quinta-feira, 10 de dezembro de 2020

Da VARIG a KLM - PORTA DE EMBARQUE - 40 ANOS DE ESTÓRIAS SOBRE AEROPORTOS E AVIÕES

 

Meu nome é Antônio Souza. A casa onde nasci e cresci situava-se a poucos quilómetros da cabeceira da Pista 17 do Aeroporto do Porto em Portugal, sim não sou Brasileiro, e justamente na rota de aproximação das aeronaves para pouso. Era fascinante ver os aviões de minha casa e deve ser dali que nasceu meu amor pela aviação. Hoje reconheço que estas duas paixões condicionaram a minha carreira e a profissão fantástica que abracei ao longo de 40 anos, a aviação e por automóveis.

Assim, cresci escutando o ruído estridente dos motores dos aviões e, desde muito cedo habituei-me a admirar a beleza daqueles “pássaros metálicos” que teimavam em se mostrar para mim. Apesar de ainda ser da era dos DC3 e dos Super-Constellation, confesso que a lembrança que guardo de infância é do Caravelle da TAP. Em 1962 a TAP havia entrado na era do jato e aquele barulho das turbinas fascinava-me e a aeronave era de uma elegância incomparável. Outra coisa que recordo com muita clareza era a potencia das landing lights destas aeronaves. Não entendia porque e que os fabricantes de automóveis e a Prefeitura não colocava aquela iluminação nos carros e nas ruas da cidade.

Cada vez que admirava aquelas belezas por cima da minha cabeça, sonhava sempre e pedia a Deus que “quando fosse adulto” eu pudesse viajar muito de avião. Acho que pedi tantas vezes que Ele, para não me escutar mais, acabou por me dar uma profissão que me proporcionou milhares de horas de voo, centenas de aeroportos e umas boas dezenas de países.

Mas apesar do meu fascínio pelos aviões e pelas landing lights, a minha paixão sempre foram os automóveis. Desde muito cedo, quatro ou cinco anos cultivei o prazer de colecionar miniaturas de automóveis. Primeiro os Matchbox e os Diny-Toys e posteriormente as várias marcas que foram aparecendo (Solido, Norev, Gama, Schuco, etc). A partir dos meus 12 anos aventurei-me na montagem de miniaturas e aos 15 anos cheguei mesmo a “produzir” em pequena escala alguns modelos inéditos e exclusivos do popular carro europeu, Citroen 2 CV. Parte destas “criações” eu vendia em lojas da especialidade, no entanto guardei alguns exemplares que ainda hoje conservo. As minhas “voltas ao mundo” não impediram que eu mantivesse este hobby e hoje conto com mais de mil miniaturas, devidamente expostas e conservadas com muito carinho.

Mas, ainda relacionado com o meu fascínio pelos aviões e a minha paixão pelos automóveis, tive a sorte de poder conciliar estes dois amores em simultâneo e num único local. Explico. Na década de 60 as corridas de kart eram muito populares no Norte de Portugal. Uma vez que não havia muitas pistas disponíveis – kartrodomos nem pensar – os clubes arrumaram uma forma de realizar, em segurança, corridas de karts num asfalto excelente, o pátio de estacionamento do Aeroporto do Porto! Por sorte meu pai também partilhava as mesmas paixões e nos fins de semana de corridas, lá íamos nós em direção ao aeroporto.  Nos fins de semana operavam poucos voos para o Porto e, aproveitando o espaço livre do pátio, colocavam-se uns fardos de palha e uns pneus velhos a cercar o recinto e mais umas dezenas de pequenos motores roncavam no meu ouvido. 

Nos dias de hoje isto seria impensável .Ainda hoje sou apaixonado por o ruído de (bons) motores. Um avião decolando, um Formula 1 em reta, não tem existe melhor melodia para os meus ouvidos. Sou de uma realidade um pouco diferente do povo irmão brasileiro, que admiro com muito carinho. Nasci e cresci na bonita cidade do Porto, em Portugal, em 1959. Como era costume naquela época, o parto foi no quarto da casa dos meus pais. Conto este pormenor para que se entenda melhor sobre as minhas paixões de infância e adolescência.

Sou autor do Livro  “Porta de Embarque – 40 anos de estórias sobre aeroportos e aviões”, onde  relato nos detalhes histórias de minhas experiências na aviação. No livro o leitor irá encontrar histórias hilariantes e impensáveis nos dias de hoje sobre acontecimentos reais. É uma leitura gostosa para se saborear. De se rir pelos cantos. Das trapalhadas que as vezes as situações da aviação nos coloca no dia a dia do nosso trabalho. Situações surreais como você ficar dentro da área controlada pelo Talibã, ter um passageiro morto na primeira classe, ter o dobro de passageiros que o avião comporta.

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 O Livro é uma ótima sugestão de leitura para um voo de avião ou de ônibus. Ou então, uma tarde de chuva, para fugir da rotina do Shopping de um final de semana. Quem comprar não vai se arrepender. Mas garanto que não vai conseguir largar o livro enquanto não terminar de ler.  Nessa entrevista que estou realizando para o Blog, vou contar superficialmente algumas coisas de minha vida e algumas coisas do Livro.

Voltando a minha infância, minha paixão principal tem a ver com os automóveis de competição. A segunda paixão nasceu do fato de a nossa casa se situar a escassos quilómetros do aeroporto do Porto, exatamente no trajeto da aproximação à cabeceira da pista 17. Desde muito cedo acostumei-me a olhar e escutar os aviões - Caravelle, naquela época - passando bem por cima da minha cabeça e um desejo muito forte começou a crescer em mim, eu teria de experimentar o voo! Confesso que o desejo maior era voar como passageiro. No fundo, o meu sonho era mesmo ser um piloto de automóveis que viajasse muito de avião. Seria o meu futuro perfeito.

Posso dizer que fui uma criança e adolescente com muita sorte, tendo duas coisas espetaculares ao alcance dos meus olhos sem nada pagar e nada buscar, carros e a Aviação. Que se transformaram nos meus incentivos para a realização da minha vida. A minha infância adolescência foi muito ricas em viagens. Mas viagens de carro!!! Queria eu poder viajar pelo mundo de avião.  Meus pais faziam das viagens na Península Ibérica um hobby e, desde muito cedo, habituei-me a viajar, a lidar com diferentes costumes e a arranhar um “portunhol” com os locais.     

Mas a vida reserva-nos sempre muitas surpresas e imprevistos. E, nos finais de 1978, num Portugal sem grandes esperanças para os jovens, fruto de uma economia muito frágil, resolvi emigrar para um país que sempre fez parte dos meus sonhos, o Brasil!   Por motivos familiares “desembarquei” em Foz do Iguaçu, a famosa terra das cataratas. Dois anos ligado ao Turismo, deram-me a oportunidade de conseguir um lugar na saudosa VARIG, como Agente de Serviço de Atendimento Especial (SAE). A construção da barragem de ITAIPU originou um número crescente de individualidades e VIPs a bordo dos voos da VARIG, sendo que este tipo de serviço – Atendimento Especial - fazia todo o sentido ser implementado no Aeroporto de IGU.


A minha ida para o Brasil, com apenas 19 anos, não foi a minha primeira escolha, na verdade tratou-se de um Plano B. Na verdade, desde os meus 17 anos, lá pelos por 1976, resolvi me aventurei a viajar pela Europa com uma mochila nas costas, pouco dinheiro. Mas uma enorme vontade de conhecer novos países e novas culturas. Em 1977 repeti a dose e, no final de uma dessas viagens havia voltado para minha casa, em Portuga, no Porto, com uma promessa de trabalho na cidade de Monchengladbach, na prospera e rica Alemanha.  

Estas viagens eram efetuadas de trem, através de um bilhete exclusivo para os jovens, chamado Inter-Rail. O segredo para poupar dinheiro, consistia em tentar pegar sempre os últimos trens da noite e assim aproveitar a viagem para dormir no trem, sem a necessidade de ter de procurar um hotel.

Mas voltando à minha escolha pelo Brasil, a minha “promessa” de emprego na Alemanha de pouco valeu junto ao Consulado deste país no Porto. Naquele tempo ainda não tinha ocorrido a criação oficial da União Europeia e a “livre circulação entre os povos Europeus”, hoje consagrada nas leis Europeias, não passava de um sonho. Assim, vendo recusado o meu visto de trabalho para a Alemanha, não hesitei e decidi que iria para o Brasil. A razão principal deveu-se ao fato de eu ter tios vivendo em Foz do Iguaçu, a famosa terra das cataratas.

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Desta vez o “cupido” da aviação atacou forte e uma paixão muito forte pela área operacional da companhia tomou conta de mim. Aos 22 anos eu tinha uma certeza muito grande,  a minha profissão teria de estar ligada para sempre à aviação comercial e na área operacional. A ascensão foi rápida e metódica. Em pouco tempo fui promovido a Supervisor de Aeroporto e, com 26 anos tornei-me um dos Gerentes de Aeroporto mais jovens da VARIG. A aviação naquela época é incomparável com a dos dias de hoje. Não havia computadores, não havia celulares, os aeroportos não tinham boas condições, enfim, o fator humano era determinante para o sucesso da operação.


A parte mais difícil, sem dúvida, era a gestão de overbooking. Com a implementação do plano Cruzado, em finais de 1986, as companhias aéreas viram-se confrontadas com um cenário muito estranho e de difícil resolução. Tarifas aéreas congeladas, o que permitiu que a população e os vizinhos Argentinos pudessem adquirir bilhetes a um preço muito baixo, aumentando assim o número de reservas e, ao mesmo tempo, as despesas decorrentes eram pagas em dólares (pecas, combustíveis, leasing, etc.) 
Com isto, os overbookings tornaram-se uma prática muito comum nos finais dos anos 80 do século passado.


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Como Gerente de Aeroporto, a pior situação aconteceu num final de tarde de um domingo, quando um voo proveniente de EZE e com destino a GRU/GIG, foi “vendido” o dobro dos assentos. Ou seja, dos 117 lugares disponíveis no Boeing 727 da Cruzeiro, a lista apresentava 234 lugares vendidos. Não havia solução à vista, porque não havia um avião extra e o avião não podia ficar no chão ou decolar com todos os 234 passageiros. Somente com muita imaginação, muitos insultos, ameaças físicas e, por fim, uma musculada intervenção policial, permitiram que 117 felizardos embarcassem para o seu destino.  Todo o processo de check-in foi efetuado por duas Agentes de Aeroporto, devidamente protegidas por PMs armados. O mesmo não aconteceu com os restantes 117, que tiveram que pernoitar na origem e acomodados em voos no dia seguinte.

Continuando o meu promissório percurso na aviação comercial, ingressei na KLM (Porto) como Oficial de Operações Sénior e, mais tarde fui convidado como Gerente de Aeroporto do Porto da jovem companhia aérea regional, Portugália. Com os acontecimentos do 11 de Setembro, tornei-me um expert em matérias de Security, assumindo o cargo de Diretor de Segurança nesta companhia. Paralelamente abracei as funções de Instrutor de Security no “Instituto Europeu de Segurança da Aviação Civil” em Bruxelas, o que me abriu as portas e conhecimentos para assumir um cargo de Gerente de Security em uma das maiores e melhores companhias aéreas do mundo, a Qatar Airways. Uma nova aviação, novas culturas e novos desafios, consolidaram a minha vasta experiência nesta matéria. 


Desta vez viajei por todos os continentes como Auditor de Security e, não posso deixar de referir a situação mais séria e perigosa que passei neste período (2011-2019). Um caso de trafico de drogas numa remessa de carga do Paquistão para o Reino Unido, levaram-me a conduzir uma investigação em Karachi, envolvendo o produtor da fruta, o Agente de Carga e o staff do Aeroporto. A parte mais delicada foi quando nos dirigimos à fazenda do produtor, nos arredores de Karachi. A área era controlada pelo Talibã e, apesar de protegidos por seguranças armados, tive de percorrer o trajeto, escondido na parte traseira de um jipe. A reunião foi realizada debaixo de armas apontadas à nossa mesa.

Hoje, regressado ao velho continente e já aposentado, mantenho o meu “casamento” com a aviação. Neste momento sou o Coordenador de Segurança da Lufthansa Portugal e resolvi, finalmente, concretizar um sonho que me acompanha desde os tempos da VARIG, escrever o meu livro de memórias destes últimos 40 anos. O livro “Porta de Embarque – 40 anos de estórias sobre aeroportos e aviões” acabou de ser publicado em Portugal e no Brasil, estando disponível através do site da Chiado Editora. O livro como já mencionei traz caso reais e engraçados e cômicos, para não dizer preocupantes, até momentos que passei medo e pânico de morrer. Conta casos reais dos locais que conheci, das pessoas que conheci. Cada pedacinho do livro traz uma história. É interessante de ser lido não só por tripulantes e passageiros ou entusiastas da aviação. É um livro voltado para todo o tipo de pessoa. 

O primeiro capítulo do livro é dedicado exclusivamente à extinta VARIG (1981 - 1989). São estórias mais inéditas e engraçadas da obra. Desde overbooking, cancelamentos de voo que acabaram numa discoteca, até ao morto que viajou na primeira classe, encontra-se de tudo. Situações impensáveis na era do politicamente correto dos nossos dias. Convido assim os leitores a desfrutarem as minhas estórias - são dezenas e entenderem melhor a evolução e transformação da aviação comercial nas últimas décadas.

O segundo capítulo do livro é dedicado à minha passagem pela KLM e ao Velho Continente, ao Aeroporto do Porto (1990 - 1994). As histórias de uma tentativa de embarque para Toronto, com malas e tudo, nos escritórios da cidade (Av. da Boavista). Existem ainda varias referências à fantástica cidade de Amsterdam! Casos de polícia ou o dia em que sou ameaçado a responder perante a Corte Holandesa. Para que o leitor conclua o seu conhecimento sobre as diferentes nuances da aviação comercial, levo até ao mundo emergente e rico das companhias aéreas do Médio Oriente. Uma passagem de oito anos por esta região, permite revelar, com detalhes, uma realidade completamente diferente dos padrões a que estamos acostumados. Uma reunião de trabalho num reduto Talibã será, provavelmente, o ponto alto deste interessante capítulo.

Aos mais jovens e principalmente aqueles que estão iniciando agora as suas carreiras, permitam-me dizer-lhes que devem fazer sempre tudo com muito amor e perfeição. Para se tornar um grande Profissional, temos de ser exigentes, antes de mais, com nós próprios. E, do mesmo modo, a paciência é fundamental para o nosso sucesso. A fama e o nome não aparecem em meia dúzia de anos, uma carreira demora muito tempo a construir. Uma última dica, não se dediquem exclusivamente à profissão, viajem, convivam com a família e amigos e, se puderem, arranjem um hobby. Esta profissão não é fácil e de vez em quando é necessário “desligar” um pouco. Espero que gostem do meu livro. Boa leitura!

Em outra ocasião tivemos uma situação de uma passageira que se recusava-se a decolar por que o caixão que transportava seu marido tinha sido carregado em outro avião. Tratava-se de uma senhora que retornava a São Paulo para concluir as cerimónias fúnebres do seu marido, que tinha falecido num acidente em Foz do Iguaçu. O caixão havia sido despachado como carga aérea, como era obrigatório,  porém a senhora tinha acordado com o Departamento de Carga que o caixão seria transportado no porão da aeronave do voo que ela estava reservada. 

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Devido ao sistema de embarque, a passageira acabou por embarcar num voo que sairia cinco minutos mais cedo do que o voo para o qual ela estava realmente reservada, e provavelmente a bordo do avião ela deve ter avistado a urna funerária sendo embarcada no outro avião e então iniciou-se a confusão a bordo do avião. E claro na minha opinião a viúva tinha razão. Por fim, apesar dos atrasos nos dois aviões, tomou-se a decisão correta. desembarcou-se o caixão do outro avião e colocou-se no avião onde a sra. já estava embarcada.

 Uma curiosidade que poucos sabem, é que naquela época o Brasil exportava grandes quantidades de pintinhos e patinhos para a Argentina. O avião descolava com os seus porões abarrotados destas pequenas e simpáticas aves entre Foz do Iguaçu e Buenos Aires. Se por um lado a operação era vantajosa para a companhia, o mesmo não acontecia aos pequenos seres vivos. Em virtude das elevadas temperaturas, típicas do local, boa parte destes pintinhos e patinhos morriam sufocados dentro das caixas de papelão colocadas umas sob as outras. A situação começou a gerar alguma comoção e revolta entre nós funcionários, pelo que não hesitei em reportar o fato à Direção de Carga da companhia. A resposta foi curta e seca: “Não se preocupem, isso está coberto pelo seguro”Apesar do desagrado total sobre a posição da companhia, não desarmamos e sem qualquer tipo de ação combinada entre nós funcionários, de repente as pessoas inadvertidamente começaram a “tropeçar” nas caixas posicionadas em frente ao Despacho, enquanto aguardavam o carregamento na aeronave, provocando pequenos rombos nas mesmas. Tinha a sua graça ver aqueles pintinhos e patinhos todos a fugir da sua sentença morte. Para que os animais não se deslocassem para o seu primeiro e último voo, o pessoal era “obrigado” a recolhê-los em local seguro. Resultado, a partir de uma certa altura, boa parte da comunidade aeroportuária, incluindo o pessoal de outras companhias, tornou-se criador destes bípedes. Afinal o “seguro” pagava!


 
Na época do Brasil lembro da saudosa Rio Sul. Certa vez, o Despacho dos voos estavam verdadeira confusão, com a gestão de vários voos e com somente um Despachante de Serviço para resolver todos os problemas e situações em terra. Um Comandante dentro num avião em voo começa a chamar pelo rádio para transmitir a sua hora de pouso no aeroporto. O Despachante de Serviço, absorvido pela gestão dos voos, não teve disponibilidade, e provavelmente nem vontade, para se levantar e dar retorno ao Comandante. E o Comandante não cessava de chamar pelo rádio. Finalmente o Despachante atende o rádio e o avião pousa. O Comandante desembarca do avião e ao encontrar o Despachante dispara: “Chamei o Despacho 14 vezes e ninguém me respondeu”Funcionário, absorto no meio de umas dezenas de documentos e umas centenas de bilhetes de voo, sem levantar a cabeça, responde prontamente: “Pois é, nós aqui só respondemos à 15ª chamada!” O caso gerou um relatório escrito pelo Comandante e envolveu a sua chefia e o autor, na qualidade de Gerente de Aeroporto. O incidente ficou resolvido satisfatoriamente, sem que o funcionário tivesse sido alvo de qualquer ação disciplinar.       

 

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Alguns amigos as vezes me perguntam como as empresas faziam para escolher quais passageiros ficariam fora do voo no caso em que haviam mais passageiros que lugares, no caso do Overbooking. Bem normalmente adotávamos critérios que sempre funcionavam muito bem. Escolhíamos para conversar casais jovens, turistas de fim de semana ou pessoas sem grandes compromissos eram relativamente fáceis de convencer. Oferecíamos em troca uma noite num hotel de luxo, um bom jantar, ou até um up-grade no voo seguinte eram motivos suficientes para que alguns passageiros se oferecessem para desembarcar. Foi o caso deste voo. Houve uma situação inusitada em Foz do Iguaçu, que enquanto um de nossos Supervisores conversava com alguns passageiros que viajavam sozinhos para propor a eles algo em troca de não embarcarem em seu voo para o  Rio de Janeiro e sim no outro dia. Um senhor dirigiu-se a mim e fez menção de me chamar a um canto. Longe do burburinho normal que se gera nestas situações. Foi direto e objetivo. Queria “muito pernoitar em Florianópolis e assim aproveitaria para “visitar uma amiga”. Não se importaria de voar para esta cidade, pernoitar lá, por sua conta – ou por conta da “amiga”? - e seguir viagem no dia seguinte à hora de almoço. Era a solução possível para que o voo saísse no horário, sem reclamações e sem tumulto. Olhei o voo de Florianópolis que havia lugares e aceitei a sua proposta. Discretamente observei a sua aliança de casado e pensei que sua história que contaria no dia seguinte para sua esposa seria um pouco diferente. E com certeza esse overbooking deixou duas pessoas muito felizes, acredito eu.


Os passageiros que não faziam check-in  tem até trinta minutos antes do embarque tinham seu voo cancelado e era embarcado passageiros interessados do próximo voo. Para isso os interessados se apresentavam no check-in  e nós registrávamos seu nome em um documento chamado Lista de Espera.  E mesmo que os atrasados cheguem, agora já é tarde, não embarcam mais nesse voo. Esta lista, segue critérios de chamada. Pois normalmente tem muito mais inscritos que disponibilidade de assentos. Os “atrasados” provavelmente ficariam em terra e os “otimistas” ansiavam por receber em mãos o tão desejado cartão de embarque que lhes garantisse o embarque no voo. O tumulto era tão grande no momento da abertura da Lista de Espera, todos os interessados exatos trinta minutos antes do voo se apresentavam no balcão do check-in , as vezes haviam mais de vinte pessoas. O atendente falava alto o nome do eventual felizardo e já o direcionava para o atendimento, tudo tinha que ser muito rápido porque o avião não poderia atrasar e não poderíamos decolar com os assentos livres. 


Houveram muitas situações hilariantes nestes momentos. Tudo que é desculpa e histórias para antecipar um voo. Certa vez, no meio desta confusão, enquanto o Supervisor gritava, em sequência, pelos nomes constantes na Lista de Espera de quem iria teria a sorte de ter seu voo antecipado, as vezes por algumas horas, um outro passageiro berrava-lhe mais alto do meio da confusão: “Sabe quem eu sou? Sou deputado!” Acostumado a este tipo de “ameaças”, o Supervisor não deu grande importância e continuou a sua função de chamada cronológica de inscrição da Lista. Mas o homem insistia e insistia em voz alta Sabe quem eu sou? Sou deputado!”. Até que se ouviu uma voz muito alta vinda do bolo de gente que se encontrava em frente ao balcão, que repetia uma única frase: “Tira-lhe o "dedo", tira-lhe o "dedo!” Apesar de termos presenciado as coisas mais absurdas naqueles balcões de check-in, não acreditávamos que alguém estivesse a sugerir cortar um dedo de um passageiro. A cena continuou de ambos os lados e, de repente, a multidão de “atrasados” e “otimistas”, por uma vez uniu-se numa gargalhada geral. Mais tarde viemos a entender. Quando se tira o “dedo” a um deputado o que é que sobra? Por acaso o deputado também sobrou e não embarcou naquele voo.

 

Lembro de outra situação de lista de espera, mas da Central de Reservas. Naquela época a Central tinha um procedimento de reservas para voos já com capacidade lotada e o passageiro sabia que somente embarcaria se houvesse assento livre em razão de alguma desistência. Pois bem, este passageiro dessa reserva se apresentou para o voo já ciente que a sua reserva não havia sido confirmada. Antes de qualquer coisa, solicitou a presença do Supervisor de serviço e num canto afastado dos restantes passageiros e funcionários, iniciou uma história rocambolesca. Que teria recebido um telefonema de alguém com um alto cargo de Chefia na Central de Reservas da Varig, em São Paulo, assegurando-lhe que a sua reserva havia sido confirmada. 


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A conversa foi-se alongando, enquanto o Supervisor aguardava pelo nome do tal “chefe” da Central de Reservas. O homem retirou então um pedaço de papel da carteira e, muito confiante, respondeu: “Foi este senhor, o Sr. Rayapu.” O Supervisor teve de se conter para não desatar à gargalhada. Na verdade, alguém da Central de Reservas teria telefonado ao passageiro e, como era norma, forneceu-lhe o código RAYAPU para facilitar a consulta aos colegas do aeroporto.  Para que não passasse mais vergonha no futuro, foi esclarecido ao passageiro que o termo “RAYAPU” era apenas um código e não o nome de nenhum funcionário com alto cargo na Varig. E assim continua sem a confirmação de embarque aguardando a desistência de algum passageiro de última hora. Por sorte, conseguiu embarcar no voo que pretendia.

 

Certa  vez fui realizar curso avançado de Sistema de Gestão de Segurança, ministrado pela IATA em 2017, no Aeroporto de Doha, de uma semana, com outros 15 participantes Argentinos, Indianos, Libaneses e mais três Catarenses.  No horário do almoço nós e o instrutor, à exceção dos jovens locais, almoçávamos numa das cantinas reservadas aos funcionários do aeroporto. Os outros três sumiam assim que terminava a ação matinal e só voltavam, normalmente atrasados, para a ação da tarde.  Após um desses almoços, fomos surpreendidos por um convite, transmitido por um dos recepcionistas da Direção do Aeroporto, que nos aguardava na sala de aula: “Os senhores Ahamad, Abdullah e Hamed convidam a todos para um snack na sala de reuniões 12, situada ao fundo do corredor. Eles aguardam lá por vocês”. Ficamos curiosos. Um “snack”, logo a seguir a um almoço? Provavelmente ele queria ter dito uma sobremesa, ou uns doces, muito apreciados nesta sociedade. Algo contrariado, o formador acedeu e lá nos dirigimos à sala 12. Quando entramos e fomos recebidos de modo indiferente pelos nossos distintos colegas, não queríamos acreditar no que víamos. Estaríamos a ser filmados para uma daquelas series dos “Apanhados”. Bem, o “snack” consistia numa mesa enorme, repleta de pratos com arroz, saladas, doces, salgados e… (o leitor está sentado?) várias travessas guarnecidas com lagostas! É lógico que o desperdício foi enorme, mas isso também faz parte da cultura local. Quando se convida alguém para uma refeição, deve sempre sobrar uma quantidade significativa de comida, como prova de abundância.

 

Estava o autor em Hamburgo, dentro do A380, quando a simpática engenheira da Airbus que me acompanhava, interrompeu o nosso trabalho e convidou-me para almoçar numa das cantinas da fábrica. Vinha mesmo a calhar pois já estávamos dentro daquela fortaleza voadora há, pelo menos, 4 horas sem um único intervalo. Dirigimo-nos a uma cantina fantástica onde nos era oferecido um grande leque de opções gastronómicas. Peixe, carne, sandes ou pratos vegetarianos, sucos e refrigerantes e claro nada de bebidas alcoólicas e  tudo estava impecavelmente limpo e no seu lugar. Uns meses mais tarde, a cena repete-se, desta vez na cidade de  Toulouse, dentro de um A350. Pausa para almoço numa das cantinas da fábrica. Apesar de mais modesta, em termos estéticos, a qualidade das refeições era boa. O mesmo processo, a escolha do prato principal e depois a bebida. Não queria acreditar, no centro da grande maioria das mesas de 6 lugares dispostas ao longo da grande sala, encontrava-se uma garrafa de vinho tinto “vin rouge” para consumo! Aceitei o convite dos engenheiros locais e saboreei um copo vinho tinto!

E assim desembarquei no Aeroporto de Campinas no dia 23 de dezembro de 1979, com uma pequena mala na mão e um “container” carregado de vontade e esperança de “conquistar” o Brasil. Depois de dois anos ligados ao turismo receptivo, tive a felicidade de ingressar na VARIG, como Agente de Atendimento Especial de Aeroporto.     

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Olhando para trás, só tenho a agradecer a Deus por esta decisão de ter saído de Portugal e ter desembarco em solo Brasileiro, da mesma maneira como milhares de outros Portugueses fizeram desde a descoberta do Brasil. Esta foi a grande oportunidade que aconteceu na minha vida. Foi no Brasil e na VARIG que me formei como homem e profissional. A acolhida do povo Brasileiro não podia ter sido melhor e em pouco tempo eu estava criando a minha família, que me deu dois filhos maravilhosos, nascidos em Foz do Iguaçu. 

A simpatia do povo e aquele “jeitinho Brasileiro” conquistaram-me logo e, confesso, não foi minimamente difícil a minha adaptação a este país maravilhoso e acolhedor.

Em termos profissionais a VARIG foi sem dúvida a melhor escola que podia ter aprendido. O “culto ao Passageiro” e a excelência do atendimento, moldaram para sempre a minha forma de encarar o negócio da aviação comercial. Ao longo dos meus 40 anos de profissão, mesmo em outras companhias, sempre apliquei os ensinamentos obtidos na VARIG em relação ao Passageiro e a sua importância para o sucesso da Companhia.

Ainda hoje viajo regularmente a este país, onde mantenho familiares e grandes amigos que visito regularmente.

Reconheço as grandes diferenças existentes entre o bem-estar dos povos Europeus e as precárias condições que uma grande parte do povo Brasileiro enfrenta, mas a alegria de viver, o otimismo e, sobretudo, a vontade de viver a vida, fazem do Brasil o meu país de coração!

 Esta paixão pelo Brasil foi reforçada nos últimos anos, quando emigrei, mais uma vez, para um país do Oriente Médio e percebi quão difícil foi a minha adaptação a uma cultura e um povo completamente diferente do nobre povo Brasileiro. Bem-haja Brasil! Minhas últimas palavras nessa entrevista gostaria que fossem " Obrigado Brasil e povo Brasileiro por ter me recebido de Braços e Coração aberto a esse pequeno Português que hoje se atreve a se considerar também Brasileiro."


Sucesso!

Parabéns só quem trabalhou nã aviação sabe qui vira um cachaça

Sou ex KLM e não saia da Varig .
Rio de Janeiro


Temos em comum os Karts e a Aviação Comercial.
Director Comercial da VARIG
GSA da Thay, American Airlines, Air Malta, Air Seychelles...

Parabéns

Só quem viveu essa estória, sabe o amor que tínhamos pela VARIG

Parabéns

Bravo

meus sentimentos a família e amigos!!mais um amigo do meu marido que falece esse ano!!que Deus proteja a todos!!
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Ivone Campos Cruz
 ele não faleceu!! Ele publicou um livro!! E graças a Deus ele está bem vivo!!


Parabéns pra todos vocês uma grande família VARIG e TRANSBRASIL + VASP uma só Família PRA TODOS DESTA época um excelente final de semana saúde paz felicidades vida longa.com sabedoria.


História muito interessante.


Parabéns

Parabéns

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a vasp transportava muito também codornas e morriam bastante também

Quantas histórias interessantes!! Sensacional!!


Parabéns!

Parece muy interesante ese libro. Será que contiene historias y anécdotas del vuelo que hacia la ruta GIG/CGH/IGU/ASU y luego después GIG/GRU/IGU/ASU?

Fui comandante da Portugália em 2000 e 2001. Levei alguns tripulantes de volta pra Lisboa quando alternaram Porto. Encontrei uma vez minha grande amiga comissária Kátia Cristina. Bons tempos.

Parabéns
 pelas belas estórias vividas.