arremessar a ximbra E as bolinhas que saíssem do
triângulo ficavam para o seu lançador.
E assim, ia-se matando uma a uma cada bolinha de gude. E a cada novo jogo fazíamos o rodízio de quem havia começado no jogo anterior. Desta forma, todos sempre tinham as mesmas condições de igualdade. E no dia seguinte, todos nós sabíamos quem havia sido o primeiro a dar início na última partida.
Quem mais debulhasse mais ganhava bolinhas. Essas
brincadeiras eram dos tempos que não existiam os computadores e tantas outras
tecnologias que existem hoje. Se elas são mais benéficas, não sei. Mas eram de
uma pureza sem igual.
Outra brincadeira era o "manjar", que
consistia numa corrida entre quatro e seis meninos entre uma determinada
distância. O objetivo não era chegar em primeiro, pelo contrário. O importante
na verdade sempre foi não chegar em último lugar. Porque esse levava vários
tapas nas costas, sem muita força para não machucar. Tudo era brincadeira. Era
um pequeno linchamento saudável.
Na ilustração acima temos duas crianças com o risco
de chegar em último lugar. O menino de boné branco e calça azul e a menina de
cabelos longos pretos e camisa laranja.
E a meninada também gostava de brincar subindo nas árvores, principalmente a mangueira que ela fácil de subir e repleta de saborosas mangas. O maior incomodo era quando éramos atacados por formigas loirinhas chamadas saúvas. Aquela formiga era uma peste.
A sua ferroada o cabra sentia na mesma hora. E
tinha outra formiga preta cabeçuda chamada "trinca culhão", porque se
ela pegasse lá nas partes baixas era nocaute certo. Toda casa que tinha uma
árvore, também tinha um balanço construído artesanalmente com corda e um
pedaço de tábua para servir de assento, para não sentar a bunda naquela corda
fina. E ficávamos competindo para quem balançasse mais alto, e nunca ocorreu
nenhum acidente.
Nós também éramos inventores. Tínhamos criatividade
para criar brinquedos, até porque naqueles tempos não existiam as lojas de
departamentos e shoppings como existem hoje, com dezenas de lojas
especializadas de brinquedos.
Desta forma, com um pedaço de madeira, serrote,
rolimãs de caminhão a gente construía protótipos de patinetes. Minha sorte foi
que minha irmã mais velha, a Ivete, havia casado com o Benício. Ele tinha uma
fábrica de refrigerante e vinagre chamado Bisbom. Tinham três caminhões, e
assim conseguíamos o fornecimento dos rolamentos que iriam virar sucata.
Outra fonte para encontrar os rolimãs é claro nos
ferros velhos, que os meninos compravam com uns trocados. Colocávamos um
rolamento de caminhão na frente e outro atrás. Inclusive no rolimã de trás
colocávamos um pedaço de borracha de pneu de automóvel que era mais macia para
podermos pisar com o pé e dessa formar frear o nosso veículo de duas rodas.
E lá ia a gurizada para cima e para baixo, com os patinetes, com os pés livres, sem nenhum calçado. Para nossas brincadeiras a gente não usava tênis, chinelo e nem nada. Era a gente aqui embaixo e os anjos nos cuidando. Era tudo na base da sola e do pé no chão mesmo. Era uma brincadeira saudável e com contato com a natureza que criava anticorpos para a nossa saúde.
Com o tempo os rolimãs acabavam estragando e nós
engenheiros de plantão, claro que desmontávamos aquelas engenhocas para retirar
de dentro aquelas bolinhas metálicas. Não era tarefa fácil de ser realizada.
Era necessário o auxílio de uma prensa, pois deixamos apoiada numa superfície
metálica, as bordas eram apoiadas e com um cepo de madeira metia-se uma pancada
bem no meio. E incorporamos elas ao jogo de bolinha de vidro. E quem tinha uma
bolinha de metal era considerado o "maioral". Veja só, quando somos
crianças, quanta simplicidade para sermos um "tham", coisas da
infância.
Falando em invenção, o primeiro liquidificador da
vizinhança foi comprado pelo meu pai. Lembro perfeitamente. Era da marca Arno.
Ter um liquidificador naquele tempo era um título de nobreza. O preço era
caríssimo, porque ainda não eram fabricados em série.
A maioria das pessoas nem sabia para o que servia
aquele aparelho esquisito. Os meninos da rua, queriam sempre ir lá em casa
tomar uma vitamina de banana com leite. E junto com a vitamina era também
servido um saboroso sanduíche com queijo amarelo e amassado muito gostoso.
Usávamos uma sanduicheira das antigas. Colocávamos o pão dentro com todos os
ingredientes.
Nasci e fui criado dentro de casa com a comida
sendo feita com fogão a querosene. Isso mesmo, naquele tempo ou as famílias
tinham fogões a lenha ou a querosene. Lembro inclusive que usávamos a marca de
querosene Jacaré. Também tínhamos um fogão a lenha, mas ficava na última
dependência, já lá no quintal, na área de serviço. Mas o fogão a lenha muito
pouco era usado.
A nossa primeira geladeira também era a querosene e
até onde se sabe as primeiras geladeiras a base de querosene surgiram nos anos
de 1920.
E inacreditavelmente ainda deve ser usada no Brasil
em lugares onde a energia elétrica ainda não chegou, visto que o Instituto de
Energia e Meio Ambiente estima que aproximadamente dois milhões de brasileiros
não tem acesso à energia elétrica. Somente décadas depois surgiu a geladeira a
gás e a elétrica. Nem chegamos a ter a gás. Evoluímos direto para a geladeira
elétrica.
E claro naqueles tempos não existia leite
pasteurizado, muito menos em caixas tetras Park ou saquinhos plásticos como
foram no início. O leite era oriundo da "vacaria do seu Didiê" do pai
de um colega de colégio. Quem buscava o leite era eu. Que também ordenhava a
vaca e claro que levava meu copinho de alumínio com um pouco de manteiga,
açúcar e chocolate e assim tomava o leite quente direto do peito da vaca, que
era delicioso e achocolatado.
O leite saia morninho. Veja só, quanta coisa
simples nós tínhamos. As novas gerações nem imaginam isso. A maioria das
pessoas jamais irá encostar nas tetas de uma vaca. Jamais irão tocar numa
enxada. E daqui uns tempos nem saberão o que é um serrote ou uma pá. Lembro de
tudo isso. Foi muito bom ter a infância que tive.
Já a televisão preto e branco, foi diferente do
liquidificar. Todos na vizinhança correram para comprar quando surgiu a
novidade. Foi um assombro a televisão. Porque até aquele momento todo e
qualquer noticiário era somente através do rádio.
Inclusive as grandes novelas como "Direito de
Nascer", que foi uma novela maravilhosa. Foi espetacular, foi uma mudança
extraordinária o nascimento da televisão e a revolução da eletrônica no mundo.
O melhor era assistir os programas de rebolado na
televisão. O mestre "Chacrinha" não era fácil não, como suas meninas
e suas frases repetidas: "Alô Alô Terezinha!!", "Vocês querem
bacalhau?" " Alo seu Nicolau toma bacalhau".
Assistir os comediantes Costinha, Golias, Juca
Chaves, o Zacarias na televisão era algo extraordinário. Não existirá
comediantes como eles. Havia um senhor no nosso bairro que era a cara do
Chacrinha. Tal era sua semelhança que só lhe chamavam de Chacrinha, o curioso
que ele ficava muito brabo com a semelhança.
E a música "Didi, Pelé, Vavá / Bailaram lá na
Europa / E a copa vem pra cá / (no duro) / Gilmar, de Sordi e Bellini / Famoso
trio final / Fizeram do meu Brasil / O campeão mundial / Zagallo, Zito e
Garrincha / Nilton Santos e Orlando / São os campeões do mundo / Que o Brasil
está saudando / Cinco a dois. Mas essa música foi esquecida por todos, uma
injustiça a Luiz Queiroga que foi seu autor. Ficou marcada a música "A
taça do mundo é nossa / Com brasileiro não há quem possa / Eta esquadrão de ouro
/ É bom no samba, é bom no couro! / A taça do mundo é nossa / Com
brasileiro não há quem possa / Eta esquadrão de ouro / É bom no samba, é bom no
couro! / O brasileiro lá no estrangeiro / Mostrou o futebol como é que é /
Ganhou a taça do mundo / Sambando com a bola no pé / A taça do mundo é
nossa / Com brasileiro não há quem possa / Eta esquadrão de ouro / Gol /
Gol / A taça do mundo é nossa / Com brasileiro não há quem possa /
Eta esquadrão de ouro / É bom no samba, é bom no couro!
E foi assim que eu e boa parte de todo o povo
brasileiro escutamos no rádio, para quem não pode assistir ao vivo e em cores a
Copa do Mundo de 1958, quando a nossa seleção trouxe o "caneco" para
o Brasil.
Em 1962 o povo brasileiro ainda acompanhou a Copa
do Mundo pelo rádio, mas pode assistir pela televisão a Copa do Mundo atrasada
um ou dois dias depois quando os filmes chegavam no brasil de avião. Finalmente
em 1970 os jogos foram ao vivo pela televisão.
E já que falei na evolução do liquidificador e da
televisão, lembrei das fraldas que eu e meus irmãos usávamos. Não só nós, mas
todos os bebês dos tempos antigos. Não tinha nada disso de fraldas descartáveis
não. Isso tudo é modernismo. Eram fraldas de pano mesmo, grandes e compridas,
dobradas em duas partes para poderem ficarem mais fofas e havia um alfinete do
tamanho de um "trem" que era para fazer o fechamento da fralda.
Lembro que certa vez alguém fazendo a troca da
minha fralda e a minha babá sem querer deu uma pequena furada na minha
"bilola". Imagina o "pinote" que eu dei. A fralda era
padronizada para todos. Sejam meninos ou meninas. E por fim após usarmos as
fraldas não tinha isso de usar e jogar fora não. Tinham que ser lavadas e
reaproveitadas. E tínhamos dúzias e dúzias de fraldas. Os varais das casas
ficavam feito festas de São João com tantas fraldas dependuras ao sol para
secar.
As canetas tinteiros eram uma graça usar. Coisas
que hoje nem vou falar que não existem mais. Vou ser mais profundo, as pessoas
nem saberiam como usar. Era uma época que para escrever precisava de tempo. Era
uma escrita desenhada, sem pressa. Hoje nem se escreve mais, tudo é no computador,
tudo é com pressa. Muitas escolas já aderiram tudo a tecnologia digital.
As crianças com três ou quatro anos já estão
conectadas a globalização. Mas, usei muito pouco essas canetas que tinham uma
penazinha e tínhamos que molhar no tinteiro para, digamos, "molhar a sua
ponta" com a tinta para poder escrever. Na escola usava o
tradicional lápis e a caneta esferográfica de plástico. Escrevia em cadernos
pautados, com linhas de alinhamento especial para a escrita a ser feita, que
aprendi a escrever com letra cursiva que era obrigatório na escola.
Nosso pai tinha uma caneta Parker 51e certa vez eu
estava fazendo a prova de ingresso ao Colégio Educandário aos dez anos de
idade, um dos gêmeos, Edmo certamente com inveja da minha
caneta bateu em cima da minha mão e envergou o bico da pena. Quando fui
desenvergar para não chegar em casa com ela daquela forma, partiu-se porque o
aço não tem a flexibilidade de outros metais. E nem preciso contar o que
aconteceu comigo quando meu pai descobriu que a caneta estava quebrada.
Lembro da professora Mariinha Paturi Sangrema,
muito enérgica. Ela agrupava seis alunos para arguição, onde tinham que acertar
as suas perguntas. E ela me escolheu para aplicar um castigo com uma palmatória
nas suas mãos aos que erraram.
Naturalmente apliquei sem muita força. Foi então
que a professora com muito prazer refez o castigo neles e em mim com a devida
força. Não sei o que mais me doeu. Se foi a dor na mão ou o sentimento de ver
meus amigos receberem duas vezes o mesmo castigo.
Aliás, esses mesmos gêmeos eram os terrores do
colégio no primário. Não sei se dizer qual dos dois era pior. Se o Edmo ou o
Edimar. Sempre brigavam entre eles e com todos os demais colegas da classe.
Certa vez meu irmão soube que houve uma briga entre nós e que eu havia levado a
pior, porque eram dois contra um. Assim, meu irmão Rosevelt não resistiu ao
acontecido no recreio e tomou as minhas dores e foi lá dar uns tapas bem dados
nos dois.
E sempre havia aquela professora que todos os
alunos não gostavam. E ela era a nossa vítima preferida, alvo de nossos planos
secretos, na maioria das vezes nem tínhamos coragem de colocá-los em prática.
Mas às vezes um ou outro decolava. Certa vez, surgiu a ideia de colocar embaixo
de sua mesa ao alcance de seus sapatos quando estivesse sentada umas
"bombinhas" ou "traques".
Era algo vendido na época, que para ocasionar uma
pequena explosão bastava apenas pisar com certa força com o sapato. E feito o
serviço, lá toda turma a sua frente assistindo sua aula, aguardando com toda à
expectativa o momento dela sentar-se. As colegas mais ansiosas ou românticas já
imaginavam a professora explodindo e saltando porta a fora. Outras suavam e
passavam o lenço na testa de tanto nervosismo.
Finalmente a professora se sentou. Nossos olhos
ficaram vidrados, nós não piscávamos. Estávamos congelados. Nunca todos os
alunos na sala de aula estiveram tão atentos aos acontecimentos quanto naquele
dia. Nossos ouvidos aguardavam uma explosão. Mas nada acontecia.
Tínhamos medo de olhar para o chão. Porque ela
poderia desconfiar. E se ela chamasse algum de nós para junto dela para fazer
um teste de última hora. Se errasse a pergunta, ela pegaria à palmatória e no
momento de bater na palma da mão ela viesse a se explodir. Tudo passava por
nossas cabeças. Mas nada do nosso plano acontecer. As bombinhas não explodiam.
Os minutos passavam e nada.
De repente ela empurra a cadeira para traz e vai se
levantar. Arrasta o sapato e BOOOOMMMMM!!!!! A bomba explode. Ninguém na sala
de aula sabe o que fazer! Todos os alunos ficam sentados quietos sem rir ou
dizer nada. A professora explodiu em duzentos pedaços. Foi um piscar de olhos e
escutamos após a explosão da bomba os pedaços saírem de sua boca: "Quem
foi o autor dessa brincadeira? Isso não vai ficar assim! Vai sair muito
caro!"
E lá foi a professora porta a fora para a
diretoria. Ela mal saiu, e toda a sala caiu na gargalhada. Havia meninas que
riam e outras choravam. Meninos que choravam de tanto rir. Sabíamos que
tínhamos poucos minutos e teríamos que já estar recompostos, porque o pior
estava por vir.
E em minutos entraram a professora e o diretor.
Aperta aqui e aperta ali. Ninguém assumiu o tal atentado e ninguém delatou.
Podíamos brigar e ter nossas diferenças, mas nenhum aluno era delator. Enfim,
levamos para casa uma anotação na caderneta e suspensão de um dia para todos.
Então,
das fraldas não tem como pular para o pinico. E a história do pinico não é
fácil não. Isso a criançada de hoje nem experimentou. Já existem adaptadores
práticos para os vasos sanitários. Mas todos nós tivemos um bom amigo pinico. E
quem não teve, não imagina o que era ficar sentado nele como um rei, esperando
alguma coisa cair.
E o cheirinho bom que vinha depois. Disso não tenho
saudade não, e nem um pouco. Na minha época existia um órgão do governo federal
que determinava que as "privadas" deveriam ser sempre fora de casa. E
o que era "privada”? Eram os banheiros antigos anexos as casas.
A nossa tinha água encanada e descarga para ser
puxada no vaso sanitário. Porém haviam "privadas" sem encanamento
simplesmente com um buraco profundo e que volte e meia de meses em meses se
fazia necessidade de manutenção, principalmente nas zonas rurais. Mas voltando,
ao interessante assunto do pinico, que é a bola da vez. Como as
"privadas" ficavam fora da casa, usávamos os pinicos a noite.
Que ficava nos aguardando, quietinho embaixo da
cama. O meu modelo era Ágata. Mas havia diversos modelos, a gosto do freguês.
Haviam de plástico, de ferro esmaltado e com certeza em ouro também para servir
a realeza ou algum sultão no Oriente Médio. Normalmente utilizava somente para
fazer xixi. Mas às vezes, amanhecia alguma coisa sólida de cor marrom escura
boiando no líquido amarelo.
E falta falar do que? Já falei da fralda e do
pinico. Claro, falta falar do papel higiênico. Essa você irá gostar de ler e
saber como era o papel higiênico na minha época. Será que era perfumado ou
picotado? O que você acha que existia lá em 1940? Era simplesmente o velho
jornal. Só que o jornal é algo que está sendo extinto hoje. Talvez em um breve
espaço de tempo de alguns anos já não mais existirá. Mas era jornal. O velho
jornal.
E quem nunca cantou a música: "Jingle Bells,
Jingle Bells, me dá um papel, não faz mal, não faz mal, limpa com jornal!"
Então, pegávamos o Jornal Gazeta de Alagoas, recortava ele em pedaços e já
deixava no banheiro para utilização futura. O jornal tinha aproximadamente 80 x
50 cm cada folha. E cortávamos em pedaços de 20 por 25cm aproximadamente. Havia
residências que tinham também os famosos bidês que a princípio era para as
pessoas do sexo feminino, mas todos sabiam que muitos homens também os usavam
para banhar suas partes íntimas.
Nós tínhamos o bidê, mas somente as mulheres que
usavam. O bidê tinha três torneiras, a central vinha o jato de água com algum
medicamento que era possível adicionar no bidê. Os outros dois, eram apenas
água, que poderiam ser quentes e frias, ou os dois de água fria. Era de certa
forma muito bom e complementar ao jornal, porque o jornal não era muito
absorvente.
Certa vez estava na loja de aviamentos do seu
Tiburcio e uma cliente perguntou a ele se havia papel higiênico e recebeu como
resposta debochada "Papel higiênico não tem, mas tem lixa número dois, que
também serve"! Ele era muito brincalhão. Velho memorável. E os tempos não
voltam mais.
Os tempos foram evoluindo. Surgiram os rolos de
papel higiênico nos supermercados, eram comercializados individualmente. Então
se colocavam várias unidades separadas dentro do carinho, todas bem simples.
Com o passar do tempo surgiram os produtos macios e perfumados. Atualmente não
são mais vendidos por unidades. São pacotes fechados com no mínimo vinte
unidades. Há alguns anos os bidês foram substituídos por ducha higiênica e a
nova novidade é um aparelho que é instalado entre o vaso e o assento que solta jatos
de água que já é usado nos Estados Unidos e na Europa. Ou seja, o futuro do
papel higiênico pode estar com os dias contados.
E porque não comentar uma brincadeira que fizemos
num carnaval. Compramos na rua dois penicos e enchemos de guaraná, e para
completar nossa aventura pitoresca colocamos um bocado de linguiça cozida
dentro. Já pensou que brincadeira marota, de péssimo alvitre e mau gosto. Mas
era a ideia que tivemos para brincar. E todo mundo achou muita graça. O homem
tomando "urina" e se fartando com os "toletinhos" da
criançada, que era na verdade o guaraná e a salsicha.
Naqueles anos não havia esgoto encanado público em
Alagoas. Mas o que falar, se analisarmos o Brasil de 2024, temos o Marco Legal
do Saneamento do Governo Federal que informa que cem milhões não tem esgoto
tratado e mais de trinta milhões não tem água tratada. E que somente a década
de 2030 o Brasil chegará à universalização desses dois serviços básicos.
Imaginando que nos dias de hoje ainda existem
irmãos nossos, principalmente aqui no sertão nordestino que precisam carregar
água em latas de tinta por quilômetros para poder realizar sua alimentação. Que
são impedidos de terem sua plantação em seu quintal porque sabem que irão
perder sua colheita, mesmo assim insistem na fé do plantio. E cada novo ano,
perdem um ou outro caprino ou uma vaquinha que traria um pouco mais de conforto
para a mesa de suas famílias.
Mas voltando a Maceió de quando era criança, todas
as casas tinham que ter uma fossa séptica da marca OMS, que era um tanque
lacrado, que a matéria orgânica era depositada pelo tubo de descarga do vaso
sanitário, decantava e as bactérias se destruíam.
E assim, ela ficava sempre resolvida. Praticamente
nunca se esgotava, porque logo após a fossa existia um sumidouro, onde era uma
caixa construída com tijolos de alvenaria e o fundo com pedregulhos ou brita.
Os tijolos eram intercalados sem cimento ou massa, para o próprio terreno
absorver o líquido e transformar num terreno fértil.
As caixas de descargas, ficavam acima do vaso
sanitário, onde a água descia através de um tubo de aço galvanizado, porque
naquela época ainda não existia o cano PVC. Onde a pessoa puxava uma cordinha,
normalmente uma corrente de metal, e descia vinte litros de água, com isso a
matéria orgânica ia embora todinha. Todo o vaso sanitário era sifonado. Era o
que tinha no momento para se contemplar, mas de certa forma se resolvia bem as
nossas necessidades.
E banho de praia? Banho de mar? Ir à praia era só
aos domingos e olha lá. Porque durante a semana tínhamos que estudar. De forma
geral era assim, todas as famílias eram muito rigorosas nesse sentido. Ninguém
permitia aos filhos irem à praia se não fosse aos domingos.
Chegávamos cedo na praia, por volta das oito horas,
depois de ter tomado aquele café reforçado nordestino tradicional. E na praia
além dos banhos a maior diversão era o futebol ou peladas na areia fofa. Depois
da pelada, dávamos alguns mergulhos e voltávamos para o futebol.
Outra brincadeira era uma boia feita com uma câmera
de ar de pneu de caminhão que havia sido consertada várias vezes e por fim não
seria mais possível utilizar em caminhões. Então, ficávamos brincando com
aquela boia para frente e para trás. Era uma maravilha. Nadando com ela naquele
mar calmo. Nós colocávamos os pés no centro da boia e patinando com os pés como
se fossemos uns patinhos, íamos na direção que queríamos, fazíamos as voltas
desejadas. Andava um, dois, três e até quatro. Os caronas iam subindo na boia,
chamávamos de bigu, aqueles que ficavam pegando carona. Era coisa de louco,
como diria o artista Jô Soares.
Quando garoto a pescaria não era muito comum. Mas
vez ou outra, surgia a ideia e juntava a meninada e íamos até a praia para
sermos aprendiz de pescadores. Até por morarmos numa cidade litorânea era muito
fácil a realização do esporte. Havia uns trapiches, que eram uns armazéns que
começavam na avenida em terra firme e andavam em palafitas em até certo ponto
do mar, onde os batelões pegavam o açúcar, que era produto de exportação, e
embarcavam nos navios.
E nesse trapiche que ficávamos com nossos caniços,
que era nada mais que um bambu ou taquara, com um fio de nylon que já existia e
com anzóis de barbela. E vez e outra alguém se acidentava o anzol. O ruim era
quando ele atravessava o couro da mão ou da pele. Porque a barbela era
exatamente para o peixe não escapar do anzol. Então, era jogo duro para tirar o
anzol do corpo com maestria.
Outra travessura que fazia com os colegas da
Avenida Comendador Leão, era a de pular a cerca da Mansão dos Leões, um antigo
usineiro da Usina Leão para apanhar mangas rosas. Fazíamos isso pela emoção,
pela astucia de roubar e pela adrenalina. Achávamos que uma manga roubada era
mais saborosa que uma de nossos pomares.
Certa vez fui pego e os empregados me deram um
banho de óleo queimado por todo o corpo. Os vigilantes me pintaram com um
enorme pincel chamado de brocha usado para pintar muro com cal e depois fui
liberado para voltar para casa. Imagina a situação de chegar em casa todo sujo
de óleo e ter que explicar para meu pai o que tinha acontecido.
Para ele uma brincadeira dessas era inadmissível,
não tinha explicação. Um filho seu roubar seja o que fosse. Era garantida uma
coça das boas e doloridas. Não sei o que era pior, o trajeto para voltar para
casa, sabendo que a surra que iria levar de meu pai estava garantida, ou se
propriamente dito a coça em si.
Depois do castigo fatal do meu pai, vinha a outra
parte, remover aquele óleo todo espalhado pelo meu corpo. Aquilo era a maior
certeza que quem fosse batizado pelos vigilantes nunca mais voltaria para pegar
uma folha sequer das mangueiras. E os cabras eram muito espertos, não batiam
nos meninos e nem cascudos, para não deixar marca nenhuma. E depois ainda ter
que sofrer com a zoeira dos moleques nos dias seguintes.
Nos dias de hoje essa situação teria outros
contornos. O caso do banho de óleo iria parar na delegacia e na televisão.
Seria manchete nos noticiários do fim da tarde. Eram tempos diferentes, da
dinastia dos engenhos. Já sou de uma nova geração, adepto de novas culturas
para ensinar meus filhos. Compreendo que o melhor método é sentar-se e conversar
com nossos filhos. O qual traz maior segurança.
Certa vez nas proximidades das festas de São João
estava na Av. Comendador Leão, aos oito anos estava assistindo uma banda
de pífanos passar, na companhia do meu amigo Luizinho, muito tímido e menor que
eu. Junto estava seu pai, deputado Luís Resende, que me entregou um limão
cortado e me pediu para me aproximar da banda e chupar o limão enorme na frente
dos músicos. O que fiz inocentemente e com o maior prazer, visto que sempre
saboreei chupar um limão.
Percebi, que mal passei a chupar a fruta, todos os músicos passaram a me ignorar e
olhar para outras direções. Achei até curioso o fato, mas não relacionei com o
limão. Constatei que um dos músicos assoprava a flauta com muita dificuldade e
ficava olhando em minha direção.
Nisso o mestre da banda de pífanos olhou e me disse
com uma voz braba "Ohhhhh infeliz, quero ver teu fim chupando um
limão!" Então, pense numa situação desagradável. Aquela situação me
marcou. Somente tempos depois que fui compreender a moral da história ou
melhor dizendo a maldade que o pai do Luizinho mandou propositadamente eu
realizar.
Ocorre que qualquer pessoa que vê alguém degustar
um limão automaticamente dá uma vontade de salivar. E neste contexto o limão é
um inimigo para quem estiver tocando um instrumento musical de sopro como
clarim, saxofone, trombone, flauta, tuba, pífano. A banda de pífano é formada
basicamente por componentes instrumental de percussão e sopro. Tendo seu
principal instrumento uma flauta transversal e está presente nas festas e
cerimônias em inúmeras cidades nordestinas, fazendo parte do folclore
brasileiro.
Quando estava na terceira série primária, aos oito
anos, era o responsável para tocar o sino as dez horas da manhã no Instituto
São José para avisar todos os demais alunos que era o horário do recreio. A
professora me fazia um sinal na sala de aula, me entregava a chave, porque o
sino ficava num lugar da escola que era fechado para os demais alunos não terem
acesso e realizar alguma eventual bagunça. Assim, saía quietinho para tocar o
sino. Subia uma escada, porque o sino não ficava tão baixo, que era fixado com
uma corda que era preso na cumeeira do telhado. O sino ficava bem alto, até em
razão da propagação das ondas sonoras das badaladas do sino.
Próximo ao sino ficava uma bandeja de cocadas
feitas por uma funcionária do colégio, Sra. Sinóca que vendia para aumentar
seus ganhos da escola. As cocadas eram feitas pela manhã e colocadas próximo ao
local do sino por ser um lugar bem ventilado para elas esfriarem e por ninguém
ter acesso. Então, antes de realizar minha missão, me sentava num banco e
degustava uma ou duas deliciosas cocadas ainda morninhas.
Ficava numa boa pois naquele local não havia
ninguém. Após bater o sino. pegava a bandeja das cocadas e levava até o birô da
professora responsável pela comercialização. E os alunos iam gradativamente
fazendo suas comprinhas e deixando suas moedinhas. Não lembro qual era a moeda
da época se era réis, tostão ou cruzeiros. Lembro apenas que a cocada era muito
barata e maravilhosamente saborosa.
Mas de fato, sem perceber naquela época que aquilo
era uma maldade provavelmente inocente e que no dia ficaria faltando uns
trocadinhos, mas que no fim do mês poderia ser um valor significativo, porque
de grão em grão a galinha enche o papo. Entendo hoje que naquela época
não havia nenhuma forma de controle do que era vendido pelo colégio. Esse foi
um fato que nunca contei a ninguém e lembrei agora. E se meu pai tivesse
conhecimento, com toda certeza teria levado mais uma bela surra quando chegasse
aos seus ouvidos. E novamente fazia isso sem nenhuma necessidade, apenas por
inocência leviandade.
Fui batizado na Igreja Católica, onde meus
padrinhos foram o Paulo Ribeiro Coutinho e a professora Filomena Coutinho.
Estudando os primeiros anos num colégio de padres e sendo filho também de um
pai conservador católico, claro que fiz primeira comunhão, onde a cerimônia foi
na Capelinha do Colégio Guido de Fontgalland. Onde também fui
"coroinha". Observa-se que o "Acólito" ou popularmente
denominado "coroinha" tem a função de auxiliar o padre nas atividades
da missa, como bater a sineta no momento da apresentação da hóstia e do cálice
sagrado pelo padre.
Onde a sineta deve ser batida três vezes, com um
pequeno intervalo de alguns segundos. Também balançava o "turíbulo"
cheio de incenso para aromatizar o ambiente da capela. Fui crismado e tive como
madrinha a professora Anieta Santos. Foi uma época muito interessante, fiz
tudo isso por devoção ao princípio religioso. Porém, sem a mínima intenção e
nem perfil para o celibato. Nunca tive a intenção de ser padre.
Além da pelada no recreio também existiam outras
brincadeiras como bola de gude, peão. Curiosamente quando o colega perdia o
jogo do peão era necessário realizar o sacrifício do peão. Ou seja, deitávamos
o peão e colocávamos o cordão chamado "enfieira" no castelo e no bico
para mirar o bucho do peão deitado, até lascar ele pelo meio. Arrancando o
primeiro pedaço já estava decretado a morte do peão.
No Instituto Sul-Americano, quando partíamos para o
recreio os meninos corriam, ou melhor íamos voando para o recreio, porque
tínhamos um assunto da máxima importância. Ou seja, havia chegado a hora da
"pelada", ou simplesmente jogar futebol. Inclusive havia uma menina chamada
Giseudinha, que integrava a turma da pelada e ela jogava e disputava conosco de
igual para igual. Ela não passava vergonha de forma alguma.
A nossa correria antes e durante a pelada era
enorme, mas ninguém se machucava. Todos se respeitavam, uns aos outros. O
problema era retornar para a sala de aula, sem ter realizado uma merenda e pior
ainda estávamos encharcados de suor. As camisas molhadas e jogávamos as
gravatas para trás. E os professores exigentes nos pediam que nos
recompuséssemos.
Durante muito tempo fui monitor de classe, que
também sei que no sul do Brasil é denominado de líder de sala de aula. Eu
conduzia o monitoramento da classe para assuntos de forma a não transgredir o
bom andamento da sala de aula e da turma. Jamais em tempo algum denunciei
algum colega por alguma coisa. O monitor era uma maneira de prevenir qualquer
brincadeira anormal que viesse acontecer na sala de aula.
Tínhamos uma professora de canto orfeão, dona
Tecilia que tinha problemas de visão e acaba auxiliando-a eventualmente em
algumas atividades. E além de estudar canto, tínhamos o prazer de cantar o Hino
Nacional, que sempre tive o orgulho de cantar, com a mão direita sobre o meu
peito, sentindo-me feliz e prazeroso ao cantar o hino do nosso país. Na minha
humilde concepção não existe hino mais lindo que o nosso, nem em letra e nem em
música.
Crianças tem uma imaginação ilimitada. Certa vez,
eu e meu irmão Roosevelt, íamos para o campo do Mutange para assistir um jogo
de futebol clássico CRB e CSA. Naqueles tempos, o transporte era realizado de
bonde. Por sugestão do meu irmão era melhor eu não pagar a passagem para
podermos comprar um lanche no jogo. Assim, na hora que o cobrador
chegasse, por ser pequeno circularia pelo vagão para me livrar da cobrança.
Tal foi a minha surpresa que terminei pulando do
bonde em movimento. Acabei ficando com diversas escoriações e para completar,
ao chegar em casa levamos uma coça daquelas do meu pai. A forma que recebi de
meu pai digamos ortodoxa para os métodos atuais não me trouxe nenhum tipo de
trauma ou sequelas para a vida, deixou apenas lembranças no passado e
ensinamentos para que adotasse uma forma diferente para eu educar meus três
filhos.
Na minha época todos os colégios não desfilavam no
dia 07 de setembro, mas no dia 16 de setembro. Isto porque o dia 16 representa
a data da emancipação política de Alagoas do estado de Pernambuco. O estado
sempre foi uma das maiores riquezas do Brasil Império, era povoado por índios
Caetés que viviam em plena natureza da Mata Atlântica e com uma vasta floresta
de árvores pau-brasil.
Assim, Alagoas desde o início teve suas riquezas
naturais destacadas pelos portugueses. Com o desmatamento abriu espaço para a
cultura da cana de açúcar e novamente Alagoas apontou no cenário nacional. Em
1817 Dom João VI decreta que a independência de Alagoas.
Diferente de outras partes do Brasil, e como esse
Brasil é grande e diversificado em culturas, nós não sabíamos o que era beber
água de uma mangueira de jardim. Sempre que havia necessidade estávamos perto
de casa, onde havia um antigo pote ou filtro de barro e com uma enorme colher
como se fosse uma lata de leite condensado com um cabo de zinco galvanizado. E
então mergulhávamos e este utensílio para depois transportar a água limpa,
gelada e filtrada para um caneco de Agatha que ficava preso no próprio corpo
metálico do colherão.
Esse pote de barro era formado por dois
compartimentos. Na parte superior se colocava água normal, que descia para a
parte inferior passando por um filtro. Naquela época nosso pai tinha uma enorme
preocupação porque não existia estação de tratamento, com cloro, medição do PH.
Enfim, não existia um tratamento com a
água como existe hoje em Alagoas. Uma curiosidade da época, é que as primeiras
vezes que se usava os antigos filtros de barro era necessário deixar por horas
a água depositada e depois sacudia a água fora, e repetia esse processo várias
vezes. Isso para extrair o gosto natural do barro.
Aprender a andar de bicicleta não foi muito
difícil. Difícil era ter uma bicicleta na infância e juventude. Era um orgulho
o rapaz saber andar de bicicleta. Tanta coisa para se preocupar e estudar, mas
aprender a andar de bicicleta era prioridade para todos os meninos. Só que para
aprender a andar muitas vezes precisava que alguém emprestasse a bicicleta e se
dispunha a ensinar. Essas eram as dificuldades.
A minha primeira tentativa fiz sozinho e evidente
que não tive sucesso e levei uma queda. Felizmente não me machuquei. Então, um
amigo emprestou a sua bicicleta e disse que iria segurar ela. Segurou uns
segundos e largou. E lá foi o Paulinho, feito um bêbado, para lá e para cá. E
assim foi a minha odisseia me equilibrando com duas rodas.
A bicicleta virou minha companhia, ela foi uma
descoberta em minha vida. Subia e descia as ruas com a maior destreza depois
daquele dia. Volte e meia tinha que fazer as pequenas compras da casa, como
farmácia. Então, quanto mais longe melhor. Curiosamente, foi então que conheci
o seu Antônio, que tinha uma garagem de bicicletas para alugar. Ele fumava
cigarro de fumo de corda. Aliás naqueles tempos só havia os cigarros de
marca Astoria, Asa e o Yolanda Branco, nós chamávamos de "lasca
peito", porque eram cigarros sem filtros. E o fumo de corda que era para
homem macho, para aquela pessoa que não tinha dinheiro para comprar cigarro de
marca ou era mesmo dos velhos tempos.
Como já expliquei a bicicleta era algo muito raro
de ser ter. Não existiam fábricas naqueles tempos no Brasil. As bicicletas eram
importadas e custavam uma verdadeira fortuna. Mas a criançada além de arteira,
também era aprendiz de engenheiros. Nós encontrávamos solução para tudo. Meu
irmão mais velho tinha uma bicicleta Halig. Ele muito ciumento deixava muito
pouco a gente andar, com medo de estragá-la.
Ela tinha o quadro logo abaixo do banco, que
caracterizava as bicicletas da época. As que tivessem o quadro eram para os
meninos e as que não tivessem era para as meninas. Assim, a solução era
improvisar, porque todos tinham pouco dinheiro e nem todas as crianças podiam
ganhar de presente uma bicicleta inglesa. Inclusive algumas famílias faziam um
sacrifício para os filhos que tivessem média acima de nove no colégio e lhes
davam no Natal, mas era muito raro isso acontecer.
Tínhamos o hábito de ir comprando as peças usadas
de bicicletas, como o quadro, as rodas. Isso era um enorme desafio para a
turma, mas a meninada unida fazia uma pequena oficina de construção de
bicicleta. Como resultado surgiu uma bicicleta sem marca definida, porque era
composta do que encontrávamos pela frente em nossa epopeia de criatividade e de
trabalho em grupo. Se encontrássemos um dínamo para gerar energia já dávamos um
jeito de improvisar uma lâmpada. Era maravilhoso tudo isso.
E como diria o poeta Zé Limeira do paraibano de
Campina Grande e completamente analfabeto e que fazia rima dos absurdos:
"Os tempos não voltam mais!" Agora um poema de sua autoria:
"Pedro Alvares Cabral Inventor do telefone. Também tocava
trombone. Na baixa do Zé Leal.
E quando Pedro Segundo. Governou a
Palestina. Até Dona Leopoldina. Devia a Deus e o mundo. E o
poeta Zé Raimundo. Vivia vendendo Jumento!" E assim
ia: "Dois noves fora três diz o Novo Testamento".
Evidentemente já andei de moto, digo evidentemente
por que era muito aventureiro para minha época e não poderia ter deixado de
experimentar essa emoção. Mas isso foi lá com meus dezessete anos. Porém aos
onze anos tinha um amigo que ganhou uma monareta, que consistia numa bicicleta
a motor, muito semelhante a uma pequena lambretinha, que era da Monark.
Certa vez estava trafegando com ela numa das
principais avenidas, a Comendador Leão e nisso passou o Jeep do DETRAN. O
veículo parou uns metros a minha frente e percebi que iriam me abordar.
Naquela época não era exigido carteira de motorista
para esse tipo de transporte. Provavelmente iriam me perguntar qualquer
informação ou algo semelhante, sabe lá o que eles queriam. E prontamente passei
o Jeep e fiz a manobra ao lado contrário deles.
Tentaram manobrar o Jeep para virem atrás de mim,
mas até eles manobrarem, já tinha entrado na rua da Maravilha e sai na Praça do
Raiol. De forma que até hoje esse rapaz me procura, quem mandou ele não saber
dirigir Jeep e nem estar montado numa bicicleta a motor, né?
Voei pela primeira vez de avião aos cinco anos. Não
lembro de quase nada. Sei apenas que viemos de Recife porque alguém tempos
depois me contou, e havíamos ficado na casa de minha avó Bélinha. Minha mãe e
meu pai não estavam a bordo. E não sei o que fomos fazer lá. E muito menos em
qual avião fizemos o voo. Nada lembro. Nem mesmo se ficamos na janela.
Como bons brasileiros, a meninada gostava de uma
pelada. Jogávamos com uma bola de meia. A famosa bola de meia feita sabe lá por
quem. Jogávamos nas calçadas de nossa rua, porque como jogávamos com os pés no
chão, não dava para jogar assim no paralelepípedo. Porque iríamos arrancar os
nossos dedos ao confundir a bola com os paralelepípedos irregulares da rua. No
entanto, com ela não era possível usar na praia, pois com o contato com a água
do mar e com a areia ela ficava muito pesada e por acaso levássemos uma bolada,
além da dor, ficava uma marca da bola, bem roxa.
Outra brincadeira era empinar papagaio ou pipa que
se originou na China, mil anos antes do nascimento de Jesus Cristo. Nós
fabricávamos com papel crepom, com talas de palha de coqueiro, da espinha
dorsal da palha. Cortávamos direitinho e fazíamos como se fosse um pentágono,
uma figura geométrica. A cauda, ou chamado de rabo, fazíamos normalmente de
tecido leve para não pesar muito e não impedir que o papagaio subisse.
Inacreditavelmente se não existir o rabo na pandorga, ela não chega nem mesmo a
decolar, muito menos ficar no céu.
Colocávamos o maldito cerol com goma laca para
derrubar as outras pipas que nem sempre estavam perto. Muitas vezes os donos
das outras pipas estavam a muitas ruas distantes das nossas. E assim, nós íamos
ao alcance delas, muito distantes para "torar", ou simplesmente para
derrubar. E o outro menino ficava somente com a linha na mão, porque a pipa ia
para a Bahia, ia-se embora para nunca mais resgatar.
Acontecia que como nós empinávamos o papagaio muito
alto. Goma laca era um produto químico de cor de casca de barata, que até rima
goma laca com barata. Hoje em dia nem em sonho podemos pensar em colocar o
maldito cerol na pipa, pois passou a ser um mal para a pessoas, podendo causar
inclusive acidentes fatais em pedestres, motociclistas e tantos outros.
E se tivesse o azar da bola bater no rosto, era
pior que um tapa bem dado. Mas as coisas eram dessa maneira. Então, quando
íamos para a praia tínhamos que levar uma bola de borracha. Quando ingressei na
Escola Técnica já entrei no time de futebol de salão. Na época era os
primórdios do futsal, que foi criado pela ACM - Associação Cristã de Moços no
Uruguai.
E nos Estados Unidos a ACM criou o Basquete e o
Voleibol. Era magrinho, pequeno e cabeçudo, sempre jogava no ataque, tinha mais
rapidez. Lembro que a peste da bola era feita de crina de cavalo, pesava que
nem chumbo. Tanto para chutar e para defender era difícil, viu? Mas com o
treinamento do dia a dia, a gurizada ia se habituando.
Em certo campeonato interno na Escola Técnica,
houve um jogo entre a nosso time e o de carpintaria, e o nosso goleiro teve a
doença de papeira como nós chamamos em Alagoas, mas no Brasil é conhecida como
caxumba. E então, os três guarda-roupas decidiram que quem iria ser o goleiro
seria o magrinho. Sobrou para o coitado do Paulo. Nem deu tempo para
questionar. Fui aclamado por todo time. Claro, ninguém queria aquela posição.
No início do jogo o ponteiro adversário, o Hatson,
deu um bico tão filho da puta que quando percebi a bola já estava em cima de
mim, coloquei o braço. Não deu outra,
quebrei o braço. Esse foi meu maior incentivo para nunca mais querer conversa
com o futebol de salão. Naquela época era um jogo de caras brutos. E eu pequeno
não tinha como revidar. Então, definitivamente encerei minha participação em
todas as categorias de futebol, até no de praia.
Jamais iremos ver novamente o mesmo nível de
aprendizado como tivemos na Escola Técnica Federal de Alagoas. Tenho orgulho de
ter sido um de seus alunos. Por ter aprendido meu ofício em suas salas e em
suas oficinas. Incontáveis a horas de ensino que lá me dediquei e quantos
outros profissionais de lá saíram com suas profissões para a sua vida. Foi uma
época muito boa, ensinamento a flor da pele.
Aprendi muita coisa nesses anos, inclusive com as
amarguras que a vida nos proporciona, que não deixa de ser ensinamentos. São
esses fatos que formam a personalidade de um ser humano. Espero que da mesma
forma que vim a absorver esses e outros
conhecimentos adquiridos no decorrer da minha existência e tenha tido sucesso
em ter transmitido aos meus filhos uma educação relativamente parecida com que
tive.
Mas
sempre curioso em tudo, deixei o futebol e fui me aventurar com o voleibol.
Achei interessante e um esporte bem mais tranquilo, sem aquelas trombadas
violentas. Estudei um pouco sobre o assunto e treinei sozinho mais um pouco e
fui me aventurar numa quadra com o maior espírito esportivo. Estava na quadra e
o adversário foi dar um saque tipo "jornada nas estrelas", vi que a
bola era para mim, e fui defender, com as duas mãos para arremessar para o
colega de time de ataque.
Quando
a bola bateu nas minhas mãos, meus dedos encurtaram, a dor foi terrível, pensei
que tivesse quebrado todos os dedos. A bola pesada, eu sem flexibilidade e sem
treinamento. Eu não sabia de nada. Aliás, naquele momento sabia sim. Sabia que:
voleibol também não é minha praia. Abandonei este esporte.
Na nossa rua havia o Clube Jaraguá Tênis Clube e
foi lá que finalmente fui me encontrar com meu esporte. Me achei no tênis de
quadra. Um esporte que não era bruto. Principalmente porque não quebrava perna,
braço e nem ossos nenhum.
Lembro que comprei uma raquete de segunda mão com o
pouco dinheiro que tinha. Era de madeira e a trança interna a gente chamava que
era tripa de gato". Naquela época não existia a tecnologia do nylon. A
rede era bem esticada, e a bola amarelinha batia e voava longe. Foi então que
me dei bem no esporte.
Mas nunca fui além de um esportista amador normal
entre jogadores associados amigos. No clube existiam seis quadras de tênis,
todas elas de saibro e o nosso privilégio maior era nós mesmos fazermos as
marcações da quadra com "cal", com uma régua de um lado para o outro
e com uma brocha para pintar. Molhava a brocha na cal e passava na marcação.
Meia hora depois a cal secava sobre o sol quente
nordestino e ficava aquelas listas lindas no chão. Nós jogávamos sem
treinamento nenhum. Somente nos domingos havia algum instrutor para nos ajudar,
que era bem diferente do que existe hoje com as aulas particulares de
tênis.
A monocultura da cana de açúcar sempre foi o
destaque na agricultura de Alagoas. Aliás o Nordeste todo sempre esteve focado
apenas a essa cultura durante toda sua história. Importante salientar que foi
com o suor e sangue de milhares de escravos que foi erguido e sustentado não só
a economia brasileira, mas também os senhores de engenhos. Aproveito para
registrar meu repúdio que nos tempos atuais, ainda no século XXI, temos
manifestações racistas e porque não dizer escravistas espalhadas no Brasil.
Seja nos estádios de futebol ou em fazendas
agrícolas, onde o Ministério do Trabalho encontra trabalho análogo ao escravo,
mesmo tendo sido promulgada a Lei Aurea a mais de cem anos, em 1888. Por
outro lado, nas últimas décadas o Nordeste tem desmistificado para novas
culturas como a plantação de mangas, uvas, peras e outras deliciosas frutas no
Vale do São Francisco, levando o nome do Nordeste brasileiro para o mundo,
atravessando o oceano. Inclusive os vinhos fabricados no nosso sertão cada vez
mais estão se destacando no cenário nacional e internacional, com o diferencial
de duas colheitas anuais.
E era num desses engenhos de cana de açúcar
que passava minhas férias de julho e
dezembro. Partíamos para o Engenho Cafundó, que é uma fazenda cuja cultura
predominante era a plantação de cana de açúcar. Naqueles tempos o local não
tinha água encanada. Desta forma, tínhamos que pegar a água de um rio, com
águas cristalinas, transparentes e límpidas. Depois a água era filtrada em
enormes filtros de barro. Lá o dia era muito pequeno para todas as diversões a
serem realizadas.
Andávamos a cavalo, no lombo de besta, banhos e
banhos de rio o dia todo. E tinha ainda a briga de ferros com as muriçocas,
pernilongos, mutucas e mosquitos o dia todo. A mutuca deixava uma ferida
incômoda, mas que se curava naturalmente. A casa grande tinha uma pequena caixa
de remédios, que quem realizava os curativos era os próprios proprietários da
fazenda. E o tratamento para a mutuca era primeiro lavar o local com água, e
depois passar o éter, água oxigenada e por fim o antigo e famoso Merthiolate
que ardia demais.
O engenho não tinha carroça de cavalos, mas tinha o
carro de boi. Que não deixava de ser uma carroça. Que saudade andar num carro
de boi. Andava devagarzinho, sendo puxado por uma junta de bois. E nós em cima
do carroção de madeira íamos cantando "Carro de boi que não geme não é
bom! Carro de boi que não geme não é bom!"
Com suas rodas enormes de madeira raiada de pedaços
de madeira, e com um velho ferro chato, uma espécie de chapa grossa metálica
circulando sobre a roda, para ela acabar não se desmanchando aos trancos e
barrancos por onde a gente ia devagarzinho passeando. Realmente era isso que
nós tínhamos na época. E lá íamos cantarolando: "Carro de boi que não
geme não é bom! Carro de boi que não geme não é bom!" E quem canta, seus
males espanta.
Subíamos e descíamos das árvores sem nos
machucarmos, apenas pequenos arranhões. Éramos incansáveis. Somente o
travesseiro realmente nos derrubava. Amava andar a cavalo, havia um cavalo
alazão muito dócil, muito gorducho, o lombo dele era macio. Todos gostavam de
cavalgar com ele, era feito para crianças. Eu era longe de ser um cavaleiro,
mas gostava de montar e não passava vergonha. Mas tinha um outro cavalo magro e
alto, que chamávamos de castainho, ele tinha o hábito de sair trotando
direitinho no trote.
Mas na volta o cavalo tinha o costume de empinar a
estilo do ator Roy Rogers e eu não sabia, e por consequente quando voltava do
meu passeio não deu outra. O animal empinou, não estava preparado, os arreios e
os estribos não estavam alinhados ao meu tamanho. Mesmo assim, pressionei o
cavalo com os pés e voei do cavalo, fui ao chão e desloquei o braço.
Fomos ao hospital e colocaram gesso no braço. E
isso era prova das bravatas que teria realizado nas férias. Imagina retornar ao
colégio com o braço todo engessado. Pedir a todos meus colegas para assinarem
seus nomes. E contar a todos como foi a aventura do cavaleiro que caiu do
cavalo Tornado, que na época era o cavalo mais famoso, claro era o cavalo do
Zorro.
Não existiria prêmio maior para um garoto da minha
idade caminhar com o aquele gesso repleto de assinaturas e vangloriar-me das
minhas bravatas no cavalo Tornado na terra dos marechais Deodoro da Fonseca e
Floriano Peixoto.
E as noites no Engenho eram embaladas com histórias
contadas pelo caseiro "mané bala", apelido dado por ser muito
ligeiro. Ficávamos até as onze horas com a luz de uma lamparina, tipo Aladim de
querosene, que tinha que dar umas bombadas manualmente, que havia uma luz
bonita e maravilhosa.
E ficávamos saboreando enormes pedaços de melancias
bem vermelhas e deliciosas e de cana de caiana, é uma cana muito doce e com
muito caldo. E na manhã seguinte acordávamos com os lençóis molhados e com as
bexigas esvaziadas. Não tinha jeito, eu e meus irmãos Newton e
Roosevelt sempre batizávamos os lençóis.
Sejamos sinceros, o que mais gostoso que amanhecer
completamente molhados e mijados? Ninguém se incomodava com essa situação, até
porque cabia a nós mesmos retirarmos os lençóis "mijados", enrolar
eles, levá-los até o rio carregando-os na cabeça, para servir para outras
crianças. E lá dávamos uma maneira do nosso jeito de fazer a nossa
"mijada" para se misturar às águas cristalinas do rio. Fazendo-se
assim, a limpeza dos lençóis. É mole ou quer mais?
Fui fazer o segundo grau na Escola Técnica Federal
de Alagoas contrariando meu pai que entendia que deveria continuar num colégio
particular, visto que havia realizado o primário e o ginásio no Colégio de
Padres Guido de Fontgalland. Entendia que seria mais bem qualificado para a
vida com o ensino particular. Todavia,
pensava diferente e fui para a escola pública, mesmo sabendo que na
escola técnica ele era diretor. Mas queria ser aluno como todos os demais
alunos. E nada disso me fez mudar de ideia.
Tive a grata felicidade de ter sido convidado a
comandante da banda marcial, o corneteiro mor, em razão de ter a habilidade de
tocar o clarim, que é um instrumento de sopro com tons agudos e fazia umas
repetidas sonoras com e parte de alguns dobrados E em razão disto que fui
convidado para essa função. Para um aluno da nossa escola pública não poderia
existir distinção maior. A nossa banda era tida como a melhor banda de todos os
colégios da nossa época. Tanto é verdade, que nosso colégio só podia sair por último,
atrás de todos os demais colégios.
Visto que o ponto maior do desfile era a nossa
banda marcial, e se desfilássemos antes, mais da metade do público iria embora
e deixaria os restantes dos colégios sem público. Nossa escola era uma das
maiores, tínhamos aproximadamente 850 alunos e para agradar a todos a direção
da escola institui duas bandas, uma marcial e outra de música, tipo fanfara.
Era uma ao lado da outra.
Entrava uma banda, sai a outra. E ficávamos
revezando. Era um espetáculo. Tudo sincronizado. O povo ficava assistindo
delirando. A bateria trabalhava do início até o fim do desfile. Era uma
loucura. Com todos os integrantes marchando sempre no compasso correto corporal
de esticar as pernas muito sincronizado.
Realizámos o ensaio das bandas no turno da tarde,
em alguns intervalos da manhã e principalmente no fim do expediente do curso
letivo. A escola tinha três andares, com espaços vazios no térreo. Era uma
escola muito linda. Os ensaios começavam muito tempo antes do desfile. Já
iniciavam no mês de fevereiro ou março para podermos dar o devido compasso, sem
erros e todos os músicos estarem alinhados um com os outros.
Era apaixonante realizar esse desfile. Na verdade
gratificante, era emocionante ver a população se sentir feliz, alegre e
satisfeita com o nosso trabalho. Nós sabíamos que ali entre eles estavam pais,
mães, avós, irmão de tantos e tantos colegas nossos. E por outro lado, essa
felicidade que encontrávamos nos rostos desconhecidos de cada pessoa na
multidão nos deixava um mar sem fim de realização e de serviço muito bem
realizado. Nossa alegria e realização era imensa nesse dia.
Entre as atividades curriculares da escola todos os
alunos do primeiro ano pela manhã tinham que realizar um rodízio em dezenas de
artes para então decidir por qual delas iria se qualificar nos três próximos
anos. Havia cursos de pintura, mecânica, máquinas operatrizes, fundição e
metalurgia, marcenaria, alfaiataria, carpintaria industrial, modelação e tantos
outros cursos.
Escolhi metalurgia em razão da magia dos metais,
existem em torno de oitenta tipos diferentes de metais no mundo. Onde os
químicos classificam os metais por suas propriedades como maleabilidade.
Explicando melhor essa propriedade que estuda a redução dos metais a lâminas,
onde o metal que tem a maior maleabilidade é o ouro. Você pode laminar uma
folha áurea de ouro numa espessura tão infinita que ela é incapaz de ficar em
pé.
Este processo de seleção da especialização era
feito dessa forma, porque naquela época não havia testes vocacionais para nos
auxiliarem nas escolhas das nossas profissões, e assim elas ocorriam conforme o
bom desempenho de cada um. A metalurgia compreendia fundição de metais ferrosos
e não ferrosos, tínhamos provas práticas e teóricas. Aprendemos o ponto de
fusão de cada metal como a prata, cobre, alumínio, chumbo, antimônio, ferro,
estanho e tantos outros.
E foi também na Escola Técnica que aprendi a
trabalhar com ferramentas que a maioria dos jovens dos dias atuais jamais
pegaram em suas mãos.
Tais como serrote, formão, a goiva, a lima, o
graminho, o compasso, o transferidor, os dois tipos de esquadros. Como também
mal conhecem outras ferramentas como a pá, enxada, o ciscador ou ancinho,
estrovenga, a foice, a picareta, o machado e os facões.
Tem dezenas ou centenas, ou quem sabe milhares de
ferramentas construídas por culturas diferentes de nosso vasto mundo. Agora,
todas elas se originaram da mãe de todas as ferramentas, que foi a
"pedra", da era paleolítica.
Na minha época para construir um simples objeto
como uma cadeira tudo era manualmente e porque não dizer com base no esforço.
Com o lápis e os esquadros eram realizados os riscos na madeira. Que após vinha
o serrote para realizar os cortes. Então, usava-se o formão para fazer detalhes
ou desenhos na madeira. Com um "arco de pua" manual era feitos
os furos. E vinha-se encaixando e colando as peças da cadeira, para depois
lixar e pintar tudo manualmente. Esse trabalho manual é raro hoje.
É mais fácil comprar uma cadeira. Ou para os
apaixonados existem as ferramentas que nem são mais elétricas. Hoje já são com
baterias e sem fios esticados a uma tomada.
Existem tudo que é tipo de ferramenta, como
furadeira, lixadeira, esmerilhadeira e que facilitam a vida de quem quer ter
uma pequena oficina até mesmo dentro de pequeno quarto de um apartamento para
construir seus artesanatos para gerar um ganho extra. Existem até lojas que
vendem tudo já pré-montado de forma ao consumidor chegar em casa, apenas
montar.
No curso de máquinas e motores havia todo um
material moderníssimo que havia sido adquirido dos Estados Unidos pelo
Governo Federal. Eram máquinas potentes e famosas como perfuratrizes, primes,
tornos mecânicos, semiautomático e automático, fresadores.
Neste curso havia a disciplina a iniciação a
manutenção de veículos automotores e para isso havia um Jeep que existia
exclusivamente para os alunos montarem e desmontarem inteirinho durante o curso
com a orientação e acompanhamento do professor. Os alunos viravam o veículo de
cabeça para baixo, suas porcas e parafusos não eram duros e nem enferrujados,
no máximo bem apertados. Mas de fácil manuseio para serem desapertados, em
razão de tanto apertar e desapertar.
No final do curso na matéria de desenho industrial
básico tive que prestar a prova final, que foi a construção de um barramento
que é a peça principal de um torno e marceneiro. Consistia numa peça de metal
fundido de dois metros e meio de comprimento, por uns 50cm de largura e de
altura uns 35cm. Era uma bela peça. E se aprovadas, eram utilizadas
internamente pelo próprio colégio.
Felizmente passei na prova e minha fabricação
passou a integrar o elenco do inventário. Nem todas as peças podiam ser
fabricadas por nós alunos, pois dependiam de máquinas industriais que não tínhamos
a disposição, como as correias, motor elétrico, coisas desse tipo que eram
fabricadas pela indústria metal mecânica especializada.
Entrávamos em dois horários, dependendo do dia da
semana. Ou as 06:00 ou às 07:00 da manhã. Entrávamos mais cedo quando tínhamos
educação física, ministrada pelo professor Derval. Após a aula, fazíamos um
racha, ou como diria uma pelada no futebol. Todos nós tomávamos banho após os
esportes, onde haviam em torno de dez chuveiros apenas com divisórias laterais
e sem portas. Todos os meninos tomavam os banhos de forma tranquila e natural.
Havia também os inspetores de alunos ou fazendo uma averiguação para evitar
qualquer brincadeira errada ou mesmo também tomando banho.
Todos tínhamos um respeito mútuo, até pela rigidez
das normas da Escola Técnica, porque se alguém fizesse alguma coisa bagunça de
ordem emocional ou bullying era repreendido imediatamente sem o menor
constrangimento. Nos vestiários cada aluno também tinha um armário feito em
granito, com uma portinha metálica e um cadeado, que chamávamos de escaninho,
onde guardávamos nossos pertences como livros, toalha, caderno. A noite os
alunos podiam tomar outro banho, este normalmente eu não tomava. Porque morava
a uns quatro quilômetros e voltava caminhando, assim tomava banho quando
chegasse.
Na escola éramos recebidos por um bom café muito
farto com enormes bules de café com leite, com pão francês de verdade, que não
é esse pão de hoje em miniatura que tem nas padarias. E olhe lá, era crocante e
com manteiga e uma fatia de queijo e as vezes vinha também uma fatia de
mortadela. O pão era uma das poucas coisas que não era feito na própria escola.
Era encomendado numa padaria.
Tinha o velho chá de burro, que era o
"mugunzá", aquele milho fervido descido no leite do coco
saborosíssimo. Nunca reclamei do alimento. Entendo que o alimento é sagrado e
sempre foi. Inclusive não tenho problema de comer pão dormido do dia anterior.
O pão é o alimento de Deus. Trigo é trigo.
Não podia faltar a macaxeira, rodelas de uma
espessura razoável de inhame ou batata doce, os ovos estrelados. E tudo servido
nas enormes bandejões de aço inox. Havia também uma proteína, uma carne, que
podia ser um jabá, que consiste na carne seca tradicional bovina, e aqui se
chama de charque ou uma carne de sol, uma galinha guisada com molho. Isso era
para todos os alunos, independentemente da quantidade de jovens. Toda a
alimentação era elaborada dentro da própria escola numa enorme cozinha industrial.
Após o café tínhamos aula até as onze horas.
A comida era de primeiro mundo, não tinha quem
reclamasse, até porque ninguém tinha aquela variedade nas suas casas, essa que
era a grande verdade. Muitos alunos talvez não tivessem jantado, em virtude de
suas necessidades financeiras. Desta forma a escola naquela época já era também
fonte nutricional dos estudantes. E
topava tudo que vinha pela frente. Sempre fui bom de garfo, com a maior
naturalidade.
Quando íamos para o desejado almoço pela gurizada,
que na sua maioria era formada por pessoas carentes. Eu fazia questão de ser
amigo de todos eles, por conta do ensinamento que era espetacular. O almoço era
também de bom tamanho, de ótima qualidade e feito com muito amor. Toda
alimentação era supervisionada por profissionais altamente competentes que
zelavam pela nossa alimentação saudável, apesar de naquela época ainda não ser
muito difundido a profissão de nutricionista.
As cozinheiras que serviam o refeitório eram as
mesmas que preparavam os alimentos. As refeições ficavam após de prontas em
enormes balcões de inox com água em banho maria, em enormes recipientes,
semelhantes aos atuais restaurantes self-service.
O almoço normalmente o básico era feijão, arroz,
macarrão e farinha e cada dia da semana havia uma proteína elaborada de forma
diferente, mas basicamente a base carne bovina. Nunca suína e jamais caprina.
Era sempre bovina. Ficávamos brincando com o macarrão, era aquele grosso com
furo no meio e ficávamos colocando-o na boca e inspirando com ele na boca.
Havia também salada de alface, cebola, tomate, rodelas de pepino temperadas com
vinagre de maçã, azeite e sal. E para completar o almoço havia bananas pratas
compridas e grossas, bem graúdas.
O refeitório era enorme, muito cumprido, ventilado
e iluminado. A iluminação elétrica era utilizada somente após as 17 horas,
porque durante o dia a luz era natural através de enormes janelas de correr e
outras na forma de guilhotinas e tinha mesas compridas e com bancos fixos, de
cada lado da mesa sentavam três alunos. Estavam todas com a mesma distância
umas das outras e com um bom espaço para caminharmos entre elas e para o
pessoal realizar a limpeza após as refeições.
Os prédios das oficinas eram de iluminação zenital superior, onde o telhado era inclinado como se fosse uma série de triângulos, a coberta inclinada para a calha, dando destino para a água da chuva. Dessa forma, era a melhor método de eliminar a temperatura da área interna e por outro lado era a melhor forma para a realização da iluminação ocorrer dentro das oficinas. Aonde vem de cima para baixo, semelhante a uma claraboia, só que a ela tem a forma de uma concha acústica.
O comportamento dos alunos na escola técnica sempre
foi muito rígido, mas sem constrangimentos, sem bullying. E como filho de
diretor da escola me achava na obrigação de andar sempre super sobre a linha. Tinha
que ser exemplo para toda a escola. E eu tinha esse perfil, até em razão de ter
tido uma educação muito rígida por parte de meu pai. Na verdade, não apenas eu,
mas todos os meus cinco irmãos a Ivete, o Mario, a Marlene, o Roosevelt e o
Newton todos fomos educados numa educação muito ortodoxa dentro de casa.
O nosso fardamento era de cor caqui, com uma lista
azul larga na perna e com camisa manga comprida. Todos bem alinhados e a roupa
passada a ferro. A maior diferença com o meu colégio anterior particular é que
antes eu tinha que usar também uma gravata. Tive uma represália aos onze anos
de idade com um professor e ex-seminarista por causa que ele havia encrencado
que o nó da minha gravata não estava bem-feito e então disse que daria dois
zeros para fazer com eles uma bicicleta.
Foi então que aprendi a fazer nós de gravata
perfeitos. E vejamos, os tempos mudaram, hoje já são vendidas com os “nós fixos”. Foram extintas nos colégios e até mesmo no
mundo profissional inúmeras profissões passaram a aposentá-la. Imagina até
motoristas de ônibus e táxis em muitas cidades eram obrigados a usá-las.
E foi na escola técnica que aprendi a dirigir um
automóvel, num Jeep, ainda menor de
idade. Para salientar que naqueles tempos não existiam autoescolas. Então, cada
um tinha que dar seus pulos. O cabra ou aprendia com um amigo ou aprendia
sozinho na marra, e cuidado de quem estava na estrada, porque lá vinham os
barbeiros aprendizes.
As crianças sempre foram muito astutas. Sempre
ficava observando os motoristas, então aprendi de olho como mudar as marchas e
para que servia cada uma delas, que tinha primeiro que colocar o pé na
embreagem e aliviar gradativamente para não dar aquela alavancada grande
Meu pai tinha um carro Kaiser, um rabo de peixe na
época. Era muito bonito. Naquela época só existia carro importado. A nossa
indústria nacional lançou o primeiro automóvel em 1956 com o Romi-Isetta, que era na verdade um microcarro
para duas pessoas, até então os carros eram fabricados no exterior e apenas
montados no Brasil.
Meu pai era muito habilidoso para inúmeras
atividades, mas dirigir um automóvel não era de sua natureza. Então, coube essa
tarefa para eu realizar. Assim, virei motorista profissional da vez, mesmo
sendo menor de idade. Era pequeno e ele nem percebia o perigo que poderíamos
causar comigo e com outras pessoas.
Aprendi a dirigir um automóvel sozinho e claro
mais uma vez aprontando uma "arte". Imagina se meu pai soubesse.
Lembram do Jeep da Escola Técnica que era utilizada nas aulas de máquinas e
motores. Então, certa noite estava na escola estudando para uma prova pratica
difícil de metalurgia referente a ferro fundido. Ao ir embora, passei ao lado
do Jeep me deu uma vontade de olhar melhor o automóvel. Abri a porta e me
sentei no banco do motorista e percebi que estava com a chave na ignição.
Meu pai também era funcionário público, sendo
responsável pelo posto do DASP - Departamento Administrativo do Serviço Público
e quando ocorriam os concursos públicos as provas chegavam no Aeroporto de
Palmares, lá no tabuleiro dos Martins, no município de Rio Largo, com quatro
horas antes do concurso e nessas ocasiões ele sempre estava presente comigo
para buscar os testes no automóvel da família.
Naquela época não existia policiamento nenhum
nas estradas, nem municipal, estadual ou federal. Dirigia o carro sempre
tranquilo e despreocupado nesse sentido. Na verdade, somente havia intervenção
da polícia quando vinha a ocorrer um sinistro, caso contrário a vida continuava
normalmente. Jamais fui abordado por nenhum policial e nem mesmo questionado
por outros motoristas ou pedestres, mesmo que minha aparência me denunciasse
ser realmente menor de idade.
Curiosamente coloquei em ponto morto. Coloquei
o pé na embreagem, sutilmente coloquei a primeira marcha. Nisso o veículo já
fez um rangido estranho de ranhura das marchas. Fiquei nervoso, mas fiquei
feliz da vida. Imagina estava com doze anos de idade e dirigindo sozinho um
automóvel, sem um professor ou um orientador de direção. Claro ninguém estava
ali me vendo. E dirigi, fui para a frente
e para trás, imagina até ré eu dei!!!! O Jeep estava sem capota, o facilitou
tudo. Não dava para fazer manobras. E depois disso voei mesmo foi na cama, nos
meus sonhos, voei tão alto. Feliz da vida e realizado pela minha bravata.
A primeira vez que sentei a frente do volante
da família, girei a chave, pisei no acelerador e conduzi com a maior proeza o
carro por cem metros foi uma alegria inesquecível. Era uma realização. A emoção
e a tremedeira começaram a atuar, meu amigo. Foi tremedeira que nunca mais se
acabou. Fiquei muito feliz, porém tremendo. É uma emoção indescritível,
principalmente para uma criança de 13 anos. Eram as coisas da vida.
Todos os serviços da casa que envolviam o
automóvel era eu que fazia sempre com o acompanhamento do meu pai. Com o tempo,
passei a dirigir sem a sua presença, e felizmente nunca houve nenhum incidente.
Nunca bati em nada, nada mesmo, nem em árvore, poste, muro, nada!
Não obstante de ter realizado o curso técnico de
metalurgia, complementei com o curso técnico de edificações durante o turno da
noite na mesma escola. E surgiu a oportunidade de durante o dia de realizar
manutenção das carteiras escolares do mobiliário do Colégio São José. Cheguei a
ter uma equipe de quatro ajudantes com idade mais avançada que a minha. Todo o
dinheiro que ganhava depositava na
caderneta de poupança da Caixa Econômica Federal, ficava apenas com alguns
trocados. Era uma época que vivia com meus pequenos biscates e bicos que realizava.
Na minha época o colégio não era moleza como nos
dias de hoje. Os professores faziam sabatina oral e se o aluno erasse levava
uma reguada. Tive que repetir a quinta série simplesmente por não ter idade
para seguir para a sexta série. E ainda me deram nota zero na prova de latim
porque o nó da minha gravata não estava perfeito. Era uma realidade repleta de
exageros. Tais situações nos dias de hoje acabariam no fechamento da escola e na
prisão dos professores. Mas por outro lado a nossa realidade de hoje, também
com a total liberalidade não é a das melhores. Em seguida prestei um miniconcurso
para a Escola Técnica Marechal Deodoro Fonseca.
No segundo grau por uma razão desconhecida uma
professora deu nota seis apesar de ter respondido todas as perguntas
corretamente. Já tinha média para passar de ano, conversei com a professora e
pedi a nota dez e o assunto foi encaminhado para o inspetor da escola que
encaminhou até a sala do diretor, que casualmente era meu pai! Assunto
esclarecido, a professora brava e o aluno feliz! Gostava das aulas de canto
orfeônico e era o monitor da turma. No dia da Emancipação de Alagoas eu ia na
frente da banda como corneteiro mór.
A rua do Comércio era a principal Avenida de
Maceió, havia as farmácias, bancos, loja de tecido, sorveteria, casa de
ferragem, o cinema. Aliás uma curiosidade era o cinema São Luís que não era
permitido entrar de bermuda, camiseta. Era necessário estar muito bem trajado.
Com detalhe de estar de calça, camisa e paletó. E olha o detalhe, se fosse
"café com leite", digo, calça de uma cor e paletó de outra cor também
não entrava. A maioria dos cinemas tinham poltronas acolchoadas. Alguns de
segunda classe como o cinema Poeirinha que era de filme sacanagem e mulheres
nuas que as poltronas eram só de madeira e só passavam filmes as 23 horas.
Quem cortava meu cabelo era meu padrinho Quincas,
era um senhor esposo de minha avó, não era meu avô. Era segunda avó drasta Dona
Sinóca. Era ela que fazia as cocadas, que vez e sempre quando ia tocar o sino
na escola filava uma ou duas. Então, o padrinho Quincas cortava o meu cabelo e
de meus irmãos.
A setenta anos atrás não havia lojas de
departamentos e muito menos nem sonhávamos em shopping center ou comprar alguma
coisa pela internet. Até porque nem existia internet e muito menos computador
ou celular. Desta forma, a minha roupa e de todos os demais formandos da Escola
Técnica Federal foram feitos pela própria escola. Através do mestre Manuel e
seus alunos. O mestre era alfaiate e professor. E assim foi feito o meu terno
cinza.
A gravata já era mais fácil de comprar. Mas o terno
ele media, alinhavava, lembro que tinha todo um ritual para confeccionar.
Depois de dez dias, voltava para fazer a
prova final, e então fazer a costura definitiva. Totalmente diferente dos dias
atuais. E assim brilhantemente eram confeccionados todos os ternos de todas as
formaturas. E por outro lado, os alunos aprendiam essa brilhante arte da alta
costura.
Apesar que ainda hoje, ainda persistem algumas
alfaiatarias em tentar sobreviver. No aniversário de quinze anos minha filha
mandei fazer meu blazer summer no Humberto Alta Costura em São Paulo,
solicitaram pagamento antecipado e me disseram que em 60 minutos estaria
alinhavado a roupa. Fui até uma padaria e tomei um café alongado e voltei nesse
intervalo de tempo. Fiquei admirado quando vi o terno. Calça e paletó estavam
alinhavados. E ele me disse, nem uma metralhadora trabalham tão rápido quanto
nós. E não deu outra. Experimentei e não houve necessidade de nenhum ajuste,
tudo ficou perfeito.
Claro que para comprar roupas comuns como calças,
bermudas, camisas, chinelos, sapatos, meias, camisetas, camisolas, naqueles
tempos era muito comum as mulheres usarem camisolas para dormir e os homens
pijamas. O comércio existia normal. Claro que não da forma que existe hoje. A
concorrência era muito pequena, até porque era uma loja aqui e outra
acola.
Certa vez meu pai havia pedido para ir à loja
comprar um chinelo avistei um senhor em cima do telhado, deveria estar
consertando alguma telha quebrada ou algo assim. Nisso passou seu João e
perguntou: "Seu Bandorim, o Sr. está no telhado é? Ele com a maior cara de
indignado respondeu "Não filho de égua, filho de rapariga, estou em cima
de uma pedra de gelo, estou aí em baixo, não está vendo? Está cego?" E
começou a sapatear em cima do telhado. Pulou tanto que quebrou o telhado
todinho só para discordar do cidadão e ainda caiu lá de cima! Como diz o ditado
"papel de ulhar a prego!" São as coisas do Brasil, fazer o que?
Lembro que todos os domingos pela manhã ia assistir
a matinal no Cinema Plaza que pertencia a um alemão e funcionou até 1992.
Existia um seriado que não perdia uma sessão sequer. Todo domingo estava lá.
Meu pai dava aquela mesadinha que era para pagar o ingresso do cinema e chupar
um picolé. E assim passei a gostar desde criança a uma boa sala de cinema. Mas
naquela época os cinemas nem se comparam com o que são hoje as atuais salas.
Um fato inesquecível ocorreu no cine São Luís. Eu
deveria ter uns quatorze anos e fui assistir um filme de Gina Lollobrigida, ela
era o ícone do cinema italiano e símbolo sexual, contracenou com Frank Sinatra
e teve seu auge nas décadas de 50 e 60. Eu atento ao filme, ela é corista de um
teatro. E ela vem caminhando numa rua bem escura. E percebo que ela irá olhar
para trás. E antes mesmo dela olhar para trás eu dei um grito bem alto dentro
do cinema "Ginnnaaaaa" Nessa hora todos os presentes aplaudiram. Bateram
palmas e deram boas gargalhadas. Porque foi algo espontâneo e inesperado.
Acredito que todos os homens presentes gostariam de
ter feito a mesma coisa. Menos um senhor que estava presente e já estava
imaginando para pegar a cinta a hora que eu passasse pela porta da nossa casa. Havia
esquecido que meu pai também estava presente no cinema, e ele não perdoaria
aquela situação. Iria vir uma surra provavelmente de cinta.
Mas naquele momento me senti orgulhoso, foi de
supetão, nada programado. Meu pai voltou de carro e eu de ônibus. A nossa porta
tinha um vidro transparente, e com a luz interna, ao abrir a porta, vi que ele
estava atrás e com o braço erguido e com a cinta balançando na mão, entrei
correndo e abaixado, e escapei da cintada e voei para o meu quarto.
Digo que tenho saudade do tempo de infância. Era um
outro mundo. Tudo diferente dos tempos atuais, sem tecnologia. Tudo acontecia
devagar. Até o relógio andava devagar. Acho que agora o relógio tem muita
pressa. Não sei se são nossos compromissos, ou se é muita tecnologia. Nasci com
o rádio, chegou à televisão preto e branco, muito tempo depois inventaram a
colorida e muito depois chegou o controle remoto. Era possível acompanhar todas
as mudanças e invenções.
Hoje cada hora tem uma dúzia de coisas novas. Não é
mais possível acompanhar ninguém. Entro num restaurante num domingo, fico
observando as outras mesas e vejo famílias cada uma com um celular teclando ou
fazendo alguma coisa. Será que estão conversando entre elas mesmas? É como se
no nascimento já fosse entregue um tablete.
O modelo mais comum e mais vendido eram os
televisores de 14 polegadas. Para se ter uma ideia, seria algo em torno de 35
centímetros. As primeiras inventadas eram de três ou cinco polegadas. O único
televisor ficava na sala e todos ficavam sentados a sua frente, em sofás, em
bancos, e até no chão.
Assistindo seu monitor pequeno, preto e branco. Aí
algum malandro inventou uma folha de plástico colorida nas cores amarela, azul
e verde na horizontal que era disposta em frente da tela do televisor, com a
finalidade de transformar uma imagem colorida.
A qualidade da transmissão era através de antenas
do próprio aparelho. Muitas vezes colocávamos buchas de bombril na ponta da
própria antena e volte e meia tínhamos que posicionar a duas anteninhas para
melhorar a sua imagem, que ficava cheia "chuviscos". Outras pessoas
usavam antenas externas de alumínio que melhoravam as imagens. Dias de chuva, a
imagem ficava péssima. E dias de jogos importantes, parece que era tudo
combinado. A imagem ficava de tal forma, toda retorcida. Os televisores eram
com válvulas, com botões para trocar de canal, acertar o volume e melhorar um
pouco a cor. Com poucos canais, meia dúzia na verdade. Nada disso de canal por
assinatura. Tudo isso chegou depois.
Claro que ainda bem que hoje em dia que existe a
luz elétrica em qualquer horário do dia e da noite. Bem diferente dos meus
tempos de criança que a luz elétrica era desligada em toda Maceió as dez da
noite. Temos o chuveiro elétrico e o ar-condicionado. As novas gerações nem
usaram um "leque para se abanar". As janelas e portas podem ser
teladas ou se usar protetor elétricos contra os pernilongos.
Antes nós
usávamos uma espiral verde chumbo que acendíamos e passava a noite inteira
queimando devagarzinho. Ficava saindo uma fumaça tão catinguenta que afastava
todos os mosquitos. Hoje existe repelentes químicos que expulsa a maioria dos
insetos. Naqueles tempos os mosquitos realmente ganhavam a batalha.
Fico até assustado com o que virá nos próximos
anos. Tenho saudade até do aroma daquele tempo. Dá dó de ter ficado tudo no
passado. Ficaram só as memoráveis lembranças das quais estou hoje registrando
para quem sabe algum dia numa noite de chuva alguém encontrar esses rabiscos e
resolver ler e ficar até assustado com o que está escrito e se perguntar como
eu e tantas outras pessoas podiam viver e sermos felizes na minha época.
Como podíamos viver sem o micro-ondas, isso se ainda quando você estiver lendo existir alguma coisa com esse nome, se não existir pesquise na internet ou em algum outro lugar, porque talvez nem exista mais essa tal de internet. Mas éramos felizes, porque precisávamos de tão pouco para sermos felizes.
Alguns falavam que era loucura construir casa
em Jaboatão e hoje é supervalorizado. É uma casa enorme, com dependências de
serviço, com espaço para várias redes e vasos de flores. Com uma
churrasqueira enorme, onde costumo reunir os filhos e netos nos aniversários,
Dia das Mães, Dia dos Pais.
O filho Sergio é o churrasqueiro oficial. No
escritório tem prateleiras com os projetos mais significativos que elaborei. Na
parte de trás da casa há muitos passarinhos onde cantam e eu assovio. Eles me
lembram os pombinhos que filmei certa vez no jardim do coffee do Lyons.
TEMPOS DIFÍCEIS
Meu pai um ano depois que minha mãe faleceu,
casou-se novamente com uma moça muito mais nova, que tinha a idade de
minha irmã mais velha, a Ivete. Não demorou muito para no nosso ambiente
familiar surgirem os primeiros problemas. Um dos meus irmãos não aguentando
aquela situação em alguns anos saiu de casa. Fui crescendo naquele ambiente que
já não mais podia chamar de lar e muito menos de minha casa. A relação
sempre foi muito conturbada.
O comum era a educação de simplesmente bater nos
filhos, com a palma das mãos, com o chinelo, com uma régua. Ou então, a
madastra dizia "deixa teu pai chegar que vou contar tudo". E então os
filhos do primeiro casamento não escapavam de apanhar, mesmo com um bom
comportamento. A reguada, o cascudo, a surra eram naturais dentro de nossa casa
por nosso pai. Então, era um relacionamento complicado e difícil. Era o que
todos nós tínhamos para enfrentar. Esse era o nosso dia a dia.
Meus irmãos um a um foram embora de casa. E quando
me vi fiquei sozinho com meu pai, minha madrasta e com os meus novos meios
irmãos. Assim, em pouco tempo, a casa e a família passaram a ser da minha
madrasta e de seus filhos, e eu nem havia constatado as mudanças. Isso não
aconteceu de um dia para o outro. Levaram-se alguns anos. Como criança nem vi a
transformação. Só percebi mesmo quando já adulto, quando havia amadureci para a
vida, depois de ter ido embora.
Vivia sempre alerta e precavido para não sair da
linha. Porque sabia que se meu pai soubesse de qualquer coisa, por menor que
fosse, iria sofrer as consequências mais severas possíveis e com certeza a coça
viria a ser fatalmente cruel. Quando fiquei sem meus irmãos na casa, sobrava
para o Paulo tudo de ruim que poderia vir a acontecer. Meu pai veio a ter
outros seis filhos com ela, que logicamente não tinham o mesmo tratamento por
ele. E assim íamos levando a vida aos trancos e barrancos. O dia amanhecia
e sabe-se lá como iria anoitecer.
Não soube o que era ter uma mãe. Minha primeira
meia irmã nasceu em torno de um ano depois do casamento, quando tinha seis ou
sete anos. Assim, aos poucos descobri a diferença que era tratado. Mas era uma
criança naquela época. E como compreender as coisas? Sabia que ela não era
minha mãe. Não havia amor e afeto. Ela era a mulher de meu pai, simplesmente
assim. E meu pai, também distante, frio e com a mão pesada comigo e com os
filhos do primeiro casamento. Na verdade, só quando adulto é que fui
compreender algumas coisas. Cheguei a fazer algumas poucas sessões de terapia
muitas décadas depois para entender melhor tudo isso.
Minha madrasta desempenhou com sucesso e com
louvores sua função de "MÁ" "DRASTA". Acredito que nunca
foi e nunca quis ser minha mãe. Nunca me amou ou despertou nenhum sentimento de
amor por mim ou por qualquer dos outros meus irmãos. Nunca se preocupou com
meus problemas ou dificuldades da escola ou do dia a dia. Para ela acho que fui
um estorvo. Algo indesejável dentro da casa de meu pai, não só eu, como cada um
de meus irmãos. Ela nunca me bateu, somente meu pai me batia. Também nunca
passei fome e sempre comi a mesma comida.
Já com meus novos irmãos nunca tive nenhum
problema, pelo contrário éramos todos irmãos de verdade. A primeira do novo
casamento foi a Lúcia de Fátima, depois vieram a Maria Verônica, a Maria
Bethânia, Maria Rejane, Ana Paula e por fim o por último a Amaro Carlos. Era o
caçula e filho querido por eles, tinha toda a mordomia, podia andar de
bicicleta dentro de casa, surfava durante a semana, era tido como filho do
papai, e tinha uma preguiça enorme.
Nunca tive problema com nenhum deles.
Inacreditavelmente nunca tive ciúmes de nenhum dos meus meios irmãos. Vi cada
um deles nascer e crescer, brincava com eles. Hoje penso, que se fosse uma
pessoa revoltada e psicopata o que poderia ter feito de maldade com qualquer um
deles, mas sempre fui uma pessoa muito serena e tranquila, e abençoado por
Deus.
Por outro lado, a madrasta já com seus filhos era
uma mãe maravilhosa. A relação era a melhor possível, mesmo quando eles faziam
muito arte, ela colocava panos quentes. Era muito amor dela. Na verdade, ela
tinha o comportamento normal esperado de uma mãe. Com seus filhos foi uma mãe
verdadeira.
Hoje já vejo as coisas de uma forma diferente, já
compreendo algumas coisas, nós não éramos seus filhos. Ela amava nosso pai. Era
uma pessoa nova, e como poderia amar seis filhos que meu pai tinha? Como ser
mãe de crianças, jovens e adultos que não eram seus? E eram outras épocas, com
outros costumes. A realidade é que nunca tive amor de pai e de mãe. Era isso
que a partir de um certo momento passou a despertar um rancor interno. Mas só
fui descobrir e entender muitos anos depois. Tinha o amor de meus irmãos. E
passei a conhecer o amor maternal quando fui morar com minha avó. Foi então que
pude viver sem medos de apanhar de meu pai e ter um sono tranquilo. Passei a
ter a conhecer o que era uma vida normal.
Certa vez, depois de já ter ido embora da casa de
meu pai, numa visita que fiz a ele, assisti uma cena inesquecível e impossível
de acontecer nos meus tempos. Era uma coisa surreal. O meu último meio irmão o
Dunga, que era o Amaro Carlos andava de bicicleta dentro de casa e batia em
tudo, na mesa, nas cadeiras e volte e meia derrubava alguma coisa, e eles
achavam graça e não tinha problema.
E não perdi a oportunidade de comentar com a
madrasta: "que coisa graciosa, aqui não tem mais diretoria, olha só você
não está vendo isso não? O jogo aqui agora virou né?" E ela com um sorriso
apenas riu e nada falou. E eu ainda disse: "Aqui tá feito a casa de
Nóca!". Mas não tenho nada a ver com isso. Não tenho a ver com isso, não
sou eu que mantenho a educação de ninguém e nem a parte financeira da
casa!" E sai de fininho a francesa.
A relação de meu pai com os seus filhos do segundo
casamento foi totalmente diferente dos seus filhos do primeiro. Foi uma relação
espetacular e a melhor possível. A Lúcia que foi a primeira minha meia
irmã era tratada por ele como uma rainha. Nenhum deles fazia absolutamente
nada. Nenhuma comprinha sequer eles faziam. Irem na venda, na mercearia, nada!
Tudo era eu que fazia até sair de casa. Absolutamente nada. O trabalho era
somente para o Paulo.
As coisas eram divididas. O labore era do Paulo e
os prazeres dos meios irmãos. Mas não foi demérito eu fazer tudo. A roupa da
Lúcia era lavada numa lavadeira que morava um pouco distante na Rua da
Maravilha e tinha que se levar a roupa para ela lavar. Claro que quem a
madrasta determinava para levar e buscar a roupa era eu. Então, levava a trouxa de roupa na cabeça, que coisa
linda, que gracinha, o Paulinho com a trouxa de roupa suja na cabeça caminhando
nas ruas do bairro do Poço, em Maceió.
Pois é até roupa suja na cabeça tinha que carregar.
Havia virado ajudante da lavadeira, feito o homem do cachorro do miúdo, que
aqui no estado do Pernambuco tinha um homem que vendia miúdo de boi, aquelas
partes como vísceras, bofe, rins e outras. Tinham um preço irrisório para
pessoas pobres. Mas ele não carregava nada, quem carregava era seu ajudante. No
meu caso, era o ajudante da lavadeira. Carregava as trouxas na cabeça, que nem
a música: "Lata d'água na cabeça, lá vai Maria..."
Hoje sou um homem maduro, estudado e principalmente
calejado pela vida. Experiente e muito bem vivido. Pelas minhas experiências
profissionais porque não dizer conhecedor de tantas e tantas coisas a mais que
meu pai e minha madrasta. Caí no mundo, no bom sentido! Viajei por esse mundo a
fora, conheci diferentes culturas dentro e fora do Brasil. Aliás o próprio
Brasil tem vários países com diferentes culturas dentro dele. O que o Nordeste
tem, o Sul não tem, e vice-versa. O Norte, então totalmente diferente de tudo
também.
E se formos para os Estados Unidos ou para a
Europa, nem tem o que ser dito, lá as culturas são totalmente diferentes do
Brasil a começar do primeiro mundo. Então, com base nisso, olhando para trás
hoje, vejo tudo isso, o que eu e meus irmãos passamos realmente como uma coisa
muito triste. Porque ninguém mereceria e entendo que foi uma retaliação que
todos nós tivemos, só não entendo a troco de que? Saber o porquê que o nosso
pai e a madrasta nos trataram daquela forma? Mas hoje, tanto faz, o tempo passou.
Cresci, venci, galguei o meu triunfo maior. Tenho uma linda família. Uma
maravilhosa esposa. Três filhos espetaculares. Seis esplendorosos netos. Amo a
todos e sei que sou amado por todos.
Poderia ter herdado o mesmo princípio de educação
que tive, mas fui abençoado por Deus em trilhar outros caminhos. O caminho do
amor, de olhar meus filhos como um verdadeiro fruto da união minha com a minha
esposa. Jamais trocaria meus filhos, meus amores paternais por qualquer outra
coisa que fosse. No lugar dele, teria feito tudo absolutamente diferente, teria
amado todos os meus filhos e demonstrado esse amor. Talvez nem tivesse casado
novamente. Jamais teria batido em meus filhos. Não teria deixado tudo aquilo
ocorrer como ocorreu.
Porque se as coisas ocorreram como aconteceram
foram com a sua aprovação e sua subserviência. Se me casasse com uma segunda
mulher que não amasse meus filhos teria me separado. Teria preferido meus
filhos. Mas tudo é muito complicado quando se fala em amor. Mas não julgo
meu pai e nem sua esposa. Ele teve seus motivos, nunca me falou, e eu muito
menos quis saber o porquê. Então nunca lhe perguntei, até porque acredito que
se lhe perguntasse, talvez ele não me respondesse. Enfim, tocamos a vida com total
indiferença, como se nada tivesse acontecido naqueles tempos.
Aos dezessete anos de idade me deparei com uma
situação nada agradável. Sempre fui o responsável pelas compras do dia a dia. Comprava
a carne diária, que chamávamos de "carne verde", porque naqueles
tempos não havia congelamento. Onde a madrasta me dava o dinheiro, fazia
as compras e entregava os pacotes e o troco a ela. E durante o jantar ela
afirmou ao meu pai "o Paulo trouxe o troco da carne errado!" Fiquei
olhando-a sem nada dizer, pois sabia que não poderia contrariá-la a menos que
meu pai me desse autorização para falar. Então ela continuou a dizer:
"São dois intrigados! Dois intrigados, são dois inimigos. E dois inimigos
não moram numa mesma casa!" Ela afirmou isso em viva voz, em bom tom e bem
alto.
Meu pai nada fez. Nada falou. Ficou ali na mesa
calado. Ele não disse NADA, absolutamente N A D A!!! Escutou tudo de forma
natural. Não esboçou nenhuma reação. Não me deu o direito de resposta, o
direito de defesa. Isso me doeu. Escutei tudo em silêncio. Fiquei
incrédulo com aquilo tudo. Foi cruel. A minha madrasta falou tudo o que
quis e meu pai nada fez. Levantei-me em silêncio, sem fazer nenhum barulho, nem
mesmo o barulho da cadeira, como nem estivesse ali. E fui para meu quarto, não
havia mais nenhum motivo para estar sentado naquela mesa de jantar e muito
menos comer algo. Fiquei com "aquele velho nó na garganta". Fiquei
como diz o matuto "PUTO DA VIDA!!!"
Falei para mim mesmo: "A partir de agora vai
ser pouco tempo que fico aqui!" Foi nesse momento que percebi que se por
acaso ainda tivesse alguma esperança,
por menor que fosse de achar que ali seria meu lar e minha família, estaria
redondamente errado. Ali não era minha casa e eles não eram minha família. E
tinha que ir embora, procurar meu destino, exatamente como cada um de meus
irmãos já haviam feito. Foi cruel descobrir que estava sozinho naquele momento,
de não ter ninguém para me defender. De não poder contar com ninguém dentro
daquela casa. Era um bichinho feio.
Devo a meu pai muitos ensinamentos, até porque ele
era formado na disciplina de filosofia, era professor e diretor da escola. Mas
sem dúvida alguma, hoje com meus cabelos brancos posso afirmar com a maior
tranquilidade e serenidade que seu maior ensinamento que aprendi com ele, foi
saber amar e educar os meus filhos. Inacreditavelmente rompi as barreiras de
seus ensinamentos e suas técnicas catedráticas.
Nunca precisei surrar e usar de força ou agressão.
Acredito que eu soube educar meus filhos sem a violência da pancada. Soube
amar meus três filhos. Eles foram a minha maior realização como ser humano.
Minha esposa me propiciou o maior patrimônio que tenho na minha vida, que é a
minha família.
E assim, no dia seguinte comecei a providenciar a
minha documentação estudantil de transferência da Escola Técnica Federal de
Maceió para Recife. Fiz tudo no segredo. Não falei para ele e muito menos para
a madrasta. Com dezessete anos já podia providenciar minha transferência, sem
sua autorização. Meu pai era diretor da Escola Técnica, mas acredito que não
ficou sabendo de nada pela escola de minha solicitação até que eu estivesse bem
longe.
Só confidenciei para meu irmão mais velho Newton
que estava indo embora e lhe pedi sigilo. Ele já era casado e não morava mais
com a madrasta. Na verdade, de todos os filhos de mamãe só faltava ir embora da
casa de meu pai. E assim aconteceu, chamamos de "Odisseia no Espaço",
a minha fuga para Recife.
Alguns dias depois, no calar de uma madrugada,
arrumei minha mochila, recolhi meus trocados e fiquei aguardando o amanhecer
sentado na cama. Ali sentado fiquei pensando na vida, em tudo que já havia
passado desde a partida de minha mãe. Em tudo que aconteceu e como teria sido
minha vida se minha mãe não tivesse partido quando eu tinha apenas cinco anos
de idade. Ao amanhecer sai da casa sem avisar ninguém e nem mesmo deixei um
bilhete e rumei para a rodoviária de Maceió.
Achei que não se fazia necessário avisar ninguém,
além das poucas coisas que transportava na minha mochila, levei também o
"nó na garganta" que ficou sobre o meu poder durante tantos anos. E
vez por outra esse nó ainda aparece, mas são apenas lembranças. E foram todas
superadas no seu devido tempo. Coisas da vida. Eu entendia que não podia deixar
um recado explicando a razão pelo qual estava indo embora da casa de meu pai.
Ficou comigo o nó na garganta e com o nosso Pai Celestial aquela dor e angústia
que senti naqueles dias de tormentos.
E tenho certeza de que agi da melhor forma
possível, porque digamos que meu pai tivesse sido informado no colégio de minha
transferência antes de minha partida, ele nada o fez e nem mesmo foi conversar
comigo. E depois de minha partida, jamais esteve na casa de minha avó a minha
procura. Certamente após meu desaparecimento, alguém esteve no meu quarto e
percebeu a ausência de minhas coisas e claro quando constatou que havia
abandonado os estudos deve ter se informado de minha transferência.
E se tivesse alguma preocupação comigo teria me
interceptado em Recife, principalmente por ser de menor. Ou ao menos teria ido
conversar comigo, abrandar a confusão, explicar seus motivos de ter ficado
calado, dar alguns conselhos, ter apaziguado a relação nossa. Mas foi
totalmente omisso.
Acho que meu pai deixou tudo por conta do destino!
Talvez fosse a melhor forma de conduzir aquela situação ou também fosse a
melhor solução para o seu casamento, realmente ter saído de casa. Nem sei
realmente se soubesse que estava na casa de sua mãe, são apenas especulações. E
nunca me preocupei em lhe dizer e tão pouco lhe escrevi uma carta. E por quê?
"palavras loucas e ouvidos bobos!" E por outro lado também não estava
preocupado e nem esperava que ninguém fosse a minha procura. Foi melhor assim
para todos. Procurei seguir meu caminho, orientado por Deus, que nunca me
desamparou e sempre senti a presença de minha mãe por perto para me
orientar.
Estava indo para a casa de minha avó Filó na cara e
na coragem. Não avisei a ela. Nem mesmo tive naquela época essa ideia. Meu
desespero era tamanho, que precisava sair daquela casa. Qualquer lugar seria
melhor que viver com a minha madrasta. O relacionamento havia chegado ao limite
suportável de ser vivido. Sempre foi muito tóxico e depois daquele jantar
deixou de ser nada saudável. Então, não me preocupei em avisar minha avó. Achava
que precisava simplesmente ir. E ir urgentemente. E fui, pior de onde estava,
com certeza não seria. E mesmo que se eu quisesse avisar, teria que ser por
carta, não existia telefone. E por carta levaria muito tempo. E tempo era o que
menos tinha a disposição.
Eu era um passarinho preso na gaiola, e da noite
para o dia, a portinha estava aberta. Estava pronto para voar e ir embora, seja
para onde fosse. Se minha avó não fosse me receber, iria para outro lugar
qualquer, mas para a casa de meu pai não voltaria. Mas meu coração dizia que
minha avó me receberia de braços abertos. Talvez, fosse a presença de minha mãe
me fortalecendo naquele momento.
Passei antes na casa de minha namorada, que ainda
estava dormindo. Bati em sua janela, que abriu assustada, expliquei o que havia
a acontecido e lhe disse que iria embora para a casa de minha avó
Filomena em Recife. A Silvia chorou muito, mas achei melhor não dar
nenhuma esperança de continuarmos o nosso namoro e parti para a
rodoviária.
E assim o dia primeiro de maio de 1964, casualmente
no dia da inauguração da rodoviária do bairro do Poço e lembro como se fosse
hoje no auto falante da rodoviária estava cantando o cantor João Dias
"Adeus amor, eu vou partir, ... " E assim, embarquei no ônibus, um
pouco ansioso e um pouco preocupado. Imaginando que meu pai aparecesse do nada
pela porta da frente com uma régua ou uma cinta na mão mandando descer do
ônibus e voltar para casa. "Mas eu não voltaria não!" Seria uma
enorme confusão. Eu menor de idade. Teria que descer. E quando chegasse em
casa, levaria a maior surra de toda a minha vida por ter fugido de casa na
calada da noite.
E com os pensamentos distantes e com a música de
João Dias, sinto uma sacudida no corpo inteiro. Era o ônibus que dava a
arrancada rumo ao nosso destino. Acredito que ninguém deve ter percebido minha
ausência. Talvez tenham sentido minha falta no momento de pedirem para ir
comprar alguma coisa em algum lugar. Acredito que eu era apenas para todos da
casa apenas uma peça de decoração ou um rapazinho que servia para atender a
serviços cotidianos do dia a dia.
A distância entre Maceió e Recife são de apenas 270
quilômetros, quase quatro horas de ônibus. Provavelmente tenha sido uma das
minhas mais longas viagens. Como a mais longa? Se já viajei por exemplo aos
Estados Unidos e ao Canadá? Como podemos medir a distância? Estamos falando de
espaço físico ou no tempo? Como seria o meu futuro que estava sendo selado nas
próximas horas? Pois nessa viagem estava rompendo toda minha história vivida
até aquele momento, todas minhas relações com meu pai estavam sendo mudadas
depois daquele jantar, isso não teria como negar.
Foram nessas quatro horas dentro do ônibus que
continuei minhas reflexões da madrugada. Toda minha história de vida, todas
minhas certezas estavam na minha frente e prontas para mudar num estalo de
dedos. E eu ali ao olhar a janela não observando as paisagens, mas sim o vídeo
da minha vida. Vinha na minha na minha mente todas as minhas lembranças desde a
infância, todas as dificuldades que passei dentro de casa até a noite
anterior.
Depois de certo tempo dentro do ônibus, pude
refletir qual seria a finalidade da viagem de cada passageiro? Talvez uns iriam
em busca de um novo trabalho ou simplesmente para suas férias, ou encontrar
suas famílias. Ou a busca de um tratamento médico ou realizar alguma
especialização ou formação. Na verdade, estava isolado naquela viagem, mais do
que nunca. Mais isolado que nos anos que passei com meu pai e minha madrasta.
E ali junto com outros passageiros naquela angústia
sem fim. Sem saber na verdade qual seria a reação de minha avó Filomena ao
chegar de surpresa na sua casa. Como seria recebido por ela, se seria acolhido
com braços abertos ou enxotado de volta para a sarjeta da vida. Meu coração
batia forte. O que falaria para minha avó. Como diria a ela tudo o que
aconteceu na naquela noite. Porque na verdade a minha avó era mãe de meu pai.
Será que ela tomaria partido do lado de meu pai e de minha madrasta?
Certa vez recebo uma visita na minha casa. Era
Gilvan, irmão da minha namorada de Maceió, que trouxe uma carta. Mal me
entregou e disse que estava atrasado e já se despediu e se foi embora pela
mesma poeira que havia o trazido. Achei muito estranho, mas abri a carta que
estava escrito em poucas palavras " A finalidade desta é para dizer que
não quero mais nada e acabou-se." E junto no envelope estava embrulhado
num tecido fininho o anel de compromisso que havia comprado e dado a ela. E fiz
questão de sacudir de imediato dentro do Rio Capibaribe. Quando
voltei a Maceió fui até a casa dela, mas a vi de longe conversando com um rapaz
que não gostava, assim nem conversei com ela. Anos depois na missa do galo em
Maceió a vi com esposo de longe.
Meu pai por ser um homem adulto, ser um homem
estudado, graduado poderia ter interferido, me perguntado. Poderia ter feito
algo. Mas não. Preferiu se calar, preferiu se omitir. Preferiu o silêncio. Hoje
penso que talvez ele tivesse tantos e tantos problemas que talvez nem tivesse
dado importância para o que a madrasta tivesse falado. Que seus problemas
fossem tão maiores, que nem poderia compartilhar conosco. Depois disso, passei
muito tempo sem querer ver ele novamente, muito tempo mesmo.
Três anos depois retornei a Maceió, estava
caminhando na Rua Comendador Leão avistei meu pai de longe e para não nos
cruzarmos, resolvi desviar o meu
caminho. E entendo que fiz muito bem, porque naquele tempo ainda não estava
preparado para o nosso reencontro. O nó ainda permanecia na minha garganta. Não
diria que nem era um simples nó. Era um nó "PRÒ", que era um nó mais
prolongado, que não desatava. E assim continuavam as coisas.
Eis que um belo dia, foi inevitável sem
planejamento ou programação nenhuma, fui a casa de meu pai e me encontrei com
ele. Pedi sua benção. Não encontrei a madrasta. Passaram-se alguns minutos, e
fui embora a francesa. Pois eu estava ainda muito magoado. Tinha ainda um
rancor muito grande, não sei se era ódio pelo desprezo por ele não ter feito
absolutamente nada.
E assim comecei a voltar uma vez ou outra a casa de
meu pai quando viajava até Maceió, mas jamais voltei a dormir ou fazer
refeições em sua casa. Entrava e pedia a sua benção, ficava algum tempinho e
sempre saia a francesa. Até mesmo porque ele não expressava nenhum sentimento
de carinho por mim. Me convidava para almoçar, mas nunca aceitei. E assim,
fomos caminhando por muitos anos até que ele vem a falecer. O importante que
ele partiu e havíamos nos reconciliados como pai e filho. Apesar de acreditar que ele nunca soube na verdade o
que seria um pai de verdade.
Posso hoje serenamente me deitar e dormir. Primeiro
porque não fiz absolutamente nada errado. E em segundo lugar porque houve a
reconciliação com meu pai. Tudo foi resolvido. As mágoas e o nó na garganta
foram desfeitos com o tempo e com os reencontros. Não tenho absolutamente
vergonha de nada que aconteceu na minha infância e juventude, até porque fui a
vítima e não o agressor. Tenho hoje a maturidade de poder conversar, escrever e
expor meu passado. Talvez venha a ajudar a outras pessoas e até mesmo explicar
a formação da minha personalidade.
Claro que gostaria de ter tido uma infância igual
aos demais amigos e colegas, com uma mãe do lado, com um pai verdadeiro, ou
pelo menos com uma "boadrasta". Poderia ter sido totalmente
diferente. Mas hoje isso não me afeta mais. Hoje não culpo meu pai. Entendo que
foi a educação que ele teve provavelmente, quando os tempos eram outros. Cresci,
lutei, quebrei meus paradigmas, superei meus rancores e desatei meu nó na
garganta e acima de tudo construí uma família maravilhosa que só me dá orgulho
e satisfação.
Em momento algum pensei em esconder na minha
biografia o meu passado. E por que esconderia? Por que renegar? A maior prova
que superei foi ter convidado meu pai e a madrasta para serem meus padrinhos de
casamento. Mas já não queria mais aquela relação que existia com meu pai. Cresci
e amadureci. O sofrimento e o aprendizado fizeram eu ver o mundo de outra
forma. Passei a saber a escolher o que desejava e o que rejeitava. Então,
aquela antiga forma de relação com meu pai, não me satisfazia mais. Assim,
não era simplesmente da “da boca para fora”. Realmente eu havia superado tudo o
que aconteceu no passado.
Quando o visitava, fazia apenas de uma forma rápida
e formal. E acredito que por outro lado, era exatamente o que ele também
desejava. Tudo serviu de alicerce para educar e criar meus filhos, que são
minha maior "prioridade". Sem eles, eu não seria o homem feliz e
realizado que sou hoje. De que adianta ser um homem realizado profissionalmente
ou que tenha uma boa casa, senão tem uma esposa maravilhosa, com filhos e netos
espetaculares?
Com certeza muitas vezes estive ausente de casa, em
razão de minhas viagens a trabalho e outras vezes tive que virar a noite
trabalhando. As vezes tinha que sair cedo antes deles acordarem e voltava tarde
quando estavam dormindo. Mas nunca deixei de manifestar amor por eles. Nunca
ganhei um beijo de meu pai.
Nunca escutei meu pai me dizer que me amava. Isso
foi meu maior aprendizado que recebi dentro da casa de meu pai. Então, eduquei
meus filhos de outra forma. Meus filhos e netos sabem que os amo, e os amo não
é da boca para fora. Eles sabem que os amo de verdade. O que seria mais
emocionante e alegre que passar um jantar ou um almoço com eles reunidos? Fazer
um churrasco com um filho? Ir a um restaurante com eles? Brincar com os netos
ou com os filhos quando crianças?
Nunca pensei em porque isso aconteceu comigo. Mas
para que? Recebi esse limão, essa missão e soube conduzir e administrar essas
situações nos momentos mais difíceis e durante o decorrer da minha vida, nada
acontece por acaso. Foi me legado essa carga. Eu poderia ter ficado a vida
inteira me lastimando ou chorando pelos cantos. Poderia ter optado pelo caminho
mais fácil, ter continuado na casa de meu pai. Mas senti que meu caminho era
outro, que o mundo era muito maior que os meus olhos enxergavam. Então, fui
atrás do meu destino e fui à luta. De certa forma tenho muito a agradecer
a eles por tudo que ocorreu. Talvez senão fosse assim não teria conhecido minha
esposa e não teria tido meus filhos maravilhosos.
Agradeço a Deus pela família que tenho!
FÊNIX RESSURGE DAS CINZAS
Ao avistar a cidade de Recife de dentro do ônibus,
minha ansiedade cedeu lugar a alegria, meu coração passou a bater mais forte.
Meu destino estava próximo a ser decidido. E não tinha como não ser diferente.
Foi então que esqueci de tudo e de todas minhas preocupações e pela primeira
vez na viagem, passei a admirar a linda paisagem. "Veneza" estava
próxima.
Estar na nossa queridíssima "Veneza
Brasileira", cortada por seu Rio Capibaribe e banhada por um lindo mar,
sendo uma das maiores metrópoles do Brasil daquela época.
Recife era a referência das capitais nordestinas. E
desembarquei na movimentada rodoviária, e despertei para minha realidade. Não
havia mais tempo para sonhar com "Veneza". E rumei direto para a casa
de minha avó. E como imaginava, fui recebido de braços abertos por ela como um
filho pródigo retornando a sua casa. Com todo o amor maternal que desde
que minha mãe faleceu nunca mais soube o que era.
E depois de uma noite muito chuvosa, com um enorme
temporal, ressurge um novo amanhã com um sol maravilhoso no horizonte. O Sol
voltou a florescer na minha vida. A partir de agora passaria a ter um lar
de verdade, ou melhor voltaria a ter uma verdadeira família.
Foi na casa de minha querida avó Filomena
Mendes de Oliveira que vim verdadeiramente me sentir ser amado. Pela
primeira vez senti na vida que alguém teria por mim o mesmo amor maternal que
minha mãe Julita teve quando eu era muito pequeno. Dentro de sua casa me sentia
seguro e protegido.
E até as vezes me perguntava por que demorei tanto
tempo para ter ido embora da casa de meu pai. Como minha vida teria sido
diferente se meu pai tivesse me entregue a minha avó quando se casou pela
segunda vez. Eu estava feliz da vida. Foi então que descobri a felicidade. Podia
deitar e acordar sem medo ou nenhum receio. Me sentir ser amado. Sentir que
aquela casa podia chamar de lar. Que felicidade!
A vida na casa de minha avó era muito saudável. Me
dava muitíssimo bem com ela. Minha avó era uma pessoa muito especial. O
amor de avó invadiu meu coração e acalmou minha alma, serenou minha mente. Pude
voltar a respirar e voltar a viver na paz. E desta forma passei a morar com
minha Vó Filomena, minha tia Zuleide que era costureira de uma alfaiataria
famosa e meu primo Arremar Mendes, dois anos mais novo que eu.
Minha avó era uma pessoa especial, uma figura
fantástica. Tinha "tiradas sábias" como "quem muito se abaixa o
cú aparece". Gostava de jogar no bicho - jacaré. 6757 6757. Por sua
influência algumas vezes também me
aventurei e dei sorte, apostei um real e ganhei 850. Que festa!
O dia a dia na casa de minha avó Filomena era muito
agradável e saudável, sem problemas, sem nenhum tipo de complicação. Sentia
pela primeira vez estar num lar de verdade e com muito amor. Minha relação com
minha avó era espetacular. Ela era uma figura sem igual. A cordialidade era
integral, e não podia ser diferente.
Realmente era neto dela por completo. Desde o
primeiro pé que coloquei em sua casa fui muito bem recebido e de lá para cá foi
só festa.
O relacionamento que tinha com meu primo Arremar
era maravilhoso, éramos como irmãos, seu apelido carinhoso era "Neguinho Arremar.
Ele tinha um jargão que me dizia "Primo você é ótimoooo" e da mesma
maneira eu retribua a mesma frase com o mesmo fervor. Foi com ele que vim a
conhecer muitos amigos, visto que ele tinha um relacionamento com todo o bairro
e todos gostavam muito dele.
Assim conheci o César, Rildo, Paulo, entre muitos
outros amigos que vim a ter. Jogávamos o jogo de "pelada" no areal do
Rio Capibaribe, quando a maré baixava ficava aquela faixa de areia, tipo uma
prainha que não se tomava banho por causa do rio, mesmo que na época fosse
limpo.
Jogávamos um futebol meio mestiço, "tantos
contra quantos", não havia um número certo de jogadores. Os amigos iam
chegando e entrando de um lado ou de outro. E por aí, íamos na
"fuzarca". Era uma bagunça só. Muito boa, muito salutar. No fim da
"pelada", que não tinha tempo para terminar. Íamos cada um para sua
casa e tomávamos o costumeiro banho e fazíamos a refeição ou algo assim.
E nunca houve nesse espaço de tempo ninguém que
tenha se machucado gravemente, para brigas ou coisa parecida. Da mesma forma,
dentro da casa de minha avó não havia discussões. E tempos depois meu primo se
casou com a Auxiliadora e teve os filhos Leonardo e Gabriela. Tudo nessa época
em Recife era festa e coleguismo. Não existia preconceito de forma
alguma. E não haveria de ter, pois todos éramos da mesma família.
E todo o sábado nós comíamos a galinha de cabidela,
que era criada no quintal de casa, onde havia em média dez galinhas. Eram
compradas na feira e ficavam no quintal ciscando e comendo uma alimentação
saudável. Minha avó dizia que era para limpar seu organismo nesse período que
ficava em nosso quintal limpo. Na sexta à noite ela matava a galinha e quem
"batia o sangue" era eu. E o curioso era quando eu batia devagar, ela
dizia para bater com força.
O sabor da galinha era inigualável. Havia um
restaurante muito famoso na cidade, onde o prato principal era a galinha de
cabidela e o sabor do prato de minha avó sem dúvida alguma era muito melhor que
do restaurante. Coisas que o tempo não apaga.
Certa vez num sábado uma colega de trabalho, a
arquiteta Jane Teixeira, venho a minha casa para fazermos um serviço e ficou
para o almoço. Por sua vez ela era uma pessoa muito bem situada financeiramente
e de certa forma eu fiquei acanhado para na hora do almoço ela comer a galinha
de cabidela. Era o que ela gostava de comer.
E a partir desse dia ficou habituada no almoço de
sábado ela aparecer lá em casa para conversar comigo e filar o almoço. Acredito
que marcava os trabalhos em minha casa, exatamente para saborear as comidas de
minha avó.
As vezes lembrava de meus irmãos que estavam em
Maceió. A saudade é um sentimento enorme e profundo. Todos nós temos e comigo
não seria diferente. Mas, tinha que engolir seco e seguir na minha nova
trajetória. Continuar o dia a dia e me programar para o futuro melhor, que até
então era só bronca.
Reaprender a viver, reaprender a fazer novos amigos. Naquela época não dispúnhamos de telefone, celular, Instagram e tantas outras tecnologias atuais. Era dar continuidade e seguir em frente com a vida. Mandando brasa e com certeza melhores dias haveriam de vir! E felizmente como vieram!
Normalmente levava um lanchinho para a escola
técnica preparado pela vó Filó, pão francês com queijo, carne ou o que tivesse
na geladeira. E não é que começaram a roubar meus sanduíches? Até que
arquitetei um plano. Tinha um amigo trabalhando na Pfizer, que arranjou umas
cápsulas de uroterramicina e misturei no lanche! E qual foi a surpresa?
Porque logo começou o burburinho na sala de aula
depois do recreio, porque alguns colegas estavam urinando azul turquesa! Então,
já sabia quem eram os filões do meu lanche!
Consciente que precisava trabalhar, não que minha
querida avó me cobrasse, pelo contrário minha avó jamais me cobrou nada. Minha
avó sempre me tratou como um filho. Tratou e me amou como um filho. E minha tia
também jamais me cobrou nada. Já havia naquela época a necessidade por fazer
algo. Não poderia simplesmente ficar em casa o dia inteiro.
Sem saber exatamente como ou porque já pressentia
que o mundo estava me esperando com os braços abertos e eu não poderia ficar
dentro de casa esperando em berço esplendido. Sabia que se quisesse mudar meu
destino e minha vida, teria que lutar e para isso o caminho seria começando a
trilhar o caminho natural do trabalho.
Foi com o primo Arremar que consegui meu primeiro
trabalho. Ele me apresentou o Augusto Cesar de Oliveira, filho de dona Inês. E
através do intermédio do companheiro de dona Inês, seu Ribeiro que consegui uma
vaga na prefeitura. Foi então que fui fazer o estágio não remunerado de
desenhista restaurador de plantas Aerofotogramétricas existentes nas mapotecas
do ETPF Escritório Técnico de Planejamento Físico.
Mas quando fui contratado na Prefeitura três meses
depois dei um enorme pulo de alegria. Foi quando o arquiteto Aquiles determinou
que fosse na Prefeitura para que fosse incluído meu nome na folha de pagamento.
Fiquei feliz da vida. Cheguei em casa e comemoramos todos juntos. E disse
para minha avó Filomena e para minha tia que metade do salário
seria destinado a ajudar nas despesas da casa.
E assim todos os meses entregava o dinheiro a minha
tia que administrava as compras e despesas da casa. E assim, aos
poucos tive a oportunidade de contribuir para transformar a casa de minha
avó mais bonita e confortável.
E por outro lado, qual foi minha a alegria: minha
tia, tinha uma outra casa em construção no bairro do Cajueiro, e decidiram
utilizar o dinheiro para investir na casa. Tal qual foi a surpresa "água
mole em pedra dura, tanto dinheirinho aos poucos que ela terminou de concluir a
casa".
Ela sem esse dinheirinho não iria conseguir
terminar a casa, porque era costureira. Isso foi muito gratificante, de ter não
só colaborado nas despesas da casa, como também ter auxiliado financeiramente
minha tia Zuleide na realização de seu sonho que a muitos anos vinha arduamente
lutando.
Uns anos depois fui convidado a trabalhar
na "Cohab Recife", que era uma Sociedade de Economia Mista, onde
o Governo Federal entrava com o investimento e o Estado e os Municípios com a
mão de obra e projetos. Não pensei duas vezes e aceitei, inclusive tinha uma
remuneração um pouco melhor, bem como mais atribuições e mais oportunidades de
ampliar conhecimentos.
Alguns colegas da época me chamaram de doido e de
otário, porque iria trabalhar que nem um animal por muito pouco. Mas eles não
compreendiam que era isso que eu queria.
Sempre entendi que se aprende trabalhando. E quanto
mais se trabalha, mais se aprende. Na Prefeitura apenas trabalhava pela manhã.
E na Cohab passei a trabalhar o dia inteiro. E continuei os estudos, pois
estava no segundo ano do curso técnico onde as aulas iniciavam às dezoito
horas. A primeira vez fui de ônibus do trabalho a escola, mesmo sendo próximo o
colégio, e quem disse que consegui
atravessar o corredor do ônibus e descer no ponto.
Tentei de todas as formas, atravessar aquele
corredor do ônibus, entupido de pessoas até o teto. Não houve jeito, quando
finalmente consegui chegar até a porta para descer do ônibus, já havia passado
vários pontos do local que era a escola técnica. Assim, aprendi que a melhor
solução seria mesmo ir caminhando do trabalho até a escola, em passos largos e
rápidos, para não chegar muito atrasado.
E ainda
chegava de certa forma com fome. Visto que não dava tempo para comer nada. E na
Cohab não tinha refeitório, quando tinha alguma coisa era um rapaz vendendo um
sanduiche e um refrigerante. As aulas normalmente terminavam depois das vinte e
duas horas.
Chegando em casa, tinha que colocar a matéria em
dia, ainda na mesma noite. Estudar um pouco mais. Tínhamos um professor de
física, era um engenheiro civil. Ele segurava o apagador com a mão esquerda e
com a direita ele escrevia com o giz. Então, conforme ele vinha explicando e
escrevendo, já vinha apagando o que havia escrito. Tudo muito rápido.
Era assim mesmo. Quem entendeu, entendeu. Quem não
entendeu, que se vire depois como puder e se puder! E não puder que repita de
ano e pronto. O problema não era dele! Ele sabia muito. Um gênio! Mas era um
péssimo professor. Não havia diálogos dele com os alunos. A matéria
simplesmente era jogada em cima da gente.
Seus alunos eram o quadro negro. Isso não era
“Comunicação”. E estava muito longe de ser. Comunicação: “Não é o que eu falo.
Mas o que os outros entendem.” Se o outro não compreende, não houve
comunicação. Simples assim! Mas, eram outros tempos! Era o que se tinha e ponto
final.
E a física já era complicada, e quando não se tem
uma forma lúdica de ensinamento. Quando não se tem uma didática apropriada para
ensinar. Ninguém podia perguntar nada. Tudo era escrito no quadro negro e
atirado em cima de nós. E a gente escrevia o que podia e da forma que
compreendia.
E nessa brincadeira as vezes passava da meia noite
em casa estudando e nos finais de semana para compreender e aprender. E não era
só física, também havia português, matemática, química, OSPB e uma língua
estrangeira, que não sei por que "cargas d'água" escolhi o francês.
Nessa época estava com dezesseis ou dezessete
anos, era menor de idade. Não mais morava com meu pai. Assim, não podia exigir
que eu estudasse ou trabalhasse. Minha avó jamais colocou qualquer exigência
para morar com ela. Então, por que eu optei em transformar minha vida numa
loucura? Trabalhar o dia inteiro. E depois ainda ter que estudar na Escola
Técnica até às vinte e duas horas e ainda estudar em casa até a meia noite
todos os dias e nos finais de semana.
Muitos colegas, estavam estudando porque papai e
mamãe exigiam. Mas eu não. Estava lá, porque queria mudar de vida. Queria ser
alguém. Tive o exemplo de dentro de casa. Já sabia que para ter um bom emprego,
teria que estudar, teria que trabalhar para adquirir experiência. Sempre fui um
radar para querer aprender.
Fui um obstinado desde jovem para compreender
muitas as coisas da vida. Acredito que amadureci muito cedo nesse aspecto.
Dizem que quando uma pessoa não tem um dos
sentidos, os restantes são mais evoluídos. Então, acredito que comigo foi da
mesma forma. Como não tive na infância e no início da adolescência um amor
materno e paterno, acho que aflorou muito cedo as minhas aptidões para a vida
profissional. Assim, acabei sendo independente na vida muito cedo, e dessa
forma sempre segui de cabeça erguida com o propósito de vencer. Se não galgasse
um lugar muito alto, pelo menos chegasse num lugar na sombra para galgar a
minha postura interior.
Ao invés de ter aceitado um estágio sem remuneração
poderia ter ficado em casa dormindo. Ao invés de ter trabalhado em dois
empregos, poderia ter ficado apenas num e assim ido a praia para jogar bola ou
namorar. Ou então, por que estudar até meia noite todos os dias em casa e nos
finais de semana? Com tantas outras coisas melhores a serem realizadas? Mas são
esses detalhes que fizeram a diferença quando fui aprovado no concurso da COHAB
e em tantas outras etapas da minha vida.
Temos que compreender que quem escolhe o nosso
destino somos nós mesmos, e não nossos pais, professores ou superiores.
Estava indo tudo bem no trabalho na Cohab quando
surgiu um concurso para desenhista projetista da Sudene - Superintendência para
o Desenvolvimento do Nordeste. Na época era um dos melhores empregos que
poderia se ter, a nível hoje de Receita Federal ou Banco Central. Na data
específica fui realizar a prova prática nas dependências da própria Sudene.
Fui recebido por um engenheiro que lamentou me
informar que certamente a vaga já havia sido preenchida por um dos outros
candidatos em razão de sua ótima prova prática que havia realizado. Então
questionei: "Como assim? Pois estou aqui para realizar também a prova
prática, visto que recebi um telegrama hoje as onze horas, e cá estou!" O
engenheiro foi confirmar a informação e desta forma, fui autorizado a realizar
a prova técnica.
Mais uma vez tive que lutar pelos meus direitos,
como assim? Já haviam preenchido a vaga? Se ainda não havia prestado as minhas
provas. Estariam cerceando o meu direito de realizar a provar e poder concorrer
de igual por igual ao outro candidato?
Mas tudo se resolveu e tive os direitos garantidos.
Fui conduzido a uma sala, onde fiquei sozinho. Havia para utilizar para a
realização da prova uma prancheta de desenvolvimento de projetos, onde tem um
tampo com inclinação e um banco para ficar sentado, uma régua "T", um
esquadro, compasso, uma calculadora, papel para operação de cálculo, um rolo de
papel milimetrado, e uma planta aerofotogramétrica de uma determinada área do
município de Petrolina.
Onde seria desenvolvido o atual polo de fruta de
mangas, uvas e goiabas. A minha missão era marcar na
planta aerofotogramétrica uma topografia conforme complexidades
exigências. Mas com minhas experiências na Prefeitura tirei de letra. Uma hora
depois o engenheiro voltou para verificar o trabalho.
Entrou na sala e perguntou: "Então Paulo, como
está o teu trabalho?" Apresentei. O rolo de papel milimetrado não havia
utilizado, intacto, sem risco nem rabisco. E qual foi a surpresa dele, ele
avistou os desenhos de doze perfis longitudinais e seções transversais já
transcritos.
E ele me perguntou: "Você achou isso
onde?" Então mostrei que havia feito com a minha mão e minha lapiseira.
Ele riu. Pegou o telefone e falou com o coordenador geral e disse: "Está
suspensa a aprovação do atual desenhista projetista, que a partir de agora
temos um novo!" E ele me levou a presença do coordenador, que ficou pasmo
com o trabalho e concordou com minha nomeação. Foi então que disse para mim
mesmo "Daqui para frente ninguém me pega, ninguém me segura!"
E
para tudo existe um momento. O momento é agora. Se você tem que estudar é
agora. Mesmo que você tenha 15, 30 50 ou 70 anos. Se você quer e precisa, tem
que arregaçar as mangas e fazer. Não adianta dizer que irá fazer amanhã. Porque
amanhã vai dizer a mesma coisa. Por outro lado, às vezes paro e penso quantos
jovens então perdidos numa universidade fazendo um curso qualquer simplesmente
porque seus pais desejam, e muitas vezes estes estudos são a base de grandes
sacrifícios de trabalho de suas famílias.
E
para eles tudo é uma grande festa, apenas mais uma oportunidade dos jovens para
se relacionar ou realizar algum networking. Mas na verdade, estes estudantes
acima de tudo estão perdendo um tempo precioso, e na vida quase tudo se pode
recuperar, menos o tempo. O tempo transcorrido não volta mais.
Felizmente não fui o primeiro, não fui o único e
certamente não fui o último a correr para vencer na vida. A querer ser alguém.
A colocar o estudo e o trabalho à frente do lazer e de tantas outras coisas.
Hoje estou com mais de setenta anos. Tenho uma vida confortável, não sou rico,
tenho uma boa casa e uma maravilhosa família. E continuo trabalhando. Acredito
que ainda tenho um pouco a oferecer a esse nosso mundo complexo. E enquanto
assim puder contribuir, irei fazê-lo modestamente. Essa é minha natureza.
Voltando, a velha "Veneza Brasileira",
não demorou muito para conhecer a sorveteria japonesa na Rua da Aurora chamado
GEMBA, era surreal naquela época, japonês vendendo sorvete, só podia ser em
Recife.
E havia um sorvete famoso que era uma bola de
qualquer sabor, mas preferencialmente de uma das frutas daqui da região como
cajá, mangaba, manga, entre outras. Mas o detalhe era que sobre o sorvete era
colocado uma bolacha Maria adentrada no sorvete como se fosse uma taça.
Então, imagina naquela época, final da década de
sessenta. A "curtição" era as pessoas trocarem de roupa, arrumarem os
cabelos. Enfim se arrumarem para irem até a Sorveteria GEMBA para degustar um
sorvete com uma bolacha Maria em cima! Seria semelhante a ir jantar no Terraço
Itália nos anos 90. E vez por outra ir ao Cine São Luís, onde assistir um filme
naquela época era coisa de louco, era fantástico.
Claro fenomenal para completar o cinema era após o
filme passar na sorveteria. Gostava também de passear pelo Bairro de Santo
Antônio para me deliciar da arquitetura belíssima da época da fundação de
Recife, prédios como Correios, Cinema São Luís, Caixa Econômica.
E como tudo tem um dia para iniciar, felizmente
existe um dia para terminar. E claro finalmente chegou o dia da formatura do
curso da Escola Técnica. A festa foi majestosa. Foi simples, mas inesquecível.
Foi no próprio colégio, com os ternos cinzas construídos pelos próprios alunos
pela alfaiatara da escola.
Junto com a festa havia uma exposição com as obras
e trabalhos que foram construídos pelos alunos no decorrer do ano letivo, como
por exemplo mandalas, pratos, e esculturas de bronze, cobre e alumínio. Havia
também pequenos móveis que eram muito bem vendidos.
Após a cerimônia, havia uma festa com um baile,
nada mais justo. Depois de vários anos de dedicados anos aos estudos. E o baile
era com a orquestra da banda marcial e da banda de música. Tínhamos na escola
uma cultura musical muito maravilhosa. Não bastava uma, tínhamos duas
sinfonias. Olha que espetáculo. Foi uma noite espetacular. Muito bom. Foi
festivo. Tudo alegria. Claro, não teve bebidas alcóolicas. Naquela época por
ser num ambiente estudantil a cultura era diferente.
Hoje, até em festinhas de São João em colégios de
primeiro grau são vendidas cervejas, os tempos mudaram. Então, a bebida quando
muito era aquela sangria, que era um tipo de garapa de vinho. A festa ocorria
no salão poliesportivo do colégio.
E na hora do baile, para abrir o baile sempre era
um rapaz qualificado para a dança, que chamávamos de "pé de ouro" ou
"pé de valsa". E isso era o mais fácil, porque todos nós rapazes
sabíamos dançar muito bem a valsa. Fazíamos sucesso na pista de dança.
Particularmente além de gostar de dançar uma valsa, também amava dançar um bom
bolero.
Aos dezessete anos chegou a época do Alistamento
Militar, inicialmente fiquei preocupado, porque já estava trabalhando e fazendo
várias coisas ao mesmo tempo. Acredito que aquele momento não era adequado para
ingressar no serviço militar e tive muita sorte visto que fui dispensado por
excesso de contingente.
Com os trabalhos que já vinha realizando na
Prefeitura e na Cohab e principalmente com a minha habilidade e aptidão por
realizar desenhos técnicos e mecânicos. Que eram de uma precisão enorme. Todos
realizados no sistema métrico decimal. Assim, com o curso técnico de
edificações, onde era propriamente a parte de construções.
Desta forma, tive uma boa formação de desenho e de
matemática. Juntando a formação escolar e a experiência nos trabalhos que tive,
a habilidade de desenhar e minha aptidão, escolhi a arquitetura. Claro para
construir, você também de certa forma também tem que elaborar o projeto. E foi
onde me apeguei na arquitetura.
Assim muito naturalmente aderi a faculdade de
arquitetura que digamos que seria uma complementação ao curso de desenhos de
edificação. Foi muito difícil naquela época porque os serviços ou porque não
dizer os bicos de trabalhos de arquitetura não eram consideráveis, mas existiam
uns aqui e outros acola. E nesse espaço nós galgamos alguma coisa. Hoje o
trabalho é significativamente reconhecido. No meu tempo, a maioria das
faculdades de arquitetura eram públicas. Algumas poucas eram privadas.
Então se para ter realizado os estudos já havia
sido muito corrido, pois estava trabalhando em dois empregos. Agora imagine eu
realizar a faculdade trabalhando com a responsabilidade que o cargo me exigia?
Havia deixado de ser um simples funcionário para ser profissional responsável
por projetos de dimensão elevada e consequentemente não só pelas finanças dos
projetos, mas também por centenas de famílias que trabalhavam nesses projetos.
Estava o tempo todo viajando. E claro, chegar pontualmente na faculdade deixou
de ser algo normal.
Nessa época passei a entrar madrugada adentro não
mais para estudar as dificuldades escolares, mas sim as necessidades dos
projetos. Finais de semana se acumulavam os projetos e necessidades acadêmicas,
tanto em estudos, como em trabalhos. Estudar a noite e trabalhar de dia não é
fácil. É Puta Difícil. É Phoda, com PH. Ura meu”, mas era o que queria para meu
futuro! Não estava na faculdade porque papai e mamãe queriam. Estava ali,
porque precisava estar. Porque queria ser arquiteto! Eu e mais ninguém!
Lembro bem que tinha uma colega de turma, que seus
pais exigiam que fizesse uma faculdade. Então ela escolheu arquitetura, puramente
porque achava bonita não a profissão, mas simplesmente a expressão
"arquitetura"! Pense, uma pessoa dedicar anos de sua vida, sem nenhum
sentido. E o pior que ela comentava que quando ingressou no curso não sabia
absolutamente nada e nem tinha aptidões para seguir na profissão.
Tinha dificuldade até para elaborar um pequeno
projeto de uma casinha popular. Ela se perdia totalmente nas aulas e se
agarrava comigo. Eu ficava apavorado com aquela situação. Não sei a moça
terminou o curso, porque troquei de cidade e consequentemente tranquei o curso.
Naqueles tempos os universitários de arquitetura
preferencialmente tinham que ter um básico de formação para poder compreender
as disciplinas acadêmicas. As escolas técnicas de arquitetura proporcionavam os
princípios técnicos e fundamentação. Começando com desenhos básicos, copiando e
redesenhando projetos com alterações e propondo soluções a problemas
identificados nos trabalhos escolares.
Ali a meninada já percebia se seu futuro seria
naquele caminho ou não. Seria como um divisor de águas. Também havia cursos
particulares e outros já trabalhavam na área. Mas ingressar virgem na faculdade
era muito cruel para os alunos, que precisavam estudar em dobro e recorrer a
muitas horas de estudos suplementares na biblioteca, visto que não existiam
computadores.
Hoje tudo é diferente. A tecnologia está no alcance
de todos. Existem softwares avançados como AutoCad ou AutoDesk é mais fácil,
porque você já tem uma biblioteca de símbolos, onde você só cópia e aplica na
planta. E existem algumas regras, por exemplo para cada banheiro tem que ter um
vaso sanitário e então ele precisa de área de um metro quadrado. Se houver um
chuveiro, precisará de mais um metro quadrado. E ainda se precisa de mais um
metro quadrado para cuba ou lava rosto.
Era comum todas as quintas e sextas feiras a noite
alguns colegas me convidarem para uma festança. Aliás nunca vi um povo gostar
tanto de churrasco, quanto o paulista. Nem mesmo o gaúcho eu vi. Eles diziam
"Vamos matar uma carne!" Nem tinha como ir. Tinha que trabalhar no
dia seguinte. Ou até mesmo naquela noite tinha que trabalhar em projetos.
A mocidade não sabia ainda o que era
responsabilidade. Talvez não precisassem. Tinha compromissos, com minha
empresa, com minha família e como meus colaboradores. Realmente trabalhava
muito. Mas algumas vezes, claro que fui a festa com a gurizada.
Meu relacionamento com os professores sempre foi o
melhor possível. Tive excelentes professores, verdadeiros mestres da
arquitetura. Mas também tive professores que nada entendiam do riscado. Até
acredito que nunca exerceram de fato a profissão. Eram apenas teóricos dos
livros.
Eram verdadeiros chatos de galocha. Não sabiam
"porra nenhuma." Ficava ali olhando eles falando e explicando.
Mirando meus olhos. Eles sabiam que já exercia a profissão. Acredito que meus
olhares diziam tudo sobre meus pensamentos.
Os professores sabiam identificar habilmente quem
ali estava realmente para aprender, quem trabalhava, quem necessitava estudar e
quem estava ali apenas apreciando o momento.
Nos grupos de trabalho ia me encaixando, visto que
tive que realizar o curso em três Faculdades e dessa forma não tive um grupo
fixo e cada vez que ingressava numa nova Instituição os grupos já estavam
formados, todos já se conheciam.
Mas isso não era dificuldade. Apesar da diferença
de idade minha com os demais alunos, sempre tive facilidade de entrosar com os
colegas, até porque acabava sendo fonte de ajuda para as dificuldades da sala
de aula.
Felizmente esses alunos turistas eram poucos. A
grande maioria estava comprometida em aprender e projetar seus destinos através
da arquitetura. Muitos como eu já trabalhavam e assim tinham a jornada dupla.
Trabalhavam para pagar os estudos, o Crédito Educativo foi fundado no final da
década de 70. Então, quem queria estudar e não passasse numa Universidade
Pública e não tivesse um berço financeiro, tinha mesmo que trabalhar.
Certa vez estávamos numa aula com um dos melhores
mestre que tive. Um senhor velhinho, tinha um carisma, um conhecimento que
poucos tinham. E havia um colega de turma filho de papai, que era dono de uma
concessionária de automóveis que ia para a aula só para perturbar, conversar e
atrapalhar a aula com sua perturbação.
E o professor com sua voz suave e uma educação lhe
disse "Meu filho, me faça um favor você é muito inteligente, assim vou
passar você na minha matéria o ano todinho, não lhe darei nenhuma ausência, mas
por gentiliza levante-se e ausente-se a partir de agora de minhas aulas até o
fim do ano, pode se levantar, sair. Meu filho, me dê a oportunidade de
transferir os conhecimentos que se fazem necessários para essa turma tão
sofrida!"
O aluno se levantou e saiu realmente envergonhado.
Nada mais justo. Fiquei de cabeça baixa. Senti a vergonha por ele, que ele não
tinha a dignidade de sentir. Foi um esporro de classe. Um tapa de luva de pelúcia
que levou. É a vida, sempre existem esses altos e baixos que não deveriam ter.
Intrinsecamente hoje compreendo talvez a origem dos péssimos professores que
tive. Sabe lá se eles não foram um desses “filhos de papai” que apenas
figuravam na faculdade, para desfilar com suas belas roupas e automóveis,
paquerar as meninas nos intervalos das aulas. Passavam de uma forma e outra nas
provas na risca mínima e saiam apenas com o canudo.
Esquecendo que o mais importante, que era o
conhecimento que certamente não havia sido adquirido. Então, depois como fazer
para exercer a profissão? Muito triste tudo isso! Um verdadeiro desperdício de
tempo e de dinheiro e pior ocupando a vaga de outro jovem que poderia estar
naquele momento estudando para ser alguém na vida no futuro. E quantos jovens
estão nessas situações nas Universidades Públicas batendo cabeça, gastando o
dinheiro do Governo Federal e ocupando uma vaga que poderia estar sendo aproveitada
por outro aluno.
Nas provas nunca precisei utilizar do artifício da
"cola". Sempre fui preparado. E as realizava conforme havia estudado.
Inclusive se fosse repreendido por um professor, nem sei como iria conseguir
encarar o professor e todos os demais colegas de sala de aula. E acima de tudo
não estaria ludibriando ao professor, mas a mim mesmo, pois estaria passando
numa disciplina que ainda não estivesse suficientemente qualificado. Desta
forma, sempre trilhei o caminho da honestidade.
Inclusive no tempo da escola técnica ao realizar
uma prova escrita e depois oral sobre literatura, eu havia respondido todas as
respostas corretamente e ainda fiz uma narrativa resumida por minha conta do
livro. A professora que não gostava de mim, e sabe lá por que ela implicava
comigo. Queria apenas que ela me respeitasse como aluno e ponto final. Talvez
ela tivesse alguma encrenca com meu pai que era diretor da escola, mas se fosse
isso, era problema deles e não meu!
Enfim, olha que surpresa, ela me deu nota
"seis". Eu a questionei ainda na sala de aula e lhe respondi na hora
"Eu lhe exijo nota DEZ!"
E ela me respondeu: "O Sr. se contente com o
seis, que já está de bom tamanho!" Eu não aceitei e devolvi: "Eu
quero os meus Dez!" A cena até me lembra os debates políticos esquentados.
E a confusão foi esquentando dentro da sala de aula, que chegou aos ouvidos do
inspetor de alunos que deveria estar transitando por ali e entrou na sala e
chamou minha atenção e ainda clamou pelo meu nome de meu pai: "Paulo,
Professor Amaro!" E lhe respondi: Professor Amaro aqui é mestre e diretor,
não é meu pai e eu respondo pelos meus atos!"
Então fomos conduzidos até a diretoria e o inspetor
me disse: "Paulinho com essa nota você já está passado então deixamos isso
de lado!" Então lhe respondi: "Eu não quero só estar passado. Eu
quero quando estiver requisitando o meu histórico escolar para aderir a
faculdade ou para apresentar a quem solicitar eu veja uma nota belíssima DEZ. Disse
a ela, que o livro eu sei todo, de cabo a rabo. E ela não sabe nem a metade.
Ela escreve para fazer a prova, mas não sabe é
nada. Se fizermos uma arguição e tivermos uma banca com três examinadores eu
vou tirar nota dez e ela vai tirar zero, vai ganhar uma bolota bem redonda.
Então essa foi a razão pelo qual jamais colei, onde desde pequeno aprendi a
estudar muito para todas as provas e a exigir meus direitos.
Quando estava em uma obra em São Paulo estava
desenvolvendo projetos e detalhes específicos para elucidação das dificuldades
das situações ocultas para outras obras. Assim trabalhava em várias obras
simultaneamente em várias cidades e nunca deixei faltar detalhamento em nenhuma
obra. Tudo era muito trabalhoso, mas também prazeroso.
Fiz meu trabalho com amor e dedicação. Nunca morri
trabalhando. Trabalhei muito. Mas não morri trabalhando não. Vamos dizer assim
no figurativo. Eu tinha uma mula. Podia estar caminhando ao lado dela. Mas
nunca cheguei a carregar ela. Havia colegas que diziam que se matavam de tanto
trabalhar. Então neste sentido, eles carregavam a mula.
Para ingressar na faculdade primeiro fiz um
cursinho pré-vestibular que iniciava às dezenove horas. Era um aperto só, eu
não tinha tempo. Muito trabalho. Eu faltava muito. Quando conseguia ir, chegava
atrasado. Felizmente como eu tinha realmente estudado nos anos anteriores,
lutei com as minhas próprias garras e não desisti. E que alegria ao ter
conhecimento que estava entre os aprovados.
Ingressei na faculdade aos vinte e sete anos, já
era casado. Foram inúmeras dificuldades. Primeiro a disponibilidade de tempo, depois
para finalizar, principalmente pelas obras e constantes viagens pelo
Brasil. Ingressei o curso quando estava na Bahia numa longa obra, assim
tive a oportunidade de iniciar o curso. No fim da obra, solicitei para trancar
o curso.
Muitos anos depois surgiu uma nova oportunidade
quando estava na cidade de São Luís no Maranhão, onde iniciávamos uma nova
longa obra e então solicitei a continuidade do curso. Infelizmente no fim da
obra tive que trancar mais uma vez a faculdade por um longo período já quase na
hora de receber o canudo.
Cobria profissionalmente dez Estados Brasileiros,
Norte, Nordeste. Do Amazonas até a Bahia. Então tinha que encaixar a faculdade
conforme o tempo que ficaria em cada obra. E para pedir a abertura do curso, sabia
que a obra teria que ter uma previsão de durar no mínimo um a dois anos. Quando
fui transferido para São Paulo para realizar as obras do interior como Mogi das
Cruzes, Suzano, POÁ, Limeira, entre outras. Então aproveitei para concluir na
UMEC - Universidade de Mogi das Cruzes, já estava com 48 anos. Inacreditavelmente
realizei o curso em mais de vinte anos entre suspensões e aulas cursadas. Isso
é um exemplo de persistência e de acreditar em querer chegar ao destino. Não
foi fácil conquistar esse diploma.
Foram semanas trabalhando durante o dia, estudando
a noite e trabalhando em projetos de madrugada. E nos finais de semana
estudando e trabalhando. E ainda tendo que encontrar um tempo para os filhos e
para a esposa. Somente eu sei o que enfrentei. Mas tinha um propósito, queria
proporcionar uma vida melhor a minha família. Fiz todo o sacrifício
principalmente pelos meus filhos. E faria novamente tudo. Não me arrependo de
nada que tenho feito. Não me arrependo das madrugadas que entrei estudando
projetos de obras da empresa.
Tenho a consciência que em razão disso tudo, muitas
vezes estive ausente de casa e de minha família, mas isso não quer dizer que
não amava cada um de meus filhos. Talvez eu amasse meus filhos mais que um pai
que visse seus filhos diariamente. Só eu sei o que passei e o sacrifício que
fiz nestes anos para poder trazer um conforto melhor para minha família. Mas
quem decidiu pelas escolhas fui eu.
A maior ironia, depois de duas décadas lutando e
estudando não pude festejar na minha festa de formatura da faculdade.
Inacreditavelmente não tive a oportunidade de ter ido. Pois um dia antes houve
um sério problema numa obra em Manaus e minha presença foi requisitada para
resolver o pepino. E o "dono do defunto se não pegar na cabeça do caixão
ele não anda!" Todavia, o mais importante era o conhecimento adquirido e o
canudo galgado. E muitas outras festas posteriores vieram felizmente.
Achava muito curioso que as festas de formaturas,
as famílias levavam toda a comida e bebida. Os garçons eram muito limitados,
apenas faziam pequenas assessorias, como servir gelo, copos ou taças. As
orquestras começavam a tocar e o bailes começavam a encantar o salão. Não era
uma festa de rico, como sempre foram as festas da faculdade de medicina.
Lembrando hoje da festa, ainda tenho saudade de tudo.
Cheguei a ser convidado a uma ou outra festa de
formatura e realmente achava tudo magnifico, aliás toda festa é realmente
agradável. Fiquei sabendo que a festa foi fantástica. Claro que gostaria de ter
ido. Poderia ter transferido a responsabilidade que era minha, a outra pessoa
se tivesse explicado a meu diretor, mas de forma alguma faria isso.
Algo me diz que naquela noite de formatura minha
mãe estava presente com sua iluminação a distância. Não só naquela noite. Ela
sempre foi muito importante em todos os meus momentos, sejam difíceis ou
felizes. Tive realmente sucesso nessa minha jornada. Estou vivo, estou feliz,
estou velhinho, mas estou inteiro, estou beirando os 80 anos de idade.
Preparado para rumar aos cem anos de idade com a minha lucidez que tenho hoje.
Senão chegar, pelo menos estou tentando e já me dou por satisfeito.
Nesse Brasil enorme tem espaço de mais para você
projetar e construir. Nada mais justo que ser um humilde colaborador, um
humilde arquiteto. Acredito que a escolha foi corretíssima. Não me vejo
nem como médico numa mesa de operação medindo o tamanho do coração com um
compasso ou como um advogado medindo a distância entre o réu e o juiz num
tribunal.
Sou apaixonado pela arte da arquitetura. Quando
avistei Nova York com aquela concentração de prédios belíssimos, vi Boston
também espetacular. A própria Philadelphia com prédios magníficos. Inclusive
tem um sino que representa a Liberdade e é tido como símbolo do movimento
abolicionista e da Guerra da Independência Americana. Trouxe de lembrança e
homenagem um pequeno sino da Philadelphia que casualmente era também o nome de
minha mãe.
Agora vamos aproveitar e viajar um pouco mais
longe. E as pirâmides do Egito? Vamos só nos deter a apenas as mais conhecidas
"Quéops", "Quéfren" e "Miquerinos". Foram obras
que duraram décadas e consumiram sabe-se quantos milhares de trabalhadores? E
quantas morreram em razão de acidentes? Junto as esfinges, foi construído um
ser mitológico, sendo um leão com cabeça de faraó. E a Majestosa Muralha da
China com milhares de quilômetros e com décadas de construção e com a
utilização de centenas de milhares de trabalhadores?
E as fantásticas Estátuas da Ilha de Páscoa?
Pensemos que obras magníficas são essas? Muitos acreditam que muitas dessas e
outras construções foram construídas por seres de outros planetas, em razão da
perfeição de suas medidas. E não existirem equipamentos para transportar
toneladas naqueles tempos, mas tudo não passa de conjecturas.
Como conseguiram construir com tamanha perfeição as
pirâmides com toda sua exuberância e majestade? E tantas outras obras do
passado, poderia citar tantos e quantos. Existem pessoas que tem paixões em
passear pelos corredores dos cemitérios e ficar a admirar as obrar
arquitetônicas de cada época. Pois então, este simples e humilde local em
cidades como São Paulo e Rio de Janeiro podem retratar o passar dos tempos e
das gerações. Sendo possível constatar aquelas suntuosas sepulturas dos
coronéis do café até chegar aos dias de hoje as simples sepulturas nas paredes,
nos jardins ou simplesmente na cerimônia da cremação.
Mas o Brasil também tem belos exemplos de
arquitetura, como por exemplo o Quartel da Rota inspirada em modelos europeus e
com túneis de fuga para vários pontos da cidade. Os alunos de arquitetura e
engenharia habitualmente visitam o quartel para estudar. Existe uma estrutura
arquitetônica em vários pontos onde os tijolos foram colocados em forma de meia
lua, numa distância de aproximadamente três metros sem nenhuma base de
sustentação e estão a mais de cem anos ali instalados, sem terem caídos ao
chão.
Inclusive o próprio teto dos túneis também é
formado com tijolos nesta mesma formação de afunilamento em formação de meia
lua até o fim e sem nenhuma fundação, e acima do teto transitam a pouco menos
de um metro trânsitos carros, caminhões, pessoas. Não existindo nenhum sinal de
desgaste. Para quem mora distante e não pode realizar essa visita pode realizar
uma pesquisa na internet e encontrar um vídeo
"geraldo-luis-visita-tunel-que-fica-embaixo-do-predio-da-rota-em-sao-paulo".
Se na história da civilização o homem levou décadas
construindo essas maravilhas de obras com ferramentas rudimentares e sem
tecnologia, sem tração de motores como guindastes ou gruas. Muitas vezes no
Brasil não conseguimos concluir um projeto iniciado num Governo. Desde um
simples projeto como uma creche ou um posto de saúde. O país tem exemplos
espalhados de obras inacabadas em todos os cantos e recantos e que a população
tanto anseia para usufruir.
Sendo um verdadeiro desperdício de dinheiro
público. Inacreditavelmente a energia elétrica em alguns lares no Brasil chegou
a poucos anos atrás e ainda existem pessoas que precisam transportar água na
cabeça em latas de tinta de dezoito litros. Sem falar sobre saneamento básico
que existe um enorme déficit.
A metrópole São Paulo é um exemplo do contraste,
existem avenidas com lindos e modernos prédios e ao seu lado um complexo de
mini favelas, sem a menor infraestrutura. Com as crianças correndo com
seus pés no chão aos trancos e barrancos no meio de córregos de
esgotos a céu aberto, alimentados por casebres construídos de restos de
madeiras, papelões ou quaisquer outros materiais que venham a servir de
moradia.
As calçadas das grandes cidades viraram dormitórios
para os desabrigados que tem como proteção um pedaço de cobertor e um degrau da
calçada como travesseiro. Aquecidos nas madrugadas frias com as campanhas de
solidariedades de desconhecidos que surgem na escuridão com um copo de isopor
de uma sopa quente e saborosa para aquecer o corpo e a alma, além de acalmar a
fome desesperada. Onde vagam em bandos ou isoladamente a sorte e ao destino de
cada dia e de cada noite.
É uma contradição tentar compreender como certas
situações ainda acontecem num país continental. Não existir saneamento básico,
energia elétrica para todos. Um desperdício tamanho de toneladas de alimentos
que diariamente vão ao lixo enquanto milhões de pessoas passam fome.
Pessoas morrem em desmoronamentos de morros, sem a
menor condição de edificação. Faltam escolas, creches e hospitais para a
população. Numa época que o homem já aprendeu a voar, a atravessar os oceanos
em horas. A sair do planeta em minutos. Pousou na lua. Descobriu novas galáxias
e novos planetas. Enviou satélites e sondas para todo o canto. E não conseguiu
fazer a sua lição de casa.
Talvez até o homem não tenha ido a lua, e tudo não
tenha passado do maior golpe publicitário da história como muitos acreditam.
Quem sabe? São os mistérios da civilização! Enquanto isso, a Amazônia continua
sendo queimada para dar lugar a ganância humana para o plantio desenfreado da
soja ou para a criação de gado e os índios despejados de suas terras para quem
sabe ressuscitarem a Serra Pelada. Mas o animal homem é assim, milhões de
pessoas morreram no holocausto e ainda hoje infelizmente surgem jovens seguidores.
Como diz a música do Sérgio Brito "Tá todo
mundo louco!" Hoje as coisas estão tão malucas que nas relações de pai e
filho chego a assistir o "poste mijar no cachorro" ou então um ladrão
após roubar um automóvel, o mesmo veículo ser novamente roubado por outro
meliante.
A criatividade para ganhar o dinheiro fácil é tão
descarada que inventaram a pirataria. Até falsificação de diploma já existe,
são atrevidos, que falsificam até diplomas de médicos e praticam o exercício da
profissão. E o que dizer que chegaram a falsificar até um submarino para
transportar drogas entre os oceanos. Não se tem mais o que se falar, de onde o
animal "homem" pode chegar em sua ganância.
O início da solução dos problemas é a socialização
do conhecimento. Temos que deixar de sermos egoístas e passarmos a pensar em
compartilhar com outras pessoas. Não estou falando em regimes ou sistema de
governo. Estou além disso. O socialismo ou comunismo já provou que não funcionaram.
Estou falando em socializar o conhecimento. Temos que evoluir a educação de
nosso país e de todas as nações. Mas verdadeiramente. Saber ler, não é apenas
ler palavras. É além disso, é compreender o sentido delas.
Quem sabe, um dia a maioria de nossos jovens
poderão ingressar numa universidade. Não podemos e não devemos guardar os
conhecimentos para nós mesmos. Temos que difundir e expandir nossas
experiências. Não podemos ser egoístas e querermos tudo somente para nós. O
mundo é muito grande. Somos centenas de milhões de pessoas. Temos que evoluir
como pessoas.
No meu tempo
de escola não tinha nada de internet ou celular. E quem tinha que ir à luta era
você. Se queria progredir e subir na vida, tinha que estudar e lutar. Claro se
fosse filho de papai naquela época era tudo fácil, com um diploma e uma
indicação as coisas eram mais fáceis.
Sou feliz em ajudar as pessoas. Acho que minha
alegria é, como alguém me disse um dia, um dom de Deus. Gosto de deixar as
pessoas felizes! Certa vez sabendo que um rapaz inexperiente, mas de bom
caráter ia ser despedido, falei com o amigo Édson Lama sobre o rapaz e a vaga
em Fortaleza.
Adriano foi chamado e conseguiu o emprego. Depois
sua mãe me ligou agradecendo. Quando minha nora Patrícia foi operada, a
recebemos em casa para se recuperar. Comprei pétalas de rosas e espalhei da
porta da rua até o quarto onde ficou se restabelecendo.
Gosto de explicar sobre meu trabalho para quem tem
interesse e curiosidade Então conto das minhas experiências,
usando a minha memória profissional. Detalho que "cobre mais estanho vira
bronze" e "cobre mais zinco vira latão". Ou que a Cimento Poty
tem silos enormes e a Compel é uma fábrica enorme em João Pessoa. Os blocos de
cimento para paredes precisam ser fechados com tijolos aparentes para melhor
aparência! Certa vez subi num silo e desci de grande altura. Foi
massa!
Você pode ter inglês fluente, ter formação e ser
filho do comandante de uma companhia aérea que irá passar pelo processo de
seleção normal como qualquer outro candidato a piloto. Naqueles tempos as
coisas eram bem diferentes. Muitas vezes existiam poucos candidatos
qualificados e muitas vagas. Hoje, a maioria das cidades brasileiras tem uma ou
várias faculdades ou universidades. sem falar que felizmente o ensino superior
foi popularizado.
Muitas vezes é mais difícil passar num processo
seletivo de uma empresa que em um vestibular. Os jovens estão cada vez mais
buscando uma melhor qualificação no Brasil e no exterior. A figura do
"padrinho" cada vez mais está extinta. Se o jovem não correr atrás,
outro irá ocupar seu espaço.
Não adianta ficar parado e ver o tempo passar
reclamando da situação. Tem que ser feito algo, e quem tem que fazer é você.
Porque se você não fizer, outros lutarão por um lugar no sol. Você tem que
estudar, se aperfeiçoar, acompanhar o que está acontecendo no mundo e ao seu
redor. Tem que acreditar em seu potencial. Agarrar as oportunidades.
Na minha época, nas décadas de 60 e 70, precisava
recorrer as bibliotecas e suas fichinhas em ordem alfabética de assuntos em
arquivos com dezenas de gavetas pequenas com milhares de fichas, para então ir
a busca de um livro em dezenas ou centenas de estantes e finalmente realizar a
um trabalho escolar ou universitário. Ficava horas sentado na biblioteca lendo
e escrevendo meus textos.
Com o advento da internet e sua popularização
qualquer indivíduo pode realizar uma consulta no seu próprio celular e
inclusive num ônibus ou num metrô. Esses dias, conversando com um rapaz, me
contou que estava escrevendo seu TCC através do celular. Conversando com uma
amiga dona de uma banca de jornal, me contou que vende apenas um jornal por
dia, as pessoas não leem mais jornal físico, tudo é virtual.
Os jovens nem imaginam como era antes. Muitos vão
de carro para o colégio desde criança e na universidade já tem seus próprios
automóveis ou motos. Hoje os carros estão popularizados e qualquer um pode
comprar um novo em suaves prestações mensais. Isso por um lado é muito bom,
pois facilitou e simplificou a vida das pessoas. Mas será que qualificou os
jovens como no meu tempo para as dificuldades da vida?
A juventude tem que aproveitar toda essa
tecnologia que está na Internet e se preparar. É importante também sonhar e
acreditar em Deus. Olha a minha história, Deus existe sim. Depois tem gente que
não acredita em Deus. Não sei onde Ele está, como Ele é. Mas existe sim.
Ninguém sabe, mas que tem alguma coisa por aí, com certeza tem. Renunciai
a muitas cosias.
A humanidade tem passado por frequentes
mudanças. Não podemos garantir se todas essas mudanças são evoluções são
benéficas ao próprio homem e ao planeta. No início as evoluções levaram décadas
para acontecer, como o desdobramento do rádio para a televisão, ou do telefone
para o celular.
Hoje a evolução é tão rápida que podemos
comprar um celular e em trinta dias já existir um mais sofisticado.
Posso dizer que sou privilegiado, pois
acompanhei as mudanças quando levavam muito tempo e agora que são muito
rápidas. Vi tudo isso acontecer na minha frente. Nascer e morrer tanta
tecnologia como o rádio, o telefone, o vídeo cassete.
Quem sabe no futuro estaremos nos
transportando fisicamente em segundos para outros países ou continentes ou até
mesmo para outros planetas. Quem sabe até onde irá a inteligência humana?
Minha maior conquista foi o conhecimento que
adquiri nesses anos todos. Você consegue imaginar alguém com minha história de
infância e juventude ter realizado uma faculdade? Mas minha maior
faculdade foi da Estrada da Vida. Ela me ensinou a lutar e querer vencer, a ser
alguém. Imagina aquele menino franzino, humilde e sem dinheiro.
Então, os Jovens têm que levantar e começar a
estudar e fazer alguma coisa para mudar seu destino. Tem que se mexer, estudar
de verdade. Parar e pensar, você aí, tem papai, mamãe que pagam a sua
faculdade, o que você tem que fazer? Estudar, estudar e estudar. Correr atrás.
Se mexer. Fazer idiomas, inglês, espanhol, alemão...
Cheguei aonde cheguei por mérito meu. Só meu e
de mais ninguém! E isso que quero passar para todos vocês. Corra atrás. Lute e
não desista dos seus sonhos, não se deixe abater pelas dificuldades. Quando
você quer ser alguém de verdade, você não depende de ninguém.
Você não depende do seu pai e nem da sua mãe.
Você depende é de você, é por isso que escrevi essas linhas. Para dar uma
sacodida nas pessoas, dar um choque de motivação. E dizer que para você vencer
na vida só depende de você. Pode até parecer repetitivo o que estou dizendo,
mas esse é o meu recado.
SIMPLESMENTE DAYSE
Foi morando na casa nova da minha tia Zuleide, que fui conhecer a Dayse, através do amigo Moacir. Uma moça linda. Me apaixonei à primeira vista. Foi um misto de paixão e amor. Lembro até hoje daquele sorriso inocente, de seus olhos castanhos, sua pele morena clara e cabelos pretos. E não tinha como não me apaixonar. Não sei explicar, mas desde o meu primeiro olhar fiquei encantado por ela, verdadeiramente abduzido pelo seu charme e suavidade da sua simpatia. Algo me dizia já nos primeiros dias de namoro que ela era a mulher de minha vida, que seria a mãe de nossos filhos, fiquei encantado por ela.
Morava
próximo da casa da Dayse e assim sempre que possível passava por lá. Era aquele
namorico direitinho. Sempre fui um rapaz bem-comportado. Algumas vezes fazíamos
um passeio até a sorveteria do centro para saborear um delicioso sorvete ou um
sanduiche. Íamos também aos sábados à noite no ACA - Associação Cajueiro
de Atletismo para dançar, onde sempre havia ótimos conjuntos musicais e músicos
crooners que tinham uma projeção regional e nacional, como Roberto Barradas.
Outro
programa era ir ao cinema, na maioria das vezes assistíamos a filmes
românticos. Nós gostávamos muito dos filmes nacionais, só não assistíamos
filmes de terror. Amávamos as chanchadas dos inesquecíveis Grande Otelo e
do Oscarito, o cinema ficava lotado para assistir os dois que cantavam,
dançavam e todos nós na plateia dávamos gargalhadas e muitas vezes até
chorávamos de tanto rir. Lembro de alguns dos seus filmes como Matar ou correr,
Carnaval Atlântica, Os Três Vagabundos, Aviso aos Navegantes e tantos Outros.
Ambos não foram apenas os melhores atores brasileiros. Acredito que foram a
inspiração para a maioria dos que vieram depois e principalmente para a comédia
e para o teatro brasileiro.
E
o que falar do Costinha? A gente só em olhar para as caretas e trejeitos que
ele fazia com o rosto já caia na gargalhada. Não era por nada que era filho de
um palhaço e tinha crescido num circo. O Costinha sabia bem a profissão de
fazer os outros rirem. E o Ronald Golias, mais um ator e comediante de sucesso
e não esqueço os trejeitos com o queixo, a boca e os olhos que fazia para as
câmeras nas filmagens. E o Mazzaropi que ainda hoje passam seus filmes na
televisão a cabo, o que dizer? É porque tem público. E dou gargalhada. Sua
atuação nos personagens "Jeca ou Caipira" representavam a inocência
daquela época, de como era os namoros, os casamentos. Claro, com um pouco ou
muito de exagero. Mas tudo muito divertido.
E
o humorista e ator Zé Trindade que se apresentava todo engomadinho e
arrumadinho, cantava e dançava. Arrancava aplausos e gargalhadas das plateias
dos cinemas. Era uma turma maravilhosa que nos fazia esquecer de tudo, só nos
fazia rir e rir. Cada um deles tinha sua personalidade diferente, seu toque
peculiar de extrair o nosso riso. Cada comediante tinha sua marca pessoal. A
turma do barulho sabia fazer acontecer. Sem palavrões, sem humilhações, sem
sexo, sem xingar ninguém. O riso era algo simplesmente natural. Nada disso
existe mais. O que restou, não chega nem perto.
Fui
muito nas prévias carnavalescas nos Clubes da Águia, da Aeronáutica e no TSAP,
esse último toda sexta feira tinha um conjunto musical extraordinário chamado
Melódicos Tropicais, com o maestro Landim. Era festança até às quatro da manhã.
Tudo com muito respeito, como já disse bem diferente dos tempos atuais. Quando
íamos embora, primeiro deixava a Dayse em sua casa. Nem sempre íamos de carro.
Então voltávamos caminhando porque tudo era relativamente perto e não existia o
risco de assaltos como hoje.
Uma
bela noite, sem nada combinar, fui a casa de Dayse, levando um par de
alianças. Fui muito cerimonioso e na
presença do Sr. Arlindo Melo e de toda família oficializei o pedido do noivado.
Sempre tive a impressão de que meu sogro já aguardava a qualquer momento pelo
pedido de casamento. O Sr. Arlindo realizou algumas considerações que considerou
importante para a ocasião. E por fim aprovou nossa união e não tinha o
"porque fazer queixo duro comigo!" Até porque não existia nada contra
a minha conduta. Seja como pessoa, como ser humano, como trabalhador e como
vizinho. Todos gostavam de mim, meus amigos, vizinhos e colegas de trabalho.
A Dayse tinha seis irmãos e eu tinha uma ótima simpatia por todos eles.
Naqueles
dias, fiquei imaginando que meu sogro não sabia com quem estava conversando. Modestamente
me considerava uma pessoa com princípios de educação doméstica muito boa e me
considerava um "príncipe". Não sou um Dom Pedro de Orleans e
Bragança, mas me considerava um príncipe ao meu estilo de etiqueta, no
comportamento, na lisura, na seriedade, nos bons hábitos, no propósito de
crescer e fornecer a futura esposa uma vida digna. Me considerava o melhor
homem que sua filha poderia ter. E não foi outra coisa que aconteceu senão
isso. Noivamos, casamos e construímos um lar, vieram nossos amados filhos e
depois nossos queridos netos.
Poucos
meses antes do casamento, uma empresa aérea internacional resolveu fazer um
concurso, onde o prêmio era U$$ 3.000,00 e uma passagem para o exterior. A
competição consistia na escolha da melhor fotografia de uma paisagem
brasileira. Participei do concurso e ganhei o primeiro lugar. Lembro que era
uma jangada voltando para a praia no fim da tarde e ao fundo tendo um lindo e
maravilhoso reflexo no mar e do pôr do sol. O valor recebido ajudou nos
preparativos do nosso casamento. Porém a viagem infelizmente não foi possível
realizar em virtude que eu estava iniciando um novo emprego.
Entre
namoro e noivado ficamos juntinhos seis anos namorando. Nosso casamento
foi realizado em março de 1971. Comemoramos dezenas de bodas. Iniciamos com a
mais singela de todas, mas não a menos importante, foi a de Papel na
comemoração do nosso primeiro ano de casamento. Depois vieram tantas outras.
Como a de Estanho aos dez anos, a de Porcelana aos vinte anos, a de prata aos
vinte e cinco, a de Esmeralda aos quarenta anos e mais recentemente a de Ouro
aos cinquenta anos. E temos outros sonhos a serem conquistados como a de
Diamantes aos sessenta ou a de Brilhante aos setenta e cinco anos.
A
cerimônia do casamento foi realizada na Igreja Católica Matriz do Espinheiro,
que foi fundada em 1941, com os traços da arquitetura sacra do século vinte.
Uma Igreja ampla e muito bem ventilada e iluminada. Sem comentar em sua beleza
arquitetônica constituída nas suas esculturas, nos seus enormes lustres com
dezenas de lâmpadas, nos seus bancos clássicos de madeiras, nas pinturas, na
Via Crúcis, no mezanino ao redor de todo o templo, as colunas romanas. Enfim,
ter realizado nossa cerimônia nessa Igreja foi algo muito especial e
inesquecível.
Nossos
padrinhos foram a Abigail e Antônio Cruz, um português que tinha uma rede de
lojas de peças de motos. E o meu tutor, o arquiteto Tertuliano Dionizio e a
Jane Teixeira, também era arquiteta e trabalhava conosco. Realizamos o
casamento civil também na Igreja. A comemoração foi no salão paroquial, com
bolo, docinhos, salgadinho, champanhe e cia limitada. Tudo ocorreu da melhor
forma possível, sem nenhum contratempo de última hora. Estava muito feliz e
radiante porque estava me casando com uma mulher muito especial e que seria a
pessoa que iria dividir a vida inteira comigo. Iríamos fazer planos, sonhar
juntos e construir quantas coisas juntos. Passaríamos por dificuldades,
mas também por bons momentos.
A
maioria dos convidados compareceu, e acredito que todos estavam muito felizes.
Meu pai e minha madrasta compareceram, e a maioria dos meus grandes amigos de
Maceió também vieram a Recife para o meu casamento, através da colaboração do
amigo Humberto Rodrigues da Cunha, porque seus pais tinham uma empresa de
ônibus. Minha tia Zuleide e seu filho Arremar que virou meu primo irmão estavam
presentes. Minha avó Filomena naquela época já estava com minha mãe Julita.
Então, de alguma forma prefiro acreditar que deram um jeito para estarem comigo
naquele momento tão especial de minha vida. Claro que as duas não perderiam
esse acontecimento.
A
viagem de Lua de Mel foi inesquecível, com tantas escolhas internacionais como
Nova York a Paris ou simplesmente do Rio de Janeiro a Gramado, tive que
escolher o segundo quarto com a prancheta do apartamento novinho que havia
comprado para nós morarmos. Pois é tinham as contas para pagar. Início de
carreira, um mundo ainda para conquistar, e a vontade de melhorar na vida, de
trazer um conforto para a amada, de não querer morar na casa de algum parente,
requeria naquela época alguns sacrifícios. E tinha um projeto para entregar na
segunda feira. E virei a madrugada trabalhando depois do casamento até o
amanhecer de domingo.
Como
diz o ditado quem casa quer casa. Então, antes mesmo de casar tomei as
providências de comprar um apartamento novinho no Porto da Madeira com um ano
de antecedência. Um prédio lindo que fui um dos arquitetos do projeto, com três
blocos de quatro andares e com apenas dois apartamentos por andar. Financiei o
imóvel e como trabalhava muito, inclusive a noite em alguns projetos
particulares de arquitetura conseguimos comprar o mobiliário relativamente
bonito e moderno de representantes de lojas do Rio de Janeiro, visto que
conhecia muito bem as lojas cariocas.
Nunca
fui favorável ao aluguel. Porque você pagava por algo que jamais seria meu, um
verdadeiro desperdício do dinheiro. Teria que pagar o aluguel todo o fim do
mês. E mal pagaria já estaria devendo o mês seguinte. Ou seja, é uma ciranda
que não acaba nunca. Então, por que não partir para um financiamento? Assim, eu
e a Dayse fugimos do aluguel e compramos nosso apartamento. E casualmente só
marcamos o casamento depois que o apartamento ter sido entregue suas chaves e
devidamente mobiliado. Nós não imaginávamos ir morar em outro lugar que não
fosse nosso cantinho.
Fizemos
muitos voos juntinhos. Inclusive o primeiro voo de avião de Dayse foi em minha
companhia. Algumas viagens fizemos a lazer, outras ela me acompanhava quando
era possível à trabalho. Quando as crianças começaram a estudar as viagens da
Dayse diminuíram porque a gurizada tinha que frequentar a escola e a Dayse
proceder o devido acompanhamento de mãe de nossos filhos. Mas quando chegavam
as férias escolares sempre encontrávamos um jeitinho para estarmos todos
juntos.
A
Dayse foi comigo muitas vezes a Fortaleza, quando estava trabalhando em Sobral
a duzentos e setenta quilômetros. Então, ela ficava na casa de um casal de
amigos, o Valtécio e Ana Lúcia Botelho, onde tinha uma enorme liberdade para
passear com eles. Enquanto isso, eu estava trabalhando em Sobral que era uma
cidade basicamente industrial e sem nada para fazer naquela época, nos fins de
semana e sempre que possível dava umas escapulidas durante a semana a
Fortaleza.
Quando
a Dayse me acompanhava a trabalho a Maceió ela ficava na casa de meu pai
durante o dia e a noite ficávamos juntos no hotel onde eu estava hospedado.
Nessas ocasiões aproveitava para ir as praias da Pajuçara, na Ponta da Terra e
na Praia dos Franceses junto com minhas irmãs e cunhadas que lhe faziam
companhia durante os dias de semana, e nos finais de semana comigo. Viajamos
juntos também a Salvador. Mas inesquecível foi nossa viagem de uma semana a
Ilha de Itaparica, onde ficamos sete dias hospedados no surreal Club de
Mediterranée. Acredito que foi o primeiro hotel do gênero do Brasil e da
América Latina. Com uma pequena e esplendorosa praia particular, com águas
calmas.
Com
restaurantes, lojas, teatro, um lago e muitas piscinas. Estrutura de lazer e
esporte eram enormes. Várias quadras de tênis, de squash, arco e flecha,
trapézio, vela, windsurf, campo de futebol oficial, hípica, campo de golfe.
Enfim, estávamos num paraíso. E para complementar uma comida maravilhosa e
muita diversão. Era uma organização espetacular do local. Inesquecível os dias
que ficamos por lá. Acredito que foi um dos melhores passeios que ficamos
sozinhos e que melhor aproveitamos.
E
claro, foi comigo várias vezes a São Paulo, inclusive levamos os três filhos, o
Paulinho, o Serginho e a Ana Paula. E muitas vezes estava no interior e eles na
capital. E nos finais de semana aproveitávamos para conhecer a capital
financeira do Brasil e sua gastronomia italiana sem igual como o Terraço
Itália, o Circolo Italiano, o Baci, o Grego Manolo, o La Casserole, o Costela
de Ripa, e claro se tem uma coisa que mulher gosta é gastar de dinheiro
isso aprendi desde o começo do
casamento. E tenho que dar gargalhada com esse aprendizado. Meu "bem é uma
coisa. Meus "bens" é outra coisa". E desta forma, a acompanhava
pelas ruas de São Paulo como a vinte e cinco de março e as ruas do
Brás. Enfim sempre proporcionar a Dayse os melhores momentos nas minhas
viagens a trabalho, visto que já não teria a minha companhia.
Nós
gostávamos de passear em São Paulo, eu tinha carro a disposição e isso
facilitava muito nossos deslocamentos. Adorávamos irmos ao bairro da Liberdade
no domingo pela manhã, que é predominantemente de origem japonesa. Certa vez
fomos almoçar num restaurante que não tinha cadeiras, apenas tatame para nos
sentarmos no chão. Tive que cruzar as pernas. Na hora de me levantar, tive que
descruzar as pernas. E quem disse que eu conseguia! Estava tudo travado! E as
dores! E naquela época eu ainda era jovem, não era nos dias de hoje. Puta Merda
e agora! Que negócio complicado almoçar por aqui sentado no chão! Deu uma mão
de obra. Os garçons tiveram que me erguer. Nunca mais quis saber do tal tatame.
Eu adoro São Paulo e sua vida movimentada.
De
Mogi das Cruzes tenho uma grata lembrança de um restaurante que infelizmente
nunca levei a Dayse porque ela sempre acabava ficando hospedada em São Paulo,
era o espanhol Dom Pepe. Ele tinha a melhor paella que já saboreei até hoje. A
primeira vez que fiz o pedido desse prato e ele muito educadamente me disse que
não, e lhe perguntei em espanhol por que
não. Ele respondeu era servido para no mínimo dez personas e eu estava com una
persona. Lhe disse, então você me cobra o preço de dez personas e eu como a
quantidade de apenas uma persona.
Ele
relutou educadamente e disse que era muito desperdício de comida. E foi-se
embora resmungando. Daqui a pouco voltou feliz e radiante com um lindo sorriso
e me disse havia encontrado uma solução. Acabava de chegar uma família com seis
pessoas e que haviam feito o mesmo pedido, então iria fazer a paella para oito
personas. E desta forma estaria tudo resolvido. E todos ficamos felizes e Dom
Pepe não teria desperdício de comida.
Com
o tempo fiquei amigo de Dom Pepe e me contou que tinha enorme dificuldade de
encontrar lagosta na cidade. E sabendo disso
lhe fiz uma grata surpresa na minha próxima viagem de Recife a Mogi. Providenciei
a compra de dez quilos de cauda de lagosta novinha devidamente congelada e
comprada no aeroporto, sendo condicionada em caixa de isopor com gelo. Quando
lhe entreguei, Dom Pepe ao abrir a caixa de isopor deu um enorme sorriso de
felicidade e puxou a carteira e perguntou quanto me devia. Simplesmente lhe
respondi "presente não se paga, presente se recebe, e não precisa nem
agradecer. Isso é lembrança do tratamento que tenho recebido por você e sua
casa. Estou muito feliz em conhecê-lo você e sua esposa!" O Pepe ficou
muito feliz, e cada dia que eu retornava era uma festa.
Tive
o prazer de levar minha família a Parati onde construí alguns imóveis. Parati é
uma cidade maravilhosa e todos aproveitavam as belezas naturais. Foram comigo
também ao Rio de Janeiro, Espírito Santo, Caruaru, Petrolina e outras menores
sem grandes atrativos de lazer. Mas o importante era estar com a família.
Quando
fomos tirar o visto americano no consulado em Recife, fomos atendidos pela
própria Consul Maria Sanchez!! Fomos realizar uma excursão aos Estados Unidos.
Conhecemos as cidades de Nova York, Washington, Miami e voltamos pelo Canada,
de Quebec a Toronto num voo da VASP que decolou de Recife e fez uma escala em
Salvador para entrada de mais passageiros. O filho da dona da agência de
viagens deixou todas as passagens aos meus cuidados. Foi uma viagem memorável!
Visitamos a World Trade Center em New York. Aliás, somos fãs do Frank Sinatra e
fiz um vídeo lindo num especial de fim de ano mostrando a cidade pelo alto, com
fundo musical de New York New York.
Fizemos várias fotos no hotel, em frente à igreja
de St. Patrick. Em Washington fiz duas compras únicas, um blazer com brasão e
de uma gravata clássica. Quando o motorista do ônibus cometeu uma infração e
foi multado, tomei a iniciativa de pedir e recolher uns dólares para ajudá-lo!
Dentre os vários presentes que trouxemos para os meninos, comprei um
travesseiro ortopédico. Pouco tempo atrás ganhei um novo que foi entregue a
filha amada. Em Washington ao sair de uma loja percebemos que havia
esquecido o cartão de crédito lá. Voltamos e o vendedor já estava com o cartão
na mão para devolver.
Um tempo após o casamento compramos um outro
apartamento a cem metros da praia e dessa forma íamos sempre a praia com toda a
família. Aliás morar na Praia de Boa Viagem é um espetáculo. É um privilégio
poder aproveitar a natureza e sempre que se quiser assistir com a Dayse o pôr
do Sol no horizonte distante com as ondas como um quadro pintado. As pessoas
que não moram em cidades praianas não podem imaginar a nossa realidade. Poder
ir à praia a qualquer momento do dia, em qualquer dia da semana ou do ano. Sem
tem que pensar em planejar uma viagem, em ter que fazer malas e enfrentar uma
estrada ou uma viagem de avião. Para nós irmos à praia é o mesmo que para
qualquer pessoa ir ao supermercado, essa é nossa realidade.
As
pessoas têm personalidades, ideias, virtudes, defeitos, manias, pensamentos
diferentes. Obviamente ninguém é semelhante e muito menos igual a ninguém.
Minha companheira é uma pessoa muito boa. Relacionamento a dois é fácil e
difícil. Os jovens do mundo moderno só estão preparados para viver os bons
momentos do matrimônio. Quando surgem as diferenças despertam os problemas. E
conforme crescem as dificuldades, o caminho natural para eles é a separação.
Desta forma, o casamento acaba virando o tradicional namoro. Casa-se e
separa-se com uma velocidade sem igual. Por fim, conclui-se que é melhor nem
mesmo formalizar as relações. E os filhos? Acabam tendo uma rede de conexões de
pais e mães diferentes como se fosse uma rede da internet.
Minha
geração, não sei se certo ou errado, aprendeu a conviver com as diferenças. Não
me imagino casado duas ou três vezes. Sei que tenho meus defeitos. E da mesma
forma, também sou compreensivo com os defeitos da minha companheira. Acredito
que a fórmula para um casamento perdurar mais de cinquenta anos seja exatamente
a capacidade de um ter a habilidade de muitas vezes "ceder ao outro"
e aprender a conviver com as diferenças do outro.
Conheço
pessoas que já se casaram duas, três, quatro e sei lá quantas vezes. E não
desistem? Acredito que elas não compreendem a essência do matrimônio que ao meu
entender é o casal aprender a conviver com as diferenças um do outro. Jamais
existirá um casal perfeito, isso é surrealismo, é utopismo. O que existe é que
os casais conversam sobre suas diferenças e aprendem conviver com elas.
Uma
separação no meu ver pode gerar dificuldades para nossos filhos. Compreendo que
meu pensamento é ultrapassado para o tempo atual. Estou beirando os oitenta
anos, sou de outros tempos. Entendo que os filhos não sejam razão para segurar
um casamento. Vejo casais se separarem e serem amigos. Conviverem e passarem as
festas natalinas todos juntos. Isso tudo é muito modernismo para minha cabeça.
Mas acredito que desde ainda exista o amor o melhor caminho é preservar a
instituição do casamento. Por exemplo, nós sempre tivemos nossas diferenças,
mas jamais pensamos em separação. E por que nos separarmos? Nós amamos, somos
felizes e constituímos uma maravilhosa família.
A
Dayse que me proporcionou através de nosso amor meu maior patrimônio. Nossos
filhos são nossa maior riqueza. Eles foram frutos de nossa união, de nossas
confidências, de nossas semelhanças e acima de tudo de nosso amor. Os poucos
bens materiais que temos são tão insignificantes comparados a nossos filhos e
netos. E a Dayse foi tão especial não só na maternidade, mas em todos aqueles
momentos em que estive distante quando tinha que estar trabalhando para trazer
o sustento da nossa família.
Se
por um lado existem as diferenças, por outro lado existem as semelhanças. E
tanto as diferenças e semelhanças complementam um ao outro. Seria tão monótono
se tudo fosse igual e não existisse nenhuma diferença. Quantas vezes degustamos
ou aprendemos algo diferente
Estamos
a mais de cinquenta anos de união e a Dayse por anos esteve presente como
mãe e pai, tanto nos momentos bons e difíceis. Ela sempre estava por perto
quando um ou outro filho que estava acamado, ou precisava de um colo, quando
precisava de auxílio nas lições de matemática ou português das idas e vindas da
escola. Dos mais simples cuidados com as suas roupas a ajudar com a tabuada ou
com o Hino Nacional. E quem sabe quantas confidências teve de nossos filhos
sobre seus segredos das escolas e de suas namoradas e namorados.
Naquela
época namorar era totalmente diferente do que é hoje. Era um namoro religioso,
com muito respeito e romantismo. Era um namoro de mãos e de olhos. Aos
olhos da família e na confiança do sogro. Certos modernismos de hoje só
ocorriam na noite de núpcias. Os homens eram mais educados, cordiais e gentis
com as namoradas. As vestimentas normalmente exigiam um blazer e um vestido. Os
homens abriam a porta do automóvel para a moça entrar. Havia todo um ar de
poesia, cordialidade e misto de educação.
Os
bailes eram inesquecíveis. Os homens eram bem trajados. As damas com lindos
vestidos ou saias longas. Nós dançávamos valsas com rosto a rosto. Tudo com o
maior respeito e romantismo. Eram os "Anos Dourados". Quem não
soubesse dançar bem ficava pelos cantos chupando o dedo. Eram os tempos dos
rapazes precisarem serem acima de tudo "pés de valsa" como dizíamos.
O saber dançar bem era mais importante que a beleza masculina. Hoje não se
precisa sabem dançar, apenas só precisa saber se sacudir e ninguém percebe
nenhuma diferença.
Não existe
mais o encantamento da cantada. Hoje em dia o negócio é totalmente diferente.
Tudo foi simplificado, cada um abre a sua porta do carro e pronto. Por outro
lado, os jovens trocam rapidamente seus namorados, a pessoa fica com um hoje e
com outro amanhã. Ficam namorando pelo celular, um ao lado do outro. Hoje o
negócio não é fácil não. Minha impressão é que os jovens não têm mais tempo
para respirar e para viver. Estamos no registro de uma nova época. Daqui a uns
trinta ou cinquenta anos irão ser analisado os tempos atuais, da mesma forma
que analisamos o namoro do meu tempo. E quem sabe como será o comportamento e
namoro dos jovens no futuro. Fico até com medo. Será que irão namorar por
telepatia?
A
evolução da vida do homem é uma metamorfose de fases, é uma caminhada das
modificações das linguagens e comportamentos que retratam cada um dos períodos
da humanidade. O que foi na minha adolescência jamais voltará a ser como era. E
no futuro certamente não será como nos dias de hoje. Tudo é uma mudança. O
mundo muda, as pessoas mudam. Só os doidos permanecem com as mesmas ideias.
Particularmente acredito que o namora da minha época era mais charmoso e
encantado. Para outros acredito que seria algo ultrapassado. Mas são apenas
opiniões. E vivemos numa época que podemos ter opiniões diferentes. Imagina se
todos tivéssemos as mesmas ideias, o mundo teria os automóveis na cor preta,
como Henry Ford idealizava.
Incrivelmente
foram as poucas as vezes que tirei férias propriamente dito. Sei que me
sacrifiquei muito nas minhas relações familiares. Poderia ter feito muito mais no
nosso casamento pela Dayse e por nossos filhos. Poderíamos ter mais bem
aproveitado os momentos em viagens de férias pelo Brasil e pelo exterior.
Porém, sempre me preocupei que a Dayse e meus filhos não trilhassem pelas
mesmas dificuldades que trilhei. Não queria que minha família tivesse que ter
restrições financeiras. Jamais aceitaria que faltasse algo dentro de
casa.
Somos casados há mais de cinquenta anos e
tivemos três filhos, o Paulo Roberto que é casado com Ana Patrícia, o Sérgio
com a Michele e a filha Ana Paula. Tenho os netos Bruna, Camila, Paulo Neto,
Sérgio Roberto e a Alicinha. Desde que nossos filhos nasceram contamos com a
ajuda da assistente lene, que já faz parte da família. E todos nós tratamos a
Aline, filha da Lene como nossa neta. Todos vivem na casa projetada e
construída por mim no bairro de Candeias a poucas quadras da Praia de Boa Viagem.
Enfim a minha maior testemunha pelo meu amor pela
Dayse foi a lua. Claro a lua, minha fiel companheira pelas noites de trabalho
distante de nosso lar. Quantas noites dormia exausto nesses anos todos estava
distante de minha família e da Dayse. Mas sempre lembrava de sua voz, de nossas
conversas, de nossas cumplicidades. Quantas vezes pensava na sexta feira de
retorno para reencontrar minha Dayse. Para olhar seus olhos castanhos, sua pele
morena clara e cabelos pretos. E toda vez que retornava para casa era como
fosse a primeira vez que a visse. Muitas vezes pensava se ela também pensava da
mesma forma.
Minha maior dificuldade no trabalho eram as
viagens, quando tinha que ficar vários dias longe da família. Às vezes me
ausentava por um ou dois meses em razão do trabalho. Esses períodos eram
terríveis para um pai. Mas sempre tive a certeza de que meus filhos estavam na
segurança de sua mãe. Dayse sempre foi uma leoa, como toda mãe na lida de
seus filhotes. E dessa forma podia dar sequência as minhas atividades
profissionais.
Sem a Dayse jamais poderia ter trabalhado e
conquistado nosso patrimônio. Engana-se quem pensa que o labore é realizado
somente pelo homem. Esse mesmo homem, precisa ter a serenidade que sua linhada
e tudo que esteja acontecendo em sua casa esteja em total normalidade na sua
ausência, e a Dayse sempre soube conduzir com a maior maestria esse papel de
mãe e de esposa.
Imagine eu trabalhar preocupado se meus filhos
estariam estudando ou perambulando pelas ruas fazendo coisas erradas. Ou então
se a Dayse estivesse tendo comportamentos inoportunos. Nunca precisei me
envolver com pensamentos como esses ou outros. Tive a felicidade de ter a Dayse
como mulher, companheira e mãe de meus filhos. E isso possibilitou que
realizasse meu trabalho sem preocupações. Claro, todas as noites eram os
momentos difíceis, onde aflorava a saudade da família. Naquela época, ainda não
existiam os celulares. Tudo era mais difícil.
A Dayse sempre teve autonomia nas decisões na minha
ausência. E não tinha como ser diferente. Naqueles tempos sem celular e muitas
vezes trabalhando diretamente nas obras, como me encontrar? Se tivesse que
tomar uma decisão numa emergência de última hora, impossível me localizar. As
vezes era mais fácil me achar somente a noite quando chegava no hotel, após o
labore. Então era assim, se algum dos filhos ficasse doente, era ela que tinha
que tomar as providências, levar ao médico ou até mesmo a uma emergência.
As idas de supermercado e de todas as demais
compras do dia a dia, como de roupas, material escolar, idas e vindas na
escola. Além de tudo que tivesse dentro de casa, mesmo tendo nossa secretária
do lar. A vida da Dayse com nossos três filhos sempre era muito corrida, além
de ser gratificante para uma mãe. E diga por passagem foi realizada com
plenitude e sucesso. Prova disso são nossos três filhos, criados e crescidos,
sem traumas e encaminhados com sucesso para a vida.
Admiro e parabenizo todo o seu trabalho. Vou até
bem mais longe, reconheço que talvez a Dayse possa ter renunciado a alguns de
seus sonhos e projetos pessoais. Optando pela família. Poderia ter seguido por
uma carreira profissional, sendo uma mulher de sucesso, quem sabe uma
arquiteta, uma professora, uma advogada, uma médica. Enfim, preferiu seguir por
outro caminho, tão mais importante e valorizado quanto o meu. Mas não tão
reconhecido pela sociedade machista que vivemos. Por outro lado, sou honesto em
reconhecer que ela tem conquistou um afeto diferente e especial dos filhos por
ela, que até as vezes tenho uma pontinha de ciúmes, mas compreendo as razões
desse amor diferente deles por sua mãe.
Ser mãe é singular e especial. É uma benção. É uma
junção de profissões. Se pararmos para observarmos iremos descobrir que ser mãe
é tão peculiar que ao mesmo tempo teremos na mesma pessoa um pouco de médica,
psicológica, professora, educadora, religiosa, dentista. Mãe é tudo isso. E
muito mais. E imagina mãe de três filhos. Quando vai trocar a fralda de um, o
outro já está chorando, e o outro já está com o pé machucado, porque o outro
bateu nele. Quanto termina de dar banho no terceiro se descuidar o primeiro já
está sujo. Coisa de doido.
Mãe tem que ter uma paciência. E quando vai fechar
os olhos a noite para dormir. Um deles acorda e começa a chorar. Cada dia é uma
emoção diferente. É um fato novo na escola. Um trabalho diferente para a escola
e uma tabuada para aprender. E num piscar de dedos começam a chegar as
namoradas. Daqui a pouco a correria dos noivados. E os preparativos dos
casamentos dos filhos. E quando você menos espera a Dayse já é avó. E eu? Eu já
sou avô porra! Mas que bom que agora as fraldas são descartáveis, já não são as
de pano. São as virtudes da modernidade.
Honestamente dificilmente teria me realizado se
tivesse seguido pelos mesmos passos que a Dayse seguiu. Sei que meu sucesso
devo muito a Dayse. Reconheço o trabalho dela e de todas as demais mulheres que
são o braço direito dos homens, quando estão em casa cuidando do maior
patrimônio de suas famílias, que são os nossos filhos. E a Dayse, além disso
foi também minha fiel companheira nessas décadas todas para todos os momentos.
Sejam os bons e ruins. Tendo sido minha confidente para minhas tristezas e
amarguras do passado. Uma mulher espetacular. Uma mulher guerreira. Que nunca
se abalou com os problemas.
Muitos sacrifícios realizei para edificar nossa
casa, pedra sobre pedra. E digo isso com muita satisfação e orgulho. Sei que
muitas vezes estive ausente em razão de minhas viagens profissionais, e coube
muitas vezes a minha esposa o papel de pai como
já falei, não quero ser repetitivo, mas é muito importante enfatizar
tudo isso nessa altura da minha vida. Mas por outro lado, foram incontáveis as
madrugadas que passei trabalhando a base de injeções, cafés e até mesmo tomando
banhos frios demorados para me manter acordado e com disposição para o trabalho
madrugada adentro em projetos que tinha que dar continuidade.
E no outro dia pela manhã já estava trabalhando
normalmente no meu horário, pois a obra não poderia parar e ficar aguardando-me
acordar fora do horário. Nunca tive nenhuma licença médica de nenhuma natureza.
Em outras palavras nunca faltei a um dia de trabalho. Pelo contrário, nos vinte
e dois anos que trabalhei numa mesma empresa onde atuei em dez estados, nas
regiões norte, nordeste e depois Rio de Janeiro e São Paulo nunca faltei. O
habitual era trabalhar sempre até a meia noite e em certas ocasiões invadir a
madrugada trabalhando e acordando cedinho para as sete horas estar na obra.
Tenho a satisfação de dizer que nunca reclamei a
quem quer se seja das horas trabalhadas fora do expediente. Pelo contrário
sempre reconheci a empresa por tudo que me proporcionou que pudesse ter
realizado profissionalmente e para a construção material de nossa família e
principalmente por todo o reconhecimento que ela sempre me deu, através dos
benefícios que eu recebia. Estou muito feliz e muito bem de saúde no auge dos
meus quase oitenta anos de idade. Não tenho nada a reclamar, só a agradecer.
Minha maior realização foi poder ver meus filhos
crescerem sem nenhuma dificuldade. Não passaram nem perto do que passei.
Tanto eu quanto a Dayse abrimos mãos de muitos sonhos para garantir a eles um
lar de verdade. E a Dayse como já falei é uma mulher sensacional e fundamental
para o sucesso de nossa família. Talvez poderia ter sido menos ortodoxo no
trabalho. Ter trabalhado menos, e ter estado mais presente com minha família.
Mas a vida foi minha foi minha verdadeira escola. Aprendi desde cedo os ossos
do ofício. Compreendi que somente com muita dedicação, estudo e trabalho iria
chegar aonde cheguei.
MEU MAIOR PATRIMÔNIO
MINHA FAMÍLIA
Família Mendes Pernambuco e Alagoas em Maceió
- 1984
Eu
e a Dayse com o nosso casamento éramos um casal normal. Tudo transcorria de
forma natural para os recém pombinhos que havia jurados laços de matrimônio.
Estávamos em nosso apartamento novinho sozinhos, conhecendo então um pouco mais
um do outro no dia a dia. Estávamos felizes e realizados com nosso enlace
matrimonial, e não teria como ser diferente.
Paulo e Dayse
Naquela
época o anticoncepcional estava engatinhando no Brasil. Por um lado, existia
muitos defensores contra que alegavam questões de natureza religiosa, que seu
uso era uma forma de aborto e ainda havia a questão do seu alto preço de
compra. Assim, adotamos dois métodos naturais e tradicionais da época, que eram
o da "tabelinha" e o da "própria natureza" para cuidar de
tudo.
Dois jovens com vinte e cinco anos de idade, recém-casados na flor da idade, aprendendo e se conhecendo no dia a dia as lições do matrimônio. Digo se conhecendo porque uma coisa é namorar e outra é morar junto como um casal no dia a dia. Então algo maravilhosamente e inesperadamente acontece.
Paulo Roberto Mendes Jr, Paulo Roberto Ribeiro Mendes, Sérgio Roberto
Mendes, Sérgio Roberto Filho e Paulo Roberto Ribeiro Mendes Neto
Em
poucos meses descobrimos que deixaremos de ser um casal e passaremos a ser uma
família. Que notícia maravilhosa. A alegria e todo um conjunto de misto de
emoções invadiram nossas vidas. Felizmente a natureza tomou todas as
devidas providências e com o acompanhamento dos "anjos".
Depois
das alegrias e comemorações dos dois recém pombinhos, claro que despertou uma
série de perguntas nossas. Qual seria o sexo? Seria parecido com a mamãe ou com o papai? E qual nome iriamos dar?
E o berço? Que berço, tínhamos que pensar em tantas coisas. As fraldas. Que
pena que naquela época ainda não tinham inventado as descartáveis, eram todas
de pano. Toneladas de fraldas de pano. As roupinhas e tantas outras coisinhas.
Só a Dayse para organizar tudo direitinho a chegada do nosso filho amado.
Dez
meses após o nosso casamento a cegonha trouxe o nosso primogênito Paulo Roberto
Ribeiro Mendes Junior no dia 08 de maio. Estava trabalhando na Aço Norte e lá
pelas dez horas da manhã telefonaram para a empresa informando que a Dayse
havia ido para a maternidade Barão de Lucena. Imediatamente fui ao hospital.
Paulo Filho, Paulo Neto e Sérgio
Filho
Tal
foi a surpresa, para não dizer desespero que quando entrou em trabalho de parto
faltou energia elétrica em todo o hospital. Não sei se o hospital tinha um
gerador de energia de emergência, só sei que se tinha não funcionou. Mas também
estamos falando de cinquenta anos atrás. Tudo era na manivela, não era tudo
automático como nos tempos de hoje.
Foi
uma loucura, as janelas para entrar ventilação e iluminação onde eu estava
ficou completamente aberta, assim o meu local estava claro e ventilado. Mas
todos sabemos que as salas de cirurgias e de partos são milimétricamente
fechadas e sem janelas. Desta forma, sem um gerador de emergência a sala de
parto ficou um breu total. E ocorreu uma correria, um desespero lá dentro.
Não
soubemos o que aconteceu de verdade. Apenas sabemos de fato que o Paulinho
sobreviveu, Graças a Deus e não ficou com nenhuma sequela. Sempre tive a
suspeita que talvez ele tivesse caído no chão, mas isso foi negado veemente
pelo médico e pelos enfermeiros.
Paulo Filho e Paulo Neto
O
Paulinho é um verdadeiro touro, tem uma saúde maravilhosa. Nasceu, feliz,
saudável, bonito. Eu ficava o admirando no berço e não é que todas suas feições
lembravam somente a mim, que alegria, que satisfação, evidentemente. O seu nome
nem preciso explicar quem escolheu o seu nome, apesar que foi muito
naturalmente sua escolha. Tanto eu como a Dayse queríamos que nosso primeiro
filho tivesse meu nome. E desde sempre o chamamos carinhosamente de Paulinho.
Casualmente o nosso neto que tem seu nome, sempre lhe digo que deveria ser chamado meu neto de Paulinho e nós o chamamos agora de Paulo, visto que já é um homenzarrão adulto. Mas ele não aceita e alega que sempre foi e sempre será o Paulinho. Sempre tive na cabeça que meu primeiro filho seria um homem e teria o meu nome. E assim foi feito.
Camila, Paulo Filho, Alice, Patrícia, Paulo Neto e Bruna
Dez
meses depois, no dia 26 de março a cegonha bateu novamente a nossa porta e nos
entregou o Sérgio Roberto Mendes. Alguém havia me dito que a Maternidade de
Olinda era a melhor maternidade pública da cidade. Naquela época não existiam
planos de saúde e os atendimentos particulares eram uma verdadeira fortuna.
Assim ou realizava-se os partos em hospitais públicos ou particulares, que eram
muito caros.
E
foi numa noite de domingo, quando estava assistindo o programa do Flávio
Cavalcanti e a Dayse me avisou que havia chegado a hora e voamos para o
hospital.
Mal a Dayse entrou na sala de parto, não deu nem quinze minutos e o Sérgio nasceu. Em seguida a enfermeira venho me avisar nasceu um homem e eu levantei as mãos aos céus e disse "Aleluia! Glória a Deus nas Alturas e paz na terra aos homens de boa vontade". Sérgio também era outro touro, alto, forte e bonito. Outro que também havia puxado a beleza do pai.
O
Sérgio eu teria escolhido o nome de Pedro Mendes. Mas a Dayse não sei por que
não gostou desse nome. E se ficasse o nome de Pedro ela teria morrido do
coração e eu teria arranjado uma encrenca para o resto da minha vida. Assim,
achei por bem concordar com ela e dessa forma o Pedro virou Sérgio. Então tá
bom, que seja Sérgio Roberto Mendes. E o melhor de tudo é que todos estão
felizes com seus nomes.
Ana Paula
No
dia 19 de março nasceu a caçula Ana Paula de Fátima Mendes, a minha
"Noca". Nasceu na Maternidade da Polícia Militar, foi a única que o
privilégio de nascer num hospital particular. Curiosamente obstetra era um
ortopedista. Nasceu um pouquinho prematura e teve que ficar dois dias na
incubadora. Também é uma mulher linda e saudável. E com seu nascimento
descobrimos existir dentro de casa uma "coruja" e um
"corujo" que viviam babando em cima de sua filinha querida. E não
tinha como ser diferente.
Tinha
a expectativa que nosso terceiro filho seria uma menina, e acertei em cheio.
Minha intenção para seu nome era Ana Paula Mendes. Então venho a intervenção da
Dayse que queria Ana Paula de Fátima Mendes. A Dayse achava que ficaria mais
bonito. Enfim ficando Ana Paula estaria de bom tamanho.
Ana Paula e Alice
E
com o nascimento da "Noca", decidimos parar por aí. Três filhos
estavam de bom tamanho. Não seria nem pouco e nem demais.
Estávamos
felizes e realizados como família. Senão daqui a pouco teríamos um time de
futebol dentro de casa ou uma enfieira de filhos tipo caranguejo. E então
ninguém aguenta, "Porra Meu!
Sempre
almejei em ser pai. Sou sincero em dizer que não tive o tempo que gostaria de
ter tido para estar presente no dia a dia de cada um deles. Com as minhas
viagens e com a minha longa jornada de trabalho de dia e até de noite, sempre
preocupado em garantir a melhor vida a toda minha família.
Jamais
me perdoaria se viesse a faltar alguma coisa dentro de nossa casa. Fazia o
maior esforço. Inclusive tomava remédios para conseguir fazer as duplas
jornadas de trabalho de dia e de noite.
Mas
mesmo a distância meus pensamentos estavam sempre direcionados a nossa família.
Havia dias que eu telefonava até mais de quinze vezes para nossa casa e
conversava com a Dayse para saber se estava tudo sobre controle e para dar
"benção a cada um deles. Tinha um cuidado especial com eles, inclusive
providenciei a instalação de um ar-condicionado no quarto deles e mesmo assim
ainda tinha um ventilador. E todas as noites que estava em casa nunca esquecia
de lhes dar um beijo, abençoar e fazer um sinal da cruz na testa de cada um de
meus lindos e queridos filhos enquanto estavam dormindo. Sempre preocupado se
estavam bem cobertos.
Olhar
meus filhos sempre foi uma das coisas mais lindas que já contemplei. Poderia
ficar ali durante horas olhando-os dormindo o soninho da inocência. Agora o
Paulinho e o Sérgio dormiam com as mamadeiras ao seu lado, de forma que quando
acordassem de madrugada já as tinham prontinhas. E faziam xixi na cama. Era um
estrago todo amanhecer. Naqueles tempos,
não havia as fraldas descartáveis. Eram aquelas fraldas de pano enormes que
tinham que ser lavadas todos os dias. E assim, não tinha outra forma de ser. Ao
amanhecer os lençóis estavam todos molhados. E fazer o que, não é?
Alice, Paulo, Ana Paula e Bruna
Eu
trocava as fraldas de dia e muitas vezes de madrugada, na maior felicidade do
mundo porque a Dayse tinha o trabalho de cuidar das crianças o dia todo que não
era fácil mesmo com a assistência das secretárias. Certa vez, o Sérgio que era
um comilão, flagrei as duas horas da madrugada com sua a mamadeira na boca e
numa das mãos estava segurando a mamadeira do Paulinho.
E
não é que ele mamou as duas todinhas e voltou a dormir. Mas na hora que
terminei de trocar as fraldas do Paulinho e ele foi pegar a sua mamadeira,
pensa num "puta pau" ou "cacete" que rolou briga para lá e
para cá. E rapidamente apartei e disse "Pera aí colegas se acalmem".
Enfim, lá estava eu na cozinha preparando uma nova mamadeira para serenar a
noite.
O
Paulinho para dormir quando bebê dava um show, sua cama devia ter espinhos ou
pregos, era só deitá-lo na cama e já abria o choro. Então, eu e a Dayse dávamos
umas voltinhas de carro. Então, ele adormecia e dava aqueles roncos infantis e
nós ficávamos felizes e voltávamos para casa. E era só colocar no berço com
todo o cuidado que o Paulinho despertava e soltava o choro e o berro novamente.
“Porra meu! PQP! Era para se lascar!" Mas fazer o que?
Alinne e Alice – Natal em casa -
2023
Todos
os três chuparam as lendárias chupetas. Enquanto isso eu e a Dayse antes de
sermos vítimas dos horrores de quando uma vinha a perder, já nos preveníamos em
termos guardado algumas de reserva. Porque era um escarcéu, uma gritaria geral,
era algo ensurdecedor. Colocávamos mais de uma pendurada na cabeça de uma
fralda e sempre tínhamos algumas estrategicamente escondidas, porque não perca
de uma, sempre tínhamos uma reserva.
Claro
aprendemos isso com a experiência das primeiras chupetas perdidas. E a criança
não pode ficar pendurada no bico do peito da mãe o dia todo. E elas gostam de
um consolo e adormecem fácil. Por outro lado, nenhum dos três chupou dedo,
porque acaba prejudicando a arcada dentária.
O
Paulinho sempre foi muito sapeca e peralta, um menino muito ativo. E com dois
anos já nos deu enorme preocupação para não dizer um susto. Isto porque teve
que fazer uma cirurgia em razão de uma hérnia escrotal. E o Dr. Joaquim
Abrantes fez a operação no início do seu plantão de forma que pode acompanhar
toda a sua recuperação nas horas seguintes no antigo Hospital Geral do
Jaboatão. E no dia seguinte venho para casa para dar a sequência de sua
recuperação. Mas eu e a Dayse, ficamos muito preocupados porque foi a primeira
vez que havíamos passados por tamanho desafio com um de nossos filhotes.
Sérgio Filho, Paulo Neto e Paulo – Festa de São João na fazenda
Num
domingo à noite, estávamos assistindo o programa do Flávio Cavalcante e o
Sérgio com seus dois aninhos estava trajado com sua roupinha de lã e passeando
pela copa e cozinha. E tinha uma chaleira no fogão fervendo a água para
preparar o café. E o Sérgio foi lá para cima do fogão. A tampa do fogão caiu em
cima da chaleira. E nisso o acidente já tinha acontecido, a água quente foi
todo em cima do Sérgio. Fomos para o Hospital e voltou para casa todo cheio de
gases contra queimaduras. E graças a Deus hoje ele não tem uma cicatriz sequer
daquele triste acidente.
Naquela
época trabalhava de dia e a noite fazia alguns bicos. Então os bicos que
esperassem, meus filhos tinham prioridade. Teria que esticar um pouco madrugada
adentro na prancheta. E no dia seguinte às 06 horas já tinha que estar em pé
para ir para a Siderúrgica. E o pior que os meus bicos nem sempre recebia meus
honorários, não tinha tempo para correr atrás para cobrar, também não tinha
celular e principalmente não tinha a experiência de como fazer os contratos e
as cobranças.
Netos Queridos: Bruna, Alice, Sérgio Filho e Camila
Por
outro lado, cada projeto que fiz serviu como bagagem e expertise necessária
para formar o profissional que solidificou o profissional que sou hoje. Sempre
pensei assim "Melhor alguém ter deixado de me pagar do que eu deixado de
ter entregado um projeto a alguém ou deixado de pagar algo a
alguém!"
A
paternidade para mim foi uma gratificação que não tem preço. Sou enormemente
feliz por ter cada um deles ao meu lado. Evidentemente sou realista e reconheço
que os três tendem ter maior carinho a Dayse do que ao pai. E compreendo isso
como algo natural. E por outro lado, isso não me importa. Não sou ciumento. Não
tenho inveja ou coisa alguma. Dou muito amor a todos eles. Sou o pai deles e
eles me respeitam e me amam cada um da sua forma e do seu jeitinho. Tomo a
benção deles e eles me beijam na testa.
Sempre
procurei utilizar da melhor forma o meu tempo quando estava em casa para curtir
com os filhos. Sempre gostei de fazer o Gagau, que era na verdade a mamadeira
ou simplificando o mingau. Apesar de eles nunca terem comido mingau. Sempre
fizemos mamadeiras com toda a cautela, muito bem esterilizadas, com as fraldas
muito bem-preparadas, bem sequinhas e aromatizadas.
Bruna, Sérgio Filho, Papai Noel, Alice, Camila e Paulo Neto
Sempre
quando estava em casa, procurava me ocupar com a complementação dos estudos de
meus filhos, apesar de terem aulas particulares em algumas disciplinas com uma
professora do próprio colégio. Porque assim tudo ficava mais fácil o
aprendizado, de forma que estava muito bem alinhado o estudo do colégio com o
estudo complementar particular extracurricular.
Sempre
compreendi que dinheiro gasto com estudo acima de tudo é um investimento e
jamais uma despesa, além de uma forma de amor e carinho para os nossos filhos
amados. E era em razão disso que me sacrificava de dia e de noite trabalhando.
Meu maior patrimônio sempre foram meus filhos. Eles foram o edifício que
durante décadas projetei na prancheta. E hoje os três edifícios estão
prontos e muito bem-acabados. Cada um possui um lindo bosque e já produzindo
lindas flores e frutos. Agora, só resta a mim e a Dayse sentar e contemplar
nossas obras de artes.
Nossos
filhos aprenderam a andar de bicicleta praticamente sozinhos. Claro, as
bicicletas tinham as rodinhas auxiliares e num piscar de olhos as rodinhas
sumiram e eles já andavam sem elas. Sempre foi um sonho para toda a criança
andar de bicicleta.
Alice, Paulo e Sérgio Filho
Então,
primeiro eles praticavam com as duas rodinhas, depois na verdade não sei quem
que retirava uma das rodinhas, e eles ficavam andando mais um tempo. Para então
a segunda rodinha ser encostada. E desta forma, foi com cada um de meus filhos
gradativamente. Primeiro com o Paulinho. Tempos depois com o Sérgio e um pouco
mais tarde com a Ana Paula. E quando não havia mais as duas rodinhas era tudo
festa. Essa gurizada é muito festeira e arteira.
A
Ana Paula nunca gostou de jogar bola. Mas o Sérgio e o Paulinho aos sábados e
domingos quando eu estava disponível, nós íamos jogar bola na Praia de Boa
Viagem. Começávamos bem cedo, às sete da manhã. Lembro como se fosse hoje,
passávamos a manhã inteira jogando bola.
Sérgio Filho, Alice, Ana
Paula e Michele
Eu
cansava e me deitava, sentava mais um pouco, tomava um banho de mar, jogava
mais um tanto, e repetia o ciclo. E os dois gostavam de estar com o pai e da
brincadeira. No meia da manhã a gente comia uma fruta. E assim até o fim da
manhã. Voltávamos para casa ao meio-dia, tomávamos aquele "puta"
banho. Almoçávamos com toda a família reunida.
E
agora eu pensava. Eles estão cansados e irão descansar um pouco. Ledo engano!
Imagina, descansar "breu”. Aqueles dois não cansam nunca.
A
bateria deles não descarregam, não acabam! O "couro começava a comer
novamente!" "Meu Deus do Céu tenho que contratar um guri igual a
eles. Porque o remédio para um arteiro e outro arteiro, é outro guri!" A
energia desses dois não era fácil. Graças a Deus os meus três filhos sempre
tiveram uma saúde espetacular.
Paulo Neto e Paulo Filho
O
melhor remédio para uma ótima saúde das crianças chama-se o
"alimento". E na nossa casa nunca faltou o feijão, arroz, macarrão,
carne. Só que as verduras eles não gostavam. Então a solução era a esperteza do
disfarce.
Fazíamos
as verduras no vapor cozidas e passávamos tudo no liquidificador e por fim
misturava no arroz, no macarrão ou no feijão e dessa forma todos comiam
tranquilamente, sem que eles ficassem catando no prato pedacinhos de tomate,
pimentão ou cebola.
Meus
filhos já não tiveram o privilégio das brincadeiras de rua, nem imaginam o que
foi brincar de bola na rua, soltar pipa, pique esconde, polícia ladrão e tantas
outras brincadeiras saudáveis da minha geração. E meus netos nem se comenta,
são da geração do vídeo game e do celular. Então, a pipa já era proibida em
virtude da fiação elétrica.
Jogar
bola na rua muito menos, ou jogavam comigo na praia, no colégio onde estudavam
e última alternativa no Clube Náutico Capibaribe, no qual eu sou sócio a muitos
anos. Onde sempre frequentaram as piscinas.
Ana Paula, Alice e Alinne
Tinha
também o remo e depois formou um time de futebol, onde o nosso Clube já
completou mais de cem anos, isso não é para qualquer um não. Onde vermelho e
branco são as cores dele. Aqui em casa, todos somos alvirrubros, e ai de quem
não quisesse ser porque eu teria uma conversinha de cantinho.
Os
meninos também gostavam de jogar bola de gude. Claro às vezes acontecia algumas
discussões entre a gurizada, mas nada com maior seriedade. E todos viviam
perambulando por aqui e por ali com os pés no chão, sem nenhum chinelo. A
gurizada sempre gostou de fazer e na verdade precisa fazer para ter o contato
com a terra. E vez por outra por aqui aparecia o famoso tal do "bicho do
pé". Esse é danado, porque coça muito e é difícil de retirar. Tem que ser
com aquelas agulhas esterilizadas, e depois de tirar, limpar bem com álcool,
água oxigenada e depois passar o Merthiolate.
Já
esportes eles não eram apaixonados como a juventude é hoje. Gostavam de jogar
tênis, acho mais para me acompanhar no clube e como "curtição", nada
mais que isso. O Paulinho no Colégio Marista até jogava futebol de salão, mas
também de forma de curtição, sem aquela paixão e rigor. Nenhum deles seguiu o
esporte como principal meta. Praticavam na escola apenas como disciplina
curricular. E naquela época também não existia a difusão dos esportes e das
academias como existe hoje, na sua valorização pela saúde.
Ana Paula, Paulo e Paulo Filho
Sempre
gostei de levar a família para jantar fora num restaurante japonês e ao dar a
gorjeta gorda, tipo 50 reais, os funcionários vibravam e vinham agradecer. Meus
filhos Serginho e Paulinho, pequenos na época, pediam que em todos os
restaurantes que fôssemos eu deixasse gorjeta igual. Realmente eu acho justo
remunerar as pessoas por um bom serviço. Isso já era uma forma de educar meus
filhos, para compreenderem quando o serviço é bem realizado e quando não o
é.
Os
três fizeram Primeira Comunhão, até porque nossa orientação religiosa é
católica e assim cumpríamos com os ritos da Igreja. Todos eles foram batizados
direitinho. Todo tem fotos da Primeira Comunhão. Todos casaram também seguindo
a tradição do catolicismo.
Tudo
de forma natural: "Beijo pai!" "Pai te abençoa!"
Estranhamente quando estou com meus amigos e eles testemunham esse fato de um
homem de cinquenta anos e de dois metros de altura vir a beijar um velhinho e
lhe pedir a benção, ficam evidentemente de água na boca, porque acredito que
eles não tenham essa felicidade e se tem nunca me disseram.
Paulo e Paulo Neto
E
meus filhos como todos os demais meninos só mudam de filiação e endereço.
Garotos tem parceria com traquinagem, nunca vi coisa igual. Certa vez o Sérgio
quando tinha uns oito anos estava de férias e o funcionário da telefônica
estava no bairro realizando algum trabalho nas linhas fixas que custavam uma
verdadeira fortuna e poucos eram os privilegiados que podiam ter um telefone em
sua casa.
E
o Sérgio desconversou o funcionário e pegou carona com o carro com ele. Com o
tempo a Dayse percebeu sua ausência e ficou desesperada. Revira a casa, a rua e
a vizinhança e ninguém sabia do paradeiro do menino. Lá pelas tantas, horas
depois chegou o funcionário para devolver o Sérgio.
Esse
menino era tão desenrolado com as pessoas que conhecia até a rapaziada dos
garis. Que ele chamava de "tio do lixo". Uma vez o Sérgio em nossa
casa em Boa Viagem, perguntou ao gari se ele queria beber um copo de um bom
whisky escocês de vinte anos, e o gari não se fez de rogado e empinou num trago
só a dose que meu filho lhe deu. A noite quando cheguei em casa do trabalho meu
filho me contou feliz da vida sua proeza e me disse que "ele havia lambido
os beiços" e eu lhe falei: "Mas que gracinha...."
E
vá lá explicar a ele que o rapaz estava em horário de trabalho e não podemos
fazer as coisas assim, ficar dando as coisas. Daqui a pouco vou chegar em casa
e não tem mais a televisão porque ele deu para o carteiro. Enfim, "coisas
da vida!"
Educamos
nossos filhos com base no catolicismo, com muita devoção nas imagens,
fotografias e desenhos de Jesus Cristo, Maria, São Pedro, São Paulo. As imagens
eram cobertas com um tecido de cor rocha ou lilás. E no meu tempo de criança no
Sábado de Aleluia, a criançada acreditava se o Padre não viesse a encontrar a
palavra "Aleluia" na Bíblia Sagrada durante a Missa o mundo iria
acabar, vejam só a nossa santa ignorância.
Alice, Paulo e Sérgio Filho
Digo
ignorância porque nunca nos foi ensinado isso. Mas era passado de criança para
criança esse temor, de rua em rua, de sala em sala de aula. E para complicar
mais ainda o nosso medo não é que o Padre demorava para encontrar a palavra
"Aleluia". São as coisas da vida.
Na nossa casa, eu e a Dayse sempre fizemos questão
absoluta de fazer uma celebração de uma Páscoa bonita, com ovos de chocolate.
Eram aquelas surpresas que todas as crianças gostam e são uma época tão linda.
E na época do Natal sempre havia uma bela árvore de Natal que veio do exterior
e comprei também um presépio e na nossa porta colocávamos um enfeite com as
cores caraterística natalinas. As duas festas sempre foram de bom tamanho, com
muita alegria das crianças. Tanto a Páscoa e o Natal sempre tiveram o espírito
religioso cristão dentro de nossa família também. Quando os filhos cresceram um
pouco mais, começaram a vir outras pessoas a comemorar o Natal aqui em casa
também.
Ana Paula, Alice e Sérgio Filho
Montar
a árvore de Natal será uma lembrança eterna de alegria e realizações. A
criançada ainda era pequena. Era uma festa e uma folia. Para as crianças era um
encantamento montar aquela árvore enorme dentro de casa e ficar decorando-a com
dezenas de bolinhas e enfeites na nossa sala.
Era
muito bom estarmos todos juntos nessa atividade. E com o tempo adquiri um Papai
Noel do meu tamanho que ele anda e fala algumas poucas palavras. Hoje eles
estão todos casados e não mais participam da montagem, chegam em nossa casa com
tudo pronto e passamos a ceia de Natal todos juntinhos.
Atualmente
casa fica lotada. Vem os três filhos, os netos, alguns convidados especiais de
cada um dos filhos, e claro a nossa secretária Joselene e sua filha Aline que
considero como neta de coração. E claro sempre ocorre as trocas de presentes e
nunca falta uma boa comida acompanhada de uma excelente bebida. É tanta comida
que no outro dia nem precisamos pensar em fazer alguma coisa.
Bruna e Paulo
E
porque não dizer que essas festas ao lado da Dayse e dos meus filhos e do resto
da família, principalmente agora com os netos e noras e genros me enche o
coração de alegria. Nunca tive essa realidade de emoção quando criança. Hoje
estou realizado como membro de uma família completa. Ter os filhos ao meu
redor. A netalhada fazendo aquela bagunça também. E que venham muitos e muitos
Natais e Páscoas para serem celebrados por todas nossas famílias.
Nos
primeiros anos de casamento, fazíamos ceia de Natal em Recife ou Maceió, com as
famílias de meus irmãos que ainda estavam por lá e com a segunda família de meu
pai. E assim, levávamos os presentes que trocávamos com os amigos e
familiares.
Lúcia e Beatriz – Irmã e Sobrinha – Vancouver
Canadá
Meus
filhos nunca foram enganados sobre a história encantada do Papai Noel que vinha
com um trenó voador puxado por renas do Polo Norte ou os ovos de Páscoa eram
trazidos por um coelhinho todo branquinho como a neve numa cestinha. Até porque
tudo isso seria conversa mole para boi dormir e eles provavelmente iriam
descobrir que tudo isso era mito mais cedo ou mais tarde.
O
espírito religioso prevalecia sobre o comércio. Hoje muitas pessoas nem lembram
mais o significado verdadeiro da Páscoa e do Natal, que é o nascimento e
morte do nosso Senhor Jesus Cristo. Só lembram do ovo de chocolate, do coelho,
da árvore e do Papai Noel. São novos tempos e novos valores.
Hoje
os tempos são diferentes. A Páscoa é um verdadeiro carnaval nas lojas. Tudo é
comércio, os corredores dos supermercados os ovos de chocolate estão todos
dependurados as centenas, senão aos milhares. Diversas marcas, tamanhos e
cores.
É
um corredor de alegoria, ou melhor nessa época levar uma criança ao
supermercado é pedir para passar mal. Na minha época e dos meus filhos não
existia essa oferta, tudo era mais discreto a comercialização, eram poucas
marcas e com poucas opções.
Paulo e Alice
Da
mesma forma o Dia das Crianças sempre foi comemorado. Também era tudo festa,
eles todos pequenos. Aliás era outra festividade sempre aguardada por eles, até
toda meninada esperava esse dia com aquela expectativa de ganhar um brinquedo.
Já sabiam que viriam os presentes e não tinha como ser diferente. E eu e
a Dayse não podíamos frustrar as expectativas deles esmorecer. A Ana Paula
sempre desejava uma boneca. E os meninos queriam principalmente os
carrinhos para brincar.
Os
meus filhos sempre estudaram em colégios com fundamentos religiosos e
particulares. Começaram bem cedo na escola, já com dois anos de idade iniciaram
sua vida escolar. No primeiro dia, claro havia aquela certa dificuldade da
separação da prole com a mãe.
No
terceiro ou quarto dia já nem mais queriam a mãe. Já entravam correndo atrás
dos amiguinhos ou amiguinhas. E já sabiam que a lancheira carregada era o que
importava. Os três se socializavam rapidamente como toda criança e aqui não
seria diferente.
Primeiro
estudaram no Colégio Mini Doutor, muito lindo, onde a diretora proprietária
além de pedagoga era psicopedagoga. Ocorriam festinhas de Dia das Crianças e de
conclusão do curso de “Doutor do ABC". A proposta era o Projeto Pedagógico
Montessori e além do mais era perto de casa, facilitando o trabalho para levar
e buscar. E em qualquer eventualidade em minutos estávamos no colégio para
atendermos.
Maravilhoso
foi a formatura, com direito a toga, boné e até com anelzinho. Muito felizes
eles foram graduados no primário. Imagina eu e a Dayse vivenciando tudo isso.
Nos sentíamos tão felizes com tudo aquilo. Coisas maravilhosas que não pude ter
na minha infância.
Os
três sempre realizaram seus estudos e os trabalhos escolares em seus próprios
quartos, como cada um tinha sua própria suíte muito bem iluminada, ventilada e
bem silenciosa. Ou seja, um ambiente propício para o estudo. Inclusive suas
namoradas aproveitavam para estudar lá. A Patrícia passava o dia todinho
estudando. Nunca vi uma pessoa para gostar tanto de estudar.
Meus
filhos tiveram a satisfação de estudar no Colégio Marista e pude encaminhar
para formações acadêmicas. Procurei passar a eles os ensinamentos que a vida me
ensinou como a ética, a honestidade, a religiosidade e os princípios da
família.
E
foi com minhas experiências de vida que escolhi para nossos filhos a proposta
pedagógica do Colégio Champagnat Marista que promove o diálogo entre as
ciências, as sociedades e as culturas sob uma perspectiva cristã da realidade.
Onde tem o propósito de formar pessoas felizes, éticos, solidários e
comprometidos com a sociedade. É uma Instituição Internacional, fundada em 1817
na França por São Marcelino Champagnat.
Curiosamente
não lembro por qual razão o Paulinho e o Serginho estudaram um ano no Colégio
Anchieta e foi lá que resgataram um passado do pai, os dois tocaram na Banda
Marcial da escola, que era diga por passagem era uma "Puta Banda",
uma maravilhosa banda. E foi um orgulho para o velho aqui ver os dois tocarem
na banda. Os dois tocavam instrumentos de percussão. Um tocava um instrumento
semelhante a um tarol e o outro filho era um surdo de marcação, com as baquetas
em batidas repetidas.
Sobrinhos do Macapá André
Gustavo e Andréia
Nas
férias. As férias, Claro as férias. Não posso esquecer das férias tão desejadas
por eles e pela Dayse. Risos. Sempre que eu estava trabalhando distante de casa
e eles de férias, num piscar de olhos as malas já ficavam prontas para todos
irem ao meu encontro.
Certa
vez indo a São Paulo num DC3 da Vasp ficaram felizes e tal e fui buscar todos
no aeroporto, no carro era só alegria e fomos para o hotel. Cada um queria
contar a sua experiência do voo. Tudo havia sido fantástico e esplendoroso. No
hotel a Dayse utilizava os serviços de um taxista recomendado para levar ela,
as crianças e a sua prima Carminha para cima e para baixo nos diversos
passeios.
Certa
vez fomos ao Play Center em São Paulo, era o paraíso das crianças. Lá elas não
cansavam nunca. Eram imbatíveis. Também tinha de tudo. Enormes tobogãs, um
enorme foguete espacial, uma roda giratória que ficavam sentadas mais de vinte
adolescentes que mais parecia um disco voador e ficava girando e tremendo, só
faltava decolar pelos céus de São Paulo, coisa de doido. E a montanha russa
daquela época era a epopeia do surrealismo daqueles tempos da emoção, tinha
barquinhos em formato de troncos navegando em um riozinho artificial.
Marquito e Daniel – Em Memória
Os
empresários tiveram até a ideia de inventar um teleférico para rodar ao redor
de todo o parque, show com uma orca e golfinhos, até o boneco do filme do King
Kong trouxeram para o parque.
Mas
inesquecível mesmo eram as intermináveis filas. Tinha fila para tudo. Para
qualquer brinquedo tinha fila. Para ir ao banheiro, para comprar um lanche. Nunca
vi na minha vida um lugar para ter tanta fila e o povo todo feliz da vida. Jurei
nunca mais voltar naquele lugar. E não voltei mesmo.
Então orientava o motorista português Ezidrio, que era natural da Ilha da Madeira, para levar o pessoal para onde quiserem ir e você também pode sugerir outros passeios aqui em São Paulo para eles. Assim, foram no Play Center, no Zoológico, Jardim Botânico. Claro que para eles a melhor atração era o Play Center. Eles nem se importavam com as filas.
Tinham
o dia todo para brincar, e quanto mais esperavam nas filas, mais
cachorros-quentes e pipoca podiam comer e refrigerantes e sucos para beber. E
sabe-se lá por onde mais eles andaram? Me sentia feliz em poder proporcionar
tudo isso aos meus filhos e a Dayse.
Sérgio Filho e Alice
E
a criançada viajando de avião de primeira classe desde pequeno. Imagina eles lá
trás na classe comercial. Com as poltronas mais apertadas. Meus filhos
danadinhos como eram, formando uma equipe da bagunça dentro do avião. O avião
em época de férias, abarrotado de crianças. Então, formando amizades a bordo,
um subindo nas poltronas dos outros, chamando as comissárias, acendendo as
luzes, correndo no corredor, uma barulheira. Além das crianças de colo chorando
e as mães desesperadas trocando fraldas. E não demora muito para virar
uma bandeja de refeição no colo de um passageiro engravatado. Isso não iria dar
certo não.
Nos
finais de semana em que estava em casa, eu e os meninos íamos ao Estádio dos
Aflitos assistir o nosso time Clube Náutico Capibaribe, de cores vermelho e
branco. Inclusive temos o título de hexa campeão, onde costumamos aqui dizer
"hexa é luxo", onde só o "timba" tem. Timba é o Capibaribe
Premiado!
Paulo
Roberto Jr e Patrícia
Certa
vez num jogo que estava o famoso Rivelino no time do Fluminense o Sérgio
comendo um enorme sanduíche disse "Painho esse goleiro Rivelino é bom
né?" O Paulinho nem me deu tempo para responder e já meteu a palavra de
correção "Meu cacete, Rivelino não é goleiro não! Ele é atacante!" Eu
ali olhando os dois, achei foi graça.
A
Ana Paula desde a cartilha de alfabetização do "abc", já fazia o
balé, com uma roupa de cor de rosa, com um coque no cabelo e com as sapatilhas.
E cada dia a Ana Paula ia aprendendo novos passos e melhorando os que já tinha
aprendido. E assim, ela ia evoluindo dançando e voando nos seus passinhos
pequenos e na sua elegância. Eu ficava admirando e fascinado por toda sua
leveza, elegância e glamour que ela tão pequena já demonstrava em toda sua
maestria para uma bailarina.
A
filha mulher é diferente do menino. Enquanto os rapazes você simplesmente
coloca um calção, uma bermuda, um chinelo e olha lá vez e outra passa um pente
nos cabelos. Com as meninas é diferente. Tem que lidar com mais carinho, mais
meiguice. Até porque para ela saber desde cedo sobre toda a feminilidade se dá
início na época de criança, desde guriazinha. E Ana Paula era prendada ficava
linda.
E
como toda menina daquela época, não só daquela época na verdade, as moças
diferentes dos rapazes, tem todo o ritual da vestimenta, com lindos vestidos,
preparação dos cabelos, batom e outras coisas tais e quais. Não é por nada que
as mulheres demoram horas para se arrumar.
Sobrinhos Lincolim Mendes e Esposa - 2022
Sempre
tínhamos jogos de tabuleiros para todos brincarmos e inteirarmos juntos.
Ficávamos um bom tempo no "pega vareta" ou como muitos chamam de
"pega palito", era uma parada federal, conseguir tirar os palitos sem
mexer nenhum outro.
Jogávamos
também o "futebol de dedo" ou "futebol de prego", que
consistia em montar numa plataforma de madeira um campo de futebol onde os
jogadores eram pregos fixados na madeira, o campo todo era cercado com travessa
de madeira e a bola era uma moeda. Havia as goleiras e jogávamos empurrando com
um dos dedos. Era um campeonato federal. Era uma brincadeira artesanal.
Com
os jogos lúdicos eles estavam sempre atentos a tudo e sempre aprendiam alguma
coisa e no artesanato também se aprende. As crianças também tinham os
brinquedos da Estrela, que na época era a maior fábrica de brinquedos. A Ana
Paula tinha vários jogos mais voltados para meninas. Mas havia uma norma dentro
de casa, onde somente podia brincar após que todas as tarefas escolares já
estivessem devidamente realizadas.
Sérgio e Michele
Tenho
que ser honesto na minha biografia, eu tinha dificuldade para brincar com minha
filha Ana Paula e isso de forma alguma não era porque amava menos ou de uma
forma diferente, minha querida filha. Fui educado em outros tempos, sem uma
mãe, sem um amor paterno, sem um cheirinho, apanhando de meu pai e com um
aprendizado machista acima de tudo. Então isso tudo de certa forma dificultou
para eu brincar com minha filha.
Hoje
vejo os pais homens brincarem com suas filhas com bonecas, deixam ser maquiados
por elas, acho tudo isso incrível, isso é um amor, é uma nova geração com novos
valores. Queria ter feito isso com a Ana Paula.
Brincar
com meus três filhos sempre era uma alegria, era a oportunidade para regressar
aos meus tempos de infância quando brincava com meus amigos e colegas de
colégio. E após as nossas brincadeiras eu sempre dava um beijo em cada um de
nossos filhos.
A
Ana Paula era fascinada por bonecas, tinha a coleção completa da Barbie. Sempre
que eu voltava de minhas viagens, trazia alguma coisinha para cada um dos três.
Se achava que podia comprar e trazia mesmo. Todas as noites que estava em casa
sempre fazia uma oração no quarto com eles, abençoava, fazia o Sinal da Cruz e
dava um beijo na testa de cada um deles. E sempre pedia a Nosso Senhor Jesus
Cristo que Ele cuidasse de meus filhos, porque Ele é Onipresente, Onipotente e
Ele é tudo. Para mim ele é tudo, e todo o resto vem depois dele.
Todos
os três sempre andavam muito bem-vestidos, devidamente bem banhados, usavam
sabonetes Johnson pompom, fragrância Johnson Baby. Tudo sempre direitinho e
limpinho. Sempre cuidando para evitar qualquer probleminha como os piolhos. E
se pegassem era uma verdadeira maratona. Naquela época havia o famoso pozinho
chamado "Neocidi" que era o único remédio naqueles tempos. Colocava
na cabeça e depois de um certo tempo lavava a cabeça da criança com o pescoço
para trás para o remédio não escorrer nos olhos.
Soube
superar a herança que recebi na infância, que serviria como exemplo para ser
pai de meus filhos. Pelo contrário, sempre soube sentar-me com meus filhos,
conversar com eles, estar com eles, brincar com eles e dizer a eles que os
amava. Expressar meu carinho e amor não só com palavras, mas também com
gestos, como um beijo e um abraço. Nunca precisei bater neles. Quando estavam
errados, uma conversa franca sempre foi a melhor solução.
Dos três filhos o mais namorador e raparigueiro foi o Sérgio. Aqui em Recife a gente costuma dizer que o “rapaz raparigueiro não pode ver uma calcinha no arame secando que já liga o radar procurando a moça para namorar!” Mas todas as fases na vida têm sua idade. Tudo isso passou, e claro, hoje eles estão muito bem-casados, tem suas famílias, seus filhos, são todos muito felizes e com a Mão de Deus sobre eles.
Paulo Neto e a Governadora de Pernambuco Raquel
Lira - 2023
O Sérgio e o Paulo não serviram nas Forças Armadas,
foram dispensados por excesso de contingente, tendo se apresentado na
aeronáutica por conta da minha amizade com o oficial Dantas que hoje ele é
coronel reformado. De certa forma foi bom eles não terem realizado o serviço
militar porque vida militar tem os seus caprichos e a rigorosidade no seu
ensinamento. De toda forma, eles aprenderam tudo isso independente de ter o
passado pelo serviço militar obrigatório.
Nenhum dos três vislumbrou a possibilidade de morar
ou estudar fora do Brasil. Naquela época a informática estava engatinhando, o
mouse ainda estava a ser inventado. A informática estava chegando devagar, eram
computadores lentos, uns tais de "IBM" e "XT".
Quando chegou a internet tempos depois deles já
estarem formados chegou um tal de "CADE", foi o bisavô do Google.
Então, nem se falava sobre "intercâmbios" na América Latina. Sei que
na Europa já existia.
Naquela época morar em outro continente não era
como hoje, que existem centenas ou milhares de brasileiros. Sem internet, sem
celular, sem Whatzapp, sem vídeo chamadas. Não existia toda a facilidade de
hoje. A Internet e as Instituições proporcionaram aos jovens a abertura e
facilidade do mundo. Hoje os jovens podem saber antes e interagir com as
famílias "adotivas" de outros países que irão receber nossos
filhos. E com os preços baratos das passagens aéreas os pais podem visitar
seus filhos anualmente.
Alice e Paulo – Praia de Boa Viagem - 2011
Assim, nunca teve essa ideia e ainda bem que nada
disso foi vislumbrado ou foi posto em prática. Imagina se acontecesse algo
com eles lá fora? E mesmo se não acontecesse, como seria ter um filho no
exterior? Com comunicação cara de telefone convencional? Nem posso imaginar
como seria pagar as despesas daquela época.
E na pior das situações se viesse a ocorrer uma
loucura como anda acontecendo nos dias de hoje, não teríamos nada a fazer para
socorrer. Ainda bem que naquela época nada disso foi cogitado e muito menos
colocado em prática.
No aniversário de quinze anos da minha única filha
Ana Paula, mandei fazer um Summer em São Paulo. Teve uma festa de princesa,
baile com troca de roupas e sapatos. Coloquei anel no dedo da minha filha
amada! Felicidade proporcionar essa alegria a ela! Ah, na viagem nós
fizemos aos Estados Unidos, trouxemos para Ana Paula um óculo com limpador de
para-brisa, bobagens que todas as meninas gostam …
Paulo e Alice
A esposa do meu filho Paulo tem uma propriedade em
Limoeiro. Na época de festas juninas nos reunimos lá, armamos fogueira e
soltamos fogos. Certa vez ele recebeu amigos e a casa ficou cheia. Com isso fui
dormir na rede do lado de fora.
Quase fui carregado pelos mosquitos!!
O aniversário do meu neto Sérgio foi no clube do Serpro quase até as vinte
e três horas. Essa gurizada adolescente, luzes apagadas e alguns
amassos. Tive saudade da minha juventude, outros tempos e com outros
namoros.
Ana Paula Mendes
O Paulinho é arquiteto de formação, um profissional
muito bem relacionado, é gerente comercial de uma empresa muito grande cuja
matriz é no Estado do Ceará. Ele trabalha na Filial de Recife, que tem outras
duas filiais em São Paulo e Salvador. Onde viaja muito para exercer
os ossos do ofício. Acredito que ele herdou parte desse profissionalismo do
pai.
O Sérgio sempre falou em fazer arquitetura ou
engenharia, mas sua praia sempre foi comunicação e vendas. Hoje trabalha
comigo, sendo meu sócio, coordena a área de captação de projetos e toda a área
comercial e administrativa. É muito eficiente em todas suas atribuições dentro
da empresa, independentemente de ser meu filho. Fico muito despreocupado com
sua gestão e suas decisões, já provou inúmeras vezes sua competência
profissional.
Minha querida filha é uma esposa e mãe exemplar.
Sinto orgulho da mulher extraordinária que é! Professora com dois empregos
muito dedicada a profissão. Inclusive com vários cursos de pós-graduação em
Tecnologia da Informação. É gerente do laboratório de informática do colégio
onde trabalha a mais de vinte anos.
Camila Mendes
Também é a minha companheira de consultas médicas e
enfermeira quando precisei de cuidados com curativos numa cirurgia nas pernas.
Minha Ana Paula querida! Pouco tempo atrás a ouvi comentar: “Sou como meu pai,
sou íntegra e tenho caráter!” Me emocionei até as lágrimas!
Outra alegria minha é que nunca quis influenciar o
destino de nenhum de meus filhos. Cada um seguiu o caminho que achava que fosse
o melhor para eles. Apenas jamais me furtei de bancar a faculdade deles. Porque
a faculdade federal a média de vagas por candidatos são 60 para uma vaga.
Então ficava muito difícil a concorrência numa
disputa dessas, e na maioria preenchida por pessoas ricas que tem possibilidade
de estudar com melhores condições. E a minha maior preocupação era que eles não
deixassem de fazer a universidade, mesmo que tivesse que arcar com os devidos
custos. Para o estudo deles nunca medi esforços do meu trabalho. Se tivesse que
virar a noite trabalhando, virava como virei trabalhando inúmeras noites como a
maior satisfação.
Ana Paula e Mariana
Hoje estou realizado, os três estão diplomados e
trabalhando. E acima de tudo com suas famílias e da mesma forma criando seus
filhos. Todos estudaram em ótimos colégios. E todos se graduaram e se pós
graduaram. Já que não pude me pós graduar e nem mesmo pude fazer a cerimônia de
graduação, tive o prazer de proporcionar aos três essa satisfação e que ninguém
poderá jamais tirar deles o conhecimento adquirido.
Fiz com muito carinho e com muito prazer e faria
tudo novamente se fosse necessário. Porque não me arrependo jamais do meu
esforço para eles terem se graduado.
Num fim de tarde estava retornando a minha
residência e aproveitei para passar no trabalho de minha filha Ana Paula
no bairro Boa Viagem, zona Sul de Recife a duas quadras do mar para
voltarmos juntos para casa. Estacionei o automóvel Gol branco e novo,
fiquei aguardando dentro do carro com o meu vidro aberto. Alguns minutos após
fui surpreendido por dois assaltantes armados com revólveres, um de cada lado
do veículo.
Paulo e Dayse
O que estava ao lado da minha porta, estava com a
arma apontada para minha cabeça e ordenou que eu descesse e entregasse a
carteira e as chaves do carro. Ao descer do carro, tive uma atitude impensada
naquele momento, que certamente hoje não o faria novamente. Sendo um reflexo da
defesa. Na verdade, cada pessoa irá reagir de uma forma diferente, e talvez a
mesma pessoa irá reagir de formas diferentes em ocasiões diferentes.
Enfim, expus minha vida em risco, porque
propositadamente deixei cair ao chão um maço de cédulas de dinheiro, como se
decorrentes do meu nervosismo. O ladrão ao se abaixar, eu disse "Agora eu
piso na cabeça dele e um fica aqui!". Em segundos voltei a minha lucidez,
olhei para o outro marginal e o vi claramente com a arma apontada em minha
direção com a face do rosto muito séria e me transparecendo que iria apertar o
gatilho e talvez me matar. São estes segundos que fazem a diferença na nossa vida.
Mário Neto nosso Sobrinho
Pensei em minha família, em cada um dos meus
filhos. E o que esses dois miseráveis poderiam me levar? Algumas cédulas de
dinheiro e um carro! Enquanto meu maior bem estaria muito bem guardado e salvo,
minha família! Imagina se naquele momento minha filha Ana Paula estivesse
dentro do carro.
Então, que levem o carro! É claro que não reagi, o
ladrão rapidamente recolheu o dinheiro no chão, embarcaram no carro e sumiram
na avenida. Depois do ocorrido o segurança da loja apareceu todo preocupado,
dizendo que não interveio no assalto porque entendeu que sua intervenção
poderia colocar em risco minha vida.
Refeito do susto, telefonei para um amigo que
acionou um delegado da polícia civil, que providenciaram as buscas. Mas um
carro Gol Branco, era o que mais existia naquela época, e em poucas horas já
deveria estar desmanchado para revenda de peças. Considero que Recife tenha uma
boa estrutura de polícia. Tem um policiamento ostensivo a pé, de bicicleta, de
moto e de carro, com muitos distritos militares distribuídos na cidade. Além da
estrutura da polícia civil que também é grande.
A polícia tem a técnica de andar misturada no meio
da população sem farda ou qualquer outra coisa e até mesmo caracterizado para
tentar inibir as ações dos assaltantes. Mas infelizmente é a velha briga do
gato e do rato. Onde o rato sempre leva vantagem sobre o gato. O rato não tem
princípios, limites e leis a serem cumpridos. E o gato não dá conta em toda a
sua totalidade para pegar todos os ratos espalhados na cidade.
Valtecio e Ana Lúcia
Amigos do Ceara
E qual aprendizado temos disso tudo? A polícia está
muito certa em todas as suas orientações. Nós cidadãos do bem não estamos
preparados e treinados para reagirmos a estas situações. E mesmo se
estivéssemos não devemos expor nosso maior patrimônio em risco, que é nossa
vida. Em contrapartida, o marginal está preparado para tudo, inclusive está
preparado para morrer. Até prefere muitas vezes morrer a voltar para a prisão.
E muitos marginais realizam assaltos a base de
drogas ou então sem a menor experiência, assim extremamente nervosos e
ansiosos, onde a qualquer gesto da vítima podem acabar ocasionando um desastre
fatal.
O Paulo tem três filhos, a Bruna, a Camila e o
Paulo. O Sérgio tem o Sérgio Filho e a Ana Paula tem a Alice. E tenho a Aline
minha neta também do coração que cresceu dentro de casa e tem uma parte igual
do meu coração. Assim, atualmente tenho seis lindos, maravilhosos e
espetaculares netos.
Comandante e
amigo Luiz Antônio
Hoje
em dia as crianças são os netos, apesar que tem alguns que já estão com seus
quatorze anos, como o Paulo Roberto Ribeiro Mendes Neto que já é jogador
de futebol de campo pelo Sub 15 pelo Colégio Marista Dom Luís. O Sérgio Roberto
Mendes tem dezoito anos é universitário na faculdade de Ciências Jurídicas. Mas
para os avós todos eles são nossas crianças e todos os nossos netos e filhos
são todos amados por nós da mesma forma e tamanho.
A
minha neta Alice que terminou agora pouco o Ensino Fundamental e está cursando
Psicologia na Universidade Fafire. A Bruna também está terminando o
ensino médio para realizar o vestibular no ano que vem. E no fim de ano as duas
terão as provas do Enem. Já a Camila está no segundo ano do Ensino Médio,
mais um pouco entra na faculdade e pretende ser neurocirurgiã, para ser honesto
nem entendo bem como é isso.
Essa
menina é igual a mãe dela, estuda igualzinho a ela, é quietinha, calminha,
magrinha. É muito dedicada aos estudos. Acho até que ela estuda demais. Mas
ainda bem. E por último o Paulo Neto que está no Ensino
Fundamental. E estou muito feliz, porque todos meus netos são muitos
estudiosos, inteligentes, felizes e agraciados por Deus pelos pais que tem.
Paulo e Dayse
Compreendo que para o ser humano os sentimentos
deveriam ser iguais para ser um pai, ser um avo ou ser um bisavô. A alegria
deveria ser a mesma. Assim, claro que estou mais do que preparado para ser
bisavô. E se Deus assim permitir, irei desempenhar minha função de bisavô com
muito amor, com muito carinho, com muita lucidez e com a expectativa de quem
sabe poder contribuir de certa forma com um pouco do meu conhecimento. Espero
ter alguma coisa para poder transmitir para eles de uma maneira muito bonita e
muito sábia porque família é isso.
Muitas vezes fico meditando como será a vida de
meus netos e bisnetos. Quais novas invenções serão criadas? Hoje tudo mudo tão
rapidamente. Tantas coisas que no passado apenas era filosofado que um dia iria
existir e hoje além de terem sido inventadas já são até obsoletas. Já nem mais
comento da Inteligência Artificial, ela é o princípio de uma nova revolução. Da
mesma forma como foi a industrial e a da informática.
Será que irão inventar o
"teletransporte"? O "transporte e a vida em outros planetas e
galáxias”? Irão descobrir a cura do câncer, da aids e quais novas doenças
surgirão?
Talvez venha a existir novas coisas que nem podemos
sequer imaginar hoje. Já me dou por feliz. Passei por tantas evoluções. Agora é
a vez de meus filhos, netos e bisnetos vivenciarem tudo isso. Talvez até mesmo,
quem sabe a ciência não descubra a genética do ser humano chegar aos duzentos
anos.
Meus bisnetos talvez venham a morar em residências
nas profundezas dos mares? Ou flutuando sobre a superfície. Uma coisa eu sei
com absoluta certeza, o mundo de hoje não será mais o mesmo daqui a cinquenta
anos. Da mesma forma que não é mais o mesmo de cinquenta anos atrás.
A maior diferença nos dois espaços de tempos, é que
as mudanças hoje ocorrem de uma forma muito rápida. Eu fico muito assustado. E
a Inteligência Artificial irá acelerar mais ainda a velocidade das
modificações. Claro, para abreviar tudo temos a ação do homem, que pode colocar
tudo a perder e acabar destruindo o Projeto Planeta Terra de uma vez por todas
e dessa vez dizimando tudo e todos.
Por outro lado, recebi vários presentes de meus
três filhos, além é claro dos maravilhosos netos. Um deles foi a felicidade dos
três nunca terem chegado nem perto das drogas.
Onde tudo começa fumando um cigarro comum ou de
maconha de brincadeira. E de brincadeira as coisas vão descendo para o inferno
da cocaína e agora no crack e outras porcarias sintéticas e porque não dizer
outros venenos. Com aquela velha história machista que os jovens sempre acham
que podem parar quando bem entenderem.
Tudo mentira. Um amiguinho traz a novidade. Diz que
é bom, que amigo que é amigo tem que experimentar. E assim começa o jovem a se
enterrar num abismo que na maioria das vezes não terá um fim. Quando percebem
já é tarde. Nessa hora, quando os pais descobriram já é difícil de voltar a
trás sem uma ajuda profissional. Muitas vezes vendem tudo para ajudar o filho.
Outras vezes acabam caindo na marginalidade para financiar o maldito vício, e
daí o caminho é certeiro como sabemos e nem preciso falar.
Sérgio Roberto Mendes
Nem
mesmo um maldito cigarro comum, nenhum dos meus três filhos nunca tiveram
a ingrata curiosidade de querer experimentar, mesmo tendo a infelicidade de ter
como mal exemplo um pai fumante. Mas Deus agraciou a mim e a Dayse com esse
presente. E agora é mais difícil deles virem a ter qualquer vício ingrato, já
são adultos. Todos eles têm a cabeça boa e no lugar. Às vezes bebem um bom
vinho ou um whisky, mas ao que tange a fumar, graças ao meu Bom Deus, não
passam nem longe.
E
hoje eu rogo a Deus que meus amados netos tenham a mesma sabedoria que seus
pais tiveram, que sigam os exemplos de seus pais e se afastem dessa maldição e
que os anjos digam amem!
Para um pai ter um filho nessa situação é uma vida sem fim. Acabou a alegria dentro de casa. É uma agonia a cada anoitecer, é uma dúvida se o filho retornará ao amanhecer. A morte dos pais é progressiva e silenciosa. É uma inércia. Sem ter o que fazer. São lágrimas e orações madrugadas a noite. Esperando o celular tocar.
E
quando os filhos abandonam ou são expulsam de seus lares porque a vida e
segurança familiar chegaram ao limite? Nem imagino eu abraçando e consolando a
Dayse ou procurando um dos filhos nas esquinas escuras da noite, em hospitais e
até mesmo no Instituto Médico Legal.
Agradeço
a Deus pelos filhos que tenho e por todas as alegrias que sempre nos
proporcionaram. Nunca nos deram nenhuma decepção. Nunca choramos por tristeza.
Pelo contrário, só colecionamos alegrias e realizações em todos os nossos
dias.
Outro
presente que recebi dos três foi jamais ter que estar presente numa delegacia
de polícia ou num tribunal para acompanhar qualquer tipo de processo judicial.
Muito menos meus filhos foram sentenciados a cumprir uma sentença penal. Não
consigo nem imaginar a dor que uma mãe passa ao saber que seu filho foi
condenado por ter cometido um crime e irá passar vários anos trancafiado numa
sela de um presídio.
Distante
da liberdade e do mundo que conhecemos. Vivendo em uma realidade triste e
desesperadora, preso como um passarinho, sobre novas regras e distante de sua
família e principalmente de seus filhos. Não me refiro propriamente do fato da
vergonha em si de ter um filho criminoso, mas do fato das consequências para
ele próprio e para seus filhos que passariam anos sem a presença de um pai ou
de uma mãe.
E
quantos filhos partem para perseguir seus sonhos e desaparecem no mundo.
Atravessam horizontes. Ficam anos sem dar notícias. Alguns simplesmente partem
daqui da Região do Nordeste rumo a São Paulo e outras cidades do Sul do país.
Outros se aventuram para outros países como os Estados Unidos e Canadá.
E
ainda tem aqueles que atravessam o oceano e migram para a Europa como fizeram
nossos colonizadores de Portugal, Espanha, Itália, Japão e tantos outros
estrangeiros que nunca mais tiveram contatos com suas famílias. Eu e a Dayse
temos a felicidade de termos nossos filhos e nossos netos todos bem pertos ao
nosso redor na mesma cidade. Nossos netos ainda é cedo se não irão realizar
algum intercâmbio para fora do Brasil, mas com a internet toda a comunicação é
fácil.
Por
outro lado, somos pais, e como bons pais eu e a Dayse jamais abandonaríamos
nossos filhos em qualquer momento de desalento ou de dificuldade, por pior que
fosse a tragédia que caísse por nossas cabeças. Jamais abandonaríamos nossas
proles à mercê de suas próprias sortes de seus destinos se tivessem feito algo
errado. Estaríamos com absoluta certeza dos seus lados para juntar cada um de
seus caquinhos e reconstruir novamente a solidez de cada um de nossos filhos,
fosse que fosse as dificuldades e o tempo que levasse.
Estou
muito feliz com minha esposa e com meus três meus filhos e com meus cinco
netos. Não poderia ter sido premiado com algo melhor na minha vida do que com
essa turminha que me dá muita paz e muita alegria todos os dias. Todos eles com
uma enorme saúde. Eu tive essa felicidade de ter todos eles. Louvado seja
o nome do Nosso Senhor Jesus Cristo que me deu essa maravilhosa família. Agradeço
a Deus e sempre peço muito a Ele que continue me prestigiando com essa saúde da
família como um todo.
Brasão da Família Mendes
Felizes
os pais que podem deitar todas as noites sabendo que seus filhos estão seguros
em seus lares e com suas famílias. Todos estão muito bem encaminhados em suas vidas.
Nenhum
está passando por dificuldades de nenhuma natureza e todos gozam de muita
saúde. Realizados são os pais que tem a consciência tranquila e o coração feliz
relativo à sua família. Podemos colocar nossas cabeças nos travesseiros todas
as noites e termos um sono maravilhoso e tranquilo. E ao acordar todas as
manhãs só temos a agradecer a Deus pelos caminhos que nossos filhos
trilharam.
O
Paulo, o Sérgio e a Ana Paula seguiram os nossos ensinamentos. Nenhum deles
envergou para o lado errado. Nossos filhos são exemplos de pessoas para a
sociedade em todos os sentidos e não devem em milímetro sequer de ética,
honestidade, profissionalismo, sentimentalismo, religiosidade, caráter ou
qualquer outra coisa. Somos plenamente realizados como pai e mãe.
Cumprimos
o nosso papel com maestria. Claro cometemos erros e enganos com toda certeza. E
quando chegar o momento da despedida para a vida eterna eles saberão que eles
cumpriram com louvor o papel deles como filhos. Nada deixaram de fazer ou
cumprir na tarefa de filhos. Sempre tivemos eu e a Dayse absoluto orgulho pelos
filhos e netos que temos. Nenhum arrependimento ficará para trás. Os nossos
papéis foram cumpridos plenamente em nossa família Graças a Deus.
TIRANDO A ROUPA
Calma, esse capítulo tem apenas o título
"tirando a roupa". Não vai ter nudez não e nem segredos ou revelações
inapropriadas. Risos. Apenas vou fazer uma juntada de acontecimentos e
inclusive de minha personalidade que no meu modo de ver constituem a pessoa do
Paulo com todos os "pingos nos "is", apenas isso!
1- Café da Manhã
Meu café da manhã eu mesmo preparo, e como um
bom nordestino tem que ter um cuscuz feito numa cuscuzeira, café bem forte,
frutas em pedaços, queijos, pão tostado, as vezes batata doce, mandioca ou
mungunzá, que se faz com a água fervida, joga a fava, retira a água e temperos.
Nas sextas feiras gosto de ir com os amigos comer camarão ou caldeirada. Aos
domingos sou prático, compro um galeto e como em casa. E tenho a minha
secretária do lar, a Dona Lene. Ela cozinha muito bem. Já faz parte da nossa
família. Está conosco desde o tempo que os três meninos eram pequenos.
Adorada por todos eles até hoje. Ela faz uma maravilhosamente galinha de
cabidela e uma lasanha “vulcânica”, vem para mesa saindo fumaça, que todos
amam.
Até me considero um nordestino humilde, pois
meu café da manhã reforçado não precisa ter a macaxeira, galinha ao molho,
cabidela que é galinha ao milho pardo, guisado de boi, feijão preto, curau,
banana cozida, carne seca. Alimentos que em outros tempos serviam de
alimentação para o homem nordestino passar o dia inteiro na lida de seu
trabalho, pois foi assim que teve a origem dessa saborosa, suculenta e
reforçada alimentação do raiar do dia.
Claro também não dispenso um Johnny Walker Black
Label e uma boa cachaça geladinha que não cristaliza. Um azeite grego e uma
água mineral Perrier também são boas indicações. Já os queijos posso indicar o
Gouda, o Faixa Azul, de Coalho e Filet assado. O bacalhau tem que ser da
Noruega. O Caldo verde tem que ser realizado com folhas bem fininhas da couve.
Vários vinhos entre eles Cabernet. Cheguei a ter assinatura de revista de
vinhos internacionais.
2 - Minha Saúde
Infelizmente os homens não têm a cultura de ir
ao médico regularmente e realizar os exames necessários anualmente. Acabam indo
apenas quando estão com os sintomas, e alguns ainda prorrogam as consultas por
muito tempo mesmo tendo os sintomas. Existem estatísticas que afirmam que menos
de 40% dos homens no Brasil realizam suas consultas periódicas. As razões desse
baixo índice são variadas tais como desculpa como falta de tempo, medo de
descobrir uma possível doença, constrangimento da balança ou de ficar nu e até
da temperatura da sala do exame. Claro que nessas estatísticas não estão
incluídas a dificuldade da população em realizar a marcação das consultas e
exames no sistema público de saúde, para os que não tem plano de saúde.
Felizmente eu estou com a minoria, realizo
periodicamente todos os meus exames e cuido da minha saúde tirando a pressão
arterial diariamente. A doutora Sarita Pessoa de Melo é minha cardiologista,
acompanha anualmente a minha próstata com os exames de ultrassonografia pélvica
e felizmente sempre com resultado normal. Minha filha Ana Paula que chamo
carinhosamente de Noca, é a minha enfermeira “Ana Neri”. Ela sempre preocupada
com a minha saúde. Sempre presente, então na pandemia principalmente! Fez os meus
curativos quando tirei cistos nas coxas e cuida de preencher minha caixinha de
pílulas! Nos Acompanhou nos postos de vacinação. Um anjo na nossa vida!
3 - Restaurante
E assim devagar tive a oportunidade de
conhecer os diversos países que temos dentro do nosso Brasil. As diferentes
culturas, religiões, porque não dizer "idiomas", culinárias, bebidas.
Tudo é diferente nesse país. A cachaça nordestina é diferente da paulista. Como
também a farinha é diferente. Nem vou falar então nos cafés da manhã servido
nos hotéis nordestinos comparados com os de São Paulo, Rio de Janeiro ou
Brasília. Vamos dizer assim, não existe o melhor ou o pior, são culturas
diferente. Pude conhecer vários ambientes como o Hotel Binder em Mogi das
Cruzes frequentado por uma grande colônia japonesa.
Em São Luís do Maranhão frequentei um
restaurante árabe cujo dono por cortesia servia a tradicional bebida turca,
Araken - horrível. Sorte minha ter uma palmeira ao lado da mesa. No Rio de
Janeiro qualquer coisa estaria bem servida e hospedada. Em São Paulo gosto
do Círculo Italiano é um centro de negócios e eventos no coração da
metrópole instalado no Edifício Itália onde um de seus construtores e
proprietários é o próprio Circolo Italiano. Dotado de um maravilhoso espaço
cultural e gastronômico e cursos de italiano. O restaurante é um ambiente muito
sofisticado, com amplos salões e bem decorados aberto também a não sócios.
Na Pizzaria Michelucho trabalhava havia o
sócio Silvio Pécora, que caprichava na borda recheada. Horário de funcionamento
era das cinco da tarde até uma da manhã! Mas nem sempre tinha tempo para jantar
em restaurantes, certa noite eu e um colega de trabalho chegamos no flat,
alugado pela empresa, e não havíamos jantado. Tudo fechado pelo avançar da
hora. Colocamos macarrão numa panela sem óleo ou manteiga. Grudou tudo e
tivemos que comer cortando aquela gororoba com faca!
E eu estando ali, não poderia deixar de ter
conhecido e frequentar o Terraço do atual quarto arranha céu mail alto de São
Paulo com quarenta e um andares, dezenove elevadores, 165 metros de altura,
sendo 151 a partir do nível da rua. O restaurante do Terraço Itália é seguido
pelo bar da Brahma e "Um dois feijão com arroz". Outro
restaurante que recomendo é da Família Mancini localizado na rua Avanhandava 81
cuja sua especialidade é comida italiana, Mediterrânea, Europeia, de Nápoles,
Campânia, Toscana, Sicília e grelhado e porque não o Le Caserole no Largo do
Arouche
Em Teresina gosto do Hotel Rio Poty com uma
comida excelente. Devido ao calor, ficava na piscina até o sono chegar e me
deitava para dormir em cima da toalha molhada. Em Salvador, entre a Ladeira da
Barra e Ondina, havia um restaurante famoso e sempre lotado. Fiquei em uma
pequena mesa em frente a um pilar. Não reclamei porque o caruru era delicioso
(mesmo com excesso de quiabo). Em Recife no bairro do Pina, há o bom e caro
Bargaço. Restaurante do Juliano com o grupo violinos de ouro do Recife.
Sensacional.
Chefe de cozinha do Restaurante
Aquários – Fortaleza - CE
Em Fortaleza: a melhor lagosta no restaurante
Aquários - grelhada na manteiga, servida na casca. Remi Martin de
acompanhamento. Companhia dos amigos Ana Lúcia e esposo. Ela estilista, sempre
elogiando “bicho velho você está muito elegante” Caldeirada maravilhosa: em
Itapessuma, antes de chegar na Ilha de Itamaracá (35 minutos sentido João
Pessoa ) zona balneária Ponte Fidalga. Mas, na estrada entre Sobral e Teresina
tem um restaurante cuja mesa tinha supostamente uma toalha preta, mas, eram de
moscas! Que horror!!!
Certa vez tirei uma gordinha para dançar num
baile ela estava tão suada que fiquei enjoado e sai para vomitar.
Numa outra festa no clube de Cajueiro ACA em Recife, tirei uma moça para
dançar, que aceitou. Ela era mais alta que eu, mas, sem problemas. Dançava
muito bem. Quando percebi umas gotinhas de suor no seu buço, ofereci meu lenço,
perfumado com Hora Intima. Ela ficou encantada. Quando eu organizava
as quadrilhas, nas festas juninas, no bairro de Cajueiro em Recife onde morava,
sempre fazia par com a mais bonita da festa!
Também sou uma pessoa simples, gosto de pratos
menos requintados. Então temos o Tokyo Lanches, o japonês Júlio Sygero
Matsumoto e o famoso macarrão à bolonhesa. Às vezes costumo almoçar com alguns
dos filhos, como o Serginho em Maracaípe, que fica a cinco minutinhos de Porto
de Galinha, no Restaurante Caribe Brasileiro, onde tem um peixe dourado frito
espetacular com batatas, vegetais e pirão com salsinha por cima. Vamos
regularmente no Boi na Brasa. Particularmente gosto de fatias finas de
picanha.
Minha comida preferida casualmente é a pescada
amarela, que é uma espécie de peixe encontrado em nosso litoral que tem águas
quentes. O peixe é enorme, chegando a medir até um metro e meio de comprimento
e podendo pesar mais de vinte quilos. O bicho é lindo. Lindo demais. E seu
sabor é espetacular na nossa culinária. Sua carne tem poucos espinhos, sendo
muita macia, saborosa, rica de nutrientes e proteínas. Além de seu preparo ser
muito fácil de ser realizada.
Gosto de beber um Whisky Johnnie Black Label,
mas bebo de forma controlada. Nada extravagante. Bebo acredito mais para me
relaxar dos stress do dia a dia e criei o hábito no transcorrer da vida. Minha
maior alegria é que nenhum dos meus três filhos não herdou esse hábito meu.
Aliás nem essa e nem o cigarro. Graças ao Bom Deus, todos passam longe. E rogo
a Deus que meus amados netos tenham a mesma sabedoria que seus pais tiveram,
que sigam os exemplos de seus pais e se afastem dessas duas maldições e que os anjos
digam amem!
Mas sejamos realistas, sempre fora de casa havia um certo vazio. Mesmo estando em tantos restaurantes glamorosos e hotéis sofisticados em São Paulo, Rio de Janeiro e em tantas outras cidades brasileiras.
Inúmeras vezes estava sentado sozinho a mesa,
tendo como companhia o prato de jantar, um copo e as vezes uma televisão ao
fundo. Nem mesmo o garçom poderia me fazer companhia, pois havia dezenas de
outros clientes que cabia a ele atender. Nos primeiros tempos não havia
celular, as conversar eram tudo por telefone fixo, sem câmera. Chegava tarde no
hotel, quando meus filhos já estavam dormindo. Então, ficava dias sem falar com
eles. E quando algum filho estava adoentado. Cabia a mãe o zelo e cuidar deles
a distância e a mim as preocupações sem ter o que fazer e a noite mal dormida.
4 - Roupas
Acredito ter extremo bom gosto em me vestir. A
trabalho e em ocasiões sociais gosto de usar um blazer com brasão e uma gravata
linda. Quando estive em Washington aproveitei para comprar várias. Também gosto
de calça risca de giz e uma casimira inglesa com botões de citrina e
roupas atualíssimas por serem peças clássicas. No aniversário de quinze
anos da minha filha Ana Paula vesti um terno de rigor summer branco feito sob
medida por alfaiate em São Paulo. Também sou exigente por bons perfumes,
minhas preferências são "Eternity For Man", "English
Lavanda" e "Lapiseira Karandashi", fabricada no oriente.
Uma boa música sempre é algo especial.
Aliás quem é que não gosta de música, não é mesmo? Gosto de MPB, de raiz e
sacra. Tais com “La Vien Rose “(Piaf), “ Pocha”, Gilson, “ Meu Primeiro
Amor”, Roberta Miranda , “ Ainda bem”, Marisa Monte, “ La Belle de Jour”, Alceu
Valença, “ Mar”, Portuguesa Dulce Pontes que tem uma voz muito agradável e
bonita. Tive aulas de música com Maestro Cussy de Almeida e nos meus tempos de
escola participei como corneteiro mór na banda marcial da Escola Técnica Federal
de Alagoas, que saudade daqueles tempos.
Tenho uma coleção de vídeos com músicas que
gosto, como New York, c’est si bon, Chico et les gipsy bella champagne. No
carro escuto muita música brasileira. Também gosto de cantoras pouco conhecidas
no Brasil, como Margareth Whitsng. Tenho uma linda Bíblia. Guardo com
muito carinho um livro que uma freira me deu, com dedicatória. Em cada página
ela assinalou o mais importante a ser lembrado. Um tesouro! Tenho
um oratório maravilhoso, eu o vi exposto na porta de uma loja, quando passava
de carro. Dei meia volta e negociei o valor. Não poderia deixar de
comprá-lo.
Por volta de 1965 ganhei ingressos para o
programa de Luiz Geraldo, popular na época. E ainda ganhei um prêmio e falei
seu nome completo ouviu um elogio seu: " Meu jovem você tem voz de
locutor! Faria muito sucesso se um dia gravasse “casinha branca”! Felizmente
acredito para o meu bem e de minha família que percorri os caminhos corretos na
arquitetura. Provavelmente não teria me realizado profissionalmente e
construído minhas realizações no mundo artístico.
Modestamente como diziam as minhas amigas eu
era um excelente “pé de valsa”, dançava muito bem! Lembro que em certa
festa convidei uma mocinha para dançar. Mas, recebi um não!! Sejamos realistas,
quantas negativas tivemos em nossa trajetória desde que
nascemos? Então, não fiquei desanimado e parti para outra e logo
encontrei a moça mais linda da festa e dançamos a noite inteira! Quando
nos sentamos para descansar, galantemente ofereci meu lenço perfumado para que
ela secasse o suor. A outra mocinha só tomou um “chá de cadeira “e acredito que
infelizmente pouco dançou naquela noite.
Nos anos de 1967, conheci o cantor Reginaldo
Rossi, na casa de um colega de trabalho, Moisés Coelho. Ele morava na Avenida
Santos Dumont, no bairro do Rosarinho, em Recife. O irmão dele, Paulinho, era
baixista o conjunto Anjos. E para minha surpresa, um belo dia o Rossi apareceu
por lá e solfejou a música “O Pão”, que mais tarde seria gravada. Era a época
da coqueluche das músicas da Jovem Guarda (ritmo “iê iê iê), que influenciaram
um movimento importante no cenário nacional. E curiosamente deram nome a algumas
boates em Recife, como “Eu e Tu”, “Cala a Boca”, entre outras.
Meu time do coração é o Náutico de Recife. Mas
gosto também do Vasco do Rio de Janeiro. Quando assisto uma partida e vejo
um jogador machucar outro de propósito, recordo de minha infância, quando
quebraram a minha perna num jogo de futebol por pura maldade e até hoje sinto
pontadas e dores. Também já tive fratura nos dedos quando jogando futebol
porque era o goleiro! Outra vez quando tinha uns dez anos pisei num ferro
enferrujado e o curativo foi colocar alho com pirão!
Certa vez fui ao Maracanã com um amigo
assistir um jogo do Vasco e do Botafogo, havíamos levado uma almofada para
cada um de nós. Quando dei uma saidinha para comprar água, o amigo escondeu a
minha almofada! Pensei que alguém tinha roubado, mas foi apenas gozação. Em
2019 o goleiro Bruno saiu do Náutico, indo jogar em Portugal. Meu neto Paulo
Neto tem foto com ele.
Gosto muito de ter amigos e me encontro com
eles volte e meia. As vezes pela manhã ou geralmente no final da tarde, na
avenida Airton Senna dentro do supermercado Leão. Numa espécie de cafeteria.
Tem o Renatão que comprou um Mercedes em 2019 com lindo bancos de couro,
mesmo bem financeiramente é meio pão duro, sempre reclama na hora de
dividir a comanda quando saímos para comer!
O amigo Vital eu apresentei ao pessoal do
Lyons coffee em janeiro de 2019, é engenheiro casado com a Cêça, tem uma loja
de motos e de reparos de moto. O Jair é casado com Cristina, dona de uma
clínica. O Sidney tem apenas trinta por cento de visão, era constante no Lyons
pois morava ali perto. Com o fechamento da cafeteria do Lyons, a turma agora
faz ponto num posto de gasolina. O Sidney agora frequenta menos, porém, por
vezes eu mesmo o buscava e levava para casa. Outro amigo sensacional é Luiz
Antônio ex-comandante da TAM. Também costumávamos frequentar o Lyons, a loja da Cacau Show e o Shopping Center.
O Mateuzinho, barbudinho, casado com a Juju,
sempre a busca no salão, ele tem o apelido de chibata. O Leno da padaria. O
Pastor Roma casado com a Ângela, que vai a caldeirada com ele e outros amigos.
Ele tem as filhas morando em Los Angeles. O Acioli tem dois filhos,
o Vinicius e a Bárbara. Em certa ocasião no Lyons o Paulo Roberto recebeu um
bolo de aniversário na mesa de presente da Dra. Sumeia Ceber, que estava sentada
perto mexendo no computador e escutou que era seu aniversário, mesmo sem ser conhecida
ofereceu o bolo ao Paulo. Posteriormente ele retribuiu a gentileza a convidando
para almoçar. José Carlos que talvez um dia se candidate a prefeito.
O José Carlos, político, muito educado e simpático. O Clovis, foi a
primeira pessoa que me convidou a participar do grupo. O Pastor Mesquita, que
sempre envia lindas postagens cristãs. O Comandante Zenobio viveu quatro anos
no Canadá. Outra vez, fizemos com Urbano uma cota para presentear com um
micro-ondas um garçom que iria se casar. A Dona Adriana que vende perfumes. E
perto do Leão, há uma barraquinha, do Tiago com venda de queijo, camarão e
pacotinhos de frutos do mar.
8 - Oscar Niemayer
Tive a oportunidade no desempenho de minha
profissão de conhecer algumas personalidades sensacionais. Entre elas o grande
mestre da arquitetura o Sr. Oscar Niemeyer. Foi quando trabalhava no escritório
de arquitetura, eu era o responsável por todas as agências do Banco Financeiro
de Campina Grande e construímos uma agência no Rio de Janeiro. Numa de minhas
visitas a obra, tive a oportunidade de realizar uma visita em seu escritório e
conversarmos. Ele era uma pessoa muito simples, um ótimo ouvinte, extraordinariamente
muito inteligente e muito calmo. E claro sem desmerecer nenhum outro
profissional, o Mestre Oscar Niemeyer representa muito bem a magnitude de tudo
o que ele muito bem projetou e construiu e nem vou citar suas obras no Brasil a
fora. Como sabemos Niemeyer foi convidado a participar da equipe que projetou a
sede atual da ONU - Organização das Nações Unidas em Nova York.
Tive a grata alegria de conhecer um monarca da
realeza europeia. Conheci o Duque de Varmlâdia Carlos Filipe que é segundo e
único filho homem do Rei da Suécia. Eu numa manhã trabalhando na sede da
empresa Votorantim em São Paulo ao lado do Teatro Municipal. Aproximadamente no
início da década de 90, quando o Dr. Clóvis Sripiliti me chamou para sua sala e
apresentou-me o Duque. De imediato fiquei surpreso.
Jamais imaginaria que viria a conhecer pessoalmente alguém da nobreza. E Dr. Clóvis explicou que o pai do Duque era o Rei Carlos XVI Gustavo que assumiu o reinado em 1973 após a morte de seu avô, rei Gustavo VI Adolfo. Conversando com o Duque Carlos Felipe de imediato constatei que seu português era perfeito, então me explicou que sua avó era brasileira do interior de São Paulo.
10 - Pelé
Em outras ocasiões quis o destino que meu caminho
se cruzasse com o menino Edson Arantes do Nascimento ou simplesmente Pelé. A
primeira vez foi nos Lençóis Maranhenses, lá nas dunas que vão mudando de
lugar. A outra oportunidade foi assistindo um jogo em Recife e nesta ocasião
falei rapidamente com ele, não cheguei nem mesmo a apertar sua mão e nem ele a
falar comigo, também nem sei se ele escutou o que falei a ele.
Imagina eu era um entre milhões de brasileiros que
sempre quiseram chegar perto do maior ídolo brasileiro do futebol de todos os
tempos. E sejamos honestos, quem era eu para o Pelé parar para conversar? De
certo eu teria algumas sugestões para lhe dar dentro do campo? Claro que não!!!
Mas essa segunda oportunidade foi através de um amigo que eu havia realizado o
projeto de reforma de sua casa, o Coronel Adilson Vanderlei, que estava no
local e facilitou minha aproximação. E teve uma última oportunidade em Manaus
quando fui assistir à partida de futebol e ele jogava pelo Cosmos.
11 - Cantores
Conheci o inesquecível jurado e pernambucano
Pedro de Lara do Programa Silvio Santos, os cantores Ney Matogrosso, Agnaldo
Timóteo, Fafá de Belém, Roberta Miranda, Rosana, Fábio Júnior. Certa vez
trabalhando no Ceará fiquei sabendo que a cantora Zizi Barnier estava se
apresentando com interpretações das músicas da Piaf, nem pensei duas vezes,
comprei ingressos e fui assisti-la.
Voltei ao hotel após o espetáculo e fui jantar
e sou surpreendido quando a vejo entrando no restaurante também para jantar.
Aproveitei a oportunidade e lhe parabenizei respeitosamente pela linda
apresentação que havia realizado naquela noite.
Também tive a oportunidade de conhecer
pessoalmente alguns políticos como o ex Presidente Fernando Collor e os
Governador Divaldo Suruagi e Luís Cavalcante. Tenho uma memória privilegiada no
que se refere as seleções brasileiras desde 1958.
Lembro sempre da expressão gozada do
ex-jogador Dedeu: vamos ganhar esse jogo comigo ou sem migo! No Rio torço
pela Escola de Samba Mocidade independente de Padre Miguel por causa das
paradinhas do mestre André, já ficando acordado de madrugada para assistir ao
desfile.
Gosto de assistir na televisão documentários e
reportagens da Sônia Bridi. Gosto ficar assistindo com um whisky e degustando
alguma coisa, como caviar, presunto ou queijos. Cinema é outra atração
deliciosa de assistir, como a matinê no cinema São Luís.
Antes ou depois um sorvete na Gemba, na rua da
Aurora, ou um caldo de cana e cachorro-quente do Barulho. Em Maceió frequentei
o cinema Plaza, na rua Barão de Atalaia. Gosto também de vídeos de tango.
Assisto novelas.
Costumo ler sempre as edições de Seleções do
Rider’s Digest. Também gosto de teatro e cheguei a participar de algumas peças
amadoras em Maceió com os amigos Linda Mascarenhas, Florêncio Teixeira e Jôfre Soares.
12 - Carros
Na minha juventude os carros da família eram todos
importados. Papai tinha um lendário rabo de peixe da Chrysler, ele era uma
coisa linda. Tivemos também um Ford Prefect ano 1948, que era menorzinho e isso
facilitava muito para meu pai dirigir nas raras vezes que pegava no volante,
pois o motorista oficial da casa era eu.
Tivemos depois um Austin A40 já com traços mais
modernizados e de porte médio, mas tinha muitas marchas para passar. Não
demorou para ele pegar a fama que tinha mais marchas no câmbio que o próprio
carnaval. Realmente nunca havia visto um negócio daqueles. A fama pegou e
ninguém queria comprar aquele carro, nem novo e pior ainda usado.
Indo para Recife meu primeiro carro não poderia ser
outro que o famoso carro popular Fusca 1966 branco, chamados por todos de
"66 vidros largo". Ele era lindo, reformei todo ele por paixão e
motivação da idade de deixar o caro espetacularmente lindo.
Curiosamente trafegando numa rua que vendiam
carros, um corretor quando viu meu carro ficou doido, me parou e queria me
comprar a todo custo. Não pude recusar sua última proposta e vendi o Fusqueta.
Pagou em dinheiro na hora e me levou até a minha casa.
O melhor do Fusca é que qualquer mecânico em
qualquer cidade do Brasil ou do mundo era um especialista e sempre se achava
qualquer peça de substituição e isso até hoje é assim. Aliás os próprios
motoristas na maioria das vezes se acham mecânicos e entendidos dos fuscões.
Ficou tão
famoso e popular que até música ganhou "Fuscão Preto" interpretada
pelo cantor Zé Batista. E o sucesso foi tão radiante que depois venho o
"Filme Fuscão" Preto. Imagina só, um carro com título de música e de
filme.
Em seguida comprei um Corcel Lancer GT 1976 de cor
marrom modelo tradicional, que incrivelmente ainda se encontram rodando pelos
recantos do Brasil. Era um carro compacto somente a gasolina como todos os
demais daquele tempo, com transmissão manual de cinco velocidades. Seu tanque
tinha uma capacidade máxima de 51 litros e podia chegar a 133 km/h de
velocidade. Era um automóvel clássico para a família brasileira.
Depois tive um Chevrolet Diplomata Automático, aí
já era carro de doutor ou arquiteto, casualmente todo cor de ouro. E para ser
franco, gosto muito dessa palavra "ouro".
E claro tinha que ter um carro de Presidente da
República, comprei meu maravilhoso Landau, esse carro era um espetáculo.
Um verdadeiro luxo, não era por nada que por
durante décadas era o carro oficial dos Presidentes. O Landau era meu xodó,
doeu ter vendido ele. Mas foi para um proveito maior.
Estava projetando e construindo minha casa em
Jaboatão dos Guararapes, e precisava de um dinheiro extra para finalizar a
construção, assim foram alguns anéis, ou melhor foi o Landau e ficou a nova
casa, melhor dizendo. E os próximos automóveis? Depois do Landau, foram apenas
carros, apenas outros carros todos da geração descartáveis.
13 - Aviação
Voei muito a trabalho nos jatinhos executivos da
empresa. Era uma delícia você chegar no aeroporto e não ter que esperar o
horário da decolagem, não ter que passar pela fila do raio x ou do embarque. O
próprio embarque é separado, assim não cruzava pelo tumulto dos corredores
lotados de passageiros indo e vindo. Era só chegar, embarcar e decolar. Muitas
vezes voava sozinho com os pilotos. Entre os aviões que tive a oportunidade de
voar estavam o Cessna Citation modelos I, II e III, o Sabre e o Beechcraft King
Air. Todos eles muito silenciosos e confortáveis. Uma maravilha.
Na cabine de um avião –
Campo de Marte - 1987
Na aviação comercial voei em quase todos os tipos
de aparelhos. Sou da velha guarda. Sou da época que existiam apenas três
empresas aéreas, a Varig, a Vasp e a Transbrasil no Brasil. Sou uma das pessoas
que tive o prazer de voar no famoso Electra II da Varig. Era o voo da
integração nacional, fazia a rota de Porto Alegre até Manaus, incontáveis as
vezes que voei. Lembro que existia uma sala de estar, onde podia-se fumar,
beber e conversar.
Voei no Caravelle que era uma aeronave belíssima e sensacional, era um senhor equipamento. Como tinha mais de dez Estados Brasileiros para cobrir também voei nos aviões 727, 737, no Jumbo 747, o MD-11, Jat Class da Embraer. O pior avião no meu ver era o 707 que era muito cumprido e o corredor muito estreito. E foram poucos os Estados Brasileiros que não tive a oportunidade de conhecer.
Também voei muito de helicóptero, por exemplo o
campo de pouso de Parati ficou interditado por conta que animais volte e meia
adentravam na pista de pouso e inclusive certa vez um Cessna
Citation novinho da empresa na decolagem bateu com a ponta da asa num
cavalo foi um horror. Foi quando passamos a pousar em Ubatuba e de lá voávamos
de helicóptero para Parati.
Naqueles tempos eu entrava na primeira classe e a
comissária fazia questão dela mesma tirar meu blazer, guardava e depois
entregava a etiqueta do casaco para devolução na hora do desembarque. Naqueles
tempos de ouro era servido vinho e champanhe de primeira. Cheguei a saborear
lagosta, caviar, camarão.
A Varig tinha um serviço de bordo impecável e
estava no mundo inteiro, ela era a bandeira do Brasil. Foi fundada na década de
20 e voava para todos os continentes e principais países do mundo. Era a
transportadora oficial da Seleção Brasileira por inúmeras vezes.
Voar nos MD-11 e 747 da Varig era um luxo.
Algo espetacular, principalmente na primeira classe. O 747 para quem nunca teve
a oportunidade de voar, era uma aeronave de dois andares que tinha uma
escadinha para subir para o segundo andar, onde ficava a primeira classe e a
executiva. Voar neles com crianças seria possível até brincar de esconde e
esconde. Também com tantos lugares diferentes para a criançada para se esconder
se fosse possível. Imagina poder se esconder no sarcófago secreto, onde os comissários
e pilotos utilizam para dormir em rodízio durante longos voos. Nem quero pensar
se os tripulantes imaginassem no que nós passageiros ficamos pensando durante
os voos.
A Varig chegou a ser a maior empresa da América
Latina e uma das maiores do mundo. Jamais imaginava-se que um dia iria fechar
suas portas. Simplesmente dominava o mercado nacional e internacional. Era o
orgulho de todo o brasileiro. Com milhares de colaboradores, rotas e
incorporações de outras empresas ia crescendo a vento e popa. Foi a única
empresa nacional a ter incorporada na sua frota três aviões 747 com capacidade
para até 450 pessoas entre passageiros e tripulantes. Ele era carinhosamente
chamado de Jumbo. E não poupava na aparelhagem com vários McDonnell Douglas
MD-11 e 767 e 777.
Mas o improvável aconteceu, a crise chegou ao seu
ápice no ano de 2006. Apesar dos salários atrasados a vários meses, com
inúmeras dívidas milionárias já a vários anos, o martelo do leilão foi batido e
a empresa foi vendida. E dias depois as impressoras começaram a emitir milhares
de rescisões sem dó e sem pena. E claro sem pagamento também.
A feijoada da Transbrasil também era inesquecível.
E a pasta da Vasp também. Voar naquela época era uma ocasião especial. A
tripulação trajava uniformes impecáveis. As tarifas muito caras isso é verdade,
não era para todo mundo. Ir ao aeroporto assistir os aviões decolar e pousar
era um passeio de fim de semana para a família.
Naquela época não existia internet e o conforto
eram as salas de vips que existiam. Ali havia uma televisão, computadores,
jornais, revistas, um bom ar climatizado, bom banheiro, algumas vezes um
chuveiro, alimentação e bebidas à vontade. Você podia ficar despreocupado com o
horário porque a equipe da sala controlava os horários e embarques. Podia-se
até dormir tranquilamente no ambiente.
Os pousos não sei por que, mas a gente que viajava
frequentemente sabia que os pilotos da Vasp digamos assim, atiravam a aeronave
contra a pista. Sempre dava um choque. Até hoje, quando faço um pouco e a
aterrissagem com emoção, me pergunto se o piloto foi funcionário da Vasp.
Os anos foram indo. Tudo com céu de brigadeiro. Nós
passageiros, todos felizes. Achávamos que éramos felizes. Pensávamos que éramos
os donos da paçoca. Foi quando caiu de paraquedas um paulista chamado Rolim
Amaro, que resolveu reinventar a forma de atender os passageiros. Simplificou e
facilitou tudo. E nos mostrou algo que até então a maioria dos passageiros
desconhecia. Nós não éramos os "donos da paçoca!"
E com a Tam, o Cliente virou como por passe de
mágica a ser "majestade do espetáculo". A Tam foi um divisor de águas
para o mercado brasileiro, mostrou ao consumidor que antes se pagava muito por
pouco. Uma das diversas grandes jogadas foi não cobrar os mesmos serviços
tarifados pelas outras. Atrelado à sistema de informática único de Check in que
permitia rapidamente as alterações sem custo de tarifas.
A Varig sempre foi uma empresa perfeita se não
desse problemas, mas se viesse a acontecer um problema, realmente era de
chorar, a logística, informática e toda a sua estrutura de dinossauro travavam
as soluções. Até mesmo a Vasp e a Transbrasil eram mais leves e rápidas nas
soluções. Então chegou a Tam, com sistemas modernizados e gerações mais
novas.
Com a Tam chegou à inteligência de pousar no
Congonhas e no Santos Dumont que até então eram aeroportos desprezados e com
tarifas altíssimas. Foi um Boom no mercado. Todo mundo voou para a Tam. Ninguém
mais queria pousar nos aeroportos de Guarulhos ou Galeão. Foi o Brasil inteiro
querendo voar de Tam.
E o "Comandante" trouxe com ele o famoso
tapete vermelho. Saiu do seu gabinete da Presidência da Empresa e foi
cumprimentar diariamente os passageiros nas filas do Check in, no embarque, a
bordo das aeronaves, foi tomar café da manhã nas salas de embarque e
incrivelmente foi a Tam que criou o primeiro programa de milhagens no Brasil,
onde com apenas dez voos ganhava outra passagem para qualquer lugar do Brasil.
E então todas as demais, criaram atrás.
Para dificultar mais a vida das demais, o
Comandante Rolim criou a primeira Sala de Embarque vip para todo e qualquer
passageiro sem distinção de classe nos aeroportos de Congonhas e Santos Dumont,
com piano bar, violino, harpa. Chegando a ter mais de oitenta músicos. Era
verdadeira festa de aniversário, com refinados doces e salgados. Com enormes
baleiros antigos de vidros recheados de bombons que ficavam à disposição dos
passageiros e inclusive com telefones a disposição DDD para todo o Brasil.
Para não bastar, o Comandante inovou os serviços de
bordo, primeiro trouxe os lendários "babeiros", depois reinventou um
cardápio tropical com tábua de queijos, pizzas, cervejas estupidamente geladas
e champanhe. O passageiro na Tam era a verdadeira majestade. Enquanto, que nas
demais empresas aéreas era apenas mais um passageiro.
Parece que sou de outro planeta. Tudo mudou. Hoje
nada disso existe mais. Literalmente nós passageiros viramos cargas humanas.
Não tem forma melhor para classificar como somos tratados. No embarque remoto o
ônibus para na porta remota e enquanto é possível colocar passageiros o pessoal
de terra vai embarcando passageiros. Acredito que se a empresa pudesse
colocaria todos os passageiros em apenas um ônibus.
E claro o perfil dos passageiros com as tarifas bem
mais baratas também mudou. E mudou o glamour que existia na profissão dos
tripulantes. E nessa confusão de embarque de aviões lotados, e com muitos
passageiros que nunca voaram, vem a confusão de quem não acha o seu assento.
Passageiro que se sentou no lugar errado.
Os que não
encontram lugar para colocar sua mala. Pior lotou o compartimento de carga de
bordo. Tem aquele passageiro que quer voar com sua companhia. E aí vem os
passageiros atrapalhados que acham que o comissário é um garçom. E nem tem
consciência das atribuições dos tripulantes relativos à segurança de bordo, mas
também não é obrigação dos passageiros terem noção dessa realidade.
Por outro lado, com a crise na aviação acabaram os
serviços de bordo com a qualidade que houve no passado. A única que mantém seu
serviço original é a Azul, que desde o início é diferencial com bebidas como
água, refrigerantes, sucos e café. E com opção de snacks são servidos
biscoitos, salgados, bolinhos recheados, amendoim e balinhas de geladinha em
formato de avião.
Mas a qualidade não foi só serviço de bordo.
Acabaram por passe de mágica todas as salas vips das companhias aéreas dentro
do Brasil inteiro. A quantidade de voos despencou. E as tarifas aumentam
proporcionalmente inversamente em direção contrário. Talvez a solução para isso
tudo seja a abertura do mercado nacional para a aviação internacional. Mas uma
certeza temos, a aviação do tempo do Comandante Rolim jamais voltará. É
inesquecível a simpatia dos tripulantes da época do Comandante Rolim. Muitas
vezes hoje quando vejo os tripulantes conversando com os passageiros vejo-os
com a mesma seriedade da época da Varig. E bem diferentes da Tam e da
Transbrasil, que tinham a simpatia no sorriso.
A Gol surgiu no decorrer de toda essa crise com uma proposta inovadora na época de passagens mais baratas, que acabou mudando muitas coisas na concorrência, como fim do telefone 0800, fim da alimentação gratuita a bordo e de jornais e revistas. Mas com o tempo as tarifas ficaram iguais a da concorrência.
14 - Moedas
Certa vez comprei de um amigo duas enormes e
valiosas moedas de ouro. Acredito que eram valiosas, risos, como investimento.
Por um tempo elas andaram sumidas! Até que um dos meninos as encontrou no vão
das almofadas do sofá! Ou seja, o investimento até hoje não rendeu as
capitalizações que tinha expectativa que viessem a render.
Na verdade, estou nesse momento através do
livro tendo a oportunidade de relembrar o momento de alegria quando comprei
aquelas moedas. Também não perdi muito dinheiro, visto que investi pouco
dinheiro nelas e agora meus netos herdarão e quem sabe daqui a mais cinquenta
anos eles não irão vende-las por alguns milhões de criptomoedas.
Gosto e entendo muito do folclore do Norte e
Nordeste, maracatu rural, maracatu de baque virado, boi de fita (Maranhão), boi
de axixa, boi de pindaré. Tenho uma foto vestido a caráter. Na minha sala de
estar há um quadro lindo do caboclo de lança, pintado pelo meu amigo renomado
José Ferreira de Carvalho ou simplesmente Ferreira. Em Alagoas costumava
ouvir a Rádio Difusora, o programa de auditório de Odete Pacheco, onde ela
conseguia dar bons prêmios graças aos patrocinadores do programa. Há um vídeo
no YouTube falando da importância dela na rádio!
O maracatu rural tem predominância e origem em
Pernambuco no século XVIII, sendo uma manifestação cultural do folclore, com
dança e música, originária de religiões africanas, com adoção dos instrumentos
como tambores, ganzás, taróis, caixas, gonguês, cornetas, trombones. A
composição é formada até cinquenta pessoas, tendo o rei e a rainha no topo,
todos com vestimentas coloridas. Tendo o caboclo vestido com fitas longas e
coloridas e uma flor na boca com lantejoulas.
O maracatu de baque virado também teve origem em Pernambuco, surgindo no século XVII. Sendo uma manifestação popular afrodescendente da época da escravatura. Seus integrantes utilizam tambores de forma ritma em compassos diferentes simultaneamente. Junto com os tambores são cantadas cantos e textos africanos numa harmonia diferente,
O boi de Pindaré é uma dança tradicional do
Nordeste e do Norte, compreende também músicas, desfiles e representação
teatral, onde pessoas se vestem com fantasias de bois. Originalmente a história
conta que a mãe Catarina fica grávida de Chico e tem vontade de comer a língua
de um boi.
Então o Francisco para satisfazer o desejo da
esposa ele corta a língua de um animal da fazenda, logo o preferido do
fazendeiro que manda todos os empregados procurar o animal. Que o localizam
agonizando a beira da morte e com a ajuda de um curandeiro, o animal é salvo da
morte.
Em razão do trabalho tinha que viajar muito pelo Brasil e conhecer nossas riquezas. Nosso país é rico em tradições diferentes. As culturas do Sul do Brasil são totalmente diferentes do Norte e do Nordeste. Pouco conhecem nossas tradições como o "maracatu rural" ou o "boi de Pindaré".
Na região sul todos conhecem o
"saci-pererê" que é um menino negro, travesso, que se diverte fazendo
travessuras com animais e pessoas. Usa uma carapuça vermelha, fuma um cachimbo,
tem apenas uma perna e se locomove pulando. Ele é o guardião das florestas, das
ervas e plantas medicinais e conhece o preparo das fórmulas das ervas.
Outra lenda da região sul é a o do Negrinho do
Pastoreio ainda da época da escravidão do século XIX, de origem africana e
cristã, onde um escravo jovem negro no pastoreio sofreu maus tratos do
fazendeiro quando um dos cavalos que estava cuidando fugiu de sua guarda. O
garoto recebeu muitas chibatadas e foi lançado num formigueiro para morrer a
noite.
No dia seguinte o fazendeiro se depara com o rapaz montado no cavalo perdido ao lado da Virgem Maria e não apresentava nenhuma picada das formigas ou ferimento pelo corpo. Num galope o menino sai galopando feliz e livre campo a fora para nunca mais voltar.
Já no outro extremo do Brasil, os povos
conhecem a lenda outras lendas como da Curupira, sobretudo no Amazonas e no
Pará, sendo considerado um dos personagens mais famosos do folclore brasileiro,
é conhecido como um menino de cabelos compridos e vermelhos onde os pés estão
virados para trás e que protege a floresta. Sua lenda tem origem nos povos
indígenas. Essa lenda é bastante antiga, havendo menção a ela do século
XVI".
Também muito difundido a lenda da Iara que
também faz parte do nosso folclore, que nasceu na região amazônica e teve
origem indígena. Consiste numa sereia com longos cabelos pretos e olhos
castanhos, ela emite um som que atrai os homens que ficam hipnotizados com seu
canto e sua voz suave. Conforme a lenda Iara era uma guerreira corajosa e uma
beleza invejável e por isso dois irmãos quiseram matá-la, porém durante o
combate Iara ganhou a briga e matou os dois irmãos.
Estamos na geração do consumismo. Tudo é de
plástico. Tudo é descartável. Estraga e bota-se fora. É inacreditável, na minha
geração, tudo se consertava. Do sapato ao televisor. Hoje, nem existe mais
sapateiros nos bairros. E quando levo um eletrodoméstico ou uma máquina para
consertar, nem fico mais assustado ao descobrir que o orçamento vai sair no
mínimo mais do que a metade que um
produto novo.
Nem sei como as lojas de consertos de
eletrodomésticos sobrevivem. A alguns anos atrás ficava admirado quando ouvia
falar que nos Estados Unidos as pessoas descartavam no lixo televisores,
refrigeradores, fogões, camas e tudo que eram outras coisas de móveis e
eletrodomésticos. E hoje é exatamente isso que encontramos nas nossas esquinas brasileiras
descartadas das grandes cidades. E inacreditavelmente muitas vezes
funcionando.
A quantidade de madeira, vidro e outros materiais
descartados que são encontrados nas ruas das grandes cidades como São Paulo,
Rio de Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte, entre outras é um absurdo. Sendo
possível construir uma casa e até mesmo mobiliar. Tudo é simplesmente
descartado.
Esses materiais se fossem administrados de forma
organizada poderiam voltar ao mercado como matéria prima. Não é raro, um enorme
vidro, maior que uma caçamba ser descartado numa obra porque teve um pedaço
trincado ou quebrado. E assim, se encontram portas, janelas e box novos e até
dos anos de 1930. Estamos ainda atrasados no processo de reciclagem. As ações
empresariais e governamentais são tímidas.
Mais triste ainda é a quantidade de comida que é
desperdiçada. São toneladas. Estamos ainda engatinhando no processo de
aproveitar essa comida toda que está indo para o lixo. Estamos longe da
solução. As classes média e alta simplesmente fazem conta que não existe o
problema ou simplesmente delegam que o problema não é seu. E assim vai o trem
Brasil aos trancos e barrancos. E o pior que moramos num país que o povo
implorando por comida, que morre de fome, em todos os cantos do Brasil. Não
sabemos o que é maior no Brasil, se é a fome da Nação Brasileira ou o
Desperdício da comida.
Nos meu tempo marcas de automóveis eram poucas, três ou quatro. A Volkswagen, a Ford, a Chevrolet e bem depois surgiu a Fiat. Hoje é uma infinidade de marcas e nem se diga de veículos. Isso é ótimo para os consumidores, maior concorrência. Vieram os japoneses e chineses.
Hoje também tudo de plástico e componentes
eletrônicos, com computador de bordo. Luzinha para avisar isso e aquilo. Mas se
o carro não ligar e você estiver numa cidadezinha do interior, senta-se e
chora. Sabe aquela época que você tinha um fusquinha e qualquer mecânico abria
o capo e resolvia qualquer problema? Esse tempo já passou! Ele não existe
mais.
Agora tem que existir um Super Mecânico! Precisa de
um Mecânico Eletrônico Especialista! Se a cidade não tiver, não tem problema. É
só chamar o guincho e levar para a Concessionária mais perto. Que depois de
alguns dias ou semanas você terá seu carro de volta. Se seu seguro tiver
"carro reserva" você ficará mais feliz. Agora se você não tiver
seguro ou dinheiro, senta-se e chora. Porque dependendo do problema, pode ser:
"Injeção Eletrônica", "qualquer um dos Módulos Eletrônicos",
"Computador de Bordo". Aliás quanto mais sofisticado o nome da peça é
claro que mais caro será o conserto.
No passado poucos tinham o telefone convencional.
Inclusive chamava-se apenas de "telefone", nem havia o termo agregado
"convencional". E quem conseguia comprar uma linha telefônica pagava
uma verdadeira fortuna, tal era a raridade de conquistar esse bem. Além disso
era obrigatório ser informado na Declaração Anual de Bens junto a Receita
Federal.
Havia pessoas que tinham várias linhas telefônicas
e as alugavam por mais de um Salário-Mínimo cada uma, garantindo verdadeiras
somas de dinheiro. E hoje a maior parte da população brasileira cancelou este
serviço mesmo sendo gratuito. E as novas gerações nem imaginam o que era aquele
aparelho que tinha os números numa esfera redonda para se discar.
No meu tempo, andava com meu carro durante anos sem
ter que passar por uma oficina. Hoje em dia praticamente tenho que fazer as
revisões anualmente e pagar pelas trocas de peças. Outra coisa que é difícil de
compreender. As estradas e rodovias no decorrer das décadas foram pavimentadas.
Os carros passaram a ser eletrônicos, antes tudo era manual. Se tudo melhorou,
por que agora tem que se gastar mais nas manutenções em espaço de tempo
menores? Até porque um automóvel antes era muito mais barato que hoje é.
Nosso velho companheiro de todas as manhãs nos
cafés, nos trens, nos ônibus, nos aviões é o próximo na fila da extinção. Sabe
quem é? Claro o velho Jornal. Até as antigas bancas de jornal aos poucos estão
acabando. As que persistem em sobreviver vendem um pouco de tudo.
De brinquedos, a pequenos materiais de lojas de
construção civil, presentes. Elas têm tudo. E com certeza o maior faturamento
não advém dos jornais e das revistas. Já passou esse tempo. Quem não se
modernizou, ficou para trás e fechou as portas a muito tempo. O rádio é um
lutador árduo. Vem lutando a muito tempo. Parte dos jovens só o conhecem nos
estádios de futebol. Ou seja, também está com os dias contados nas próximas
gerações. Não tem como escapar da guilhotina, ela é feroz e fulminante.
Mas tem coisas que a gente se surpreende. O Homem
foi a lua. Foi ao espaço. Montou bases espaciais, onde fica meses no espaço.
Descobriu novas galáxias, enviou sondas de reconhecimentos ao espaço universal.
Descobriu a cura para doenças que matou milhões de
pessoas no passado como a tuberculose, a febre
tifoide, a peste negra, a varíola, o a febre tifo, a gripe espanhola. Só essas
doenças totalizaram mais de um bilhão de mortes pelo mundo. E o mundo foi pego
de surpresa em pleno século XXI pelo Covid.
Que obrigou o "Mundo Moderno Tecnológico
Informático" a ficar trancado como no passado, a usar máscaras como na
época da tuberculose. A nuvem preta assolou os quatro cantos do mundo, não
poupou "ricos" ou "pobres". Não teve quem não conhecesse
alguém que a maldita doença não tivesse perdido a vida. Pior ainda dessa vez,
houve os fanáticos contra a vacina. No mundo milhões de vidas foram ceifadas.
Ficou a lição a humanidade para não dormir em berço esplendido. A medicina tem
muito ainda a evoluir, temos ainda a AIDS com um rastro de milhões de
mortes.
A nova geração será com a base da
"inteligência artificial", acredito que tudo que existe hoje passará
por uma nova transformação superior a "revolução industrial" ou
digamos a "revolução da informática". Os filmes das séries
"Perdidos no Espaço", "Star Trek", "Guerra nas
Estrelas" e tantos outros.
Talvez estejam muito mais próximos de se tornarem
realidade e homem no futuro vir a tirar suas férias em outros planetas ou até
mesmo com a ganância da humanidade destruir o nosso planeta e a civilização ter
que ir morar no espaço em enormes naves espaciais que nem nos filmes atuais.
Talvez mais uma vez os filmes antigos como o agente 69 com o seu antigo projeto
de sapato de telefone celular acabou sendo inventado décadas depois.
17 - O Paulo deixa a prancheta, mas a arquitetura não o deixa
Estive a frente junto com alguns outros
moradores do bairro para transformarmos um pedaço de terra em uma pracinha como
área de lazer. A união de todos e minhas conversas na prefeitura com a
arquiteta Sra. Sheila possibilitaram a nossa vitória e a inauguração da Praça
Cajueiro como uma linda área de laser. É como dizem dos aeronautas quando se
aposentam, que nunca mais a aviação sairá deles. E assim, também a arquitetura
não sairá de minhas veias. Tenho como paixão também ficar observando a
arquitetura dos prédios antigos, museus, catedrais, mercados públicos, teatros
municipais e porque não dizer também cemitérios.
Estes lugares preservam toda a história
brasileira. São tantos detalhes de nossa arquitetura. Infelizmente diariamente
a história vem sendo degradada não só no Brasil, mas no mundo inteiro, pelo
animal homem, seja através de sua busca incansável para construir um novo
empreendimento mais moderno, para furtar um busto de bronze, descobrir um
sarcófago e suas riquezas ou em guerras incompreensíveis.
Tenho muita vontade de fazer uma viagem com a
Dayse. Voltarmos a Nova York. Relembrar nossa viagem, caminhar pela Av. Times
Square, na região de Manhattan, visitar a inesquecível Estátua da Liberdade,
visitar a Organização das Nações Unidas e o Central Park. Partir dos Estados
Unidos para Quebec e reviver a nossa experiência do frio da segunda maior
província do Canadá.
Quem sabe ainda nos atrevemos e atravessarmos o
oceano num transatlântico e ancorarmos em Portugal para degustar alguns
queijos, um bom vinho do Porto e aproveitar para conhecer uma Casa de Fados.
Visitar algumas vinícolas francesas, apreciar as pinturas de Monet no Museu do
Louvre e subir na Torre Eiffel.
Como bom católico não poderia deixar de visitar o
Vaticano e o Coliseu em Roma e a Torre de Pisa, em Pisa, a 264 quilômetros
de Roma. Além do magnífico Colosseum.
E passando pela Inglaterra conhecer o Big Ben, o
Palácio de Buckingham e a Torre de Londres. E quem sabe me aventurar e
reencontrar o Duque de Varmlâdia Carlos Filipe, filho do Rei da Suécia.
Para finalizar nossas férias, pousaríamos na
Argentina dançando um tango na Casa Rosada, com uma rápida escala em Santiago
do Chile para aumentar minha coleção de moedas chilenas. Mas tudo isso por
enquanto são apenas sonhos. Mas de sonhos o homem também vive.
TRABALHANDO EU CHEGO LÁ
Comecei a trabalhar muito cedo, aos quatorze anos
já auxiliava meu pai em atividades como motorista. Ele era responsável pelas
provas de concursos públicos realizados em Maceió. Como nunca gostou de dirigir e não era muito
hábil, delegou essa função para eu realizar. Naquela época não havia a
fiscalização sobre os motoristas. Então, íamos até o Aeroporto dos Palmares
para buscar as provas e após a realização do concurso novamente levava meu pai
ao aeroporto para remetê-las ao DASP - Departamento Administrativo dos Serviços
Públicos no Rio de Janeiro.
Sempre estive muito atendo as ocasiões que surgiam
a minha a porta. Não perdi tempo quando tive a oportunidade de ganhar um
dinheiro realizando manutenção de carteiras escolares e do resto do mobiliário
do Colégio São José. Cheguei a ter uma equipe de quatro ajudantes com idade
mais avançada que a minha. E todo o dinheiro que eu ganhava depositava na
caderneta de poupança da Caixa Econômica Federal, ficava apenas com alguns
trocados. Era uma época que vivia com meus pequenos biscates.
Quando fui morar com minha querida avó Filomena em
Recife, sabia que se quisesse mudar meu destino e minha vida teria que lutar e
para isso o caminho seria com muito estudo e dedicação ao trabalho. E foi com o
primo Arremar que consegui meu primeiro trabalho. Ele me apresentou o Augusto
Cesar de Oliveira, filho de dona Inês. E através do intermédio do companheiro
de dona Inês, seu Ribeiro que trabalhava na Prefeitura, consegui uma vaga no
DLFO - Departamento de Licenciamento Fiscalização e Obras.
Foi então que fui fazer o estágio não remunerado no
restauro de plantas parcelares aerofotogramétricas, existentes nas
mapotecas do ETPF (Escritório Técnico de Planejamento Físico). Qualquer
restauro por si só já é um trabalho meticuloso, de uma mão de obra tamanha e de
muita responsabilidade. Foi uma época de enorme aprendizado. Só me deu orgulho
e boas lembranças.
Quando fui contratado na Prefeitura três meses
depois dei um enorme pulo de alegria. Foi quando o arquiteto Aquiles determinou
que o fosse na Prefeitura para que fosse incluído meu nome na folha de
pagamento. Fiquei feliz da vida. Cheguei em casa e comemoramos todos juntos. E
disse para minha avó Filomena e para minha tia que metade do meu
salário seria destinado a ajudar nas despesas da casa. E assim todos os meses
entregava o dinheiro a minha tia que administrava as compras e despesas da
casa. E assim, aos poucos tive a oportunidade de contribuir para
transformar a casa de minha avó mais bonita e confortável no bairro no
Cajuzeiro em Recife.
Arquitetos e amigos Tertuliano Dionísio e Jane Teixeira
E claro como todo arquiteto também realizava meus
bicos por fora. Lembro que meu primeiro trabalho foi para o Clube dos
Lenhadores em 1964. Um clube humilde carnavalesco de Recife com mais de cem
anos. E não cobrei absolutamente nada, porque sabia da história gloriosa de
luta do Clube. E foi uma felicidade tamanha. Em seguida realizei um trabalho
para o Clube de Sargentos Wolf, também carnavalesco. O serviço foi tão
bem-feito e como era véspera de carnaval fui agraciado com a mesa número
"01" do baile de carnaval e com todas as despesas pagas pelo Clube.
Me senti como se fosse o Rei Momo da cerimônia carnavalesca.
Em 1969 tive a oportunidade de projetar o Hotel
Jangadeiros na praia de Boa Viagem, com treze andares, uma cobertura e uma
piscina com vidro onde podia-se ver as pessoas nadando, como se fosso um
aquário. Era uma coisa de outro mundo. E depois os proprietários solicitaram
que projetasse um segundo hotel também
na beira mar de Recife.
Obra JBO – IPOJUCA – PE – Março - 2020
E assim compartilhei diversos trabalhos com o
arquiteto Tertuliano Dionizio, como por exemplo toda a rede financeira do Grupo
Banco Industrial de Campina Grande, que seria um mini Bradesco, com filiais em
todo o Brasil. No Rio de Janeiro fiz todo o projeto, inclusive de todo o
mobiliário. No bairro do Flamengo que projetamos a sede administrativa do
banco, que tenho que ser sincero em dizer que obra ficou belíssima, mesmo sendo
suspeito em dizer isso. Fazia parte da equipe também a arquiteta Jane
Teixeira.
Certo domingo o engenheiro chefe da obra foi realizar uma inspeção na obra e ficou surpreso ao me encontrar trabalhando com a prancheta na mão. Expliquei que isso fazia parte de minha responsabilidade de garantir que todas as equipes não tivessem carência de detalhes para darem continuidade aos seus trabalhos e não ficassem sem o que fazer em razão de detalhamento do projeto e desta forma sempre estava revisando o projeto quando todos estavam ausentes na obra.
Após a finalização da sede do Rio de Janeiro,
realizei o projeto de outras várias filiais do Banco, onde naquela época
existia o setor de Caixa Executivo, que era uma modernidade para as agências
bancárias. Como também havia a recepção, gerência e todas as demais funções
pertinentes ao bom funcionamento de uma instituição financeira.
Foi trabalhando com o arquiteto Tertuliano
Dionizio, que cada vez mais fui me dedicando e me apaixonando na profissão.
Sempre tive uma enorme liberdade para desenvolver todos os trabalhos, mesmo com
as responsabilidades de cada projeto. Aprendi muito com ele e cresci
profissionalmente.
Lembro que ele me chamava de "major" e
nosso escritório era na Av. Conde da Boa Vista. E um dos trabalhos que
fizemos ele me mostrou o terreno do Sesi do Rio Tinto da Paraíba e explanou
como seria o projeto. Quinze dias depois e todo o material já estava pronto. Já
estava desenhando as portarias, vestiários, quadras polivalentes de futebol e
voleibol, restaurante, prédio da administração e um espaço dançante com
palco.
Uns anos depois fui convidado a trabalhar
na "Cohab Recife", que era uma Sociedade de Economia Mista, onde
o Governo Federal entrava com o investimento e o Estado e os Municípios com a
mão de obra e projetos. Não pensei duas vezes e aceitei, inclusive tinha uma
remuneração um pouco melhor, bem como mais atribuições e mais oportunidades de
ampliar conhecimentos.
Em Recife foi uma enorme revolução no campo da
habitação popular jamais visto até então. Na primeira unidade entregamos 1.051
casas, a segunda unidade com 1.043 casas. Já a terceira unidade com 702
residências. A número quatro com 604, e vieram as unidades cinco, seis, e
tantas outras chamadas de URs.
E eu estava lá no meio disso tudo. E o que dizer.
Cada dia era um enorme aprendizado, até porque estava lá como desenhista
projetista. Eu desenvolvia os projetos. Ou seja, projetava, detalhava,
preparava toda a documentação para as licitações. Também integrava as equipes
de fiscalização de campo. Veja bem, não é porque eram moradias para pessoas
humildes que não eram muito bem fiscalizadas.
Tínhamos critérios possíveis e inimagináveis para
as moradias terem o melhor conforto e qualidade de construção. A Cohab Recife
foi uma segunda faculdade que cursei, e porque não dizer, uma pós-graduação.
Estava indo tudo bem no meu trabalho na Cohab
quando surgiu um concurso para desenhista projetista da Sudene -
Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste. Na época era um dos melhores
empregos que poderia se ter, a nível hoje de Receita Federal ou Banco
Central. Na data específica fui realizar a prova prática nas dependências
da própria Sudene.
Fui recebido por um engenheiro que lamentou me
informar que certamente a vaga já havia sido preenchida por um dos outros
candidatos em razão de sua ótima prova prática que havia realizado. Então
questionei: "Como assim? Pois, estou aqui para realizar também a prova
prática, visto que recebi um telegrama hoje as onze horas, e cá estou!" O
engenheiro foi confirmar a informação e desta forma, fui autorizado a realizar
a prova técnica.
Mais uma vez tive que lutar pelos meus direitos,
como assim? Já haviam preenchido a vaga? Se ainda não havia prestado as minhas
provas. Estariam cerceando o meu direito de realizar a provar e poder concorrer
de igual por igual ao outro candidato?
Mas tudo se resolveu e tive meus direitos
garantidos. Fui conduzido a uma sala, onde fiquei sozinho. Havia para eu
utilizar para a realização da prova uma prancheta de desenvolvimento de
projetos, onde tem um tampo com inclinação e um banco para ficar sentado, uma
régua "T", um esquadro, compasso, uma calculadora, papel para
operação de cálculo, um rolo de papel milimetrado, e uma planta
aerofotogramétrica de uma determinada área do município de Petrolina.
Onde seria desenvolvido o atual polo de fruta de mangas, uvas e goiabas. A minha missão era marcar na planta aerofotogramétrica uma topografia conforme complexidades exigências. Mas com minhas experiências na Prefeitura tirei de letra. Uma hora depois o engenheiro voltou para verificar meu trabalho.
Entrou na sala e perguntou: "Então Paulo, como está o teu trabalho?" Eu apresentei. O rolo de papel milimetrado eu não havia utilizado, intacto, sem risco nem rabisco. E qual foi a surpresa dele, ele avistou os meus desenhos de doze perfis longitudinais e seções transversais já transcritos.
E ele me perguntou: "Você achou isso
onde?" Então mostrei que o havia
feito com a minha mão e minha lapiseira. Ele riu. Pegou o telefone e falou com
o coordenador geral e disse: "Está suspensa a aprovação do atual
desenhista projetista, que a partir de agora temos um novo!" E ele me
levou a presença do coordenador, que ficou pasmo com o trabalho e concordou com
minha nomeação. Foi então que disse para mim mesmo "Daqui para frente
ninguém me pega, ninguém me segura!"
Com
os trabalhos que já vinha realizando na Prefeitura e na Cohab e principalmente
com a minha habilidade e aptidão por realizar desenhos técnicos e mecânicos.
Que eram de uma precisão enorme. Todos realizados no sistema métrico decimal.
Assim, com o curso técnico de edificações, onde era propriamente a parte de
construções.
E
na Sudene realizei muitos projetos de casas, fábricas e prédios na Paraíba, Rio
Grande do Norte, no Ceará e em Pernambuco. Era uma fábrica de projetos. Foi uma
evolução enorme que a Sudene teve naquela época. Lembro que a primeira fábrica
que projetei pela Sudene foi a Concreto Blocos do Nordeste, que fabrica blocos
de cimento e pisos articulados de altura semelhante a um tijolo para suportar
muitas toneladas. Esse piso foi feito para durar até se acabar e não se acaba
sem muito durar. Ou seja, dura até o fim do mundo. É um piso para passar
caminhões e carretas dentro de um pátio numa enorme fábrica.
Da
Sudene surgiu novamente uma oportunidade extraordinária. Dessa vez foi para a
FAO - Fundo para Agricultura e Alimentação, sendo uma Entidade ligada a
ONU – (Organização das Nações Unidas). Onde a FAO tinha como objetivo no mundo
inteiro projetos relacionados a agricultura e alimentação. Houve o interesse da
FAO em minha pessoa em virtude de outro trabalho já realizado por mim
relacionado a "Bebedouros de Irrigação" quando estava na Sudene
relacionado a irrigação das frutas de Petrolina e Juazeiro que são exportadas
para o mundo inteiro. Fui uma das diversas pessoas que iniciaram tudo o que
existe no Oásis do Vale do São Francisco que hoje brotam uvas, mangas, coco
verde, banana, acerola. Sem falar na produção de açúcar, álcool e vinho.
Minha
responsabilidade estava relacionada ao desenvolvimento e levantamento
topográfico e elaboração das áreas que seriam plantadas. Inclusive havia
assessoria específica do mundo inteiro, como mexicanos, argentinos, ingleses,
judeus, árabes. Era uma equipe maravilhosa. Uma verdadeira Torre de Babel.
Todos unidos em prol de um objetivo único. Transformar aquela região desértica
em uma potência produtiva.
Conferência Topográfica Locação
de Obra João Pessoa - PB
Petrolina
no início era apenas um vilarejo nos tempos remotos de 1850, era chamada de
"Passagem para Juazeiro". Estando localizada às margens do Rio São
Francisco e com a visão do projeto idealizado pela FAO, se transformou não só Petrolina,
mas também muitas outras cidades ao seu redor, surgindo então o Vale do São
Francisco, propício para o cultivo de uvas, mangas, melões, bananas e cana de
açúcar. Tendo a sua produção durante o ano inteiro, diferente de outras regiões
do Brasil, em virtude de seu clima e da disponibilidade da água.
Com mais da metade de sua produção sendo escoada para o mercado internacional. Até o aeroporto teve que ser duplicado, que virou um dos mais importantes do interior do nordeste. E isso tudo transcorreu durante décadas e com a colaboração de milhares de trabalhadores.
Tenho a obrigação de citar algumas dessas pessoas que se dedicaram para a realização desse sonho como o Gerente Geral Dul'á Navariente, o Administrador General Nafes, o Engenheiro Jesus Morquecho, a Engenheira Liuba Faenzilber, o Engenheiro Puntney, o Engenheiro Gutyeres Frias, o Engenheiro Paulo Verçosa e o Engenheiro Manoel Lubambo.
Depois, surgiu a oportunidade na Siderúrgica Aço
Norte, sendo do Grupo Gaúcho Gerdau. Quando fui admitido a siderúrgica estava
sendo construída em Pernambuco. As obras estavam na fase da terraplanagem num
enorme terreno. O projeto da obra era originário do Rio Grande do Sul. Iniciei
minhas atividades também como desenhista projetista.
Foi muito desafiador e inovador minha vida
profissional, porque o grupo trabalha já em outro nicho de mercado, onde o dia
a dia é cem por cento engenharia mecânica e metalúrgica.
Com extrema precisão nas medidas, não podendo haver
nenhum erro de sequer um milímetro a mais ou a menos. Visto que são medidas
mecânicas de altíssima precisão. Todavia, a minha função era voltada para a
arquitetura civil voltado aos prédios e bases dos equipamentos.
Só para se ter uma ideia um dos prédios tem 35 por
200 metros. E uma siderúrgica é composta por vários prédios de significativa
dimensão como o prédio da sucata, laminação, aciaria e trabalhos para um
arquiteto civil não faltava. A aciaria para os leigos é uma parte da
siderúrgica que promove a mudança do ferro gusa com sucata em aço.
Certa vez o grupo comprou uma pequena siderúrgica e
fui incumbido de realizar o levantamento da situação real da empresa. Já nos
primeiros levantamentos foi possível identificar a forma precária que
trabalhavam, sem falar sem normas e procedimentos. Ao solicitar ao Gerente
Geral as plantas e desenhos dos processos, simplesmente me respondeu que nada
existia.
Fiquei olhando para a siderúrgica e pensando nos
funcionários trabalhando daquela forma arcaica e arriscada. Havia levado uma
trena de trinta metros e comecei a realizar as primeiras medições sozinho. E
até ficava vendo-os me observando medindo e trabalhando como se estivesse
fazendo algo de outro mundo. Felizmente também havia levado dois cadernos de
papel milimetrado, e assim colei as suas folhas e fiz uma planta de um metro
por dois metros aproximadamente.
Philadelphia – EUA - 1995
Comecei a medir e desenhar toda a siderúrgica. Para
se ter uma ideia a balança dos caminhões era muito pequena, então tinha-se que
pesar primeiro a parte da frente do veículo e depois a parte de trás, somava-se
os dois pesos e dividia-se por dois. E transportei tudo para a planta, os
prédios, a balança, portaria, administração, refeitório, vestuário, laminação,
almoxarifado, carga fria, rampas de lavagem e lubrificação de veículos. O
gerente geral no fim do dia perguntou como estava o trabalho e lhe apresentei a
planta.
Ele ficou assustado e não acreditou que eu havia a
desenhada. Tal foi sua preocupação que ele telefonou para o Engenheiro e
Diretor da Empresa que ao saber no dia seguinte pegou um avião e foi para a
empresa. Realizou uma reunião comigo e analisou a planta desenhada no dia
anterior e aperfeiçoada no hotel a noite. Ele ficou espantado com o que estava
vendo.
Expliquei qual era minha função naquele momento.
Onde o grupo habitualmente numa incorporação de uma empresa procura realizar
diversas adequações aos padrões operacionais, já prevendo também ampliações.
De imediato ele informou que eu teria carta branca
para continuar meu trabalho e me parabenizou pela exatidão de meus resultados.
Fiquei muito feliz, com sentimento de prazer imenso. Quinze dias depois,
recolhi os resultados das "cartas convites de concorrência" das obras
que iríamos realizar na siderúrgica, eu estava entrando na empresa e meu
superior de Recife estava na siderúrgica, até fiquei assustado porque ele não
havia me dito que estaria nos visitando. Mais assustado ainda fiquei quando me
disse com as suas mãos na cabeça para eu ficar "calmo" porque o
Presidente Jorge Gerdau Johannpeter e Klaus Johannpeter além de
outros membros da Diretoria estavam a horas me esperando.
Fui a sala de reunião, sendo apresentado a todos, e
expliquei o motivo do meu atraso, visto que estava recolhendo os envelopes
lacrados em diversas empresas das obras que seriam realizadas. Disseram para eu
ficar tranquilo. E fomos discutir todo o projeto.
Apresentei todos os dossiês e mapas comparativos de
preços e custos que havia elaborado. Bem como uma avaliação cadastral realizada
pelo Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura. Ao término da reunião a
diretoria comunicou que deveria concluir o detalhamento do projeto e deveria
fazer toda a execução da obra, onde teria carta branca. Foi uma felicidade
imensa. Foram quase oito anos na Siderúrgica Aço Norte.
Numa bela manhã com um sol forte, soube que havia
uma vaga na Votorantim, na época chamava-se Grupo Zé Hermínio de Moraes. Era o
Grupo do Cimento Poty. A primeira missão minha foi a revitalização da fábrica
Poty na região de Recife em Pernambuco. Foi necessário construir um Centro
Regulador de Estocagem, com o objetivo de realizar o transbordo da carga
dos caminhões ou simplesmente ficavam estacionados a noite para seguirem viagem
no dia seguinte.
Mas o normal era realmente a estocagem do cimento
com empilhadeiras no Centro de Estocagem para posteriormente seguirem viagens
para diversos postos de distribuição. Foi um sucesso o meu trabalho e não parei
mais.
E passei a revitalizar cada um dos prédios do
grupo. Quando me entregaram o projeto da Companhia Nordestina de Papel, informei que não era possível de ser feito como
planejado e redefini todo o projeto civil, relativo aos prédios, ao pé direito,
a estrutura metálica, a adequação das pontes rolantes etc. Porque o projeto
originário vem pronto da Alemanha. E felizmente foi novamente outro sucesso. E
não parei mais, viajando pelo Norte, Nordeste e Sudeste.
Certa vez fui convidado pelo Dr. Clóvis a
acompanhá-lo numa reunião em São Paulo num investimento que estava praticamente
fechado relativo a uma fábrica de purificação de água HTL num local que possuía
uma atmosfera muito ácida, razão pela qual é necessário utilizar elementos
antiácidos, não podendo utilizar por exemplo estrutura metálica. Tendo que
utilizar concreto com revestimento e a utilização de impermeabilizantes de alto
custo a base de pintura epóxi, e mesmo assim a durabilidade dessa estrutura é
relativamente pequena.
Frente a todas as minhas explicações o negócio da
nova fábrica foi água abaixo e o Dr. Clóvis economizou uma fortuna de um
prejuízo certo. A partir daquele momento passei a fazer parte de reuniões de
novos negócios e ser sempre consultado por ele. Acabei também repaginando o
projeto da casa sede de sua fazenda e fiz o projeto de uma suinocultura
industrial, sendo uma das coisas mais lindas do mundo que fiz e que nunca pensei que eu faria algo
semelhando com capacidade para 125 matrizes.
Escavação de sapatas – Obra de João Pessoa - PB
Em outro projeto inovador fui elogiado por um amigo
do Dr. Clóvis ao tomar conhecimento que eu tinha modernizado o local onde
ficavam as matrizes de suínos com equipamentos de "sonorização".
Casualmente essa pessoa também era produtor rural no setor de suinocultura e
perguntou se porcos gostavam de música.
Eu lhe respondi que a música acalmava e tranquilizava as matrizes, ficando enormes e vagarosas durante a gestação. Ele ficou pasmo com minha explicação e disse que iria realizar projeto piloto em sua propriedade. Fiquei gratificado pelo reconhecimento.
Outra tarefa que tive a felicidade de realizar foi
a projetar a loja de Pneus Shop. Já com tecnologia elevada, troca,
balanceamento e alinhamento de pneus tudo eletronicamente. Havia várias filiais
em cidades nordestinas e inclusive uma na Rodovia Dutra. Nessa projetei uma
balança para oitenta toneladas, uma enorme loja de pneus, portaria,
administração geral, vestiários, refeitório, uma área de lazer, captação e reuso
de água.
Perfuramos um poço artesiano com 110 metros de
profundidade e bombeado a água para uma caixa de cinquenta mil litros e,
um truck center que é uma loja de pneus para caminhões grandes e ônibus com
todos os respectivos serviços. Isso é um pequeno resumo de algumas de algumas
das obras que realizei no grupo Votorantim.
Também realizei modernizações de algumas usinas de
cana de açúcar, onde também incluía um laboratório de análise de sacarose. Onde
os caminhões canavieiros chegam carregados de cana e através de um aparelho é
colhido através de uma pulsão o líquido da cana para então proceder o teor de
sacarose cada uma das pesquisas.
Reconstruía as instalações administrativas, que
muitas vezes eram casas antigas, ainda com telhas de barro francesas e com
vegetação crescendo. Desenhei e construí um projeto com embelezamento, com ruas
internas, com fluxo de entrada e saída. Na verdade, era algo natural para
qualquer projeto, mas inexistente dentro de fazendas.
E foi numa das Usinas que realizei um dos meus
projetos mais emocionantes e significativos. Tive a oportunidade de resgatar um
pedacinho da história do Brasil que estava se deteriorando. Minha função era a
modernização das moendas de cana, construção de um laboratório e outros prédios.
Além de todos os demais aparatos habituais de projeto que ocorria quando era
incorporado uma nova empresa ou fazenda ao Grupo.
E durante minhas incursões pela fazenda me deparei com dez locomotivas canavieiras antigas abandonadas no meio do matagal, já em estado de ferrugem acentuada.
Locomotiva Canavieira Restaurada.
Hoje escultura no gramado da sede em Piratininga –
SP
Fiquei abismado e maravilhado com tanta coisa linda
abandonada e apodrecendo com o transcorrer dos anos na chuva e no sol. Fiquei
olhando admirando elas feito uma estátua, era tanta coisa linda.
Não sabia se chorava ou ria. Apenas descobri que
seria o salvador daqueles monumentos. Naquele momento me senti modestamente
como o ator Indiana Jones no Filme Caçadores da Arca Perdida.
Imediatamente telefonei ao Dr. Clóvis lhe contando
da descoberta e ele também ficou da mesma forma admirado e compreendeu ser um
desperdício deixar aquele pedaço da história da fazenda se acabar naquele
pedaço de terra.
Trocamos
ideias e fui autorizado a iniciar a recuperação de todas as locomotivas. Não
sei qual foi maior alegria que tive naquele dia. Se foi a descoberta ou a
autorização para realizar a restauração de todas.
A primeira que recuperei tinha o tamanho de uma camionete rural willys, aproximadamente seis metros de cumprimento, muito magrinha com uns 120 centímetros de largura, com dois metros de altura. Todo o trabalho de restauração foi realizado com os próprios funcionários da fazenda, desde o serralheiro, pintor e todos os demais envolvidos.
Essa locomotiva foi enviada para a Fazenda São José
do Bom Retiro situada na cidade de Capanema no Estado de São Paulo, onde tem a
sede do Dr. Clóvis. Inclusive enviei parte dos trilhos para que a locomotiva
ficasse por completa instalada sobre tormentos de madeira. Ficou uma coisa
linda e Dr. Clóvis ficou muito satisfeito.
As outras locomotivas também recuperei e foram
enviadas a sedes de outras empresas. Muito bem-posicionadas em gramados, de
forma que todos pudessem observar, fotografar e compreender que elas eram uma
escultura e fizeram parte da história da agricultura brasileira. Claro fiquei
muito envaidecido pela realização desse projeto, foi uma felicidade imensa a
concretização pois pude resgatar um pouco da história da Usina São José da
cidade de Goiana no Estado de Pernambuco.
Outro projeto sensacional que realizei foi o hangar
particular da Empresa Indaia Táxi no Aeroporto de Guararapes, em Recife. Era a
empresa particular de transportes aéreos do Grupo Votorantim. Tendo sido
primeiramente aprovado pelo antigo DAC - Departamento de Aviação Civil.
Inclusive esse Hangar ficou famoso e como
referência para outras empresas realizarem seus hangares. Realizamos o projeto
completo, com oficina de manutenção, vestiários, sala de estar executivo, sala
gourmet, uma pequena cozinha, banheiros. De forma que pudesse acolher os
diretores, a presidência e seus familiares com o conforto que eles
mereciam.
Obra de terraplanagem – JBO – Ipojuca - PE
É sempre importante lembrar que toda obra não se
faz apenas com os engenheiros e arquitetos. Pelo contrário existem os
auxiliares de serviços gerais, o servente, o especialista em pedreiro, o
pedreiro de acabamento, o azulejista, o armador que cuida de toda a ferragem da
obra, o carpinteiro que cuida das formas, o gerente de obras e outras funções.
Todos nós juntos que seja no campo ou na cidade que
erguemos um edifício, um empreendimento, uma refinaria ou qualquer outra obra.
Todos nós temos uma importância no projeto. Sem o nosso trabalho coordenado a
obra não seria realizada com sucesso. Imagina se for construindo o edifício com
a ferragem ou com a dosagem errada de cimento. Ou então no lugar errado,
digamos no endereço do vizinho, e incrivelmente já ocorreram erros assim.
Sempre admirei a forma que era tratado pelo Dr.
Clóvis e sua família. Quando fui apresentado por ele a seu filho e me
apresentou como seu “colega de trabalho” e não como seu funcionário. E certa
vez acompanhei Dr. Clóvis até sua casa e a sua própria esposa preparou um
expresso na máquina de café italiana.
Trabalhei durante vinte e dois anos no Grupo
Votorantim e sai com a cabeça erguida pela porta da frente não só da
Votorantim, como de todas as demais empresas por quais passei. Sei que sempre
realizei com enorme profissionalismo todo o meu trabalho. Nunca precisei magoar
ou machucar qualquer colega de trabalho. Ajudei muitos colegas da mesma forma
como outros me ajudaram. Compartilhei meus conhecimentos, até porque quero que
outros venham a aproveitar meus aprendizados.
Fui devagarzinho me preparando para o momento da
minha aposentadoria. Não imaginava ficando dormindo até o meio-dia ou sentado
no sofá vendo o dia passar pela tela da televisão. Nada disso! Já tinha meus
planos de abrir uma empresa de arquitetura e trabalhar com meus filhos. E
assim, surgiu a Arquimendes Representações. Estou a mais de dez anos
trabalhando em projetos no polo petroquímico com obras de terraplanagens.
Nunca coloquei limite dos meus esforços nas minhas
atividades profissionais e as empresas em que trabalhei sempre souberem disso.
Por exemplo com tudo preparado para minha formatura em Mogi das Cruzes no
Estado de São Paulo, acabei não estando presente na minha cerimônia em
razão de uma viagem urgente a Manaus.
Normalmente nas quartas feiras de cinzas já estava
trabalhando, inclusive certa vez o Dr. Clóvis ficou surpreso ao me encontrar
trabalhando numa dessas quartas feiras. Outra vez numa semana pré-carnavalesca
estava em João Pessoa e fui informado no sábado que deveria estar em São Paulo
na semana do carnaval para definir um projeto de fábricas de produtos químicos
e informei que estaria à disposição da empresa a viajar a qualquer momento.
Outra
curiosidade que da época de trabalho pela maioria das empresas que trabalhei é
que sempre fiquei hospedado nos melhores hotéis da cidade, em sua maioria em
cinco estrelas, quando existiam essa possibilidade na localidade. Mas não por
minha exigência, porque poderia ter ficado em hotéis mais simples que estaria
muito bem hospedado. Nas minhas prestações de contas, sempre fui muito
criterioso, anexava todas as notas fiscais e comprovantes, mas sempre a pessoa
responsável por ordem da diretoria com a maior delicadeza me dizia que não
havia necessidade das prestações de contas.
A
dona Sueli Mourador dizia que eu não precisava apresentar a despesa, apenas
informar o seu valor. Tenho o orgulho de afirmar que nunca me aproveitei dessa
situação para acrescentar valores indevidos as minhas prestações de contas.
Jamais coloquei um centavo a mais em nenhuma prestação de minhas contas. Isso
jamais fez meu estilo. Nem sequer sonhar. Essa foi a educação que recebi de meu
pai, e foi essa que passei a meus filhos.
Sempre
trabalhei com muita dedicação e profissionalismo. Sei que meu trabalho era
muito bom. E os benefícios que tinha não eram pelos meus lindos olhos verdes.
Sempre fui um homem muito dedicado ao trabalho, a perfeição dos meus projetos.
Até porque ganhava muito bem. Mordomia completa de toda a forma concedida pela
empresa.
Cheguei aonde cheguei por mérito meu. Só meu e de
mais ninguém! E isso que quero passar para todos vocês. Corra atrás. Lute e não
desista dos seus sonhos, não se deixe abater pelas dificuldades. Quando você
quer ser alguém de verdade, você não depende de ninguém. Você não depende do
seu pai e nem da sua mãe. Você depende é de você, é por isso que escrevi essas
linhas. Para dar uma sacudida nas pessoas, dar um choque de motivação. E dizer
que para você vencer na vida só depende de você. Pode até parecer repetitivo o
que estou dizendo, mas esse é o meu recado.
Amo o meu trabalho. Continuo trabalhando. Hoje
estou feliz, estou satisfeito, realizado, tenho uma família estruturada. Tenho
minha esposa, meus filhos, minhas noras, meus netos. Estou velhinho. Estou
beirando os oitenta anos. Ainda trabalho mais por paixão que por necessidade.
Tenho uma memória superprivilegiada, estou ativo. Agradeço muito a Deus pela
minha saúde e pelo meu bem-estar físico. Obviamente que tenho algumas
limitações, sou hipertenso.
ÚLTIMAS LINHAS
Estou chegando ao final desse projeto de escrever a
minha história, vou ser honesto primeiramente em dizer que em momento algum
tive a pretensão de exibicionismo ou me vangloriar para dizer que escrevi minha
biografia. Ao contrário que possam pensar está minha história relata a
trajetória de vida de um homem trabalhador, de um pai de família, como tantos
outros que todos os dias acordam e vão trabalhar atrás do sustento para suas
famílias. Não existiram glórias ou milagres na minha história, é apenas uma história
de um homem religioso, pai de família e trabalhador.
Houve muito estudo, muita dedicação, muito esforço,
muitas noites trabalhando. Muito apoio de minha esposa Dayse, sem nossos
esforços jamais teríamos chegado até
aqui. Com minhas viagens constantes, ela foi a mãe protetora, uma leoa
protetora de nossos três filhos. O qual sempre foram nossas maiores riquezas.
Nossas benções que recebemos com a graças de Deus.
Este projeto durou aproximadamente um ano. E
realizei em total sigilo. Ninguém de minha família soube de nada. Nem minha
esposa, nenhum de nossos filhos ou netos. Tudo foi um absoluto segredo.
Realizei com a colaboração de um amigo, Jones Rodrigues, que conheci nos
últimos tempos. Eu enviava por mensagens de voz, ele transcrevia, depois eu lia, fazia correções e aprovava cada
um dos capítulos.
No início eu tinha uma ideia do projeto, conforme
fomos desenrolando o projeto foi tomando outras formas. As minhas histórias se
confrontaram com as evoluções que estavam ocorrendo e acabei tendo a
oportunidade de olhar para meu interior, como se fosse uma seção de terapia, de
autoanálise.
Revivi toda a minha vida. Tudo o que aconteceu
comigo. Desde a partida de minha querida mãe. Depois a infância com meu pai. A
escola e o colégio. As brincadeiras com os meus irmãos e meus amigos. Os
problemas de relacionamento. A partida para a casa de minha avó Filomena que
foi minha segunda mãe. O início da vida profissional. A paixão e casamento pela
Dayse. A chegada dos três filhos. Depois meus netos.
Enfim, hoje olhando para trás, posso dizer que não
tenho feridas abertas. Tudo que aconteceu foi resolvido no seu devido tempo.
Alguém até pode questionar se tudo realmente foi resolvido, por que foram
mencionados alguns assuntos nessa obra? Então, veja bem, tudo o que aconteceu
foi parte de minha história e a forma como que contei foi como os meus
sentimentos foram atingidos. Desta forma, o livro não seria verdadeiro como uma
biografia se fossem omitidas certas situações que me fizeram sofrer muito. O intuito
não é machucar ninguém, mas simplesmente narrar o fato como aconteceu, mesmo
que atualmente superado.
Costumo dizer que sou uma pessoa privilegiada. Tive
a oportunidade de superar todas as minhas dificuldades, de trilhar pelos
caminhos corretos e do bem, de ter Deus ao meu lado em toda a minha vida. De
ter sido abraçado pela minha avó Filomena quando eu mais precisava de um colo.
E porque não repetir mais uma vez de ter encontrado uma mulher maravilhosa que
construiu comigo nossa família pedra sobre pedra.
Nessas décadas todas, tantas coisas eu vi acontecer
na minha frente. Coisas que para os jovens de hoje são tão insignificantes, e
eles nem dão valor. Por exemplo um simples rolo de papel higiênico, meus netos
ficarão de boca aberta quando souberem que eu tinha que todos os dias rasgar o
jornal e colocar no banheiro. E nem vou contar como era antes do jornal, ainda
bem que nem peguei aqueles tempos.
A evolução dos carros rabos de peixe para os
fuscas, depois para os opalas e landaus e tantos outros que nem existem mais
hoje. Quando surgiu o projeto do Proálcool, e agora a moda é o carro elétrico.
O mercado nacional foi aberto, a Ford foi embora do Brasil. Isso alguns anos
atrás isso seria impossível. Hoje ninguém mais sabe quantas indústrias
automobilistas existem no país e muito menos o nome de cada uma delas.
Nem falarei da modernização quando chegou o
primeiro liquidificador na minha rua, que casualmente foi na minha casa.
Atualmente máquina de lavar roupa já é necessidade para todas as famílias
brasileiras. E para isso aboliu-se as velas e lampiões. Imagina meus netos não
poderem usar seus celulares e internet porque não existir luz elétrica em
nossas casas? Ou ter que tomar banho com uma lata de água em cima da cabeça com
uma mangueirinha de chuveiro de plástico.
Hoje as telas de televisão são enormes. Muitas
vezes temos a impressão de que é pura realidade e você está no cenário. Agora
você imagina meus queridos netos assistirem uma televisão de quatorze polegadas
preto e branco ou então assistir o final da copa do mundo num radinho de pilha
o jogo atrasado algumas horas, porque a décadas atrás os jogos não chegavam no
Brasil ao vivo, naquela época ainda não havia os satélites. Os jogos somente na
década de trinta passaram a ser transmitidos ao vivo no mundo inteiro.
E quando éramos crianças nos reuníamos em roda na
fazenda e escutávamos histórias de lobisomem em noite de lua cheia. Dormíamos
morrendo de medo. Com o vento forte soprando e fazendo qualquer barulho, nos
cobríamos com lençol a cabeça toda lembrando das histórias. E o homem de lá
para cá foi a lua. Saiu do planeta sabe-se lá quantas vezes. Foram os
Americanos, os Russos, os Chineses e tantos outros. Colocam seus satélites para
isso e para aquilo. E o Santos Dumont voou com seu 14 Bis. E eu tive a
oportunidade de assistir tudo isso.
Vi passar pela televisão tantos salvadores da
pátria com suas ideias espetaculares e planos infalíveis. Teve um que culpou o
chuchu pela inflação. Depois criou o slogan que primeiro era preciso o povo se
unir e trabalhar para fazer o bolo crescer, depois de pronto seria partido e
divido com a nação, e até hoje o povo está esperando o bolo crescer.
Teve outro slogan "Brasil ame ou
deixei-o!" E teve o futebol também como estratégia política. Sensacional
foi a vassourinha mágica do Jânio Quadros, a construção de Brasília com
Juscelino Kubitschek e o Oscar
Niemayer, as ideias de João Goulart e sua queda, os anos militares e nova
democracia.
E o que aprendi? Todos passam, ninguém é
eterno. O próprio muro de Berlim caiu e quantos morreram tentado atravessar
ele. Até mesmo a Muralha da China um maluco fez um buraco para abreviar seu
trajeto diário. Ninguém tem a verdade absoluta. E não existe um salvador
da pátria.
O tal salvador da pátria é o próprio povo
brasileiro que tem que amadurecer. E para isso acontecer, somente com educação
e desenvolvimento da sociedade. Enfim, estamos muito longe disso. Assim, vamos
continuar com o povo sonhando com os salvadores da pátria, seja da direita, da
esquerda, do centro ou do lado que vier.
Mas se por um lado evoluímos, temos o outro
lado. A ganância do animal homem até onde será que irá? A Amazônia e o Pantanal
dos meus tempos de criança não existem mais. A própria comunidade indígena e do
próprio homem branco pode estar em extinção acelerado nas próximas gerações.
Será que poderemos frear o descongelamento das
geleiras? Será possível ser recuperada a camada de ozônio de nosso planeta? O
aquecimento do planeta poderá ser freado? Será que sobrará alguma coisa para os
netos de meus netos?
Ou será que o destino das futuras gerações
serão as previsões dos atuais filmes cinematográficos de extinção da raça
humana que vive em guerra eterna com robôs em um planeta em destroços e estarão
obstinados a viverem em naves espaciais ou em outro planeta? Pode ser surreal o
que estou escrevendo, mas tantas coisas foram previstas em acontecer e nem vou
longe, só lembrar do telefone do sapato do agente secreto 86.
E quem é esse Brasil afinal? Muitos jovens têm
um desejo latente de ir porta a fora de nosso País. E se vão embora. Não tenho
pretensões de entrar no mérito do certo ou errado. Mas nosso Brasil antes de
ser um País é um verdadeiro Continente. Enquanto o Brasil sozinho tem
aproximadamente 8,52 milhões de quilômetros quadrados, toda a Europa tem
aproximadamente 10 milhões de quilômetros quadrados com seus cinquenta
países.
Por outro lado, o nosso Brasil está longe dos
desastres ambientais como os terremotos, tsunamis, vulcões, geleiras, neves e
tantas outras situações naturais que existem em outros países. No Brasil temos
uma agricultura fértil onde tudo que se plantar nasce. Existem verdadeiras
hortas até dentro de apartamentos. Temos riqueza de qualidade de terra, de
água, de sol, de tudo. Temos agricultura fértil o ano todo, com culturas
diferentes do Norte ao sul.
Claro, falta melhor distribuição de renda,
maior oportunidade para os trabalhadores, mais investimento para a educação,
saúde, tecnologia, segurança pública. Temos um choque de desigualdade entre
cidades do agreste nordestino e as cidades do sul. É um contraste enorme, em
todos os setores, principalmente relativo à saúde, educação e condições de vida
dos brasileiros.
Existem ainda cidades com falta de água,
famílias com precariedade de condições básicas de existência e sem emprego. O
mesmo se aplica para as grandes favelas nos grandes centros brasileiros.
Conheci na jornada de minha vida tantas e tantas
pessoas. Mas a personalidade mais importante que vim a conhecer que jamais
esquecerei foi uma morena, com um sorriso inocente, com olhos castanhos, pele
morena e cabelos pretos. Foi paixão imediata.
Não sei explicar, mas desde o meu primeiro olhar
fiquei encantado por ela, verdadeiramente abduzido pelo seu charme e pela sua suavidade
da sua simpatia. Algo me dizia já nos primeiros dias de namoro que ela era a
mulher de minha vida, que seria a mãe de nossos filhos. Fiquei encantado pela
Dayse. Meu maior patrimônio que sem dúvida alguma são meus filhos, orgulho de
minha existência.
REFERÊNCIAS
BIOGRÁFICAS
·
Acervo da
Biblioteca do IBGE
·
Revista
Algo Mais – Rafael
·
Eucurtorecife.com.br
·
Álbum de
Pernambuco
·
Revista de
Pernambuco
·
Almanaque
de Pernambuco
·
https://pt.wikipedia.org/