quinta-feira, 27 de fevereiro de 2025

Publicitário Luiz Carlos recorda fatos inéditos da época da TAM

É uma alegria poder compartilhar alguns momentos inesquecíveis que passei com o brilhante Rolim Amaro. "O Comandante foi o empresário, o personagem, a personalidade com quem eu mais debati,  briguei e admirei na minha trajetória profissional de quase cinquenta anos. Uma das coisas que mais admirava nele era sua honestidade profissional. Por exemplo, se alguém chegasse com uma ideia melhor que ele tinha, ele acatava e não tirava a paternidade de quem deu a sugestão. E seu filho Marcos é o empresário mais generoso com quem eu já trabalhei. Eu gosto do Marcos deste da época que ele era um guri."

O Luiz Carlos recorda uma ocasião que acompanhou uma entrevista do Comandante Rolim com o jornalista Guaraci, na época da Revista Exame, comentava que era uma pessoa simples, não tinha o costume de ostentar e tinha apenas um relógio. Acabada a entrevista os três foram almoçar. O Comandante ainda na mesa se despediu do jornalista e foi embora sozinho para o escritório. Em seguida os dois foram para o estacionamento do shopping. "Quando então para em nossa frente um Porsche Carrera, baixo o vidro e lá está o Comandante Rolim com um charuto. Nos dá um piscada com um dos olhos e vai se embora com a tal simplicidade alegada."

Era comum o Comandante levar o Marcos na TAM e conceder entrevistas com ele no seu colo e inclusive penteando o menino, sem o menor constrangimento. Numa dessas entrevistas para uma revista especializada em aviação, o repórter ao término se sentindo muito íntimo do entrevistado, até porque ele deixava os jornalistas muito à vontade, lhe perguntou "esse menino é seu "neto" Comandante Rolim?". O Rolim não perdeu as estribeiras e lhe respondeu: "É deveria ser! Mas é meu filho!"  

Uma situação muito comum foi quando foi criado o Departamento Fale Com o Presidente que ficava ao lado de sua sala, isso lá nos primórdios da TAM, quando a companhia não tinha mais de mil colaboradores. O Comandante se sentia à vontade de sair de sua sala e ir para o outro setor para atender o telefone e assim falava "Alooouuuuuu. Boa tarde. Aqui é o Comandante Rolim falando!" A pessoa que estava ligando achava que era brincadeira e ficava rindo, e ainda dizia "Imagina que é o Comandante Rolim!" E ele insistia "É aqui é o Comandante Rolim que fala pode dizer porque você está me ligando!" A pessoa demorava um certo tempo para acreditar. Assim, ele anotava o pedido, fosse por exemplo trocar a bala de hortelã por exemplo de café. E no voo seguinte do passageiro já estava lá a bala que ele tinha solicitado. Ele mandava um motorista comprar a bala no supermercado mais próximo comprar a bala e já estava resolvido.

Com a chegada dos Fokker 100 a TAM passou a realizar voos inaugurais em cada rota nova que o jato iria realizar, convidando jornalistas, clientes e realizava coletiva para a imprensa. Realizava um lindo sobrevoo na cidade. Uma das primeiras cidades foi Curitiba. No final desse evento eu passei numa padaria que vendia cigarros e charutos e tive a brilhante ideia de comprar um charuto para o Comandante, porque sabia que ele gostava, mesmo sabendo que não era um Cohiba que é reconhecido como o melhor charuto não só de Cuba, mas do mundo. O Rolim olhou o charuto e com a maior cara de pau me disse "O Sr. vai longe nessa companhia!" E eu não sabia se eu ria ou ficava sério! Até porque eu sabia que o charuto não era grande coisa, mas valeu a minha modesta intenção.

Certa vez  reclamou que eu não ficava o tempo todo na TAM, visto que eu não era funcionário, eu era prestador de serviço. Então, lhe respondi "Comandante, mas eu estou a quatro quilômetros!" E ele rapidamente me olhou e me disse: "Eu gostaria que você estivesse a quatro passos!" Sobre o famoso tapete vermelho que foi uma das maiores marcas da TAM Luiz Carlos relembra que surgiu junto com o personagem do desenho animado do "Reizinho" que o Comandante Rolim realizou ampla campanha publicitária de forma que o passageiro na sua empresa era tratado como um verdadeiro rei, a própria majestade. 

Por outro lado, o nível de sua preocupação em manter elevado a qualidade de atendimento, envolvia inclusive funcionários disfarçados entre os passageiros para avaliar a qualidade dos serviços e do atendimento. Todo o foco da TAM sempre foi a qualidade do atendimento e a satisfação dos clientes. Isso que fez a TAM crescer. Os passageiros rapidamente sentiram o diferencial no atendimento em todos os setores da companhia. Funcionava a simplicidade e a desburocratização em atender e resolver as questões. Um simples sorriso sempre foi outra marca da empresa.

A TAM foi a única empresa aérea que durante anos adotou um famoso "babeiro branco" que era distribuído antes das refeições. Poucos sabem de sua verdadeira origem. E surgiu a partir de um incidente quando uma comissária involuntariamente sujou a gravata de um passageiro. O Comandante Rolim casualmente estava a bordo e rapidamente ofereceu sua gravata para o passageiro. Retornando ao escritório convocou uma reunião para definirem uma solução, visto que naquela época a TAM servia refeições a bordo, inclusive com molhos. Então, nasceu o famoso babeiro muitos passageiros levavam para seus lares como lembranças, principalmente os colecionadores de souvenir, e com certeza muitos ainda devem ainda existir em coleções particulares.

A TAM começou a ser percebida pelo mercado não apenas como uma empresa que chegou com uma frota novinha de aviões. Estava marcada pelo rosto de seu comandante e associada a bons serviços: tapete vermelho ao pé da escada da aeronave, recepção do próprio comandante a cada um dos passageiros, simpatia inigualável dos tripulantes, serviço de bordo de primeira classe, excepcional atendimento sem burocracia e rapidez, através de um moderno sistema. "A TAM buscava eficiência e rapidez em todos os canais, desde o check-in, compra de passagens, o Fale com o Presidente, a pontualidade nos voos, o serviço de bordo. Ou seja, a TAM apresentou um novo serviço para a velha aviação". Era como Rolim fazia questão de enfatizar a quem pudesse ouvir: avião novo e piloto velho!

A sua visão empresarial na forma de atender e escutar o cliente era algo inovador. Os passageiros ficavam incrédulos por estarem sendo recebidos pelo dono da empresa na porta do avião. Isso era inovador. Até então nunca se tinha visto algo semelhante no Brasil. E não raro os passageiros faziam questão de lhe oferecer os seus cartões de visita. Ocasião que o Comandante aproveitava para realizar a gentileza e entrega também o seu. E eram minutos que escutava dos passageiros elogios e críticas. Depois no retorno de sua sala enviava pessoalmente uma resposta por e-mail a cada um dos cartões que havia recebido. 

Agora imagina, o passageiro ao chegar no seu destino e abrir sua caixa de e-mails e se surpreender com a mensagem do dono da TAM. São pequenas iniciativas que ficam marcadas e fazem a diferença. Isso foi uma das razões que fez a TAM crescer, Rolim não só escutava seus clientes, mas colocava na prática muitas das sugestões que lhe eram dadas. Os registros telefônicos não iam para um lixo eletrônico. Serviam para serem idealizadas na TAM. 

Sua estratégia estava voltada ao diferencial da qualidade do atendimento. A TAM tinha que ter o melhor atendimento de todas as demais empresas nacionais. E tinha. Quem voava naqueles tempos não esquece até hoje do "Jeito TAM de Voar!" Quando se encontra um passageiro Fidelidade Vermelho daquela época todos lembram com saudosismo de tudo. É uma época que não voltará mais. Nunca mais infelizmente. Sobre a política de descontos o Rolim era contrário, porque isso colocaria em risco supremacia da qualidade. Certa vez, eu lhe pedi uma passagem para uso particular e o Comandante perguntou se eu lhe daria um desconto nos meus honorários de prestação de serviços. 

A TAM ainda caçula entre as todo-poderosas companhias aéreas protagonizou lances de ousadia a bordo dos turboélices Fokker F 27. Muitos devem se lembrar dos autos falantes dos aeroportos de Congonhas e do Santos Dumont solicitando aos passageiros fichas a partir do número 700 para realizar o embarque “imediato”, isso depois de mais de duas, três horas de exaustiva espera nos dias e horários de pico. Então, a TAM chegou como alternativa, com o pequenino Fokker 27, compensando a falta de oferta e de espaço com a possibilidade de assentos marcados com antecedência, serviço de bordo impecável e quente, sendo outro diferencial na época. Os aviões Fokker F 27 decolavam lotados mesmo sem desconto algum, todos preferiram estar num dos assentos da TAM, porque tinham hora certa para decolar e um espetacular serviço de bordo. Os passageiros queriam qualidade e não desconto. 

No dia de estreia do voo da TAM na rota, uma aeronave Fokker F 27 partiu de São Paulo rumo ao Rio de Janeiro com pouco mais de um terço de passageiros pagantes e o restante de jornalistas e diretores da empresa. Na chegada ao Santos Dumont, uma cortina de repórteres aguardava na pista, para entrevistas com o comandante Rolim e os passageiros que escolheram escapar às garras do monopólio das gigantes do setor. Já no retorno a São Paulo, alguns fatores contribuíram para lotar o pequeno Fokker F 27. A iniciativa dos funcionários da TAM, com o comandante Rolim literalmente no comando da operação, caçando passageiros de outras companhias (muitos dos quais com fichas de números acima de 700 de espera); e o aceite do candidato Roberto Freire, então na corrida à Presidência da República no primeiro turno, em voar com a companhia. A imprensa se deliciou com tanto material.

Certa vez o Comandante decidiu patrocinar o Clube São Paulo para associar a TAM a cidade e o Luiz Carlos relembrou que chegou atrasado na reunião e o Rolim falou "Sempre se espera pela pior pessoa numa reunião!" Nisso o Rolim explicou: "Já está tudo resolvido, será realizado a cerimônia do evento no Morumbi." Foi quando o Luiz lhe sugeriu de ser realizado no Aeroporto de Congonhas. Nisso os olhos do Comandante brilharam com a ideia e falou "Brilhante ideia Luiz Carlos, vamos realizar no meio da Pista. Melhor impossível! Parabéns!!!. E assim foi realizado. No meio da pista do Congonhas. Sendo realizado um enorme de um evento para a assinatura com o presidente da época do Clube que era o Nunes Galvão.

Mas um fato ainda incomodava o Comandante Rolim em seu plano rumo à liderança do espaço aéreo brasileiro: ter a imagem da TAM intimamente associada à cidade de São Paulo. E o patrocínio do São Paulo Futebol Clube ainda não era suficiente, como ele costumava falar: "Quero a TAM conhecida como TAMGonhas!" Naquela época a TAM era a única empresa visionaria que investia pesado em Congonhas, Comandante entendia que "Congonhas é o aeroporto dos homens de negócios!"

Este conceito de associar a TAM ao Congonhas fez eu criar o projeto “Um Voo no Tempo”. Ao apresentar a proposta, o comandante Rolim não hesitou: "Senhor Luiz, passe no Marketing, se entenda com eles e pode tocar!" De início fiquei assustado e indaguei: "Mas comandante, é um projeto caro, o senhor não quer nem saber quanto vai custar?" Ele me olhou nos meus olhos com um sorriso e uma seriedade ao mesmo tempo e disse "Disso eu cuido pessoalmente, não precisa se preocupar!",  sentenciou com um ar maroto de felicidade ao sorrir.

O Projeto “Um Voo no Tempo” foi seguramente a festa mais pomposa já realizada pela TAM em sua longa trajetória, e impossível de ser superada pelo local onde aconteceu: no último andar do hoje  reformado e modernizado aeroporto de Congonhas. E quem dela participou jamais irá esquecer. A ideia foi irresistivelmente tentadora, naquela noite a TAM devolveu à cidade a nostalgia de um sonho antigo. Com a intenção de resgatar o glamour dos bailes dos anos dourados realizados em São Paulo. Foi realizado uma linda festa black-tie para 1.000 privilegiados. Imaginou-se uma exposição fotográfica que narrasse a história da construção do aeroporto, bem à entrada dos convidados, hoje saguão principal.

Quem fosse um dos mil felizardos a receber em casa um dos convites na forma de cartão de embarque estaria incluído na seleta lista elaborada pela TAM. O convidado era recepcionado pelo comandante Rolim e aeromoças trajando uniformes à moda anos 50, passava pela exposição fotográfica e se encaminhava para a sala de embarque. A cada cem pessoas, inicialmente eram embarcadas num dos dois jatos Fokker 100 colocados à disposição para a festa. A decolagem e o rápido voo sobre a cidade de São Paulo que iam até Santos e Campinas. Para depois os convidados serem direcionados ao salão de festas todo ornamentado à imagem e semelhança daquela década. Então, imaginem isso. A chegada da festa da TAM iniciava primeiro com os convidados realizarem um voo aéreo sobre a cidade de São Paulo. Isso é tão surreal, que é escrevi duas vezes.

No salão soava a música dos The Platters (“Only you”, entre outros sucessos) e na pista muita gente circulava com cuba-libre, a bebida mais solicitada da noite. Emissoras de televisão, repórteres de rádio, jornais e revistas brigavam por uma entrevista com famosos e colunáveis. Àquela altura, o empresário Olacyr de Moraes, um dos mais próximos amigos do comandante Rolim, ainda não tinha tropeçado no mundo dos negócios e era chamado de “rei da soja”. O “Um Voo no Tempo” custou cerca de US$ 200 mil, um orçamento extremamente barato se considerados alguns dividendos. O maior deles, sem dúvida, foi o espaço generoso que a imprensa dedicou à festa, fazendo com que a TAM ficasse exposta positivamente durante mais de uma semana.

Conforme o Luiz Carlos o Comandante Rolim era muito brincalhão e não perdia oportunidades. Certa ocasião ele precisava da assinatura urgente do Presidente da companhia que estava almoçando na sua própria sala com o Olacyr de Moraes. A secretária avisou e ele autorizou a sua entrada. O Comandante analisou o documento e assinou. Em seguida o Rolim disse: "Olacyr, esse é meu assessor de imprensa. Você usa e depois você manda matar, entendeu?" E todos deram gargalhadas. Quando as pessoas vinham lhe perguntar sobre sua idade, que acho que ele não gostava de responder, ele sempre dava a mesma resposta, que nunca foi publicada "A idade da gente é uma coisa séria né! Quando se é garoto a gente faz um xixi contra o vento e vara o vento. Depois vai ficando velho e vai ficando velho e o xixi cai no sapato. Então, deixa essa conversa para lá"! Outra vez quando estavam almoçando, o Comandante percebeu que o Luiz Carlos tinha o hábito de almoçar muito rápido e lhe disse "Quando eu vou contratar alguém eu a convido para almoçar, e se ela demorar muito para comer, eu não a contrato!"

Mas o Comandante Rolim não era só trabalho. Gostava de uma boa música, principalmente a paraguaia. Tinha uma fazenda em Ponta Porã, no Mato Grosso, sendo fronteira com a cidade Pedro Juan Cavallero do Paraguai. E lá vivia com os músicos. E gostava muito de uma sanfona, chegando a transportar uma gaita num avião. E foi provavelmente por tudo isso que teve a brilhante ideia de criar o espaço na Sala do Congonhas e do Guarulhos com espaço com música ao vivo e que depois foi expandido para alguns outros aeroportos. Chegou inclusive a utilizar sanfoneiros por algum tempo.